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Uma crítica à reedição do Enunciado n° 368 do TST

Agenda 17/01/2006 às 00:00

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO; 2. DA REEDIÇÃO DO ENUNCIADO 368; 3. O EQUÍVOCO DAS RAZÕES INVOCADAS; 4. DA APLICAÇÃO DO DECRETO 3048/99; 5. CONCLUSÃO.


1. INTRODUÇÃO

Com o advento da EC n° 20/98, a Justiça do Trabalho passou a ter competência para executar, de ofício, as contribuições sociais oriundas das sentenças que proferir.

Em que pese a clareza do antigo § 3º do art. 114 da CF, atual inciso VII do art. 114, havia uma celeuma no que tange a competência de se executar o vínculo empregatício.

Alguns Ministros do TST entendiam que só era cabível a execução das contribuições sociais de sentenças/acordos condenatória(o)s, sendo o período do vínculo uma atribuição da Justiça Federal.

A maioria entendia que a Justiça do Trabalho era competente para executar tanto as sentenças condenatórias, como as sentenças declaratórias, uma vez que não havia restrição no texto constitucional.

Após vários anos de divergência, o TST editou o Enunciado 368, que atribuia sem ressalvas, a competência da Justiça Laboral para executar o período reconhecido nesta especializada.


2. DA REEDIÇÃO DO ENUNCIADO 368

Em 10.11.2005, o pleno do TST reeditou o Enunciado 368. Vejamos o inteiro teor dos motivos veiculados no site:

"O Pleno do Tribunal Superior do Trabalho decidiu hoje (10), por maioria de votos, que não cabe à Justiça do Trabalho (JT) a cobrança das contribuições devidas ao INSS sobre as ações declaratórias, nas quais é reconhecido o vínculo de emprego do trabalhador. A execução do tributo pela JT ficará restrita às decisões em que há condenação da empresa ao pagamento de parcelas trabalhistas e sobre os valores resultantes de acordos entre as partes.

Na sessão, os ministros do TST criticaram a postura adotada pela Previdência Social diante das decisões judiciais que declaram a relação de emprego. Os valores correspondentes ao reconhecimento do vínculo têm sido recolhidos a um fundo específico do INSS e não diretamente à conta do trabalhador na Previdência. O INSS, contudo, não admite a decisão judicial como prova de tempo de serviço do trabalhador, que termina com a aposentadoria postergada.

"Trata-se de uma injustiça com o trabalhador e um despropósito a Justiça do Trabalho garantir a arrecadação do tributo sobre o dinheiro do trabalhador, que não tem a contagem de tempo reconhecida para a aposentadoria e fica sem os próprios valores recolhidos", afirmou o presidente do TST, ministro Vantuil Abdala.

O ministro pretendia que tivesse sido firmado um acordo prévio sobre esta questão com a Previdência, o que não foi possível pela alta rotatividade no comando do Ministério.

A mudança de entendimento foi adotada após a revisão da Súmula nº 368 do TST, que interpreta o alcance do dispositivo constitucional que atribui à Justiça do Trabalho a competência para a execução das contribuições previdenciárias decorrentes de suas decisões. O tema foi objeto de um amplo estudo feito pelo ministro Simpliciano Fernandes, cujo posicionamento foi adotado pela maioria dos integrantes do TST.

Com a decisão do Pleno, o inciso I da Súmula 368 passa a dispor que "a competência da Justiça do Trabalho, quanto à execução das contribuições previdenciárias, limita-se às sentenças condenatórias em pecúnia que proferir e sobre os valores objeto de acordo homologado que integrem o salário de contribuição".


3. O EQUÍVOCO DAS RAZÕES INVOCADAS

Após uma análise crítica das razões fundamentadoras, verica-se que o TST não utilizou-se de fundamentos jurídicos, uma vez que os motivos são de ordem polítio-social.

Em que pese as suas argumentações políticas, o Constituinte derivado determinou que compete a Justiça do Trabalho a execução, de ofício, das contribuições sociais das sentenças que proferir.

Não cabe ao TST, salvo via declaração de inconstitucionalidade da EC 45/04 alterar a competência da jurisdição constitucionalmente estabelecida.

Neste diapasão, o TST invade a discricionariedade das diretrizes das política públicas próprias do Poder Executivo.

Discricionariedade é a margem de "liberdade" que remanesce ao administrador para eleger, segundo critérios consistentes de razoabilidade, um, dentre pelo menos dois comportamentos, cabíveis perante cada caso concreto, a fim de cumprir o dever de adotar a solução mais adequada à satisfação da finalidade legal, quando, por força da fluidez das expressões da lei ou da liberdade conferida no mandamento, dela não se possa extrair objetivamente uma solução unívoca para a situação vertente.

A noção de Discricionariedade, ou "atribuição discricionária" envolve um aspecto liberal, de autonomia em face de uma determinada autoridade. Logo, atuar discricionariamente significa proceder no exercício de uma atividade, sob aspectos racionais e proporcionais, dentro do âmbito estabelecido pelo ordenamento jurídico, optando pelo melhor procedimento que irá satisfazer o bem comum, diante de conceitos ambíguos trazidos pela norma posta.

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Neste diapasão, Discricionariedade implica uma escolha entre muitas possíveis, em atendimento ao interesse público próprio de sua atribuição e competência, com uma função finalística perante o fato real. Seria, pois, a determinação do sentido de uma noção deixada na norma. A opção da melhor atitude a ser tomada pela autoridade dentre inúmeras, deve ser entendida diante de um aspecto de liberdade sempre relativa, limitada e contrastável pelo Judiciário, caso este venha a ser acionado.

Portanto, cabe ao Poder Executivo Federal eleger o modo de gestão da previdência social, inclusive, a forma de aplicação de seus recursos, não existindo direito adquirido sobre essa entendimento.

Ademais, a Previdência Social pública brasileira não é um sistema de capitalização. É regida pelo Princípio da Solidariedade onde a sociedade financia todo o sistema e o governo determina suas diretrizes.

Vejamos uma decisão do STF que deixa claro esse entendimento:

RE 344331 / PR – PARANÁ

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a): Min. ELLEN GRACIE

Julgamento: 11/02/2003 Órgão Julgador: Primeira Turma

Publicação: DJ 14-03-2003 PP-00040 EMENT VOL-02102-04 PP-00831

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IPI. CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS. ALÍQUOTAS REGIONALIZADAS. LEI 8.393/91. DECRETO 2.501/98. ADMISSIBILIDADE.

1. Incentivos fiscais concedidos de forma genérica, impessoal e com fundamento em lei específica. Atendimento dos requisitos formais para sua implementação.

2. A Constituição na parte final do art. 151, I, admite a "concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do país".

3. A concessão de isenção é ato discricionário, por meio do qual o Poder Executivo, fundado em juízo de conveniência e oportunidade, implementa suas políticas fiscais e econômicas e, portanto, a análise de seu mérito escapa ao controle do Poder Judiciário. Precedentes: RE 149.659 e AI 138.344-AgR.

4. Não é possível ao Poder Judiciário estender isenção a contribuintes não contemplados pela lei, a título de isonomia (RE 159.026). 5. Recurso extraordinário não conhecido.


4. DA APLICAÇÃO DO DECRETO 3048/99

Regulamentaré edictar regras que se limitem a adaptar a atividade humana ao texto, e não o texto á atividade humana.

Onde se estabelecem, alteram, ou extinguem direitos, não há regulamentos – há abuso de poder regulamentar, invasão da competência do Poder Legislativo. O regulamento não é mais do que auxiliar das leis.

O poder regulamentar, consiste no mais importante meio pelo qual a Administração Pública exerce atividade normativa secundária. Existe, com efeito, uma imensa série de atos normativos editados pela Administração, a exemplo de instruções ministeriais, circulares, regimentos, estatutos, ordens de serviço, entre outros.

O conceito estrito de regulamento, em nosso país, refere-se apenas ao ato normativo secundário editado pelo Chefe do Executivo. Sendo proveniente de qualquer outra autoridade, não mais corresponderá à idéia constitucional de regulamento. Nesse sentido, de acordo com o preclaro jurista Geraldo Ataliba, ainda sob a vigência da Constituição anterior:

Consiste o chamado poder regulamentar na faculdade que ao Presidente da República – ou Chefe do Executivo, em geral, Governador e Prefeito – a Constituição confere para dispor sobre medidas necessárias ao fiel cumprimento da vontade legal, dando providências que estabeleçam condições para tanto. Sua função é facilitar a execução da lei, especificá-la de modo praticável e, sobretudo, acomodar o aparelho administrativo, para bem observa-la .

O regulamento fornecerá um critério material para a tomada de decisões em casos concretos. Daí a diferenciação do regulamento enquanto ato normativo e um ato administrativo executivo. O regulamento é dotado de generalidade e abstração. Os regulamentos expressam verdadeira atividade administrativa de caráter normativo.

Com efeito, a Lei 8212/91 é quem organiza a Seguridade Social e instituiu o Plano de Custeio trazendo os melindres de toda a estrutura.

O art.43 explicita que nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o juiz, sob pena de responsabilidade, determinará o imediato recolhimento das importâncias devidas à Seguridade Social e no seu § único, esclarece que nas sentenças judiciais ou nos acordos homologados em que não figurarem, discriminadamente, as parcelas legais relativas à contribuição previdenciária, esta incidirá sobre o valor total apurado em liquidação de sentença ou sobre o valor do acordo homologado.

Regulamentando o art.43 com maior vagar, o art.276 § 4º do Decreto 3048/99 é claro em estabelecer que:

Art.276. Nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o recolhimento das importâncias devidas à seguridade social será feito no dia dois do mês seguinte ao da liquidação da sentença.

§ 7º Se da decisão resultar reconhecimento de vínculo empregatício, deverão ser exigidas as contribuições, tanto do empregador como do reclamante, para todo o período reconhecido, ainda que o pagamento das remunerações a ele correspondentes não tenham sido reclamadas na ação, tomando-se por base de incidência, na ordem, o valor da remuneração paga, quando conhecida, da remuneração paga a outro empregado de categoria ou função equivalente ou semelhante, do salário normativo da categoria ou do salário mínimo mensal, permitida a compensação das contribuições patronais eventualmente recolhidas.


5. DA INADMISSIBILIDADE DA SENTENÇA JUDICIAL COMO COMPROVAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO

Entre os motivos políticos utilizados pelo Colendo TST está o de que a sentença da Justiça do Trabalho não é considerada pelo INSS como início de prova material.

Nos deparamos com outro equívoco do TST onde ele próprio assegura ao INSS o direito de não aceitar suas decisões (Justiça do Trabalho), caso a autarquia previdenciária não tenha participado na relação processual na fase de conhecimento. Vejamos uma decisão a respeito:

PROC. Nº TST-RXOFROMS-558.262/99.2

C:

A C Ó R D Ã O

SBDI2

RLL/At/emf

MANDADO DE SEGURANÇA. RECONHECIMENTO E/OU AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PARA EFEITO DE APOSENTADORIA DETERMINADOS AO INSS EM RECLAMAÇÃO TRABALHISTA DA QUAL A AUTARQUIA NÃO FOI PARTE. CABIMENTO.

O mandado de segurança é o único remédio cabível para cassar ordem ilegal do juiz que, tendo julgado reclamação trabalhista, da qual não participou o INSS, determina ao órgão previdenciário que averbe o tempo de serviço declarado na sentença transitada em julgado. Segurança concedida.

Analisando as razões da decisão acima, o TST representado por uma de suas turmas entendeu que

"De plano, considero a decisão usurpadora da competência da Justiça Comum ou Federal, já que, a pretexto de definir tempo de serviço imputável ao empregador, na verdade compôs relação previdenciária.

A relação previdenciária tem características próprias, submetidas, no tocante ao tempo de serviço, às normas do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, em que sobressai a exigência de princípio razoável de prova material. Tal regra é de compreensível fonte material: a Previdência deve estar imune a acertos das partes quanto à existência de uma relação jurídica que venha a atingi-la e onerá-la.

O art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 assim dispõe:

A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.

De outro lado, o INSS não poderia ser atingido pelos efeitos dessa decisão, uma vez que não participou da relação processual, fugindo, destarte, dos efeitos subjetivos da coisa julgada (art. 472 do CPC), a qual objetivamente também não o atinge (art. 468 do CPC). Com efeito, uma vez que o Instituto não integrou a lide principal, não pode ser obrigado a cumprir determinações que não pode contestar, sob pena de ofensa aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal.


6.CONCLUSÃO

Considerando que as razões que levaram a reedição do Enunciado 368 do TST foi baseada em argumentos políticos, onde não observou-se a legislação previdenciária em vigor, sobretudo, a Lei 8212/91 e o Decreto 3048/99, não há como se sustentar a constitucionalidade, conseqüentemente, a sua aplicação nas execuções fiscais no àmbito trabalhista.

Sobre o autor
José Evaldo Bento Matos Júnior

procurador federal, lotado no órgão de arrecadação da PGF em Teresina (PI)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MATOS JÚNIOR, José Evaldo Bento. Uma crítica à reedição do Enunciado n° 368 do TST. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 928, 17 jan. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7838. Acesso em: 22 dez. 2024.

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