1. Objetivo
EM TEMPOS DE CONFINAMENTO E RESTRIÇÕES PESSOAIS EM RAZÃO DA COVID – 19, o mundo tem passado por grandes transformações decorrentes de uma nova visão de sociedade globalizada, que impõe mudanças e reflexões no posicionamento dos institutos do Direito, em especial da Constituição Federal, do Direito Processual Penal e da justiça internacional. Assim, estas alterações devem sempre estar norteadas por princípios que constituem o Estado Democrático de Direito, principalmente em face do direito de punir do Estado, bem como nas mais variadas acepções da intervenção na vida do cidadão.
2. Conteúdo
a) O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS EM TEMPOS DE COVID - 19. CONTEÚDO DE CIDADANIA. O INDIVÍDUO COMO DETENTOR DE DIREITOS CIVIS (SAÚDE, VIDA, LIBERDADE) E SOCIAIS (FRATERNIDADE, EDUCAÇÃO, TRABALHO, MORADIA). UNIVERSALIZAÇÃO E POSITIVAÇÃO PELAS DECLARAÇÕES DE DIREITOS. COVID–19 – UMA PANDEMIA QUE TEM PROVOCADO MUDANÇAS NAS GARANTIAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS.
Temos que, segundo pesquisas realizadas, a COVID-19, mais conhecido como coronavírus se trata de um vírus pertencente à família Coronaviridae. Nela, existem desde causadores de uma gripe simples, até doenças que podem causar um risco maior para a população.
Não é demais acrescentar que coronavírus é uma família de vírus que causa infecções respiratórias. Recebe esse nome porque as características do vírus se assemelham a uma coroa (corona, em espanhol). A primeira vez que esse agente infeccioso foi identificado em humanos e isolado, foi em 1937. Porém, só foi descrito como coronavírus em 1965, quando a análise de perfil na microscopia revelou essa aparência.
O novo vírus, descoberto em 31 de dezembro de 2019, e que atraiu a atenção das autoridades de saúde em todo mundo, foi nomeado tecnicamente de COVID-19. Por também ter aparência de coroa, ele tem sido chamado de novo coronavírus. Os primeiros casos desse agente foram registrados em Wuhan, na China.
Embora as autoridades de saúde estejam em alerta, a maioria das pessoas se infectam com os coronavírus comuns ao longo da vida, sendo as crianças pequenas mais propensas a se infectarem com essas variantes. Os tipos mais regulares que infectam humanos são o alpha coronavírus 229E e NL63, e o beta coronavírus OC43, HKU1.
O atual ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, em publicação datada de 11/03/2020, destacou que não há motivo para pânico, destacando na oportunidade que "É preciso ter calma. Todos os anos nós temos milhares, milhões de casos de gripe no mundo com fatalidades, com óbito (por Influenza A, B, por uma série de vírus que ocorrem todos os anos). O coronavírus não é uma novidade, enquanto vírus respiratório, nos sistemas de saúde do mundo. Teremos dias bons e dias ruins? Provavelmente, sim! Mas, calma porque a gente vai atravessar como já o fizemos em várias outras situações como essa", asseverou.
No entanto, o vírus que está se espalhando no mundo hoje, começando na China, é um coronavírus novo. Inclusive, já matou várias pessoas ao redor do mundo, e alcançou o continente americano.
Apesar de ser conhecido desde meados de 1960, o novo coronavírus é uma forma nova. Sendo assim, é necessária uma nova abordagem para as descobertas desse vírus.
COMO OCORRE A TRANSMISSÃO?
A OMS (Organização Mundial de Saúde) acredita que a contaminação ocorra entre humanos. Porém, ainda não se sabe exatamente o portador inicial do vírus, dado que ele pode vir de vários animais.
No entanto, os casos estão sendo associados ao mercado de frutos do mar em Wuhan. Mesmo que alguns mamíferos marinhos possam portar o coronavírus (como o caso da baleia-beluga), outros animais são comercializados no local. Portanto, seriam alguns deles: morcego, galinha, cobra e coelho. Contudo, todos animais selvagens vivos.
Ademais, em tese, o vírus pode, ao se hospedar nas células humanas, se reproduzir. Portanto, ao se instalar, o vírus acaba se espalhando pelo corpo do hospedeiro.
No entanto, as informações sobre a sua propagação não são exatas, e ainda se sabe pouco. De fato, a doença pode ficar encubada cerca de duas semanas após o contato com o vírus.
Em SP e no Rio, home office e suspensão de aulas. Em locais onde já acontece a chamada transmissão comunitária do vírus, como as cidades do Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP), as recomendações passam a ser mais severas. Diferente da transmissão local, na transmissão comunitária não é mais possível saber quem transmitiu para quem a doença. Nestas cidades, o Ministério da Saúde já recomenda desde a última sexta-feira que empresas adotem o teletrabalho (home office); que aulas sejam interrompidas; e que os gestores locais monitorem o ingresso e a saída de pacientes com covid-19 nas UTIs.
COVID-19 - O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Hodiernamente muito utilizado, mas pouco compreendido, o termo “Estado Democrático de Direito”, encerra diversas peculiaridades, o que dificulta ainda mais sua conceituação, sobretudo quando estamos diante de uma pandemia mundial denominada COVID-19.
A Carta Constituinte trata desse termo logo em seu primeiro artigo, adjetivando a República Federativa do Brasil como tal, bem como consagrando os princípios fundamentais como a soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político.
O Estado Democrático de Direito, portanto, exige, sobretudo em tempos de COVID-19, reger-se pelo Direito e por normas democráticas, haja vista que o povo escolhe os seus representantes, os quais agem como mandatários daquele, porém esse poder delegado não é absoluto. É de vital importância também a proteção e garantia dos direitos fundamentais como modo de proteção e respeito aos cidadãos.
Nesse sentido leciona José Afonso da Silva, “a tarefa fundamental do Estado Democrático de Direito consiste em superar as desigualdades sociais e regionais e instaurar um regime democrático que realize a justiça social”.1
Portanto, o Estado Democrático de Direito deve garantir a dignidade e cidadania. Ou seja, a dignidade da pessoa humana e a cidadania foram colocadas na esfera de fundamentos da República justamente para validar a existência do Estado Democrático de Direito. A idéia central de dignidade da pessoa humana, como uma proposição formada por vários conteúdos, dentre os quais estão os chamados direitos individuais e os políticos, além dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Ora, nesse mesmo contexto precisamos entender com certa reserva as decisões que são adotadas pelos Governantes, pois geralmente essas mesmas pessoas, eleitas pelo povo, passam a legislar sem a devida competência para o referido cargo, agindo de maneira proeminente, deixando de lado o Princípio Constitucional que é o pilar-base da nossa conceituação jurídica.
Na situação pandêmica causada pelo COVID-19 - anote-se, muitas vezes, sem a devida lógica jurídica - percebemos a obstrução desastrosa da “liberdade de ir e vir”, ocasionando uma insegurança à população, pois não respeita a competência.
Nesse mesmo diapasão, tornou-se muito comum, assevera-se, sem entrar no quesito saúde, muitos Governos Municipais proibirem os cidadãos de utilizarem a praia, quando essa competência é expressa da União, conforme preceitua o Artigo 20 da Constituição Federal Brasileira, in verbis:
Art. 20. São bens da União:
IV - as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II;
b) CIDADANIA, DIREITOS CIVIS E SOCIAIS
O termo cidadania foi forjado ao longo das lutas do povo marcadas na história, trazendo em sua concepção um conjunto de valores construídos a partir do surgimento da cultura de cada nação.
Certamente esse conceito está em processo de constante evolução, tendo como base uma participação ativa da sociedade em seus diversos formatos. Desta forma, cidadania é a ocorrência da conscientização de que o Estado Democrático de Direito só existirá caso tenha como arrimo a Dignidade da Pessoa Humana e os Direitos Humanos amplamente garantidos. Evidente que somente a partir deste axioma será possível construir uma sociedade plenamente justa, solidária e fraternal, exigindo-se o apoio e colaboração de toda a comunidade.
Os direitos civis referem-se às liberdades individuais, como o direito de ir e vir, de dispor do próprio corpo, o direito à vida, à liberdade de expressão, à propriedade, à igualdade perante a lei, a não ser julgado fora de um processo regular, a não ter o lar violado.
Esse grupo de direitos tem por objetivo garantir que o relacionamento entre as pessoas seja baseado na liberdade de escolha dos rumos de sua própria vida - por exemplo, definir a profissão, o local de moradia, a religião, a escola dos filhos, as viagens - e de ser respeitado. É preciso ressaltar que liberdade de cada um não pode comprometer a liberdade do outro. Ter os direitos civis garantidos, portanto, deveria significar que todos fossem tratados em igualdade de condições perante as leis, o Estado e em qualquer situação social, independentemente de raça, condição econômica, religião, filiação, origem cultural, sexo, ou de opiniões e escolhas relativas à vida privada.
Dessa forma, o exercício e a garantia dos direitos civis não existem sem a tolerância e o convívio com os diferentes modos de ser, sentir e agir. Se reivindicamos o direito às nossas liberdades individuais, assumimos ao mesmo tempo o compromisso e a responsabilidade de zelar para que essas liberdades existam para todos. Preocupar-se com a garantia dos direitos significa tanto exercitá-los em nossa vida quanto construir no cotidiano condições que permitam a sua ampla realização.
A condição fundamental para a garantia dos direitos civis é de natureza social. Logo, se em uma sociedade determinados grupos ficam excluídos desses direitos, essa desigualdade atinge não apenas as pessoas que sofrem as violações, mas a todos, inclusive aqueles que têm seus direitos garantidos. O nosso cotidiano está repleto de exemplos: cidadãos negros são quase sempre considerados mais "suspeitos" do que os brancos no caso de roubos.
Para que os direitos sociais sejam estendidos a todas as pessoas, é preciso, em primeiro lugar, que todos já tenham o direito à vida assegurado. Todas as coisas que possuímos, como dinheiro, bens materiais, trabalho, poder e até mesmo nossos direitos, perdem valor quando a nossa vida está ameaçada. Nenhum bem humano é superior à vida, que é o bem maior de qualquer pessoa. Ao valorizar a minha vida e a do outro, estou valorizando a humanidade. Mas, além de garantir a vida, há ainda que se viver com dignidade, o que requer a satisfação das necessidades fundamentais.
Quando estamos diante de uma situação pandêmica, como a COVID-19, certamente passamos pelo enfrentamento de situações que colocam em risco a própria situação do direito ao trabalho, pois precisamos, em alguns casos, reinventar a maneira como o ser social irá desenvolver o seu labor e, não longe disso temos as denominadas condições de trabalho adaptadas, como é o caso do trabalho em casa, mais conhecida como “home office”, oportunidade que demonstra claramente a maneira que a sociedade é obrigada a fazer, independente da sua classe social ressaltando a possibilidade de vermos a sociedade trabalhista sendo, também, obrigada a “abrir mão” de sua comodidade de trabalho.
A OAB foi uma das classes de profissionais nessa onda de COVID-19 que se manifestou através do Dr. Caio Augusto Silva dos Santos - Presidente da OAB SP, Presidente da Seccional do Estado de São Paulo, no site da OAB, senão vejamos:
O exercício da Advocacia e o combate ao novo Coronavírus
Recentemente deu-se origem à Deliberação nº 8 do Comitê Administrativo Extraordinário COVID-19, segundo a qual “I – a medida de quarentena instituída pelo Decreto 64.881/2.020, não se aplica: a) às atividades internas de escritórios de advocacia ou contabilidade, com fechamento do ingresso ao seu interior, ressalvado o acesso dos clientes”.
Naquilo que toca à OAB SP e à CAASP, convém destacar que a mencionada Deliberação nada mais fez do que cumprir com fidedignidade o mandamento constitucional constante do artigo 133 da Constituição Federal.
Ora, como a Advogada e o Advogado são indispensáveis ao funcionamento da Justiça e correspondendo o Poder Judiciário a uma atividade essencial mesmo nos momentos de exceção como o que estamos a enfrentar, nenhum cabimento teria a imposição de restrição de livre trânsito e acesso aos meios necessários ao exercício da Advocacia, dentre os quais estão os escritórios com os equipamentos e documentos que neles se encontram.
Não se quer com isso dizer que a Advocacia esteja liberta do cumprimento das medidas médico-sanitárias determinadas pelas autoridades no combate à malfadada pandemia do Coronavírus. Muito pelo contrário, esta Secional já se manifestou no sentido de que todos devem conduzir suas ações preservando o isolamento social e praticando os hábitos de higienização recomendados.
O Sistema OAB e a Advocacia devem adotar providências imediatas e o quanto possíveis para a execução das suas indispensáveis atividades por meio de trabalho remoto, tudo como forma de preservar a saúde de todos, mas obviamente sem desconsiderar, por exemplo, que a Advogada e o Advogado precisam entrevistar-se com seus clientes e dirigir-se às autoridades, praticando diligências e tendo acesso a documentos para à proteção dos cidadãos que representam. Alguém questiona a essencialidade da Advocacia para cuidar, dentre tantas outras, de postulações em favor de alimentos, de tratamentos médicos, da preservação de liberdades e do acesso a benefícios previdenciários? É evidente que não.
Não se tem dúvida de que os escritórios que possuem muitos profissionais da Advocacia em seus quadros devem operar preservando cuidados com a saúde, inclusive com a sensibilidade de compreender que não faz sentido algum impor jornada presencial quando é possível a prática de home office, notadamente nesse momento onde todos estão a destinar atenção redobrada a familiares e dependentes que permanecem em isolamento social, com inegável sobrecarga de afazeres e de tensões àqueles que têm idosos e pessoas dos grupos de risco sob suas responsabilidades.
Há quem tem medo de dizer que a Advocacia deve seguir com suas funções, cumprindo sua missão de atividade indispensável à Justiça, e de que as Advogadas e os Advogados não podem ser cerceados nas prerrogativas que lhes habilitam defender os fundamentais direitos de cidadania. Esse, definitivamente, não é o caso OAB SP e da CAASP. E tampouco foi do Governo do Estado de São Paulo quando deu origem à Deliberação nº 8, cônscio que se mostrou ser da necessidade de respeito à Constituição Federal e ao cidadão.
Essa é a razão pela qual oficiamos o Governo do Estado para que com urgência esclareça o seu encaminhamento quando revogou a citada Deliberação 8, o que acreditamos ter ocorrido para a emissão de orientação ainda mais clara e consentânea com o ordenamento constitucional vigente, isto é, de que não se pode impor restrição ao exercício da Advocacia quando rigorosamente cumpridos os cuidados médicos-sanitários exigidos no momento pandêmico.
Por fim, um recado e um pedido. O recado de que a OAB SP e a CAASP sempre estarão ao lado do cidadão – e, por consequência, da Advocacia –, com os braços estendidos aos integrantes dos Poderes Constituídos que defendam o Estado Constitucional Democrático de Direito e os direitos de cidadania, mas sem qualquer subserviência a quem quer que seja. O pedido de união, responsabilidade, serenidade, trabalho e fé em Deus, deixando de lado os embates ideológicos, políticos, partidários e institucionais, para que juntos consigamos preservar a saúde de todos, combatendo com destemor a proliferação da Covid-19 e salvaguardando com coragem a indispensabilidade da Advocacia.
É importante deixar destacado que o trabalho é um direito e um dever de todo cidadão. De certa forma, é pelo trabalho que construímos grande parte dos bens coletivos, sejam eles de origem manual ou intelectual. É um direito fundamental, pois é por meio dele que transformamos a natureza e melhoramos nossa qualidade de vida e a de todas as pessoas. É preciso ressaltar que a remuneração pelo trabalho deveria proporcionar aos trabalhadores e suas famílias a satisfação de suas necessidades fundamentais de alimentação, moradia, saúde, educação, cultura e lazer.
O direito à saúde é um dos direitos fundamentais dos seres humanos; sem ela ninguém consegue viver com "bem estar", nem realizar tudo o que for necessário para ser feliz. Por isso, ele deve ser garantido a todos, independentemente da condição financeira. Ou seja, esse direito não pode ser considerado como um produto comercializável, ao qual somente as pessoas de maior poder aquisitivo têm acesso. Além disso, boas condições de moradia, alimentação e trabalho devem ser consideradas como essenciais para a saúde das pessoas.
Inobstante ao quesito trabalho, quando estamos falando sobre as condições da sociedade frente à educação, também não podemos olvidar outros pontos que também faz com que a população tenha que se reinventar, porém essa nova modalidade de “estudo à distância” não é alcançada por todos, afinal somente as grandes metrópoles e demais cidades conseguem chegar ao mesmo perfil de educação, haja vista que nem todos os cidadãos conseguem ter acesso.
A Constituição Federal afirma que a educação é um direito de todos e um dever do Estado e da família, que visa ao pleno desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania. No entanto, não basta dizer que todos têm o mesmo direito de ir à escola. É preciso que tenham efetivamente a mesma oportunidade, independente das condições econômicas de cada um. Crianças e adolescentes que têm de ser submetidas ao trabalho precoce para contribuir no orçamento familiar, veem as suas oportunidades de acesso à educação tolhidas por conta da situação sócio econômica de suas famílias.
Sobre o direito à educação, o "Estatuto da Criança e do Adolescente" estabelece as seguintes responsabilidades do Estado:
Oferta do Ensino Fundamental, obrigatório e gratuito, e progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade para o Ensino Médio;
Oferta de creche e pré-escola para as crianças de 0 a 6 anos;
Oferta de ensino noturno regular para atender ao adolescente trabalhador;
Atendimento especializado para portadores de necessidades especiais;
Obrigatoriedade dos pais em matricular seus filhos na escola, definindo como direito dos responsáveis participar da definição das propostas educacionais;
Garantia de oferta de ensino de boa qualidade.
Os direitos sociais, apesar de expressos em quase todas as legislações nacionais, não estão totalmente assegurados a todos, além de ainda corrermos o risco de que sejam retirados das constituições. Exemplo disso no Brasil são os direitos trabalhistas, como a estabilidade no emprego, décimo terceiro salário, licença maternidade e férias, entre outros, que podem, de acordo com os interesses econômicos, deixar de ser direitos de uma hora para outra.
Ou seja, direitos não são "dados" historicamente e sim conquistas que resultam de muitas lutas. Ainda hoje, com Constituições modernas e democráticas, é preciso lutar para que sejam efetivamente garantidos na nossa vida cotidiana e, ainda, para que continuem inscritos nas legislações dos diferentes países.
c) DA UNIVERSALIZAÇÃO E POSITIVAÇÃO PELAS DECLARAÇÕES DE DIREITOS
Com a promulgação da DUDH - Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), em razão do período pós segunda guerra, situação que deu margem ao surgimento de correntes que tratam da promoção do DIDH (Direito Internacional dos Direitos Humanos), sendo essas correntes a universalista e a relativista.
Para Humberto Lima de Lucena Filho, a idéia da corrente universalista se debruça na incumbência de desafiar problemas locais ou em escala regional sob a perspectiva da norma, que leva em conta a especificidade de certos direitos, como para elevá-los ao patamar de inerentes, indivisíveis e interdependentes, irrenunciáveis, imprescritíveis e etc.
Não obstante, Norberto Bobbio aponta que a afirmação de direitos do homem se deu em três fases, sendo que a última delas é a universalidade, assinalando em que momento e qual o meio em que se iniciou o processo de universalização.
Somente depois da Declaração Universal é que podemos ter a certeza histórica de que a humanidade - toda a humanidade - partilha alguns valores comuns; e podemos, finalmente, crer na universalidade dos valores, no único sentido em que tal crença é historicamente legítima, ou seja, no sentido em que universal significa não algo dado objetivamente, mas algo subjetivamente acolhido pelo universo dos homens.
Quando a comunidade internacional reconhece a importância da DUDH para o estabelecimento de um mínimo de proteção a todo ser humano, através de cada Estado que a ratificou, este não foi senão o primeiro passo do processo de sua universalização.
Assim, a universalização de direitos é o aspecto mais complexo no que tange à outras questões que são discutidas sobre o tema.
A questão central pulsante diz respeito, dentre outras de menor complexidade, à possibilidade de se estabelecer um padrão mínimo de direitos aplicáveis a uma universalidade de sociedades marcadas por sensíveis diferenças de ordem histórico-cultural, sob a alegação de que é necessária a manutenção de um nível básico de respeito.
É a partir do idealismo da universalização trazido no bojo da DUDH que surge a teoria do relativismo cultural, abrindo um leque para discutir a necessidade da relativização dos direitos humanos em contrapartida das facetas culturais que problematizam a possibilidade de universalização dos direitos humanos.
O florescimento da teoria do relativismo cultural se dá em meio à críticas pelas quais foi exposta a teoria universalista, tendo em vista o questionamento suscitado pela doutrina internacional no sentido de serem ou não os direitos trazidos pela DUDH realmente universais, em razão de os países que votaram e participaram de sua redação serem em maioria, ocidentais.
Desta forma, o raciocínio dos relativistas baseia-se na ideia de que os mandamentos da DUDH não são impostos, não sendo, portanto, obrigatórios, em função do número pequeno de Estados que participaram da elaboração do texto do citado documento.
Em que pesem as considerações que são feitas pela corrente relativista, deixar de se estabelecer um “mínimo ético irredutível”, mesmo que existindo uma imensidade incalculável de culturas no mundo, seria o mesmo que violar direitos humanos pela via da omissão.
Isto porque a importância de entendimentos diversos - seja para agregar valor à corrente universalista, ou mesmo para mostrar pontos em que esta teoria necessita de melhoria - se perfaz na teoria relativista quando se observa que esta permite, de forma direta, a relativização de direitos básicos que, embora já sedimentados no Ocidente, sofrem as consequências da ingerência de uma teoria pouco possível na prática, o que leva a graves violações de direitos que causam incontáveis traumas àqueles que estão desprotegidos pela ordem internacional.
Referências
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BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 18ª Ed. Brasil: Malheiros, 2006.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 6ª Ed. Coimbra: Almedina, 1995.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 20a ed. São Paulo: Saraiva, 1998.
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CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.
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BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico - Lições de Filosofia do Direito, São Paulo, 1996, Ícone Editora.
Fonte: https://larifiori.jusbrasil.com.br/artigos/246179480/a-universalizacao-dos-direitos-humanos-em-face-do-multiculturalismo
Disponível em: https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/bbc/2020/03/14/medidas-governo-brasileiro-coronavirus.htm?cmpid=copiaecola.
Nota
1 SILVA, José Afonso da. Curso Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 1994, p.110.