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Reprovação no exame de ordem:

de quem é a falha?

Agenda 26/11/2005 às 00:00

Semestralmente, as seccionais da OAB de todo o país publicam, com orgulho e pesar, os altos índices de reprovação em seus Exames de Ordem. Orgulho em livrar a sociedade de profissionais despreparados para o mercado de trabalho. Pesar, por atestar a falta de qualidade das faculdades e universidades. Diante dos assombrosos números apresentados, uma pergunta se faz imprescindível: será apenas das faculdades a responsabilidade pela reprovação de seus graduados? No caso do Rio Grande do Sul a resposta é, certamente, negativa.

Por certo os estabelecimentos de ensino jurídico, não raro, deixam a desejar. Não oferecem a estrutura física e pedagógica necessária ao pleno desenvolvimento acadêmico. Além do sucateamento das instituições públicas, há que se considerar a falta de livros nas bibliotecas e a falta de tempo dos orientadores das monografias de conclusão de curso também nas privadas. Esses são problemas reais, conhecidos e contornados por todas as comunidades acadêmicas.

Todavia, superadas as adversidades anteriores à colação do grau, o bacharel que se submete ao Exame de Ordem enfrenta outras dificuldades. Após ser aprovado na primeira fase, onde a prova é corrigida eletronicamente, é habilitado a participar da segunda fase, onde, pelo menos no Rio Grande do Sul, é que aparecem os problemas, e que começa o verdadeiro calvário dos examinandos candidatos à inscrição nos quadros definitivos da OAB.

Muitos dos profissionais em exame, após receber a resposta de sua prova, interpõem recurso, previsto no Regulamento do Exame, requerendo a revisão da mesma, em razão de erros cometidos pelos corretores na avaliação das questões. Respostas idênticas com notas distintas, graus rasurados para menos, questões sem qualquer correção ou atribuição de grau. Até aí, equívocos compreensíveis quando se considera o fato de que errar é possível quando se tem uma gama tão grande de provas a serem corrigidas e, imagina-se, poucos avaliadores para tanto (em que pese, em verdade, não seja divulgado pela OAB quem e quantos são os corretores das provas do Exame).

Os problemas aparecem, realmente, quando os examinandos recebem as respostas aos seus recursos: respostas padronizadas (com direito a padrões impressos com rasura), onde fica claro que as razões recursais não foram analisadas pela banca revisora. Questões com respostas idênticas não recebem a equiparação da nota, questões sem correção retornam sem a atribuição do grau. O que parecia erro, mostra-se, em verdade, total falta de adoção dos critérios estipulados no edital do concurso.

As afirmações são graves, mas de forma alguma descabidas, porque proferidas por quem enfrenta tal situação. Interposto recurso da correção realizada em minha prova, postulei pela atribuição de grau a questão que deixou de ser corrigida (e, frise-se, foi respondida com acerto e valia cinco pontos!), além da revisão de graus de outras questões que, quando comparadas com provas de outros candidatos, receberam, injustificadamente, nota menor. Como resposta, recebi padrões que diziam que não cabia revisão de nota. Padrões sim, já que mesmo na questão que pedi a competente correção e atribuição de grau recebi a resposta de que não cabia revisão da nota! Como não há qualquer forma de reconsideração da resposta, não restou outra via que não a do mandado de segurança.

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Por gravíssimas falhas cometidas pelo corretor e pelo revisor, me vi obrigada a buscar a tutela judicial para ver corrigido tal ato. Pela falta de sensibilidade e, por que não dizer, de seriedade de alguns membros da comissão que avalia e revisa as provas, me vi compelida a contribuir com as estatísticas de reprovação. A discussão acerca de minha prova segue na justiça federal, oxalá seja procedente, ao final. Que o Poder Judiciário não cegue, nem pactue com tais arbitrariedades. Quiçá não esqueçam os magistrados que os olhos da Justiça são vendados para que ela seja imparcial, não para que seja cega e se omita diante dos fatos. Enquanto isso, sigo impedida de exercer com dignidade a profissão que tanto admiro, tanto almejei, pela qual a tantos sacrifícios me sujeitei até hoje, e que com tanto orgulho e empenho exerci durante a graduação (logicamente, com todas as limitações advindas da condição de estagiária).

Não obstante os cursos jurídicos sejam deficientes, não podemos esquecer que eles só funcionam porque têm a chancela da própria OAB, já que o art. 17 do Decreto 2.306/97, que estatui que a "criação e o reconhecimento de cursos jurídicos em instituições de ensino superior, inclusive universidades, dependerá de prévia manifestação do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil".

Lamentável que instituição como a OAB, que tem o dever moral e legal de pugnar pela ética e pelo respeito às leis, aja de tal forma. Não se pode admitir que o Exame de Ordem seja utilizado para aumentar o rendimento da instituição. Não se pode admitir que profissionais de fato preparados para o exercício de seu ofício sejam impedidos de usufruir o seu direito constitucional ao trabalho em razão da preguiça de alguns outros profissionais. Diante do descaso na correção das provas, onde fica a ética profissional, preconizada no Estatuto da Advocacia? O Exame é legal e necessário, mas a reprovação não pode servir para avaliar somente as instituições de ensino. Urge que as bancas corretoras também sejam avaliadas, para que bem avaliem as provas de seus futuros colegas de profissão. Só dessa forma poder-se-á dizer que existe, realmente, ética na advocacia.

Sobre a autora
Fabiana Bica Machado

Advogada em Porto Alegre (RS)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACHADO, Fabiana Bica. Reprovação no exame de ordem:: de quem é a falha?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 876, 26 nov. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7609. Acesso em: 2 nov. 2024.

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