Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Equações do poder:

para uma leitura interativa e interdisciplinar do poder

Exibindo página 2 de 3
Agenda 21/08/2019 às 13:40

Equação do Poder: uma visão matemática para as relações de poder

Por  Julia Ribeiro Tamborlin, Tais Cristina Bertini, Adenilson A. Novaes e Lucca B. Marques

Poder × Matemática

Quando pensamos em como se daria a relação de poder se esta fosse uma equação matemática, após a incitação do professor Vinício, pensamos logo em funções. Vamos, a seguir, mostrar o conceito e comportamento e uma função, o que é entendido como poder e a relação de funções com o poder no meio social.

Função

Na Matemática, chamamos de FUNÇÃO uma relação entre dois conjuntos. Ela é representada como uma “fórmula matemática” que descreve essa relação. Matematicamente dizemos: dados dois conjuntos, A e B, uma função de A em B é um terno (f, A, B), sendo f uma relação de A para B, satisfazendo:

  1. D(f) = A (O domínio da função é todo o conjunto A)
  2. Se (a,b) f e (a,c)  f, então b=c. (Quando escolhemos um elemento deA, ele só pode atingir um único elemento de B)

A função transforma algo do conjunto A em algo do conjunto B. Para entender melhor o que a função faz, imagine a confecção de um bolo. Temos os elementos do conjunto A que são os ingredientes, temos a função forno, que é onde esses ingredientes serão transformados e, posteriormente teremos o resultado, o bolo assado, que é um elemento do conjunto B.

No estudo de funções as classificamos de três formas: função injetora, função sobrejetora, função bijetora. Falaremos particularmente da FUNÇÃO BIJETORA. Uma função bijetora é aquela que é injetora e sobrejetora ao mesmo tempo. Isso significa que todos os elementos do conjunto B só podem ser atingidos uma única vez pelos elementos de A e todos os elementos de B tem que ser atingidos pelos elementos de A, como na imagem abaixo:

Por ser bijetora, essa função admite uma INVERSA. Isso significa que podemos fazer o contrário: Agora os conjuntos A e B trocam de lugar e os elementos de B que irão atingir os elementos de A.

Poder

A definição de poder também dever ser considerada. Em seu significado mais geral, a palavra poder indica a capacidade de ação ou de produzir efeito. Sendo compreendido tanto no sentido social, isto é, nas relações dos seres humanos em sociedade, em que passa a ter um sentido muito mais específico, quanto sob uma perspectiva instrumental, que diz respeito à capacidade do ser humano de controlar a natureza e seus recursos.

Em seu sentido social, a ideia de Poder está conectada à possibilidade ou à capacidade geral de agir, à habilidade de um indivíduo de determinar o comportamento de outro indivíduo. Nesse sentido, o ser humano não é apenas o sujeito capaz de exercer poder, mas é também objeto sobre o qual o poder é exercido.

Poder e funções

A partir dessas definições, podemos relacionar a ideia de poder com funções bijetoras. Assim, imagine que o conjunto A representa o ESTADO, com suas leis e ordens e, imagine que o conjunto B representa o POVO. Se aplicarmos uma função PODER, que sai do conjunto A até o B, temos que o poder sai do Estado e atinge o Povo. O resultado dessa função são as leis trabalhistas, os deveres dos cidadãos, os impostos, ou seja, o Estado exerce um poder sobre o Povo.

Porém, o motivo de termos definido a função inversa se deu ao fato de que o povo também exerce poder sobre o Estado. São diversas as formas, mas as mais comuns são os deveres do Estado para com a sociedade, como por exemplo, garantir ao povo a educação, saúde, saneamento básico, segurança, lazer, cultura.

Seguindo o raciocínio, temos também que o povo exerce poder sobre o Estado escolhendo seus representantes através das eleições. O povo deve estar atento ao que os políticos estão fazendo com o poder lhes dado. Em um caso mais radical, pode-se tirar o poder que concedeu a eles através de manifestações, onde levam o Estado a mudar o comportamento - seja retirando o representante atual do cargo de poder ou por mudanças em leis e emendas.

Matematicamente, os elementos saem de B (Povo) e chegam até A (Estado).

Um exemplo é a Revolução Constitucionalista de 1932, uma revolução armada com o intuito de convocar uma Assembleia Nacional Constituinte, como resposta ao golpe de estado que originou a Revolução de 1930 e, posteriormente, a posse de Getúlio Vargas.

Porém, este exemplo se dá de forma diferente, pois o povo em si não conseguiu impor suas exigências ao governo, o que poderia descaracterizar a função. Nesse caso, dizemos que se trata de um elemento que não faz parte do domínio da função.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Concluímos que, o poder, assim como a função bijetora, está atribuído aos dois conjuntos POVO e ESTADO de forma que cada um possa exercer o poder sobre o outro.

(PS: importante frisar que este exemplo corresponde à interpretação restrita desse grupo).


Fórmula para o Poder

Por Raphael Elias Toledo Ferreira

O poder é um conceito bastante amplo. É possível pensar em várias situações às quais se pode associar tal ideia, e dentro dessas há vários fatores também. Por exemplo, uma pessoa pode exercer o controle sobre uma ou outra ação de um indivíduo, mas nunca sobre todas. Você pode até mandar alguém resolver uma tarefa de matemática, mas ele não fará isso se não souber o conteúdo, não importa a recompensa, a punição, ou a motivação que se apresente. Mas algo factível, é possível que ele faça, embora possa desobedecer também.

Dessa forma, percebemos que o poder que é possível exercer sobre alguém é limitado por coisas óbvias, como aquilo que esse alguém consegue ou não fazer, ou por sua disposição ou não em fazer, ou por qualquer outro fator. Mudando o raciocínio, o poder também é passível de ser  associado a uma posição política ou jurídica. Um agente público da esfera municipal teria  um coeficiente de poder menor que um agente público da esfera federal, na medida em que um cargo dá mais dispositivos legais do que outro. Mas podemos pensar que o poder de um governante é limitado pelas capacidades de seus subordinados, o que não é raro observar na política.

Tendo isso em vista, dizemos que não existe somente uma equação para o poder, mas várias igualmente válidas em seus contextos, a depender do aspecto do poder que se está calculando. Pode ser obter algo, ou fazer alguém tentar algo, etc.

Para efeito de avançar para algum ponto, assumirei que o poder do qual estamos falando é medido exclusivamente no indivíduo que está sendo influenciado. Então a equação do poder que irei propor não vai medir o poder de alguém, mas sim o poder sobre alguém. Nesse sentido, a equação será subjetiva. Ainda, pensaremos no poder em relação a uma ação específica.

Várias coisas inibem ou estimulam um indivíduo à determinada ação. Como exemplo para inibição, podemos citar não a incapacidade, mas a ideia da incapacidade, de modo que uma pessoa que não está pensando que é incapaz de enfrentar um opressor, é muito mais propensa a enfrentá-lo do que aquela que pensa ser incapaz. Perceba, como estamos focando na mente do indivíduo, enquanto abordamos essa equação do poder.

Assim, quando uma pessoa tenta fazer algo, veremos isso como a concretização de um poder multifacetado que age sobre ela. Não importa se ela vai conseguir ou não. Quanto mais poder agir sobre essa pessoa no sentido de realizar uma ação, maior deve ser a probabilidade de essa pessoa tentar fazê-la. Usaremos então a probabilidade como medida do poder resultante final que está agindo sobre uma pessoa no sentido de motivá-la a uma ação X. Quando esse valor for 1, certamente essa pessoa irá tentar a ação, quando for 0, certamente não irá tentar. Quanto mais próximo de 1, significa que é mais provável que ela tente, até 1, que é a certeza da tentativa. Quanto mais próximo de 0, significa que é mais provável que ela não tente, até 0, que é a certeza de que ela não irá tentar.

Portanto:

Poder sobre um indivíduo no sentido dele realizar uma ação X = Probabilidade de tal indivíduo tentar realizar essa ação

Enfatizamos o "tentar", na medida em que esse é o indicativo de que o indivíduo de fato foi influenciado, e não é indicativo ele não conseguir fazer algo.

Aqui vale uma breve digressão para falarmos de probabilidade. A probabilidade é essencialmente uma medida do quanto se espera, matematicamente, que algo ocorra. A forma precisa de se calcular a probabilidade de um evento ocorrer é pela razão entre o número de casos favoráveis pelo número de casos possíveis, isso quando os casos são todos equiprováveis. Para a nossa equação do poder, lidamos com dois casos somente: o indivíduo realiza a ação X ou não realiza. Se os dois casos fossem equiprováveis, teríamos que a probabilidade de tal indivíduo realizar a ação seria 1/2. Mas não é o que ocorre, pois certas variáveis modificam essa situação de equilíbrio. Como veremos a seguir, isolamos algumas dessas variáveis extremamente básicas.

Esperamos que tanto maior é a probabilidade de um indivíduo fazer algo quanto maior é o seu foco nessa ação. Podemos propor uma medida do foco também de 0 a 1, com 0 não pensando na ação, e 1 cogitando somente ela. Mas somente cogitar não é suficiente, pois é necessário que haja uma motivação: uma recompensa ou punição para agir. Devemos ter  em mente que essa punição ou recompensa não é no mundo externo, mas na própria mente da pessoa que realizará a ação. A recompensa de uma simpatia está antes de mais nada, na mente da pessoa que a pratica. Assim, a punição é algo subjetivo, e aferimos -1àquela que é a maior punição que uma pessoa considera, e 1 à maior recompensa, também subjetiva.  Qualquer valor abaixo de 0, para a recompensa, é normalizado para 0, uma vez que se agir significa ir para uma situação pior, na soma de tudo, então o indivíduo não irá agir.

Por último, podemos pensar na questão da agitação de um indivíduo. Quanto, mais agitado e ativo, maior sua propensão de fazer algo, quanto menos físico, ou mais inibido, menor a probabilidade. Assim, podemos colocar uma escala de 0 a 1 nessa característica também com 0 sendo algo equivalente a uma pessoa com depressão, ou uma pessoa acamada por algum motivo de saúde, e 1 uma pessoa eufórica, e disposta, física e mentalmente. Chamaremos esse aspecto de atividade. Assim, uma fórmula possível para poder seria

Poder sobre um indivíduo no sentido dele realizar uma ação X  =  foco x recompensa x atividade

Quanto menor o foco de uma pessoa em determinada ação, menor a probabilidade dela efetuar essa ação. Quanto pior a recompensa, também menor a probabilidade. E quanto menor a sua atividade menor a probabilidade, até resultar em 0. O inverso também vale, quanto maior cada um, maior a probabilidade, até resultar em 1, i.e. certeza da ação, ou melhor, da tentativa.

É certo que uma fórmula tão abstrata não dá muito domínio sobre essa questão do poder. Mas como esse é um assunto muito complexo e possuí muitas variáveis, tal nível de abstração é um começo para modelagem mais completa. Há de se ressaltar que pode haver consequências positivas e negativas simultâneas para uma só ação e a fórmula coloca como recompensa o resultado final do cálculo que o indivíduo fez desses resultados. A atividade de um indivíduo dependerá muito do momento. Se ele acabou de acordar ou se acabou de tomar café, e esse café tem um efeito relevante em seu organismo, etc.

Muita coisa entra em jogo nessa complexa temática. E quanto mais a investigamos, mais conscientes nos tornamos para evitar sermos influenciados pelos extremos ideológicos de direita ou esquerda, pelos extremos políticos, partidários, etc. E percebemos o quão atual é a sentença de Freud: “Só o conhecimento traz o poder.”

Sobre o autor
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINEZ, Vinício Carrilho. Equações do poder:: para uma leitura interativa e interdisciplinar do poder. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5894, 21 ago. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/76043. Acesso em: 22 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!