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A ameaça ao grupo econômico trabalhista no PLV 17/19

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Agenda 23/07/2019 às 14:10

5. ALGUNS PROBLEMAS VISLUMBRADOS

Esta nova configuração do grupo econômico na CLT, se aprovada, gerará situações que demandarão considerável esforço dos intérpretes e aplicadores do direito para serem solucionadas.

Em primeiro lugar, como já referido, será preciso esclarecer a redação truncada do dispositivo, inclusive para fixar se há situações em que a desconsideração da personalidade jurídica aplicada ao grupo econômica poderá gerar subsidiariedade.

Em segundo lugar, a alteração proposta nada diz quanto ao §3º do mesmo art. 2º da CLT, que complementa o §2º em sua redação atual. Trata-se de mero esquecimento ou silêncio eloquente? Perceba-se que, caso se entenda que a manutenção do §3º foi proposital, será plausível a interpretação de que o grupo econômico trabalhista subsistirá, exigindo tão somente “a demonstração do interesse integrado, a efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta das empresas dele integrantes”, sem as formalidades da legislação civil.  

Outro problema será gerado pela manutenção integral do art. 3º, §2º da Lei nº 5.889/73, o que certamente dará ensejo às posições que utilizarão sua previsão em favor do trabalhador urbano, evitando tratamento diferenciado. Em outras palavras, muitos intérpretes encontrarão neste dispositivo um bom fundamento legal para manter o grupo econômico trabalhista em sua conformação atual, mesmo nas relações urbanas, tornando inócua a inovação trazida pela eventual aprovação do PLV 17/19.

Como estes dois exemplos mostram, a exclusão do conceito de grupo econômico da redação do art. 2º, §2º da CLT poderá causar enorme insegurança jurídica. De fato, além daqueles que interpretarão o silêncio do legislador como referência aos grupos formais do direito empresarial (Lei das S.A.) e daqueles que entenderão que o grupo trabalhista permanece intacto (com base, por exemplo, no art. 3º, §2º da Lei nº 5.889/73), é possível ainda que sejam feitas referências a diversos outros dispositivos que tratam da matéria, tornando mais complexa a regulação do tema. Cite-se, por exemplo, o art. 28 do Código do Consumidor (Lei 8.078/90), o art. 33 da Nova Lei do CADE (Lei 12.529/11), o art. 30, IX da Lei 8.212/91 e o art. 494 da IN RFB 971/09.

Por fim, e este talvez seja o mais grave dos problemas, há que se ter em conta que a nova redação, se convertida em lei, reduzirá severamente a eficácia do instituto do grupo econômico como ferramenta de garantia do crédito trabalhista.

Primeiro, porque, se prevalecer o entendimento pela referência às figuras do direito civil e empresarial, o dispositivo terá aplicabilidade reduzida, pois muitos grupos trabalhistas possuem apenas manifestação fática, sem qualquer formalização de seus atos.

Segundo, porque, mesmo que os grupos de fato sejam acolhidos pelos intérpretes e aplicadores do direito do trabalho, ainda assim a referência ao art. 50 do Código Civil é insuperável, a indicar que a responsabilização das empresas do grupo exigirá a demonstração da “manipulação fraudulenta” da personalidade jurídica, ônus de prova que recairá sobre a parte autora. Tudo isso agravado pelas modificações propostas pelo PLV também para o dispositivo civilista, que tornam a desconsideração da personalidade jurídica ainda mais difícil de ser aplicada.

Ademais, no campo processual, a alteração tornará inquestionável a necessidade de instauração do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ), previsto no art. 855-A da CLT, para responsabilização das integrantes do grupo não indicadas no polo passivo já na petição inicial, o que tornará o processo mais lento e burocrático.


CONCLUSÃO

O grupo econômico trabalhista é instituto com feições peculiares que o distinguem de figuras civilistas, na medida em que: 1) é informal, exigindo, para sua formação, a mera atuação econômica conjunta de empresas com interesses integrados; 2) gera responsabilização automática de todos os integrantes do grupo, mesmo que não haja prática de abuso ou fraude; 3) a responsabilidade é solidária, e não subsidiária; 4) a solidariedade é ativa e passiva, conforme a tese do empregador único ainda predominante na jurisprudência.

O PLV 17/19, se aprovado, promoverá alterações no art. 2º, §2º da CLT que podem desfigurar por completo o instituto, aproximando-o dos grupos econômicos formalistas que subsistem em outros ramos jurídicos. Nesse contexto, o efeito da solidariedade ficará vinculado à difícil prova de manipulação fraudulenta da personalidade jurídica.

A consequência imediata será a drástica redução da garantia de solvabilidade do crédito laboral e o incremento da complexidade e morosidade dos processos trabalhistas. Tudo se refletirá em milhares de execuções judiciais frustradas. A longo prazo, haverá estímulo ao abuso do poder econômico de grandes grupos em detrimento dos direitos mais básicos dos trabalhadores, com o gradual rebaixamento do patamar civilizatório mínimo hoje alcançado nas relações laborais.

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Diante do cenário drástico que se avizinha, é possível antever que a aplicação da alteração, caso aprovada com a redação em estudo, será problemática e sofrerá resistência dos intérpretes e aplicadores do direito, inclusive em razão de seu texto confuso e da manutenção de regras conflitantes. Há brechas que serão exploradas, muitas vezes com o legítimo propósito de resguardar direitos fundamentais.

  Urge, portanto, que o projeto seja debatido e aperfeiçoado, de modo que a promoção da liberdade econômica não se faça às custas do necessário respeito aos direitos básicos dos trabalhadores, inclusive o direito fundamental à prestação jurisdicional efetiva.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 8. ed. São Paulo: Atlas. 2017. v.1.


Notas

[1] Vide: PINTO, Bruno Ítalo Sousa. O art. 855-A da CLT: adaptações do incidente de desconsideração da personalidade jurídica ao processo do trabalho. Revista de direito do trabalho, São Paulo, v. 44, n. 196, p. 205-246, 2018.

[2] Exposição de motivos da MP 881/19, disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/Exm/Exm-MP-881-19.pdf. Acesso em: 12 jul. 2019.

[3] Idem.

[4] Relatório da Comissão Mista Destinada a emitir parecer sobre a Medida Provisória Nº 881, 30 de Abril de 2019, disponível em: https://www.conjur.com.br/dl/mp-liberdade-economica-cria-conselho.pdf. Acesso em: 12 jul. 2019.

Sobre o autor
Bruno Ítalo Sousa Pinto

Especialista em Filosofia e Teoria do Direito pela PUC-MG, em Direito do Trabalho e Previdenciário na Atualidade pela PUC-MG e em Direito Civil e Processual Civil pela UCDB-MS. Bacharel em Direito (UFPI). Analista Judiciário, desempenhando a função de Assistente de Juiz no TRT da 16ª Região.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PINTO, Bruno Ítalo Sousa. A ameaça ao grupo econômico trabalhista no PLV 17/19. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5865, 23 jul. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/75436. Acesso em: 2 nov. 2024.

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