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A capacidade postulatória dos herdeiros ou do cônjuge sobrevivente na reparação por danos morais do de cujus

Agenda 24/06/2019 às 00:40

Busca-se analisar, de maneira superficial, porém, científica, a atuação do cônjuge sobrevivente ou dos herdeiros em ações indenizatórias que versam sobre reparação por danos morais do de cujus.

De forma geral, quando se tem a imagem, honra, dignidade ou decoro violados, é responsabilidade da própria vítima buscar o judiciário para buscar a reparação dos danos causados. Porém, há exceções em que pessoas alheias ao sofrimento subjetivo da vítima podem exercer o polo ativo das ações referentes a assuntos sobre reparação de dano moral à honra das vítimas propriamente ditas. Não buscando exaurir todas essas exceções, busca analisar de maneira superficial, porém, científica, a atuação do cônjuge sobrevivente ou dos herdeiros em ações indenizatórias que versam sobre reparação por danos morais do de cujus.

Como é sabido, o direito à imagem é considerado um direito fundamental de primeira geração alicerçado no artigo 5º, inciso X da Constituição Federal, in verbis: 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Necessário refletir o motivo de o legislador pátrio dar tamanha importância para a honra e a imagem do ser humano, uma vez que este é um dos pilares que rege nossa democracia, sob os termos do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

Esse núcleo de direitos gira em torno da intimidade da vida privada que, apesar de apresentarem grande ligação, pode ser diferenciado no sentido de que a intimidade tem conexão com relações subjetivas e de trato íntimo da pessoa, suas relações familiares e de amizade, enquanto a vida privada envolve todos os demais relacionamentos humanos, como relações comerciais e de estudo, por exemplo (MORAES. 2016, p. 58).

Há de se falar, conforme nos orienta Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino (2016, p. 178) que “a dor sofrida com a perda de ente familiar também é indenizável a título de danos morais, visto que a expressão ‘danos morais’ não se restringe às hipóteses de ofensa reputação, dignidade e imagem da pessoa.” O dever de indenizar vai além, ele busca a dor experimentada dos familiares, busca o nível destrutivo que a ofensa causa na honra ou imagem da vítima de modo que excepcionalmente o dano moral é presumido, ou seja, independe da comprovação do grande abalo psicológico sofrido pela vítima.

O informativo nº 0513 do Superior Tribunal de Justiça, de 6 de março de 2013 traz o seguinte entendimento: 

DIREITO CIVIL. DANO MORAL. OFENSA À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DANO IN RE IPSA. Sempre que demonstrada a ocorrência de ofensa injusta à dignidade da pessoa humana, dispensa-se a comprovação de dor e sofrimento para configuração de dano moral. Segundo doutrina e jurisprudência do STJ, onde se vislumbra a violação de um direito fundamental, assim eleito pela CF, também se alcançará, por consequência, uma inevitável violação da dignidade do ser humano. A compensação nesse caso independe da demonstração da dor, traduzindo-se, pois, em consequência in re ipsa, intrínseca à própria conduta que injustamente atinja a dignidade do ser humano. Aliás, cumpre ressaltar que essas sensações (dor e sofrimento), que costumeiramente estão atreladas à experiência das vítimas de danos morais, não se traduzem no próprio dano, mas têm nele sua causa direta. REsp 1.292.141-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 4/12/2012.

Como narra o ilustre doutrinador Alexandre de Morais (2016, p. 57) “a proteção constitucional consagrada no inciso X do art. 5º refere-se tanto as pessoas físicas quanto as pessoas jurídicas, abrangendo, inclusive, à necessária proteção a própria imagem frente aos meios de comunicação em massa (televisão, rádio, jornais, revistas, etc.)”.

Segundo à jurisprudência, embora a violação moral atinja apenas os direitos subjetivos do de cujus, o espólio e os herdeiros têm legitimidade ativa ad causam para pleitear a reparação dos danos morais suportados pelo de cujus. Assim tem-se os acórdãos: AgInt no AREsp 85987/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 05/02/2019, DJe 12/02/2019; AgInt no AgInt nos EDcl no AREsp 1112079/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 21/08/2018, DJe 24/08/2018; REsp 1185907/CE, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 14/02/2017, DJe 21/02/2017; AgRg no AREsp 326485/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 01/08/2013; REsp 1071158/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/10/2011, DJe 07/11/2011; e AgRg nos EREsp 978651/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/12/2010, DJe 10/02/2011.

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Requer atenção para alguns dos julgados elencados no contexto:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. MATÉRIA QUE DEMANDA REEXAME DE FATOS E PROVAS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.   MAJORAÇÃO.  FUNDAMENTO INATACADO.  SÚMULA 283/STF. SUMULA  7   DO   STJ.   ART. 6º DO CPC DE 1973.  AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.  SÚMULAS 282/STF E 211/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.  1.  Em relação ao alegado cerceamento de defesa, culpa exclusiva da vítima, e lucros cessantes, a alegação genérica de violação à lei federal, sem indicar  de forma precisa o artigo, parágrafo ou alínea, da legislação tida por violada, tampouco em que medida  teria  o acórdão recorrido vulnerado a lei federal, bem como em  que  consistiu  a  suposta negativa de vigência da lei e, ainda, qual   seria  sua  correta  interpretação,  ensejam  deficiência  de fundamentação  no  recurso  especial,  inviabilizando  a abertura da instância   excepcional.   Não se revela admissível o recurso excepcional, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia. Incidência da Súmula 284-STF. 2.  O STJ possui firme o entendimento no sentido de que "embora a violação  moral  atinja  apenas  o  plexo  de direitos subjetivos da vítima,  o  direito  à  respectiva  indenização  transmite-se  com o falecimento  do  titular  do  direito,  possuindo  o  espólio  e  os herdeiros   legitimidade   ativa   ad   causam   para  ajuizar  ação indenizatória por danos morais, em virtude da ofensa moral suportada pelo  de  cujus"  (AgRg  nos  EREsp  978.651/SP, Rel. Ministro Felix Fischer, Corte Especial, julgado em 15/12/2010, DJe de 10/02/2011). 3.  O acolhimento da pretensão recursal, a fim de reconhecer a alegada culpa concorrente  exigiria  a  alteração  das  premissas fático-probatórias  estabelecidas  pelo  acórdão  recorrido,  com  o revolvimento  das  provas  carreadas  aos autos, atraindo o óbice da Súmula 7 do STJ. 4.  O v. acórdão recorrido assentou que os honorários advocatícios, por pertencem ao advogado, não podem ser fixados levando-se em conta a condição da parte de beneficiária ou não da justiça gratuita, mas sim o  trabalho  desenvolvido  pelo  patrono.  A subsistência de fundamento inatacado  apto a manter a conclusão do aresto impugnado impõe   o   não-conhecimento   da  pretensão  recursal,  a  teor  do entendimento  disposto  na  Súmula  nº  283/STF:  "É  inadmissível o recurso extraordinário quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles". 5. "A indenização por danos morais fixada em quantum sintonizado aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade não autoriza sua modificação em sede de recurso especial, dada a necessidade de exame de elementos de ordem fática, cabendo sua revisão apenas em casos de manifesta  excessividade  ou irrisoriedade do valor arbitrado, o que não  se  evidencia  no presente caso. Incidência da Súmula 7 do STJ" (AgRg  no AREsp 740.709/RS, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 19/10/2017, DJe de 26/10/2017). 6.  O STJ possui firme o entendimento no sentido de que, quando o acórdão proferido é de  cunho  condenatório,  devem os honorários advocatícios  ser  fixados  entre  o mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre  o valor da condenação, nos termos do art. 20, § 3º, do CPC de 1973,  e  em  sede  de  recurso  especial,  não  é possível rever os critérios   adotados   pelo   julgador  na  fixação  dos  honorários advocatícios, por importar o reexame de matéria fático-probatória. A incidência da Súmula 7/STJ somente pode ser afastada quando o valor fixado for exorbitante ou irrisório, o que não ocorre no caso dos autos. Incidência da Súmula 83 do STJ. 7.  A matéria referente ao art. 6° do Código de Processo Civil de 1973 não foi objeto de discussão no acórdão recorrido, apesar da oposição de embargos de declaração,  não  se  configurando  o prequestionamento,  o  que  impossibilita  a  sua  apreciação na via especial (Súmulas 282/STF e 211/STJ). 8. Agravo interno não provido. (AgInt no AgInt nos EDcl no AREsp 1112079 / PR AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2017/0129515-5 Relator(a) Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO)

Interessante outro entendimento:

RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE AÉREO QUE VITIMOU IRMÃO DA AUTORA. LEGITIMIDADE ATIVA PARA A AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. VALOR DA INDENIZAÇÃO MANTIDO. IRMÃO UNILATERAL. IRRELEVÂNCIA. DANO MORAL IN RE IPSA. 1. Por analogia do que dispõem os arts. 12 e 948 do Código Civil de 2002; art. 76 do Código Civil de 1916; e art. 63 do Código de Processo Penal, com inspiração também no art. 1.829 do Código Civil de 2002, como regra - que pode comportar exceções diante de peculiaridades de casos concretos -, os legitimados para a propositura de ação indenizatória em razão de morte de parentes são o cônjuge ou companheiro(a), os descendentes, os ascendentes e os colaterais, de forma não excludente e ressalvada a análise de peculiaridades do caso concreto que possam inserir sujeitos nessa cadeia de legitimação ou dela excluir. 2. No caso em exame, seja por força da estrita observância da ordem de vocação hereditária - pois a autora é a única herdeira viva do de cujus -, seja porque pais, filhos, cônjuge e irmãos formam indissolúvel entidade familiar, reconhece-se a legitimidade da irmã da vítima para o pleito de indenização por dano moral em razão de sua morte. 3. O fato de a autora ser irmã unilateral e residir em cidade diferente daquela do de cujus, por si só, não se mostra apto para modificar a condenação, uma vez que eventual investigação acerca do real afeto existente entre os irmãos não ultrapassa a esfera das meras elucubrações. No caso, o dano moral continua a ser in re ipsa. 4. Valor da indenização mantido, uma vez que não se mostra exorbitante (R$ 81.375,00). 5. Recurso especial não provido. (REsp 1291845 / RJ RECURSO ESPECIAL 2011/0165462-0 Relator(a) Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO)

Como sabido, o direito à honra é instituído na legislação infraconstitucional pelo art. 20 do Código Civil como um direito personalíssimo, restando garantido a possibilidade de exigir que cesse qualquer ameaça ou lesão ao mesmo, cabendo inclusive, reclamar perdas e danos, nos termos do art. 12 do mesmo Código.

Ainda com base no Capítulo II do Código Civil, em seu artigo 20, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.

No mesmo sentido, o art. 5º, X, da Constituição Federal garante ser inviolável, dentre outros, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito de indenização por dano material ou moral decorrente de sua violação.

Conclui-se do narrado, que deverá ocorrer a aplicação do artigo 927 do Código Civil, Restando configurado o dano moral, tendo os seus efeitos exorbitando, por sua clara natureza e gravidade, o aborrecimento normalmente decorrente de um mero noticiário de televisão ou nos dizeres caluniosos de terceiros, repercutindo na esfera da dignidade do de cujus, e de forma reflexa, gerando o dever de reparação em favor dos herdeiros.

Como demonstrado nos julgados, o valor indenizatório tem o objetivo de prevenir, de modo que o ato lesivo não seja praticado novamente. Deve-se atentar, ainda, em respeito ao princípio de razoabilidade, para a condição social da vítima e do causador do dano, da seriedade, natureza e repercussão da ofensa, assim como exame do grau de reprovabilidade da conduta do ofensor.

O valor deve garantir, em memória do de cujus, reparação que lhe compense os danos, bem como, cause impacto suficiente para desestimular a reiteração do ato por aquele que realizou a conduta reprovável em momento ulterior. Mas não somente isso, deve, na questão, verificar a possibilidade material da indenização atender também ao direito de indenização que recai aos herdeiros ou ao cônjuge sobrevivente uma vez que, no caso, são eles aqueles que realmente sofrem os danos decorrentes de ações ilícitas contra a honra do falecido(a).

O valor da indenização deve ser fixado de modo a não só garantir à parte que litiga no polo ativo a recomposição do dano em face da lesão experimentada, mas igualmente deve servir de reprimenda àquele que efetuou a conduta ilícita.

Portanto, cabível a indenização por danos morais, e nessa diapasão, a indenização por dano moral deve representar para a vítima, na representação dos seus herdeiros, uma satisfação capaz de atender de algum modo o abalo emocional sofrido e de infligir ao causador sanção e alerta para que não volte a repetir o ato, uma vez que fica evidenciado completo descaso aos transtornos causados.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BITTAR, Carlos Alberto. Reparação Civil por Danos Morais. 4ª ed. Editora Saraiva, 2015. Versão Kindle, p. 5423

MOTTA, Sylvio Direito Constitucional: Teoria, Jurisprudência e Questões / Sylvio Motta. 27. ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2018.

MORAES, Alexandre de Direito constitucional / Alexandre de Moraes. – 33. ed. rev. e atual. até a EC nº 95, de 15 de dezembro de 2016 – São Paulo: Atlas, 2017.

PAULO, Vicente, 1968- Direito Constitucional desco!T(llicado I Vicente Paulo, Marcelo Alexandrino. - 15. ed. rev. e atual. - Rio de Janeiro: Forer.se; São Paulo: MÉTODO: 2016.

Sobre o autor
Leandro Ferreira da Mata

Cientista Jurídico; bacharel em Direito pelo Centro Universitário Estácio Brasília; Especialista em Direito da Criança, Juventude e dos Idosos e em Segurança Pública e Organismo Policial.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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