SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO..........................................................................................................7
2. CONCEITO DE CRIME ORGANIZADO...................................................................8
3. CARACTERÍSTICAS DO CRIME ORGANIZADO...................................................9
4. CONTEXTO HISTÓRICO DAS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS........................11
5. SURGIMENTO E ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS NO BRASIL.........................12
6. LEIS DE COMBATE ÀS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS...................................13
7. (IM)POSSIBILIDADE DE INTERCEPTAÇÃO “JURÍDICA”..................................16
8. (IM)POSSIBILIDADE DE INTERCEPTAÇÃO “FÁTICA”......................................18
9. CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................22
REFERÊNCIAS...........................................................................................................24
(IM)POSSIBILIDADE DE INTERCEPTAÇÃO DO WHATSAPP NO COMBATE ÀS
ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS
Duílio Dionísio Donato1
RESUMO
O presente trabalho tem a finalidade de investigar a possibilidade de interceptação
do WhatsApp no combate às organizações criminosas. Para tanto, foi realizada uma
pesquisa de caráter bibliográfico. Esse trabalho se encontra estruturado da seguinte
maneira: inicialmente encontra-se o conceito de crime organizado, logo após é
tratada a temática das características dessas associações. Depois tratou-se dos
aspectos históricos desses grupos. Na sequência foi feita uma análise das leis que
regularam e regulam o combate a essas organizações. Por fim, passa a explorar a
outra face do objeto, ou seja, a interceptação do WhatsApp na luta contra o
problema; para tanto, efetuou-se um estudo normativo e fático desse procedimento.
O interesse surgiu da necessidade de pesquisa na área, tendo em vista o Brasil
vivenciar uma crise sistêmica na segurança pública, tendo como uma das causas a
criminalidade organizada. O cotidiano brasileiro é marcado pela violência e
cometimento de toda sorte de crimes por essas organizações: homicídios, roubos,
desvios de recursos públicos, corrupção, tráfico de drogas, de armas, de pessoas;
porte de armas de alto poder destrutivo em vias públicas, dentre outros. Dominam
territórios, aterrorizam a população e esvaziam os cofres públicos sem temer o
Estado. O debate tem a finalidade de aperfeiçoar armas legais que o Estado
brasileiro tem à disposição para combater esse problema, como é o caso da
interceptação das comunicações desses “genocidas”, porém, não consegue fazer
uso efetivo delas devido às circunstâncias adversas.
Palavras-chave: Crime Organizado. Interceptação Telemática. WhatsApp.
ABSTRACT
The aim of this paper is to look into the possibility of WhatsApp interception in
combat against criminal organizations. A bibliographic search was made for this. This
work is structured in the following way: Initially, we can find the concept of organized
crime, right after the theme of the characteristics of these associations is
approached. Then the historical aspects of these groups are discussed. An analysis
was made of the laws that regulated and regulate the fight against these
organizations. Finally, it explores the other side of the object, that is, the interception
of WhatsApp in the fight against the problem; for that, a normative and factual study
of this procedure was made. The interest arose from the need for research in the
area, in view of Brazil experiencing a systemic crisis in public security, having as one
of the causes of organized crime. The daily life is marked by violence and commit of
1 Aluno de Graduação em Direito na Universidade Estadual da Paraíba – Campus III
E-mail: duilio.dionisio.donato@gmail.com
7
many kinds of crimes by these organizations: homicide, robberies, misappropriation
of public funds, corruption, trafficking of drugs, weapons and people; Weapons
license of high destructive power on public roads, among others. Dominate
territories, terrorize the population and empty the public coffers without the fear of the
State. The debate has the purpose of improving illegal weapons in which the
Brazilian State has at their disposal to combat this problem, such as interception of
communications of these "genocide", however, is not able to make effective use of
them due to the adverse circumstances.
Keywords: Organized Crime. Telematic Interception. WhatsApp.
1. INTRODUÇÃO
Sendo a interceptação das comunicações um dos meios de produção de
provas, sem qualquer pretensão de exaurir o tema, o presente trabalho tem a
finalidade de investigar se é possível ou não a interceptação do fluxo das
comunicações feitas através do WhatsApp, pois, este aplicativo, atualmente, é o
principal meio de comunicação da maior parte dos brasileiros, e, por consequência,
dos integrantes de organizações criminosas.
Os números da violência e criminalidade vêm crescendo vertiginosamente, e
grande parte desse aumento tem uma causa específica, a organização para se
cometer delitos. Vidas são perdidas diariamente, onde figuram como vítimas,
principalmente, homens, pobres e negros. Há uma relação de causa e efeito clara
entre esse aumento e o crime organizado, todavia, a reação da sociedade brasileira
a esse problema ainda é tímida.
A tecnologia avançou de forma exponencial nas últimas décadas. Com a
chegada da internet, uma janela se abriu para todo tipo de comunicação. O que nos
tempos remotos só podia ser feito através do transporte físico das mensagens e
informações, nos dias atuais é realizado na velocidade da luz. Através de sistemas
cada vez mais eficientes, a humanidade tem se comunicado como se as pessoas
estivessem frente a frente, mesmo os participantes estando a quilômetros de
distância.
No Brasil a ligação telefônica, até poucos anos atrás, era a forma mais
utilizada para se comunicar. Porém, há cerca de menos de uma década, essa
tecnologia já foi superada por meios telemáticos, como o WhatsApp, que contam
com uma infinidade de recursos para esse fim.
Surgido em 2009, o WhatsApp é um aplicativo de troca de mensagens
instantâneas que permite a comunicação de forma simples e com custo
extremamente baixo. Com apenas dez anos de existência, se consolida no Brasil
como o principal meio de comunicação entre os brasileiros. Todavia, traz consigo
uma maior facilidade de planejamento e execução das ações das organizações que
têm a finalidade de delinquir.
Diante desse cenário, esse trabalho é construído com o objetivo de se
analisar o que são organizações criminosas, trazendo à baila os conceitos e
características apontados por renomados autores e a exposição de definições
8
coesas com a realidade brasileira. É feita também uma exposição dos aspectos
históricos desse fenômeno, buscando informar o leitor acerca da origem dessas
organizações no mundo e no Brasil, fazendo apontamentos sobre algumas delas.
Superados os conceitos, características e aspectos históricos, nessa esteira,
há a visualização da reação legislativa no que se refere ao enfrentamento do
problema, se observando a evolução legislativa adotada pelo Estado para conter o
avanço do crime organizado.
Em seguida, se inicia a compreensão dos mecanismos normativos
relacionados ao tema interceptação do WhatsApp. Extrai-se o que diz a lei sobre
esse delicado meio de produção probatória; se realmente há permissivos legais para
tanto ou se, pelo fato de ser algo muito recente, o legislador ainda não proveu o
Estado de normas que permitam e regulem o tema.
Ato contínuo, é feita uma explanação em torno do WhatsApp. É visto seu
conceito, sua história e formas de influência na vida das pessoas em sociedade. Isso
para que se possa entender sua dinâmica e também se consiga a resposta pra
pergunta da possibilidade ou não de sua interceptação na prática, ou seja, se
existem ferramentas eficazes para se atingir esse fim, deduzindo-se uma outorga
estatal.
Por fim, são inferidas algumas conclusões sobre os pontos ora tratados, além
de apontamentos relacionados que servirão de reflexão aos leitores e,
eventualmente, de incitação à futuras pesquisas sobre a contenda.
A relevância jurídica é corolário do que se menciona anteriormente, haja vista
o trabalho trazer à luz um ponto específico da persecução penal. Levando em
consideração a contemporaneidade do surgimento de alguns elementos do tema,
contribuirá diretamente aos atores da persecução penal, tanto para acusadores e
defensores quanto para julgadores, pois é algo que tem trazido bastante
controvérsias e dúvidas aos operadores do direito.
A metodologia aplicada é a lógico dedutiva, além de ser utilizada nesta
pesquisa a metodologia documental, de caráter estritamente bibliográfico. Nesse
diapasão, se fez consultas sobre normas pertinentes ao tema: em especial à
Constituição Federal de 1988; Lei 12.850/2013 - Lei das Organizações Criminosas
(LOC); Lei 9.296/1996 - Lei das Interceptações Telefônicas (LIT) e Lei 12.965/2014 -
Marco Civil da Internet (MCI); além de consulta à doutrina, jurisprudência e em
fontes da rede mundial de computadores.
2. CONCEITO DE CRIME ORGANIZADO
De início, importante se faz trazer a observação de que não é pacífico entre a
maioria dos autores que haja uma definição acabada de um conceito de organização
criminosa. Porém, é relevante pontuar alguns conceitos de autores de referência no
tema, para se detectar eventuais padrões intrínsecos nas definições.
Se mostra pertinente o que assevera Mendroni:
não se pode definir com absoluta exatidão o que seja organização criminosa
através de conceitos estritos ou mesmo de exemplos de condutas
9
criminosas. Isso porque não se pode engessar este conceito, restringindo-o
a esta ou àquela infração penal, pois elas, as organizações criminosas,
detêm incrível poder variante. Elas podem alternar as suas atividades
criminosas, buscando aquela atividade que se torne mais lucrativa, para
tentar escapar da persecução criminal ou para acompanhar a evolução
mundial tecnológica e com tal rapidez, que, quando o legislador pretender
alterar a Lei para amoldá-la à realidade – aos anseios da sociedade-, já
estará alguns anos em atraso. E assim ocorrerá sucessivamente (2015.
pg.18).
Apesar de se ter autores sustentando a ideia da quase impossibilidade de
elaboração de um conceito, há algumas definições que podem servir de base para
uma conceituação mais lapidada entre os que enveredam pelo caminho de tornar
cada vez mais claro uma definição.
O Fundo Nacional Suíço de Pesquisa Científica, traz uma definição amoldável
à realidade. Jean Ziegler informa o teor :
Existe crime organizado transcontinental quando uma organização cujo
funcionamento é semelhante ao de uma empresa internacional pratica uma
divisão muito aprofundada de tarefas, dispõem de estruturas
hermeticamente fechadas, concebidas de maneira metódica e duradoura, e
procura obter lucros tão elevados quanto possível cometendo infrações e
participando da economia legal. Para isso, a organização recorre à
violência, à intimidação, e tenta exercer sua influência na política e na
economia. Ela apresenta geralmente uma estrutura fortemente
hierarquizada e dispõe de mecanismos eficazes para impor suas regras
internas. Seus protagonistas, além disso, podem ser facilmente substituídos
(2003. p.55).
De acordo com Guaracy Mingardi apud Mendroni, crime organizado é o:
grupo de pessoas voltadas para atividades ilícitas e clandestinas que possui
uma hierarquia própria e capaz de planejamento empresarial, que
compreende a divisão do trabalho e o planejamento de lucros. Suas
atividades se baseiam no uso da violência e da intimidação, tendo como
fonte de lucros a venda de mercadorias ou serviços ilícitos, no que é
protegido por setores do Estado. Tem como características distintas de
qualquer outro grupo criminoso um sistema de clientela, a imposição da Lei
do silêncio aos membros ou pessoas próximas e o controle pela força de
determinada porção de território (2015. p.18).
Em que pese as dificuldades em se formular um conceito preciso, é
necessário que os legisladores construam um conceito o mais claro e objetivo
possível, pois a punição carecerá de uma atitude eficiente dos responsáveis
legiferantes para a adequada aplicação do direito, com vistas ao combate
aperfeiçoado ao problema. Mais adiante no trabalho, na análise da legislação, será
conhecido o conceito adotado atualmente pelo Brasil.
3. CARACTERÍSTICAS DO CRIME ORGANIZADO
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O entendimento desse fenômeno passa por uma conjectura dos padrões
encontrados em alguns pontos dos conceitos em evidência.
Refletindo sobre esses padrões, averigua-se que esse tipo de criminalidade
está fundado numa associação de pessoas, as quais têm por finalidade delinquir,
com os esforços voltados para a acumulação de capital ilícito, em outras palavras, o
objetivo principal é econômico. Parece ser essa a característica, que pode-se
chamar de fundamento principal, condição sine qua non da existência e
funcionamento delas. Logo, poderia se concluir que, baseado no raciocínio Sublata
causa, tollitur effectus (suprima a causa que o efeito cessa), eliminando os ganhos
financeiros das organizações, em tese, elas se extinguiriam.
Uma das mais poderosas armas utilizadas é, sem dúvidas, o poder financeiro.
A grande disponibilidade financeira dessas “Corporações” as tornam ainda mais
eficientes, principalmente para agirem livremente quando se chocam com os
agentes públicos corruptos, pois dessa forma se fortalecem ainda mais quando seus
integrantes têm a certeza da não punição.
A lavagem de dinheiro, que é o ato de tornar lícito o dinheiro adquirido de
forma ilícita, é característica que se destaca. Por meio de empresas de qualquer
natureza conseguem, de forma simples, lavar dinheiro facilmente das mais variadas
formas.
Diferem de outras organizações, como é o caso das terroristas que têm
objetivos político-ideológicos.
Existe no seu interior uma hierarquia estrutural, tal qual uma empresa, com
funções bem definidas. Suas práticas e estrutura se assemelham muito com a de
uma empresa de natureza lícita.
Importante é se ter em mente que se utilizam de meios tecnológicos pra
consecução de seus fins. A informática, telecomunicações, telemática, redes sociais,
inclusive o WhatsApp, são novas formas de auxílio, servindo como ferramentas para
o sucesso de seus atos.
Notam-se ainda setores voltados à defesa da manutenção e existência
dessas organizações. Da mesma forma que ocorre na concorrência pelo cliente
entre empresas de natureza lícita, há concorrência entre essas redes criminosas. O
domínio territorial e consequentemente o domínio das atividades ilícitas é marcado
por uma verdadeira guerra entre as facções, em muitos casos, buscando a
eliminação dos integrantes da organização rival.
De outro lado, se identifica o oposto, uma cooperação entre elas. Seguindo
princípios econômicos, comercializam toda sorte do que lhe é disponível, como
armas, explosivos, munições, drogas, território, informações, recursos humanos;
chegando até, em alguns casos, a se fundirem com outras organizações, não só
nacionais, mas também internacionais e até mesmo fazerem negócios com
organizações terroristas, tornando-se verdadeiras “multinacionais do crime”.
Conforme matéria do site, O Globo:
Na região de fronteira que separa Brasil, Argentina e Paraguai, a atuação de
grupos ligados ao terrorismo internacional sempre foi, para as autoridades
americanas, um fato incontestável. No Brasil, pelo menos oficialmente, o
11
caso nunca foi admitido, e as declarações governamentais costumam
minimizar o tema. Nos últimos anos, no entanto, os serviços de inteligência
do país reuniram uma série de indícios de que traficantes de origem
libanesa ligados ao Hezbollah, o "Partido de Deus", se aventuraram numa
associação com criminosos brasileiros. Relatórios produzidos pela Polícia
Federal apontam que esses grupos se ligaram ao PCC (2014. p.1).
4. CONTEXTO HISTÓRICO DAS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS
A maioria dos autores, inclusive Silva (2014), relatam que a criminalidade
organizada no mundo surgiu na Idade Moderna, mas precisamente por volta do ano
1644, período em que estava ocorrendo uma guerra entre os Hanes contra os
Manchus na China. Esses grupos foram constituídos com o escopo de expulsar os
Manchus, pois esses haviam invadido o território controlado pelos Hanes, mas,
posteriormente passaram a praticar crimes. Data do ano de 1760 a criação da
“Sociedade do Céu”, concebida pelos Hanes para fazer frente aos fundadores da
dinastia Qing. Houve uma pulverização dessa organização por toda China, a qual
ganhou inúmeras ramificações, essas associações interligadas receberam a
denominação de Tríades.
Já no século XX, com a ascensão do Partido Comunista Chinês ao poder, as
leis foram aplicadas de forma mais intensa e eficiente. Os integrantes de facções
chinesas se viram acuados e muitos acabaram migrando para Hong Kong, então
colônia da Inglaterra. O governo Chinês quantificava no ano de 1950 o número de
trezentos mil membros dassas organizações, isso só em Hong Kong.
As Tríades realizavam, nesse período, atividades ilícitas como: exploração da
prostituição, agiotagem, tráfico de seres humanos, tráfico de drogas, contrabando,
tráfico de armas, organização de sequestros, homicídios, roubos, jogos de azar,
entre outras. Mantêm costumes antigos, como por exemplo, punir os integrantes os
queimando vivos e amputando dedos de pés e mãos. Estruturam-se de forma
hierarquizada, escalonada em níveis de alto escalão até níveis mais baixos, partindo
do grande chefe, denominado “Cabeça de Dragão”; passando pelos responsáveis
financeiros no nível dois; tendo também um terceiro nível, onde estão os chefes
locais; até o último nível, o dos calouros do grupo.
Conforme Silva (2014), outra tradicional organização criminosa é a Yakusa.
De origem japonesa, os primeiros relatos desse grupo foram confeccionados por
volta do século XVII, mas só no século seguinte ganhou a forma existente
atualmente. Se valendo da exploração de inúmeras atividades ilícitas, como: casas
de prostituição, cassinos, lavagem de dinheiro, tráfico de seres humanos, etc... No
século XX foram detectadas “chantagens corporativas”, exigência de altos valores
em troca da não divulgação de segredos à concorrência.
“Em virtude de sua presença em todo o território japonês, elas ainda atuam
em vários países na Ásia e no Estado mericano do Havaí, a fim de padronizar
negócios empresariais, ainda que ilegais” (SEQUEIRA. 1996. p.279).
Indo até o continente europeu, observa-se o surgimento de outra notória
organização nessa seara, conforme Junior apud Silva:
Na Itália, em 1814, os príncipes e os feudais da Sicília, ante a opressão
provocada pelo rei de Nápoles, que limitou seus poderes e privilégios,
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contrataram certos homens, a fim de lhes protegerem das investidas da
realeza. Referidos homens constituíram associações secretas denominadas
de “máfias”. Em 1865, ela ganhou admiração da população, pois lutavam
pela independência daquela região. Todavia, passaram a praticar crimes, a
partir da segunda metade do século XX. Aquelas pessoas, antes defensoras
de seu povo, eram conhecidas como “homens de honra” (2014. p.4).
Os membros eram divididos em famílias na Máfia Siciliana. Eram
internamente conhecidos como “homens de honra”, os quais seguiam códigos de
conduta, inclusive sob juramento e eram sujeitos até a pena de morte, caso traíssem
a Máfia. Eram uma sociedade secreta onde qualquer um podia compor e ingressar
em seus quadros.
Conforme SALLA, “à medida que se sofisticavam os mecanismos de
prevenção e contenção dos crimes (como alarmes, dispositivos eletrônicos etc.),
também sofisticavam as ações criminosas” (2008. p.378).
Com a crise essas famílias se viram obrigadas a deixarem seu país,
começando assim, uma imigração da Máfia. Inúmeras famílias se deslocaram para
os Estados Unidos da América, isso aconteceu por volta do século XIX e início do
XX, indo com eles, por dedução lógica, as atividades criminosas características do
grupo. Sendo o ano de 1920, marcado pelo aumento das atividades criminosas
organizadas nesse país, principalmente em função da “Lei Seca”, que proibia a
comercialização de álcool, vindo daí altos ganhos financeiros através do
contrabando de bebidas alcoólicas. Investiam em todo tipo de atividade proibida pelo
Estado, inclusive corrompendo autoridades.
5. SURGIMENTO E ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS NO BRASIL
Versa do final do século XIX o surgimento desse fenômeno no Brasil.
Jagunços e capangas de grandes donos de terra no sertão nordestino se uniram
com o propósito de agir em desconformidade com a lei, praticando uma grande
variedade de crimes. Tal movimento ganhou a denominação de Cangaço. Eram
apoiados por agentes do Estado, inclusive por policiais que forneciam armas e
munições. Organizados por uma estrutura hierárquica, sendo a pessoa de Virgulino
Ferreira da Silva “Lampião”, um dos líderes mais afamados desse período.
Saqueavam pequenas cidades, vilas, praticavam roubos, sequestros, furtos, etc…
sempre com a finalidade de obter lucros desenfreados em prol da associação
(SILVA. 2014).
No começo do século XX, pode-se notar o surgimento de uma das
modalidades de contravenção mais antigas, porém, pertinente nos dias de hoje, o
“Jogo do Bicho”:
Posteriormente, desenvolveu-se no começo do século XX, através da
contravenção penal denominada “jogo do bicho”. Passado algum tempo, tal
jogo de azar foi popularizado e patrocinado por grupos organizados, através
de policiais e políticos corruptos (SILVA. 2014. p. 9).
13
Chegando na década de 70, nota-se o aparecimento de algumas
organizações extremamente bem sucedidas e de denominação conhecida por quase
toda população. Uma delas é o Comando Vermelho, que foi fundado no interior de
uma penitenciária do Rio de Janeiro por presos políticos e comuns. É também da
mesma época e espaço a constituição da Falange Vermelha, a qual foi formada por
especialistas em roubos de bancos. Ainda pode-se citar o Terceiro Comando, Amigo
dos Amigos – ADA, Terceiro Comando Puro, entre outras. Associações parapoliciais,
hoje conhecidas como milícias, também já podiam ser identificadas nessa época,
essas focadas também em expulsar facções que agiam, predominantemente, em
favelas do Rio de Janeiro.
Nos anos 90, o Brasil concebeu a, atualmente, maior organização criminosa
em atividade em seu território, o Primeiro Comando da Capital – PCC:
Na década de 90, no presídio de segurança máxima de Taubaté, localizado
no Estado de São Paulo, aparece o Primeiro Comando da Capital – PCC,
que organizou-se para atuar de diversas formas em vários estados do país,
com a finalidade de elaborar rebeliões, roubos a bancos, extorsões
mediante sequestro, tráfico de drogas com conexões internacionais e
assaltos de membros de outras organizações (SILVA. 2014. p. 10).
No tocante a comunicação dos membros, de grande importância se faz a
interceptação das comunicações para a revelação de estratégias, modo de agir,
identificação de membros, previsão de riscos, definição de políticas públicas, enfim,
pro combate de forma geral a estes grupos. É o que aponta recente investigação da
Operação Echelon sobre o PCC, onde o promotor Lincoln Gakiya, do Núcleo de
Presidente Prudente do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime
Organizado (GAECO), relata que há uma estratégia de crescimento de 3% ao mês,
o que equivale a mil novos membros para se unirem aos já trinta mil “batizados” no
Brasil. Mostrou de maneira detalhada a estrutura hierárquica, expondo que a facção
tem um comando central denominado Sintonia Geral, ao qual se subordinam os
Comandos Estaduais, chamados de Sintonia Final dos Estados e Países. Além de
várias outras sintonias ou gerências especializadas (ISTOÉ. 2018).
O PCC só não atua de forma incisiva em apenas quatro estados da
federação, são eles: Mato Grosso, Distrito Federal, Rio de Janeiro e Rio Grande do
Sul. Nesses estados preferem fazer parcerias com outras facções. Domina, com
exclusividade, o Piauí, Mato Grosso do Sul e São Paulo. Além de ter forte atuação
em países da América do Sul e até mesmo da Europa.
Claro é o fato de não só existirem esses tipos de grupos voltadas,
principalmente, aos crimes violentos e de tráfico de drogas e armas, há também
organizações que se dedicam com mais intensidade a outros tipos de crimes:
desvios de dinheiro público, crimes financeiros, fraudes, compra de votos e uma
infinidade de outros crimes que são cometidos em conluio de pessoas.
6. LEIS DE COMBATE ÀS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS
14
Até o ano de 1995 não havia no Brasil legislação tratando do assunto. A
primeira lei a tratar do tema foi a Lei 9.034/1995 (alterada pela Lei 10.217/2001),
estes normativos dispunham acerca do uso de meios operacionais de combate às
ações praticadas por organizações criminosas, porém não trazia um conceito pátrio.
Não passava de mera norma decorativa no plano jurídico, devido à impossibilidade
de uso e eficácia quase nula, o que trouxe consequências legais:
Diante disso, Luiz Flávio Gomes apud Masson defendia a perda de eficácia
de todos os dispositivos legais da Lei 9.034/1995 fundados nesse conceito,
quais sejam: ação controlada (art. 2.º, II), identificação criminal (art. 5.º),
delação premiada (art. 6.º), proibição de liberdade provisória (art. 7.º) e
progressão de regime (art. 10). Por esse raciocínio, as demais medidas
investigatórias do art. 2.º(interceptação ambiental, infiltração de agentes,
acesso a dados etc.) somente haveriam de ter eficácia nas investigações
que envolvessem quadrilha ou bando ou associação criminosa (2018.
p.20).
Em 2004 a situação muda com a incorporação da Convenção de Palermo, a
qual foi inserida no Ordenamento Jurídico pátrio pelo Decreto Presidencial
5.015/2004. Nele existia um conceito de “grupo criminoso organizado”, porém não
sua tipificação. O que também trouxe um imbróglio jurídico. Se não vejamos:
A 1.ª Turma do STF (HC 96.007, DJe 08.02.2013), contudo, rechaçou esse
entendimento, fixando a ideia de que a conduta seria atípica, haja vista a
inexistência no ordenamento interno do conceito legal de organizações
criminosas (à época). Para a Suprema Corte, como a “introdução [no
ordenamento pátrio] da Convenção ocorreu por meio de simples decreto
não poderia a definição de organização criminosa ser extraída do Decreto
5.015/2004, para fins de tipificação do delito vertido no art. 1.º, VII, da Lei
9.613/1998, sob pena de violação à garantia fundamental segundo a qual
“não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia
cominação legal” (MASSON. 2018. p.21).
Em 2012, após o assassinato de juízes, com destaque pro caso da juíza
Patrícia Acioli da 4ª Vara Criminal de São Gonçalo, Rio de Janeiro, morta com mais
de vinte tiros disparados por homens encapuzados, houve mudanças. Esses fatos
colocaram o Brasil mais próximo de realidades como a da Colômbia dos anos 80.
Chegaram a instituir por lá a “persecução penal sem rosto”, onde juízes, membros
do MP, policiais, funcionários e testemunhas tinham suas identidades mantidas em
sigilo e podiam praticar atos processuais mascarados; e da Itália dos anos 1990.
Nunca é demais relembrar alguns atos realizados pelo Cartel de Medellin na
Colômbia:
(...)dada a incontrolável expansão do crime organizado, sobretudo com o
cartel de Medellín, a temida associação liderada por Pablo Emilio Escobar
Gaviria [...] encontrou-se no juiz sem rosto uma forma de estimular a
coragem dos magistrados colombianos, abalada em virtude das milhares
mortes de civis, policiais, jornalistas, políticos (p. ex., Luis Carlos Galán,
candidato à presidência, e Rodrigo Lara Bonilla, ministro da justiça),
magistrados e membros do Ministério Público, incluindo o Procurador-Geral
da República Carlos Mauro Hoyos, tudo por obra dos sicários do cartel.
15
Como ressaltam Rosa e Conolly, em referência a Carlos Daza Gómez, “a
Colômbia nos anos oitenta estava vivendo época em que os magistrados
eram ameaçados pelos narcotraficantes, sob a liderança do conhecido
Pablo Escobar Gaviria, A situação de poder e de liberdade por parte dos
ditos ‘criminosos’ era de tal gravidade, que em 6 de novembro de 1985,
membros da guerrilha denominada M19 –ligada a Pablo Escobar – entraram
no Palácio da Justiça (Bogotá), então sede da Corte Suprema e do
Conselho de Estado, e mataram 11 magistrados, entre eles o presidente da
Corte Suprema de Justiça, 22 funcionários, sete advogados auxiliares, 11
membros da Força Pública e 3 civis (MASSON. 2018. p.27).
Nesse contexto, como resposta do Legislativo à pressões do Judiciário é
promulgada a Lei 12.694/2012, a qual institui uma espécie de juízes sem rosto,
podendo um colegiado de juízes julgar causas que envolvam organizações
criminosas. Traz também um conceito brasileiro de organização criminosa, mas não
comina pena:
Art. 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a
associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e
caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo
de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante
a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro)
anos ou que sejam de caráter transnacional (BRASIL. 2012. p.1).
Por fim, já no ano seguinte, permeia no ordenamento a Lei 12.850/2013. Ela
define com mais precisão o conceito de organização criminosa, comina pena de
reclusão, traz novas ferramentas de combate, novos meios de produção de prova,
regula alguns institutos, como o da colaboração premiada (conhecida no meio
popular como delação premiada) e o da infiltração de agentes, dá mais poderes a
Delegados e membros do MP; no geral dá mais um passo legislativo no
enfrentamento do problema. Ainda se tem muito que avançar legislativamente, pois
a norma ainda traz polêmicas, que certamente serão objetos de apreciação por
tribunais superiores, falta de regulação de alguns procedimentos, como é o caso da
captação ambiental que não é regulada nessa lei, nem em qualquer outra norma, e
as atecnias que já eram esperadas por uma lei redigida por políticos que não se
preocupam tanto com princípios científicos.
Fato curioso é a data do início da afamada “Operação Lava Jato”, 2014, que
se utiliza com muita frequência do instituto da colaboração premiada como meio de
obtenção de provas.
Por demais longa seria uma análise pormenorizada desta lei, e tampouco se
adequaria ao objeto do presente trabalho, entretanto, relevante é a apreciação dos
meios de produção de prova concebidos, regulados e mantidos nesta lei. Para tanto
veremos um panorama das ferramentas de investigação e meios de obtenção de
provas desta lei:
CAPÍTULO II
DA INVESTIGAÇÃO E DOS MEIOS DE OBTENÇÃO DA PROVA
Art. 3º Em qualquer fase da persecução penal, serão permitidos, sem
prejuízo de outros já previstos em lei, os seguintes meios de obtenção da
prova:
16
I - colaboração premiada;
II - captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos;
III - ação controlada;
IV - acesso a registros de ligações telefônicas e telemáticas, a dados
cadastrais constantes de bancos de dados públicos ou privados e a
informações eleitorais ou comerciais;
V - interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas, nos
termos da legislação específica;
VI - afastamento dos sigilos financeiro, bancário e fiscal, nos termos da
legislação específica;
VII - infiltração, por policiais, em atividade de investigação, na forma do art.
11;
VIII - cooperação entre instituições e órgãos federais, distritais, estaduais e
municipais na busca de provas e informações de interesse da investigação
ou da instrução criminal (BRASIL. 2013. p.1-2 grifo nosso).
A partir de agora trataremos com especificidade o inciso V do art. 3º da Lei
12.850/2013, Lei de Combate às Organizações Criminosas – LCO, o qual trata da
interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas.
7. (IM)POSSIBILIDADE DE INTERCEPTAÇÃO “JURÍDICA”
A parte final do inciso Xll do artigo 5º da Constituição Federal, é regulada no
Brasil pela Lei 9.296, de 1996 (Lei das Interceptações Telefônicas). O inciso XII da
CF/88 informa que:
DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS
XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações
telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último
caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer
para fins de investigação criminal ou instrução processual penal (BRASIL.
1988. p.2).
O valor fundamental constitucional do inciso XII encontra ressalva na parte
final desse mesmo inciso, onde o mandamento constitucional, em ponderação de
valores pelo legislador, optou por autorizar a devassa do sigilo das comunicações
telefônicas de forma clara. Porém, o texto nada prevê literalmente com relação às
comunicações telemáticas. Por conta disso, alguns autores defendem a tese de que
a norma constitucional apenas autorizou a interceptação das comunicações
telefônicas, quando afirma “salvo no último caso”. Para essa corrente, essa
expressão estaria se referindo exclusivamente às comunicações telefônicas,
deixando de fora qualquer outra espécie do gênero meio de comunicação. Todavia, a
regulação desse inciso através da Lei 9.296 de 1996, traz novos elementos e a
previsão expressa da interceptação telemática no parágrafo único do artigo primeiro
(MASSON. 2018).
Vejamos os principais pontos desta lei que interessam a este trabalho:
LEI Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996.
17
Regulamenta o inciso XII, parte final, do art. 5° da Constituição Federal
Art. 1º A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza,
para prova em investigação criminal e em instrução processual penal,
observará o disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente
da ação principal, sob segredo de justiça.
Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de
comunicações em sistemas de informática e telemática (BRASIL. 1996. p.1).
Com essa lei surgiram questionamentos e inúmeras polêmicas acerca dessa
previsão legal. Por hora, nos interessa a controvérsia que se relaciona com o objeto
desse trabalho: se a presente lei, em especial o parágrafo único do artigo 1º,
harmoniza-se com a Constituição Federal de 1988?
O site oficial do STF, em 06 de fevereiro de 2018, noticia que a 2ª Turma do
STF entendeu que o dispositivo não contraria a Constituição:
2ª Turma confirma validade de interceptação de dados telemáticos em
investigação criminal. Por unanimidade, a Segunda Turma do Supremo
Tribunal Federal (STF) negou provimento ao Recurso Ordinário em Habeas
Corpus (RHC) 132115[…] No julgamento, os ministros confirmaram
entendimento da Corte segundo o qual o sigilo da comunicação de dados
por meios telemáticos (e-mail), assim como os demais direitos individuais,
não é absoluto. No STF, a defesa […] Pediu ainda a nulidade das
interceptações telemáticas sob o argumento de que o parágrafo único do
artigo 1º da Lei 9.296/1996 seria incompatível com o sigilo da
correspondência (artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal). A respeito
da alegada incompatibilidade das interceptações telemáticas com o direito
individual do sigilo de correspondência, o ministrou destacou que nenhuma
garantia constitucional é absoluta. “Sigilo da comunicação de dados por
meios informáticos, assim como os demais direitos individuais, não é
absoluto, podendo ser afastado para apuração de crime por meio de
decisão judicial devidamente fundamentada”, afirmou. Ele lembrou ainda
que a Primeira Turma do STF, no julgamento do HC 70814, reconheceu que
o sigilo de correspondência não é absoluto e conferiu validade à
interceptação da correspondência remetida pelos sentenciados, entendendo
que a inviolabilidade do sigilo não pode constituir instrumento de
salvaguarda de práticas ilícitas. Assim, para Toffoli, a exceção constitucional
ao sigilo alcança as comunicações de dados telemáticos, não havendo
qualquer vício no caso em análise. A decisão da Segunda Turma foi
unânime (STF. 2018. p.1).
Com o fito de trazer mais elementos relacionados à discussão, se vê
interessante trazer à baila alguns pontos de outra norma infraconstitucional que
aparenta regular, de certa forma, o tema ora debatido, a Lei 12.965/2014, conhecida
como Marco Civil da Internet:
CAPÍTULO II - DOS DIREITOS E GARANTIAS DOS USUÁRIOS
Art. 7º O acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania, e ao
usuário são assegurados os seguintes direitos:
I - inviolabilidade da intimidade e da vida privada, sua proteção e
indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
II - inviolabilidade e sigilo do fluxo de suas comunicações pela internet, salvo
por ordem judicial, na forma da lei;
18
III - inviolabilidade e sigilo de suas comunicações privadas armazenadas,
salvo por ordem judicial;[…]
CAPÍTULO III - DA PROVISÃO DE CONEXÃO E DE APLICAÇÕES DE INTERNET
Da Proteção aos Registros, aos Dados Pessoais e às Comunicações Privadas
Art. 10. A guarda e a disponibilização dos registros de conexão e de acesso a
aplicações de internet de que trata esta Lei, bem como de dados pessoais e
do conteúdo de comunicações privadas, devem atender à preservação da
intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das partes direta ou
indiretamente envolvidas.[...]
§ 2º O conteúdo das comunicações privadas somente poderá ser
disponibilizado mediante ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei
estabelecer, respeitado o disposto nos incisos II e III do art. 7º (BRASIL. 2014.
p.2-3).
De início, é necessário entender o Marco Civil. São encontrados quatro tipos
de informações: a) registros de conexão; b) registros de acesso a aplicações de
internet; c) dados pessoais e; d) conteúdo de comunicações privadas. Buscamos
nesse trabalho a resposta para o questionamento de ser possível ou não a
interceptação do WhatsApp no combate à organizações criminosas, logo, a única
espécie de informação que nos interessa, por hora, é a d) conteúdo de
comunicações privadas.
O Marco Civil, em seu inciso II do artigo 7º, prevê a possibilidade da
interceptação, mediante ordem judicial, de comunicações pela internet, e no final
menciona que esse procedimento se fará na forma da lei. Se trata de dispositivo
meramente redundante, pois, com outras palavras, tem o mesmo sentido e alcance
do parágrafo único do artigo 1º da Lei 9.296/96; e a essa lei faz referência na
expressão “na forma da lei” (MASSON. 2018).
Já o inciso III do mesmo artigo, pelo que se entende, minimiza qualquer
discussão sobre a possibilidade de se ter acesso à comunicações anteriores ao
mandado judicial. Ou seja, por conta desse dispositivo, é legalmente autorizado e de
difícil contestação, o acesso, mediante ordem judicial, ao conteúdo de mensagens
trocadas antes mesmo da data da autorização judicial.
Outro dispositivo que pode trazer dúvidas quanto a sua interpretação é o
parágrafo 2º do artigo 10 do Marco Civil, o qual dá a impressão de que lei futura
estabelecerá hipóteses para que provedores de conexão de internet (empresas
voltadas à disponibilização de internet) e provedores de aplicações de internet
(empresas donas de aplicativos e programas de internet), interceptem comunicações
telemáticas. Porém, o termo “nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer” se
trata de referência também a Lei 9.296/96, que já regula o tema. Essa possível
polêmica pode surgir pelo fato da palavra “estabelecer” ter sido redigida de forma
equivocada ou, no mínimo, ambígua com o “r” no final, passando a ideia de tempo
verbal futuro. O conveniente seria a palavra “estabelece” trazendo o sentido de
norma já estabelecida.
Por todo o exposto até aqui, há uma dedução lógica no sentido de ser
legalmente possível a interceptação telemática do WhatsApp para o enfrentamento
ao crime organizado. O Estado brasileiro, no âmbito de seus três poderes, garante
legitimidade a esse procedimento.
Tal conclusão teria o condão de por fim ao questionamento desse trabalho,
entretanto, a pesquisa revelou que, na prática, se mostra impossível a concretização
pelos agentes do Estado do procedimento em tela, de forma legal. Devido a essa
19
constatação, há a necessidade do acréscimo de um último capítulo para possibilitar
ao leitor uma análise mais ampla das nuances desse procedimento.
8. (IM)POSSIBILIDADE DE INTERCEPTAÇÃO “FÁTICA”
A palavra interceptar traz um significado de apreender, confiscar aquilo que
pertence a outra pessoa, interceptar mensagem, carta; interceptar cargas desviadas.
Traz a ideia de trazer para si, algo de outra pessoa.
A palavra telemática, por sua vez, é formada pela aglutinação das palavras
telecomunicações (comunicações a distância) e informática. Tem o significado de um
conjunto de serviços executados através de redes de telecomunicações, sendo que
para tanto se vale também de meios informáticos.
Já a palavra telefônica tem o mesmo prefixo de telemática, o prefixo grego
“tele” (distância, afastamento controle feito a distância) e a palavra grega “phoné”
que quer dizer som, significando som a distância, em tradução livre.
Necessário se faz também a distinção desses meios de comunicação. Meio
de comunicação é gênero que tem como espécies, dentre outras a) meio de
comunicação telefônico e; b) meio de comunicação telemático. A teoria clássica do
círculo da comunicação descreve os elementos essenciais da comunicação: a)
emissor/destinador; b) código; c) mensagem; d) canal de comunicação, além de e)
receptor/destinatário. Toda comunicação a distância exige um canal, que é o meio
pelo qual a mensagem passará para chegar até o destinatário. E é justamente no
canal da comunicação que reside a diferença entre as espécies comentadas.
Enquanto a comunicação telefônica usa como canal as redes com fio e sem fio das
operadoras de telefonia; a comunicação telemática utiliza como canal a rede mundial
de computadores, internet. Então, a interceptação telefônica resulta da
obtenção/interceptação da mensagem numa estrutura (canal) completamente
diferente da telemática.
O IBGE divulgou uma pesquisa feita nos quatro últimos meses de 2017. Essa
pesquisa, que é parte das coletas da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
Contínua (PNAD), mostra números de crescimento exponencial do uso da internet.
Essa pesquisa, noticiada pelo site G1 da Rede Globo de Comunicações (2018),
mostra que em apenas um ano o Brasil ganhou 10 milhões de novos internautas,
passando de 116,1 milhões em 2016 para 126,4 milhões em 2017. O percentual do
total da população com acesso passou de 69% em 2016, para 75% em 2017.
Números que, se acompanhada a tendência, já deve passar dos 80% nos dias
atuais.
Revela também que a principal finalidade do acesso é a comunicação através
do envio de mensagens por meio de redes sociais. 95,5% das pessoas afirmaram
que utilizaram a rede para enviar ou receber mensagens; 83,8% afirmaram fazer
chamadas por voz ou vídeo através de aplicativos de internet.
Ainda conforme a pesquisa:
[...]outro levantamento do IBGE mostrou que o celular se consolidou no
Brasil como o principal meio de acesso à internet. Naquele ano, em 92,1%
dos casos, o smartphone era usado para conexão à rede. Esse percentual
aumentou para 97,2% em 2016, chegando a 98,7% no final de 2017. [...] Em
20
contrapartida, microcomputador (incluindo desktops e notebooks) e tabletes
têm caído cada vez mais em desuso. O percentual de domicílios com uso
de PCs caiu de 57,8% em 2016 para 52,3% em 2017 (G1. 2018. p.5).
Aliado a esses números, há projeções que o setor que reúne operadoras de
telefonia pode ter perdido US $ 386 bilhões de dólares em receita com serviços de
voz. As receitas com telefonia diminuirá para US $ 472,7 bilhões em 2019, o que
deve ser tendência nos anos seguintes, conforme a Ovum Research em matéria do
portal Forbes. De outra banda, as receitas de dados de internet provavelmente
alcance US $ 586,4 bilhões a nível mundial. (2015. tradução nossa).
O supramencionado faz concluir que, atualmente, a principal forma de
comunicação é a telemática. E que ligações telefônicas, como forma de
comunicação, ficou em segundo plano, pois houve uma migração da matriz de
comunicação do brasileiro para os meios telemáticos e, consequentemente, a
interceptação da comunicação telefônica perdeu efetividade, uma vez que houve
essa migração. Fato que mostra a eminente necessidade de se avançar nesse
campo, no tocante à interceptação
O WhatsApp se insere nesse contexto como a aplicação de internet mais
usada para a intercomunicação entre os brasileiros. Conforme notícia veiculada no
site Exame da editora Abril (2016), em 2009 o uso de smartphones era bem
pequeno, mas os brasileiros já buscavam outras alternativas de comunicação para
fugir dos altos custos de ligações e SMSs, como o MSN. É nesse ano que surge o
WhatsApp que foi fundado pelo norte-americano Brian Acton, que trabalhou em
vários lugares como engenheiro, e pelo ucraniano Jan Koum, esse de família pobre
que foi para os EUA ainda criança, onde chegou a trabalhar como zelador. Após um
grande investimento, o que possibilitou fornecer várias novidades como mensagens
de áudios, num curtíssimo espaço de tempo o aplicativo chegou a marca de 400
milhões de usuários ativos no mundo em 2013.
Em 2014, o dono do Facebook, Mark Zuckerberg, faz uma proposta de mais
de uma dezena de bilhão de dólares aos fundadores, e compra a empresa dona do
aplicativo WhatsApp. A compra o tornou dono de mais uma das principais redes
sociais usadas pelos brasileiros, tendo em vista que ele é dono também do
Facebook e Instagram.
O WhatsApp é um software (programa/aplicativo) multiplataforma. Tem uma
vasta gama de utilidades e permite ao usuário, através de uma conexão com a
internet, trocar mensagens de texto, áudio, vídeos, realizar chamadas de voz,
chamadas de vídeo, vídeo conferência, trocar arquivos digitais de qualquer natureza,
inclusive com várias pessoas ao mesmo tempo, de forma instantânea, dentre outras
utilidades.
É um meio de comunicação telemático, onde o emissor envia uma mensagem
(texto, foto, vídeo, arquivo, etc) que tem obrigatoriamente que passar por um canal
até chegar ao receptor. Há então três possibilidades de interceptar a mensagem: 1)
no equipamento do emissor; 2) no canal(rede telemática) ou; 3) no equipamento do
receptor.
Entretanto, em 2016, o WhatsApp passou a exibir uma mensagem no formato
de um alerta amarelado, e nele um cadeado com os seguintes dizeres: “As
mensagens que você enviar para esta conversa e chamadas agora são protegidas
com criptografia de ponta a ponta.” Significando que as mensagens transitarão com
21
uma tecnologia de criptografia. E que sequer o próprio WhatsApp, nem mesmo
terceiros que consigam hackear o processo, conseguirão o teor da mensagem.
Apenas o emissor e receptor podem ver a mensagem, pois, no momento que ela é
enviada o aplicativo codifica-a (criptografa), segue pelo canal também codificada, e
chega até o aparelho receptor também codificada, este decodifica (descriptografa) a
mensagem e tem acesso a ela. O resultado é que só quem está numa ponta e na
outra consegue ler a mensagem. Um terceiro consegue até capturar, mas precisará
das chaves para decodificá-la.
Matt Steinfeld, diretor de comunicação do aplicativo, sendo entrevistado por
Renato Santino, em matéria publicada no dia 07/03/2016 no site Olhar Digital, traz
informações relacionadas ao assunto:
É importante observar que o WhatsApp não armazena o conteúdo das
mensagens. A partir do momento em que entregue entre duas pessoas, ela
é apagada dos nossos servidores. Nós só temos nossos servidores com o
propósito de entregar as mensagens. Não mantemos registros sobre o que
as pessoas conversam nos nossos servidores. Outra coisa importante é que
nos últimos dois anos, nós implantamos um recurso chamado criptografia
‘end-to-end’. Ela basicamente ‘bagunça’ a mensagem enviada, o que inclui
texto, fotos, vídeos, clipes de voz para que ela não possa ser acessada por
cibercriminosos ou outros agentes maliciosos.[...] Nós usamos um tipo de
criptografia end-to-end de código aberto, uma ferramenta chamada
TextSecure criada pelos engenheiros de uma empresa chamada Open
Whisper Systems [NOTA DA REDAÇÃO: o protocolo TextSecure é aprovado
por Edward Snowden, ex-analista da CIA, para a troca de mensagens
seguras]. quando eu abro uma janela de chat, o que acontece por trás das
cortinas é que uma chave de encriptação é trocada entre nós. Isso cria um
canal seguro para comunicação; só eu e você temos a chave para
desbloquear esta comunicação. Quando eu mando uma mensagem, aquela
chave que nós compartilhamos desencriptará a mensagem. Ela é enviada
pelos nossos servidores até o seu aparelho em uma forma criptografada,
chegará ao seu aparelho, e porque você tem esta chave, ela irá
desencriptar a mensagem, para que você possa lê-la. Esta mensagem é
uma nova chave. Então, se você quiser responder à minha mensagem, o
sistema lhe dá uma nova chave, para que a sua resposta seja encriptada
com uma chave completamente diferente. Este tipo de criptografia se chama
“Forward Secrecy”. O motivo pelo qual isso é importante, é que, se, por um
acaso, alguém tem acesso à nossa chave da nossa primeira mensagem, ele
só será capaz de ler uma das nossas mensagens, porque todas as outras
usam uma chave de encriptação diferente. Então, em caso de um ataque,
para ter acesso às suas mensagens, a pessoa teria que quebrar a
criptografia em cada uma das mensagens, o que é uma tarefa gigantesca
(SANTINO. 2016. p.3-5).
São várias as ordens judiciais para a interceptação do WhatsApp, só em 2016
foram 3500, contudo, a empresa não cumpre nenhuma delas, pois alega não ter
tecnologia para executar e que não faz guarda do conteúdo das mensagens. A
consequência foram os inúmeros bloqueios que o aplicativo sofreu no Brasil por
determinação judicial, onde a principal motivação para as suspensões é o fato de a
empresa não cumprir a ordem de interceptação. Essa é uma parte da manifestação
da juíza Daniela Barbosa de Souza, ao ordenar uma das suspensões, conforme O
Globo em 19/07/2016:
22
Se as decisões judiciais não podem efetivamente ser cumpridas, e esta
informação é sempre rechaçada por peritos da Polícia Federal e da Polícia
Civil que afirmam ser possível o cumprimento, como foi possível ao Google
do Brasil, em determinada ocasião, cumprir as decisões judiciais que até
então alegava ser impossível, deveremos, então, concluir que o serviço não
poderá mais ser prestado, sob pena de privilegiar inúmeros indivíduos que
se utilizam impunemente do aplicativo WhatsApp para prática de crimes
diversos. (2016. p.3).
O assunto está no momento em pauta para ser analisado pelo STF na ADPF
403 e ADI 5527, conforme notícia do dia 25/01/2017 do site de notícias do STF:
Diante da relação entre as discussões postas nas duas ações, os relatores
concluíram pela ampliação do escopo da audiência pública, a fim de
abranger os dois temas.
Na ADPF 403, o Partido Popular Socialista (PPS) sustenta que os bloqueios
judiciais do WhatsApp violam o preceito fundamental da liberdade de
comunicação e expressão, garantido no artigo 5º, inciso IX, da Constituição
Federal e também no Marco Civil. A ADI 5527 foi ajuizada pelo Partido da
República (PR) contra os dispositivos da Lei 12.965/2014 que dão suporte
jurídico à concessão de ordens judiciais para que aplicações de internet
forneçam o conteúdo de comunicações privadas e preveem sanções em
caso de descumprimento (STF. p.1).
Com a frase “The future is private" estampada de forma destacada no telão do
palco do discurso, o presidente-executivo, Mark Zuckerberg, na abertura do encontro
anual do Facebook com desenvolvedores, o F8, ocorrido no dia 30/04/2019, afirmou
em alto e bom tom que “O futuro é privado" (notícia veiculada pelo jornalista Thiago
lavado do portal G1). Disse também que “[…] após a internet permitir que o mundo
todo se conectasse, como numa grande praça, o próximo desafio é criar
experiências mais íntimas, como numa sala de estar”. Indicando que fortalecerá
ainda mais as barreiras ao acesso
Isso posto, significa que, na prática, não é possível a interceptação do
WhatsApp pelos agentes do Estado, de forma legal, sob nenhuma hipótese, haja
vista a impossibilidade técnica para se operacionalizar esse procedimento
9. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ante tudo que nesse trabalho foi exposto, obtivemos resultados
primeiramente na análise do fenômeno das organizações criminosas quanto ao seu
conceito. Entendemos que se trata de pessoas que se associam por diversos
motivos, mas principalmente com o objetivo de obter ganhos econômicos,
cometendo crimes para tanto. Dos conceitos trazidos à discussão foi possível
encontrar algumas características que são comuns a quase totalidade de qualquer
associação delinquente, como é o caso da hierarquia, domínio territorial, finalidade
de lucros, dentre outros.
Frutos também foram colhidos na análise histórica do crime grupal. Foi
possível verificar a provável gênese na China com as Tríades, onde os membros
inicialmente se aliaram para expulsar povos invasores, mas depois se consolidaram
23
praticando ilícitos; no Japão foi examinada a atuação da Yakuza, que explorava
diversas atividades criminosas, como cassinos, casas de prostituição, lavagem de
dinheiro, etc, agindo em todo território japonês. Ainda foi possível entender as Máfias
italianas, essas constituíam uma sociedade secreta, praticando toda sorte de
infrações penais concernentes a esse tipo de criminalidade. Essa Máfia, em meio à
crise econômica, imigrou para os EUA, o que, de certa forma, contribuiu para o
aumento do crime organizado na América do Norte.
Resultou, por afinidade, a compreensão das estruturas criminosas que foram
concebidas no Brasil. O início com o Cangaço de Lampião e em seguida o
surgimento de facções que até os dias de hoje afrontam o Estado e minam a paz
dos brasileiros. O CV no Rio e hoje em dia com atuação em parte dos Estados
brasileiros; os Amigos dos Amigos, Terceiro Comando Puro, além de grupos
milicianos. E o maior e mais bem sucedido grupo, que tem negócios em quase todo
país e no exterior, inclusive com organizações terroristas; comanda um exército de
mais de 30.000 homens; tem um faturamento milionário e projetos de expansão, o
PCC. Não só essas, mas também uma infinidade de organizações fazem toda sorte
de negócios e cometem uma gama extensa de crimes em nosso território, como por
exemplo os “Mensaleiros” e tantas outras organizações políticas, empresariais e de
vários outros ramos.
Os sentimentos de otimismo e preocupação tiveram lugar ao nos
debruçarmos na reação normativa estatal. Apenas em 1995 tivemos uma lei que se
preocupou com o problema, porém, essa lei tinha um problema sério de eficácia. Em
2004 trouxemos uma norma alienígena para nosso ordenamento, mas também
carecia de ferramentas e eficácia. Em 2012, com os assassinatos de juízes, o
Estado passou a tratar o tema de forma mais enérgica ao inserir vários dispositivos,
principalmente de proteção a juízes. Culminando em 2013 com a feitura de uma lei
mais arrojada, com diversas ferramentas, mais preocupada com o avanço do crime
organizado, porém, ainda não satisfatória, tendo em vista o estrago que a
criminalidade organizada provoca em nosso seio social.
Quando fomos pesquisar sobre a outra face do objeto, que é uma ferramenta,
um meio de produção de prova previsto na Lei de Combate às Organizações
Criminosas: a interceptação de comunicações via WhatsApp, descobrimos uma
dimensão a ser explorada. Nessa exploração fomos em busca da resposta para um
questionamento: possibilidade ou não de interceptação do aplicativo. Nos
deparamos com a Constituição e o direito fundamental à inviolabilidade das
comunicações e sua ressalva por reserva jurisdicional. Desse ponto fomos levados
até a Lei das Interceptações Telefônicas - LIT, no caminho tiramos algumas dúvidas
com relação ao Marco civil da Internet. Voltamos para LIT e vimos a adequação dela
com a CF/88 reconhecida pelo STF (é constitucional a interceptação telemática) o
que significa dizer que é possível, normativamente, a interceptação do WhatsApp,
conclusão que poria fim ao presente trabalho.
Porém, antes de finalizar, por conta da descoberta da impossibilidade prática,
foi necessária uma análise do procedimento em sua dimensão pragmática. Foi vista
a mudança na matriz de comunicação do brasileiro, a história e características do
WhatsApp, dentre elas a natureza telemática de seu funcionamento. Fomos
surpreendidos com a criptografia de ponta a ponta, a qual impossibilita tecnicamente
a interceptação e declarações recentes de Mark Zuckerberg, que indicam o
fortalecimento dos mecanismos de proteção ao acesso de conteúdos de
24
comunicação. Além de serem observadas as consequências desse fato perante o
judiciário com bloqueios do aplicativo e a chegada da discussão ao STF. No final
concluindo não ser possível a interceptação do WhatsApp no combate às
organizações criminosas.
Pois bem, a dinâmica do mundo não permite que uma situação no espaçotempo
se eternize. Com o passar do tempo essa situação trilhará um caminho, pelo
qual, no momento, não temos resposta de onde vai dar. Por esse motivo,
acompanhar uma continuidade, críticas ou pesquisas relacionadas a esse trabalho
seria não só um espanto filosófico, mas também uma honra a este pequeno esforço
que acabamos de fazer.
REFERÊNCIAS
2ª TURMA STF. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS : RHC 132,115
PR. Relator: Ministro Dias Toffoli. DJ: 06/02/2018. Disponivel em:
https://www.google.com/url?
sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=2&ved=2ahUKEwigmJ38qvbiAhUoGbkGH
U2fALUQFjABegQIABAC&url=http%3A%2F%2Fredir.stf.jus.br%2Fpaginadorpub
%2Fpaginador.jsp%3FdocTP%3DTP%26docID
%3D748467158&usg=AOvVaw1WcUIDQ-8nia5jQi4GV5YC. Acesso em: 28 mai.
2019
BRASIL. Constituição de 5 de outubro de 1988. Brasília, DF, 5 out. 1988.
Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso
em: 7 maio 2019
BRASIL. Decreto nº 5.015, de 12 de março de 2004. Promulga a Convenção das
Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional. Brasília, DF, 15 mar.
2004. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-
2006/2004/decreto/d5015.htm. Acesso em: 16 abr. 2019.
BRASIL. Lei nº 9.034, de 3 de maio de 1995. Dispõe sobre a utilização de meios
operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações
criminosas. Brasília, DF, 4 maio 1995. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9034.htm. Acesso em: 17 abr. 2019.
BRASIL. Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. Regulamenta o inciso XII, parte final,
do art. 5° da Constituição Federal. Brasília, DF, 25 jul. 1996. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9296.htm. Acesso em: 8 maio 2019.
BRASIL. Lei nº 12.694, de 24 de julho de 2012. Dispõe sobre o processo e o
julgamento colegiado em primeiro grau de jurisdição de crimes praticados por
organizações criminosas; altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 -
Código Penal, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de
Processo Penal, e as Leis nºs 9.503, de 23 de setembro de 1997 - Código de
Trânsito Brasileiro, e 10.826, de 22 de dezembro de 2003; e dá outras providências.
Brasília, DF, 25 jul. 2012. Disponível em:
25
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12694.htm. Acesso
em: 19 abr. 2019.
BRASIL. Lei nº 12.850, de 2 de agosto de 2013. Define organização criminosa e
dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações
penais correlatas e o procedimento criminal; altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 (Código Penal); revoga a Lei nº 9.034, de 3 de maio de 1995; e
dá outras providências. Brasília, DF, 5 ago. 2013. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12850.htm. Acesso em:
13 maio 2019.
BRASIL. Lei nº 12965, de 23 de abril de 2014. Estabelece princípios, garantias,
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