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Essência e desenvolvimento da incapacidade como fato jurídico-previdenciário e a rejeição da MP nº 242

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Sumário: 1. Prolegômenos; 2. Auxílio-doença; 3. Aposentadoria por invalidez; 4. Auxílio-acidente; 5. Carência,data de início da incapacidade – DII e qualidade de segurado; 6. Data de início dos benefícios – DIB; 7. Renda mensal inicial – RMI; 8. Suspensão e cessação/cancelamento dos benefícios incapacitantes; 9. Competência para o processo judicial; 10. A MP 242, a decisão do STF e a rejeição do Congresso Nacional; 11. Epílogo


1. Prolegômenos

            O Brasil é um Estado em transformação. Particularmente com vistas à consolidação do Plano Real, a reforma do padrão monetário se seguiu e vem seguindo as reformas estruturais: abolição de monopólios estatais; reformas administrativa, fiscal e previdenciária; privatização de estatais e outorga de serviços.

            No Regime Geral de Previdência Social - RGPS, vemos e vivemos suas transformações. A mais recente veio com o "pacote da Previdência", lançado pelo então Ministro da Previdência Romero Jucá, logo que tomou posse, com a edição da MP 242, em 24.03.05. Abstraímos a MP 258, de 22.7.05, que cria a "Super-Receita", porque afeta à área admininstrativo-tributária.

            E, como grande parte dessas transformações acaba nas barras dos tribunais [basta lembrar que a MP 242 já é objeto da ADI 3.467, proposta no STF em 12.04.05, ou seja, menos de 1 mês após sua edição!], a Justiça tem papel importante nessa história, que contamos aqui, pontuando a jurisprudência dominante sobre os benefícios por incapacidade, de forma objetiva, sem o fel de Cassandra nem o mel de Pangloss. Isso porque este conhecimento é de prudência elementar, como bem disse o Ministro Sepúlveda Pertence, decano do STF, "que mais não seja, para fugir do ridículo de enunciar o óbvio vetusto como verdade nova ou, como gloriosa descoberta jamais dada à luz, a antigualha de há muito superada" [01].

            Sendo acacianos [e "politicamente corretos"], começamos pelo começo, distinguindo em linhas gerais os benefícios incapacitantes, abordando em seguida suas particularidades nos diversos aspectos previdenciários.


2. Auxílio-doença

            O auxílio-doença é devido a toda e qualquer categoria de segurado atingido por incapacidade laboral temporária por mais de 15 dias consecutivos, enquanto permanecer nessa condição [art. 59, caput, LBPS].

            Exceção ao princípio da inércia na concessão de benefícios previdenciários, mesmo que o segurado não tenha requerido auxílio-doença, o INSS deve processar de ofício o benefício quando tiver ciência da incapacidade do segurado [art. 76, Decreto 3.048/99 – RPS].

            O segurado em gozo de auxílio-doença não pode exercer nova atividade profissional, sob pena de cancelamento do benefício. De outra banda, no caso de exercício concomitante de mais de uma atividade profissional diferente [ainda que vinculadas a regimes previdenciários diversos, ex: uma no RGPS e outra no regime próprio de previdência], é possível permanecer trabalhando mesmo em gozo de auxílio-doença, se a incapacidade atinge o exercício de somente uma das atividades [art. 73, caput, RPS]. Dessa forma, sendo constatada, pela perícia médica, a incapacidade permanente e insuscetibilidade de reabilitação para o exercício de apenas uma das atividades habitualmente desenvolvidas pelo segurado, este faz jus ao auxílio-doença indefinidamente, pois a aposentadoria por invalidez não pode ser concedida enquanto houver possibilidade de exercício de outra atividade laborativa. Outrossim, se nas várias atividades o segurado exercer a mesma atividade profissional, será exigido de imediato o afastamento de todas.

            Ficando o segurado totalmente incapaz para o trabalho que desenvolvia, em função de acidente de qualquer natureza, deve ser reabilitado para outra função percebendo auxílio-doença, não se justificando a conversão em auxílio-acidente enquanto isso não ocorrer [02].


3. Aposentadoria por invalidez

            A aposentadoria por invalidez é devida a toda e qualquer categoria de segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado totalmente incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição [art. 42, caput, Lei 8.213/91 - LBPS].

            Este benefício, no direito anterior, tornava-se irrevogável após a sua manutenção por um período de 5 anos [Súmula 217/STF]. A LBPS conferiu natureza precária à aposentadoria por invalidez, que pode ser cancelado nas hipóteses dos arts. 46 e 47. Surge aí uma específica questão de direito intertemporal: essa precariedade não se aplica àqueles benefícios que já contavam mais de 5 anos de manutenção na vigência da Lei 8.213/91.

            A conversão de aposentadoria por tempo de serviço em aposentadoria por invalidez, em face de incapacidade superveniente oriunda de doença profissional ou do trabalho, era permitida na redação original do art. 123, LBPS. A norma foi revogada pela Lei 9.032/95, de modo que se a incapacidade definitiva surgiu após esta lei, já não há falar em direito à transformação.

            Se o segurado está parcialmente incapaz, não se justifica, à míngua de previsão legal, a concessão de aposentadoria por invalidez fincado em que suas condições pessoais, socioeconômicas e culturais [ex: idade avançada, baixo grau de instrução ou as atividades que sempre exercera durante toda a vida] impedem-lhe desempenhar qualquer outra função que permita a subsistência. É que este benefício, não tendo natureza assistencial, não se presta a amenizar restrições do mercado de trabalho no nosso país [03].


4. Auxílio-acidente

            O auxílio-acidente é benefício de natureza indenizatória devido a algumas categorias de segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia [art. 86, caput, LBPS, redação das Leis 9.032/95 e 9.528/97]. Na redação original, o benefício era restrito a acidente do trabalho [e equiparados – arts. 20 e 21, LBPS], de modo que somente a partir da Lei 9.032/95 os acidentes de qualquer natureza dão ensejo ao auxílio-acidente. Outrossim e em relação à perda da audição [disacusia], tal novidade não se aplica: continua dando ensejo ao benefício somente se decorrer de acidente de trabalho e equiparados, por força de regra específica do art. 86, §4o, LBPS.

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            Fazem jus ao auxílio-acidente o segurado empregado [urbano ou rural, exceto o doméstico], o trabalhador avulso e o segurado especial [art. 18, § 1º, LBPS].

            O fato condicionante do auxílio-acidente é a perda ou redução da capacidade de trabalho do segurado, sem caracterizar a invalidez permanente para todo e qualquer trabalho [hipótese de aposentadoria por invalidez]. É necessária ainda a demonstração do nexo de causalidade entre o infortúnio e a redução da capacidade laborativa [04]. Nessa toada, não enseja a concessão do benefício os casos em que: i) o requerente apresenta apenas redução da capacidade funcional sem repercussão na capacidade laborativa; e ii) há mudança de função, mediante readaptação profissional promovida pela empresa, como medida preventiva, em decorrência de inadequação do local de trabalho [art. 104, § 4º, RPS].

            Para a concessão do auxílio-acidente, embora não se exija carência, mister que o requerente possua a qualidade de segurado no momento do acidente. Nessa premissa, não há óbice para a concessão do benefício à pessoa desempregada, se o acidente ocorreu no período de graça [art. 15, LBPS]: "o fato de o Impetrante estar desempregado não constitui óbice para a concessão do benefício de auxílio-acidente, eis que não deixou de pertencer à categoria de empregado, mantendo tal condição enquanto estiver vinculado à Previdência Social pelas contribuições vertidas nessa condição" [05]. É aplicação da interpretação teleológica da norma previdenciária.

            Sua natureza indenizatória permitia fosse acumulado com salário, bem assim com outros benefícios pagos pela Previdência Social, que têm natureza diversa [natureza substitutiva], cf. art. 86, § 3º, LBPS, redação original. A Lei 9.528/97, no seu turno, restringiu dessa permissão a aposentadoria, de modo que somente é ainda possível a acumulação [por incidência de direito adquirido previdenciário] se e somente se o fato jurígeno do auxílio-acidente [que é o acidente de qualquer natureza] for anterior ao advento desta lei [independente da data da consolidação das lesões] [06].


5. Carência, data de início da incapacidade – DII e qualidade de segurado

            O auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez exigem carência de 12 contribuições mensais [art. 25, I, LBPS]. Outrossim, esses benefícios independem de carência nos casos de acidente de qualquer natureza, incluindo aí acidentes de trabalho e equiparados, cf. arts. 20 e 21, LBPS, bem como de moléstias graves, assim consideradas as constantes da Portaria Interministerial 2.998/01 [art. 26, II, LBPS].

            O que releva na concessão desses benefícios incapacitantes não é a data de início da doença - DID, e sim a data de início da incapacidade – DII. Nessa compreensão, o termo final da contagem da carência é a DII, e não a DID. Desse modo, não são devidos esses benefícios se a incapacidade alegada decorre de doença preexiste à filiação [leia-se: DII antes da filiação], exceto quando a incapacidade sobrevier de progressão ou agravamento dessa doença [arts. 42, §2o, e 59, p.u., LBPS] [07].

            O auxílio-acidente, no seu turno, independe de carência [art. 26, I, LBPS].

            Registre-se, por oportuno, que a perda da qualidade de segurado inviabiliza a concessão dos benefícios incapacitantes tout court, pois extinta a relação jurídico-previdenciária na qual o INSS ocupa o pólo passivo para benefícios e serviços [art. 102, caput, LBPS]. O termo para verificação da qualidade de segurado é a DII, e não a data de entrada do requerimento - DER, de modo que não implica a perda do direito ao benefício quando o segurado deixa de contribuir para previdência por estar incapacitado para o trabalho, i.e., após a DII, ocorrendo já o direito adquirido. [08]

            Finalmente, o aposentado por idade ou tempo de contribuição que volta a trabalhar não tem direito a benefício algum por incapacidade, somente fazendo jus à reabilitação, quando empregado, nos termos do art. 18, §2o, LBPS.


6. Data de início dos benefícios - DIB

            O auxílio-doença é devido ao segurado empregado a partir do 16o dia do afastamento da atividade [art. 60, primeira parte, LBPS], sendo que os primeiros quinze dias de afastamento ficam por conta do empregador [art. 60, § 3º, LBPS]. Para os demais segurados, o benefício é devido a contar da DII [art. 60, segunda parte, LBPS]. Quando requerido por segurado afastado da atividade por mais de 30 (trinta) dias, o auxílio-doença é devido a partir da DER [art. 60, §2o, LBPS].

            Se concedido novo benefício decorrente da mesma doença dentro de 60 dias contados da cessação do benefício anterior, o empregador fica desobrigado do pagamento relativo aos 15 primeiros dias de afastamento, prorrogando-se o benefício anterior [leia-se: o auxílio-doença anterior é reativado a partir da DCB], nos termos do art. 75, § 3º, RPS.

            A aposentadoria por invalidez decorrente de transformação de auxílio-doença, é devida a partir do dia imediato ao da cessão do auxílio-doença [art. 43, caput, LBPS].

            Quando não for proveniente de transformação de auxílio-doença, a DIB observará o § 1o desse art. 43 : a) para os segurados empregados, com exceção do doméstico, a contar do 16o dia do afastamento da atividade ou, se entre o afastamento e a entrada do requerimento decorrerem mais de 30 dias, na DER; b) ao segurado empregado doméstico, trabalhador avulso, contribuinte individual, especial e facultativo, na DII ou na DER, se entre essas datas decorrerem mais de 30 dias.

            O auxílio-acidente será devido: a) a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado [art. 86, §2o, primeira parte, LBPS]; b) na data da entrada do requerimento quando não antecedido de auxílio-doença.

            Em se tratando da definição da DIB de benefícios incapacitantes concedidos judicialmente, aplica-se o seguinte raciocínio para todos, distinguindo-se duas situações: a) não houve prévio requerimento administrativo ou segregação compulsória do trabalho: a DIB há de ser fixada na data da juntada do laudo pericial em juízo [09]; b) houve: a DIB pode então ser fixada retroativamente, se assim determinar o laudo pericial. Vale registrar que a hipótese (b) se satisfaz com o requerimento de qualquer dos benefícios incapacitantes, em virtude do princípio da fungibilidade entre estes, de modo que, ilustrativamente, havendo requerimento de auxílio-doença deferido e posteriormente cancelado, a DIB de aposentadoria por invalidez concedida judicialmente poderá ser fixada na DCB do auxílio-doença [10].

            O princípio da fungibilidade é aplicado aos benefícios oriundos de incapacidade tout court, permitindo que o juiz conceda, v.g., aposentadoria por invalidez mesmo que o autor pleiteie apenas a concessão do auxílio-doença ou auxílio-acidente, se resulta da perícia médica que a incapacidade laboral do segurado é total e permanente, caso em que não há error in procedendo nem nulidade por julgamento extra petita [11]. Há aqui uma flexibilização do rigor científico por questão de política judiciária: considerando que se trata de processo de massa, como são as causas previdenciárias, não seria razoável impor aos segurados - nem mesmo à tão crédula quanto famosa "Velhinha de Taubaté" -, o ajuizamento de nova ação para obter, no caso e após repetida a mesma liturgia, o reconhecimento da aposentadoria por invalidez

            A perícia judicial deve ser realizada por médico especializado na área da enfermidade [12]. Há ainda a possibilidade de complementação da prova pericial mediante prova testemunhal, até porque ‘O juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos’ [art. 436, CPC].

            Neste passo, importa salientar que, muita vez, o segurado que teve o benefício cancelado administrativamente por alta médica, pede seu restabelecimento judicial já em sede de antecipação de tutela, trazendo atestados subscritos por médicos particulares como prova da persistência da incapacidade. Em casos tais, a jurisprudência tem entendido que prevalece a perícia realizada pelo INSS no âmbito do processo administrativo, a qual goza de presunção de veracidade, só podendo ser afastada, para efeito mesmo de antecipação de tutela, por perícia judicial realizada com médico da confiança do juízo [13].

            Merece registro, afinal, a prática adotada por alguns juízes do Juizado Especial Federal que, para dar maior celeridade ao feito, têm determinado a realização de perícia judicial antes mesmo da citação do INSS, que é apenas intimado para acompanhar a perícia na data aprazada. Novamente aqui, a prática heterodoxa é preferível [em detrimento da aplicação da lei a ferro e fogo], seja por questão de política judiciária, bem assim por se tratar de processo de massa e com fincas na instrumentalidade do processo: é um mal menor para evitar um mal maior, qual seja a transformação das causas previdenciárias em causas sucessórias.


7. Renda mensal inicial - RMI

            Mencione-se, inicialmente, que os benefícios decorrentes de acidente do trabalho tinham sua RMI calculada com base no salário-de-contribuição do dia do acidente ou no salário-de-benefício, o que lhe fosse mais favorável [arts. 28, § 1o, LBPS, redação original], observando-se, em caso de remuneração variável, a regra específica do art. 30, LBPS, redação original. Andante, a partir da Lei 9.032/95, o benefício acidentário é calculado sempre e sempre com base nas regras gerais, a seguir analisadas.

            Aqui abrimos um parêntese para uma questão. Na compreensão de que a RMI é a mesma para os benefícios acidentários e demais benefícios previdenciários incapacitantes, há sentido no esforço hercúleo que é demonstrar o nexo causal, com vistas à caracterização do benefício como acidentário? A resposta é afirmativa. De efeito. Comprovar o nexo causal não é uma vitória de Pirro na Batalha de Heracléia, pois os benefícios acidentários, para além da dispensa de carência e garantia de estabilidade provisória de 12 meses [art. 118, LBPS], têm isenção do Imposto de Renda, nos termos do art. 6o, XIV, Lei 7.713/88 e art. 2o, I, OI PROCGER/DIRBEN 31/01. Os outros benefícios incapacitantes somente têm isenção quando oriundos das patologias arroladas no art. 2o, II, OI PROCGER/DIRBEN 31/01, a exemplo da tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla e neoplasia maligna. Fechamos o parêntese.

            O auxílio-doença, inclusive o decorrente de acidente de trabalho, consiste numa renda mensal correspondente a 91% do salário-de-benefício - SB [art. 61, LBPS, redação da Lei 9.032/95].

            No caso de exercício de atividades concomitantes, se o segurado é considerado incapaz para uma ou algumas delas, e não para todas, o valor do salário-de-benefício é calculado tão-só com base no valor dos salários-de-contribuição dessas atividades para as quais se incapacitou [art. 73, § 1º, RPS]. O RPS, no seu art. 73, § 4º, inserido pelo Decreto 4.729/2003, dispõe que o auxílio-doença concedido em função de afastamento de apenas uma ou algumas atividades, mas não de todas, pode ser pago em valor inferior ao salário mínimo, desde que sua soma com os demais rendimentos supere o valor mínimo legal. Tal dispositivo é inconstitucional [viola o art. 201, § 2º, CF] e ilegal [viola o art. 33, LBPS], na medida em que este benefício substitui o rendimento do trabalho [natureza substitutiva]. Demais a mais, embora se admita excepcionalmente que a Administração Pública amplie, via regulamento para além da lei, direitos dos administrados [exemplo eloqüente no âmbito previdenciário é a continuidade da conversão da atividade especial em comum, mesmo após 28.5.98, com base no art. 70, RPS, redação do Decreto 4.827/03, que contraria o art. 28, Lei 9.711/98], não se admite absolutamente que o regulamento restrinja a lei: o Estado não pode dar com uma mão e tirar com outra!

            O benefício pago ao segurado especial é no valor de um salário mínimo (art. 39, I, LBPS), salvo se houver contribuições facultativas (art. 25, § 1º, LBPS), quando se aplica a regra geral (art. 39, II, LBPS) [14].

            A aposentadoria por invalidez, inclusive a decorrente de acidente de trabalho, consiste numa renda mensal correspondente a 100% do SB [art. 44, caput, LBPS, redação da Lei 9.032/95].

            Surgiu, quase sem querer, nas liquidações de sentença versando o IRSM de fevereiro de 1994 – 39,67%, certa polêmica em torno da RMI da aposentadoria por invalidez precedida de auxílio-doença. Se a esfinge não deu nenhuma dica a Édipo, a legislação previdenciária, diversamente, nos dá.

            Nessa compreensão, se no período-básico-de-cálculo - PBC da aposentadoria por invalidez, o segurado esteve em gozo de auxílio-doença [leia-se: a DCB do auxílio-doença não coincide com a DIB da aposentadoria por invalidez, hipótese em que há retorno ao trabalho e novo afastamento do trabalho - DAT entre os benefícios, não ocorrendo transformação do auxílio-doença em aposentadoria por invalidez], procede-se a novo cálculo do SB, contando como salário-de-contribuição o valor do salário-de-benefício do auxílio-doença, reajustado pelos mesmos índices de correção dos benefícios em geral [art. 29, § 5º, LBPS].

            Noutra banda, se o segurado estiver em gozo de auxílio-doença, é dizer, a aposentadoria por invalidez é decorrente de transformação de auxílio-doença, "A renda mensal inicial da aposentadoria por invalidez concedida por transformação de auxílio-doença será de 100% do salário-de-benefício que serviu de base para o cálculo da renda mensal inicial do auxílio-doença, reajustado pelos mesmos índices de correção dos benefícios em geral " [art. 36, § 7º, RPS] [15]. Deveras, não há novo cálculo de salário-de-benefício, mas reajuste daquele já calculado para o auxílio-doença, pela boa razão de que o PBC de ambos os benefícios é o mesmo e limitado à mesma e única data de afastamento do trabalho – DAT. Há ainda o argumento histórico: esta é a mens legis da legislação atual, em sintonia fina com toda legislação anterior.

            Para o benefício pago ao segurado especial, vale o susomencionado para o auxílio-doença.

            O segurado aposentado por invalidez que necessita de assistência permanente de outra pessoa tem o valor de sua aposentadoria acrescido de 25%, mesmo que o valor da aposentadoria atinja o limite máximo legal [art. 45, LBPS]. O acréscimo, que é recalculado quando o benefício que lhe deu origem for reajustado, cessa com a morte do aposentado, não sendo transferível à pensão. O Anexo I do RPS traz relação exaustiva ou numerus clausus [16] das situações que autorizam esse acréscimo de 25%, a exemplo de cegueira total, paralisia dos dois membros superiores ou inferiores, alteração das faculdades mentais com grave perturbação da vida orgânica e social e doença que exija permanência contínua no leito.

            A RMI do auxílio-acidente, na redação original do art. 86, § 1º, LBPS, correspondia, dependendo da gravidade das seqüelas, a 30%, 40% ou 60% do salário-de-contribuição do segurado vigente no dia do acidente, não podendo ser inferior a esse percentual do seu salário-de-benefício. Posteriormente, a Lei 9.032/95 alterou tal regra para estabelecer que a RMI corresponde a 50% do SB. Surge aí outra questão de direito intertemporal: aplica-se a nova lei mais benéfica aos auxílios-acidente concedidos anteriormente nos percentuais de 30% e 40%? Em relação aos benefícios pendentes de concessão, a matéria está pacificada no STJ e no STF quanto à aplicação imediata da lei acidentária mais benéfica. Outrossim, no caso de benefícios já concedidos, o anterior entendimento do STJ de que se aplicava a lei da época da concessão, e não a lei nova mais benéfica, evoluiu a partir do ERESP 238.816, julgado em 5.2.01 pela 3ª Seção, para a aplicação da lei nova mais benéfica também aos benefícios já concedidos. O STF, por sua vez, ainda não decidiu esse tema, que está pendente de julgamento nos RE’s 416.827 e 415.454, valendo lembrar vetusto entendimento do STF que nega a retroatividade [mínima] na espécie, sem expressa disposição legal nesse sentido [17].

            A RMI do benefício concedido ao segurado especial equivale a 50% do salário mínimo, exceto se comprovar filiação facultativa, nos termos do que se disse acima.

            Enfim, vale ressaltar que a concessão de auxílio-acidente com valor inferior ao salário mínimo não afronta a regra proibitiva de concessão de benefício previdenciário com valor inferior ao mínimo legal [art. 201, § 2º, CF e art. 33, LBPS], haja vista que o suporte fático desta regra são os benefícios de natureza substitutiva, e o auxílio-acidente tem natureza indenizatória pela redução da capacidade laborativa [18].

Sobre os autores
Roberto Luis Luchi Demo

juiz federal substituto, ex-procurador federal

Maria Salute Somariva

Advogada militante na área previdenciária em Cascavel/PR

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DEMO, Roberto Luis Luchi; SOMARIVA, Maria Salute. Essência e desenvolvimento da incapacidade como fato jurídico-previdenciário e a rejeição da MP nº 242. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 853, 3 nov. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7486. Acesso em: 23 nov. 2024.

Mais informações

<b>Na época da elaboração do presente artigo, o co-autor Roberto Luis Luchi Demo exercia a profissão de procurador federal.</b>

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