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A dupla visita na visão da inspeção do trabalho:

aspectos excepcionais e aplicabilidade - Orientações aos empregadores

A ação punitiva e a orientadora da inspeção do trabalho, figurada pela dupla visita, se complementam, inexistindo contradição entre as duas.

P.S:  o artigo foi escrito com base na legislação vigente anteriormente à MP Nº 905 (legislação vigente à época da confecção do artigo, não à época da sua publicação).

No âmbito da Inspeção do Trabalho e dos processos administrativos oriundos de Autos de Infração à legislação trabalhista, é comum os empregadores reivindicarem a aplicação do critério da 'dupla visita' como subterfúgio à manutenção da autuação. Entendendo que sua aplicabilidade seria irrestrita, muitas vezes pecam no interesse em adequar situações irregulares às normas, aguardando a presença da fiscalização estatal para fazê-lo.

Segundo o Decreto nº 4552/2002, que aprova o Regulamento da Inspeção do Trabalho, os Auditores-Fiscais do Trabalho, a nível regional ou nacional, são subordinados tecnicamente à autoridade nacional competente em matéria de inspeção do trabalho, a qual é representada pela Subsecretaria de Inspeção do Trabalho - SIT, parte integrante do extinto Ministério do Trabalho, incorporado pelo Ministério da Economia. Esta dá as diretrizes técnicas a serem seguidas pelo corpo fiscal, dentre as quais incluem-se as relacionadas ao instituto da dupla visita. Objetiva-se, com este artigo, elucidar algumas questões sobre o tema, orientando empregadores sobre a visão da SIT no que tange a questão.

Nesta seara, segundo protesta grande parte dos empregadores, deve o Auditor, na primeira visita, apenas orientar o empregador quanto às irregularidades observadas e autuar somente na segunda visita, caso aquele não tenha cumprido as determinações anteriores e/ou caso não tenha regularizado as situações inadequadas. Normalmente o representante da empresa aduz ainda que há arbitrariedade na autuação, por não ter sido dada orientação e nem ter sido concedido prazo para regularização.

A princípio, esclarece-se que o  dever de orientação, de competência dos Auditores-Fiscais do Trabalho, possui dois aspectos principais. O primeiro é o dever geral de orientação, previsto no artigo 18, II, do Regulamento da Inspeção do Trabalho, aprovado pelo Decreto 4.552/2002, que diz que compete aos Auditores-Fiscais do Trabalho, em todo o território nacional, ministrar orientações e dar informações e conselhos técnicos aos trabalhadores e às pessoas sujeitas à Inspeção do Trabalho, atendidos os critérios administrativos de oportunidade e conveniência.

O segundo aspecto manifesta-se na obrigatoriedade de que o Auditor-Fiscal do Trabalho observe o critério da dupla visita ou notifique o empregador como pressuposto para lavratura de Autos de Infração.  Há, entretanto, uma visão equivocada de que o critério seria um regra absoluta, quando, na realidade, a dupla visita não é requisito a ser observado antes da lavratura de todos os Autos de Infração. Trata-se, na verdade, de uma exceção à regra do artigo 628 da Consolidação das Leis do Trabalho/ CLT, o qual preceitua que a cada infração deverá ser lavrado o respectivo Auto de Infração.

Ressalta-se, portanto, que não há nenhum dispositivo legal que imponha à fiscalização do trabalho uma atuação educativa em detrimento da sancionatória, nem que estabeleça relação de hierarquia elas. Na verdade, dita a CLT, em seu art. 628:

  Art. 628: Salvo o disposto nos arts. 627 e 627-A, a toda verificação em que o Auditor-Fiscal do Trabalho concluir pela existência de violação de preceito legal deve corresponder, sob pena de responsabilidade administrativa, a lavratura de auto de infração.

Como regra geral, há o dever de autuação, que só deverá ser excetuado nas hipóteses fixadas legalmente. A atuação explicitada na lei não possibilita ao agente público dispor da discricionariedade, configurando-se o ato de lavrar auto de infração, portanto, como um ato administrativo vinculado. Nestes casos, não há margem ao agente público para apreciar oportunidade ou conveniência administrativas para efetivar o ato. Atos vinculados, segundo PAULO e ALEXANDRINO, "são os que a administração pratica sem margem alguma de decisão, pois a lei previamente determinou o único comportamento possível a ser obrigatoriamente adotado sempre que se figure a situação objetiva descrita na lei". (PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Administrativo Descomplicado. 25ª Edição. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2017, p. 512-513.

Percebe-se que há apenas a livre convicção da autoridade fiscal no que diz respeito à caracterização ou não da infração trabalhista naquele caso concreto; porém, uma vez caracterizada, não há escolha sobre se lavrar ou não o Auto de Infração correspondente.

O dever legal de autuação imediata, no entanto, é relativizado na hipótese da dupla visita, benefício esculpido na Consolidação das Leis do Trabalho, cuja aplicação deve seguir rigorosamente as hipóteses fixadas legalmente. Acerca do critério, reza o art. 627 da CLT:

Art. 627 - A fim de promover a instrução dos responsáveis no cumprimento das leis de proteção do trabalho, a fiscalização deverá observar o critério de dupla visita nos seguintes casos:

a) quando ocorrer promulgação ou expedição de novas leis, regulamentos ou instruções ministeriais, sendo que, com relação exclusivamente a esses atos, será feita apenas a instrução dos responsáveis;

b) em se realizando a primeira inspeção dos estabelecimentos ou dos locais de trabalho, recentemente inaugurados ou empreendidos. (grifo nosso)

Neste sentido, o Regulamento da Inspeção do Trabalho/RIT, aprovado pelo Decreto n. 4.552/2002, que regulamenta da atividade dos  Auditores do Trabalho, dispõe no seu  artigo 23:

Art. 23.  Os Auditores-Fiscais do Trabalho têm o dever de orientar e advertir as pessoas sujeitas à inspeção do trabalho e os trabalhadores quanto ao cumprimento da legislação trabalhista, e observarão o critério da dupla visita nos seguintes casos:

I - quando ocorrer promulgação ou expedição de novas leis, regulamentos ou instruções ministeriais, sendo que, com relação exclusivamente a esses atos, será feita apenas a instrução dos responsáveis;

II - quando se tratar de primeira inspeção nos estabelecimentos ou locais de trabalho recentemente inaugurados ou empreendidos;

III - quando se tratar de estabelecimento ou local de trabalho com até dez trabalhadores, salvo quando for constatada infração por falta de registro de empregado ou de anotação da CTPS, bem como na ocorrência de reincidência, fraude, resistência ou embaraço à fiscalização; e

IV - quando se tratar de microempresa e empresa de pequeno porte, na forma da lei específica.

§ 1o  A autuação pelas infrações não dependerá da dupla visita após o decurso do prazo de noventa dias da vigência das disposições a que se refere o inciso I ou do efetivo funcionamento do novo estabelecimento ou local de trabalho a que se refere o inciso II.

§ 2o  Após obedecido o disposto no inciso III, não será mais observado o critério de dupla visita em relação ao dispositivo infringido.

§ 3o  A dupla visita será formalizada em notificação, que fixará prazo para a visita seguinte, na forma das instruções expedidas pela autoridade nacional competente em matéria de inspeção do trabalho.

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Muito se alega, no momento das autuações, acerca das 02 (duas) alíneas constantes no artigo 627 da CLT, quando se requer a aplicação do critério, na maioria das vezes, utilizando-se do argumento do estabelecimento recente. Não se pode, entretanto, dar uma interpretação extensiva ao termo, posto que o Decreto n. 4.552/2002 o particulariza de forma inequívoca, no parágrafo 1º do artigo acima referido.

O primeiro ponto a ser destacado é que, na hipótese de primeira inspeção em estabelecimentos ou locais de trabalho recentemente inaugurados, o Decreto estabelece que o critério deve ser obedecido tão somente por um período de 90 (noventa) dias, a contar do seu efetivo funcionamento, tempo que o legislador considera eficiente para a plena adaptação, por parte de um recém-empregador, à vida empresarial. O dispositivo, aparentemente, é desconhecido da maioria dos empresários, que abordam o artigo 627, b, CLT, não raro, entendendo-o como aplicável a empresas  com funcionamento fora deste lapso temporal, quando já restará afastada a incidência do benefício da dupla visita, tendo a Inspeção do Trabalho o dever legal de atuar de forma impositiva.

Nesta toada, a despeito de ser argumentação menos comum, o mesmo período há de ser respeitado pelo agente de fiscalização na hipótese de promulgação de nova lei, regulamento ou instrução, haja vista ser este o lapso temporal entendido como o necessário para a ampla adaptação a um novo dispositivo pelo empregador. Há de se reportar, nesta temática, ao artigo 3º da 'Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro': "Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece". O dispositivo garante a eficácia de nosso ordenamento jurídico ao estipular a presunção de conhecimento da lei. Ainda assim, o Decreto garante que, diante de nova lei cuja promulgação tenha menos de 90 (noventa) dias, aplique-se a dupla visita, considerando prazo para adequações à inovação jurídica.

A terceira linha de protestos acerca da aplicação da dupla visita impõe como supostamente necessária a nulidade das autuações devido ao fato de as empresas tratarem-se de Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, nos termos do incisos IV do artigo 23/RIT.

Importante destacar, contudo, que o Decreto nº 4552/2002 - o qual norteia a ação dos agentes de fiscalização do trabalho - em seu artigo 23, também não determina que o critério será aplicado de forma irrestrita às Microempresas e Empresas de pequeno porte, mas na forma da Lei específica. A amarra refere-se à Lei Complementar nº 123/06, a qual, seu artigo 55, §1º determina uma exceção à aplicação do referido critério.

Art. 55.  A fiscalização,no que se refere aos aspectos trabalhista, metrológico,sanitário, ambiental, de segurança, de relações de consumo e de uso e ocupação do solo das microempresas e das empresas de pequeno porte, deverá ser prioritariamente orientadora quando a atividade ou situação, por sua natureza, comportar grau de risco compatível com esse procedimento. (Redação dada pela Lei Complementar nº 155, de 2016)  Produção de efeito

§ 1o  Será observado o critério de dupla visita para lavratura de autos de infração, salvo quando for constatada infração por falta de registro de empregado ou anotação da Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS, ou, ainda, na ocorrência de reincidência, fraude, resistência ou embaraço à fiscalização.

Neste contexto, estando o estabelecimento enquadrado como 'microempresa' ou 'empresa de pequeno porte' (diante da Receita Federal do Brasil, em virtude do seu faturamento), no caso de inspeção trabalhista, aplica-se a Lei específica. E esta relacionou situações excludentes  para os quais afasta-se do caso o critério da dupla visita, a saber, quando for constatada infração por falta de registro de empregado ou anotação da Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS, ou ainda em casos de reincidência, fraude, resistência ou embaraço à fiscalização. Tais exceções, igualmente, parecem ser desconhecidas dos empregadores, que protestam pela inobservância da dupla visita até mesmo nos casos em que foram flagradas  as infrações referidas como exceções.

Destarte, vislumbra-se que o legislador preocupou-se em supor situações cuja gravidade, aos olhos da Inspeção do Trabalho, tornassem inaplicável o benefício, situações que figuram-se como realidade em parte considerável das fiscalizações a pequenas empresas. As mesmas exceções estão previstas no Decreto 4552/2002 (inciso III do artigo 23) para os casos de empresas com menos de 10 (dez) empregados, tornando relativa a aplicabilidade do critério em comento, a depender das irregularidades verificadas.

De forma complementar, há ainda uma gama de empregadores que intenciona livrar-se de irregularidades apontadas ao tentar condicionar a atuação do Auditor-Fiscal do Trabalho à possibilidade de instauração de procedimento especial para a ação fiscal, hipótese cuja regulamentação encontra-se no artigo 28 do mesmo Decreto:

Art. 627-A (CLT). Poderá ser instaurado procedimento especial para a ação fiscal, objetivando a orientação sobre o cumprimento das leis de proteção ao trabalho, bem como a prevenção e o saneamento de infrações à legislação mediante Termo de Compromisso, na forma a ser disciplinada no Regulamento da Inspeção do Trabalho. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001) Art. 28 (RIT). O procedimento especial para a ação fiscal poderá ser instaurado pelo Auditor-Fiscal do Trabalho quando concluir pela ocorrência de motivo grave ou relevante que impossibilite ou dificulte o cumprimento da legislação trabalhista por pessoas ou setor econômico sujeito à inspeção do trabalho, com a anuência da chefia imediata (destaques nossos).

Contudo os dispositivos são, evidentemente, muito claros ao estabelecerem o referido procedimento como uma faculdade ao AFT, especialmente ao condicioná-lo à ocorrência de uma determinada situação na qual cabe somente ao Auditor, não ao administrado, concluir pela possibilidade de segui-lo.  Trata-se de ato que configura-se no exercício do poder de polícia administrativa. Seu principal objetivo é encontrar alternativas para o cumprimento do ordenamento jurídico trabalhista quando o Auditor concluir pela ocorrência de algum motivo que tenha impossibilitado o cumprimento da legislação. Trata-se, portanto, de uma espécie de procedimento de exceção na qual o Estado pode renunciar ao seu dever de punição em troca de adequação, não se tratando, destarte, de obrigação do Auditor adotá-lo.

Por vezes, empregadores tentam isentar-se de autuações que apontam irregularidades que comprometem  a saúde e segurança do empregado e, com frequência, que representam grave e iminente risco ao trabalhador. Destaque-se que as Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho, as quais tratam da Saúde e Segurança do trabalhador, são de ordem pública, caráter imperativo e vinculam o empregador, sendo irrelevante, inclusive, a sua condição de pequeno ou grande empregador. Não é demais rememorar que o rigor de tais normas se justifica na medida que intenciona evitar acidentes de trabalho e doenças ocupacionais, de graves conseqüências para o trabalhador e sua família. Neste contexto, observe-se que o Decreto 4552/2002, em seu artigo 28, § 6º, ordena a inaplicabilidade do conceito da dupla visita, sob a ótica do procedimento especial, ao dispor que: “§ 6o Não se aplica o procedimento especial de saneamento às situações de grave e iminente risco à saúde ou à integridade física do trabalhador.”

Nesta esteira, oportuno ainda referir-se ao conceito de infração insanável, caso em que, segundo orientação da SIT, afasta-se a possibilidade de regularização sem autuação e, particularmente, a aplicação do critério da dupla visita. É vigente, na atualidade, o ordenamento técnico de que a dupla visita só poderá ser cogitada quando a lei violada não causar dano ao trabalhador, isto é, quando a infração for sanável. E, nos casos de infrações que geram ou geraram danos à saúde dos trabalhadores, deve-se classificá-las como insanáveis quanto ao dano ocorrido, afastando a possibilidade de concessão de prazo para ajustes.

Desde a Portaria Ministerial nº 3.158/71, o agente fiscal deveria levar em conta as irregularidades encontradas, verificando as sanáveis e as insanáveis, dando prazo para correção somente para as primeiras. Destarte, o entendimento já era o de que, a despeito da dupla visita, a atuação fiscal deve orientar e colaborar, sem, contudo, abrir mão de sancionar aquilo que não é mais passível de correção.

Neste contexto, é vigente, na atualidade, a Nota Técnica nº 62/2010/DMSC/SIT, que norteia a atuação fiscal no que tange a dupla visita e diz que, para as infrações insanáveis deve haver sempre autuação, pois há a presunção absoluta de que o empregador conhecia a lei e sua não aplicação gerou danos aos trabalhadores, hipótese em que seria ineficaz sugerir uma dupla visita, pois a retificação da conduta somente serviria ao futuro. Esta é a interpretação da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho.

Fugindo do aspecto estritamente técnico e fomentando a análise global que envolve a dupla visita, não se pode olvidar de versar ainda sobre os critérios de oportunidade e conveniência, fartamente reivindicados pelos empregadores por ocasião das autuações. Adverte-se, entretanto, que estes devem ser observados pelo agente de fiscalização, norteando o ato administrativo quando a lei não prevê expressamente como lidar com determinada situação. Ambos estão ligados à discricionariedade, que é um poder concedido à Administração, de modo explícito ou implícito, para a prática de atos administrativos com a liberdade na escolha segundo critérios próprios da autoridade, observando sempre os limites estabelecidos em lei. Não se coadunam, portanto, com a aplicabilidade do benefício em debate.

Muito se fala também sobre a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Estes visam a adequar o ato praticado aos fins pretendidos, limitando o poder discricionário do agente da Administração Pública que pratica o ato, de modo a evitar resultados desproporcionais e injustos. A proporcionalidade aparece nas situações em que o ordenamento jurídico permite escolher um dentre vários meios utilizados. De acordo com BARROS, "a doutrina do princípio da proporcionalidade é fruto do direito alemão, que repousa sobre a noção de poder. Ele vem sendo conceituado ora como técnica de redução e controle jurisdicional da discricionariedade administrativa, ora como instituto destinado a atacar essa discricionariedade". (BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho.  5ª Edição. São Paulo: LTR, 2009, p. 177). Quanto ao princípio da razoabilidade, a mesma autora diz que "parte-se do pressuposto de que o homem aja razoavelmente, com bom senso, e não arbitrariamente. Esse princípio impõe limites a situações em que a lei não consegue prevê-los de forma muito rígida, dadas as inúmeras circunstâncias que podem surgir no caso objeto de apreciação". (BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho.  5ª Edição. São Paulo: LTR, 2009, p. 190).

Por sua vez, afirma CARVALHO, que "o administrador, na realização do ato administrativo discricionário, deve empreender a necessária ponderação dos valores existentes, segundo os parâmetros extraídos de um senso médio de racionalidade". (CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: Teoria do Estado e da Constituição - Direito Constitucional Positivo. 13ª Edição. Belo Horizonte; Del Rey, 2007, p. 822). Já Celso Bandeira de Mello diz que "a administração, ao atuar no exercício de discrição, terá que obedecer a critérios aceitáveis do ponto de vista racional, em sintonia com o senso normal de pessoas equilibradas e respeitosas das finalidades que presidam a outorga da competência exercida". (MELLO apud CARVALHO, 2007, p. 822).

 Note-se tais conceitos como princípios abstratos, sem conteúdo concreto, balizadores da conduta do agente público, a serem utilizados em situações em que cabe o exercício da discricionariedade. Frise-se, portanto, que o Auditor não poderá jamais dispor da proporcionalidade e/ou razoabilidade para escolher entre aplicar ou não a dupla visita ao atuar em fiscalizações. Os conceitos não poderão, igualmente, ser usados para desconstituir autuações que aplicaram corretamente as exceções legais ao benefício, afastando-o.

Em suma, no caso da dupla visita, a discricionariedade do Auditor, que se desdobra nos mencionados conceitos, é inexistente, dados os parâmetros legalmente impostos para sua aplicabilidade. O que se observa, no entanto, é o pouco esclarecimento do setor empresarial sobre os motivos de sua inobservância, de modo que, quando inaplicável, a proporcionalidade e a razoabilidade são, de forma inadequada, acionadas contra as autuações.

 Percebe-se, por fim, que a ação punitiva e a orientadora da Inspeção do Trabalho, figurada pela dupla visita, se complementam, inexistindo contradição entre as duas. Assim, registre-se que nada impede que o Auditor notifique o empregador para que proceda a adequação de uma irregularidade ao mesmo tempo em que o autua, não exercitando a dupla visita como um benefício compulsório a ser usado em prol de todos os empregadores, mas como uma condição a ser seguida em situações expressamente especificadas na lei.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho.  5ª Edição, rev. e ampl. - São Paulo: LTR, 2009.

CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: Teoria do Estado e da Constituição - Direito Constitucional Positivo. 13ª Edição, rev. atual. e ampl. - Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Administrativo Descomplicado. 25ª Edição, rev. e atual. - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2017.

Sobre as autoras
Juliana Morais de Azevedo

Auditora Fiscal do Trabalho.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AZEVEDO, Juliana Morais; FERNANDES, Cíntia Fernanda Clementino Oliveira. A dupla visita na visão da inspeção do trabalho:: aspectos excepcionais e aplicabilidade - Orientações aos empregadores. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6027, 1 jan. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/77133. Acesso em: 25 dez. 2024.

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