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O período descontínuo na aposentadoria por idade rural:

uma análise acerca do princípio da igualdade e justiça social

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Agenda 31/05/2020 às 14:22

SEGURADO ESPECIAL E A COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL

O capítulo anterior abordou a inserção do trabalhador rural, como um segurado especial, ao regime da Previdência Social, observando os aspectos históricos e evolutivos que proporcionaram tal feito. Foi observado que o trabalhador rural é beneficiado com particularidades que distinguem os critérios exigidos para a concessão dos benefícios previdenciários entre eles e os trabalhadores formais, sendo exemplo dessa distinção o modo de contribuição e a idade mínima para gozo da aposentadoria por idade. Assim, faz-se necessário tecer aqui o conceito, características e os meios de comprovar o exercício da atividade rural pelo segurado especial.

Conceito e características do Segurado Especial

Em termos legais, a CF/88, em seu art. 195, § 8º considera como sendo Segurado Especial o produtor, parceiro, meeiro, o arrendatário rural e o pescador artesanal, bem como os seus respectivos cônjuges, classificando-os como segurados obrigatórios da Previdência Social. Uma vez apresentados os indivíduos que compõem tal classe, o dispositivo legal traz a exigência de que tais segurados exerçam a atividade rural sob regime de subsistência, isto é, como atividade principal.

Após o seu surgimento, a lei 8.213/91, que dispõe sobre os planos de benefícios da previdência social, passou por inúmeras reformas, uma delas foi a lei 11.718 de junho de 2008, que trouxe uma implementação ao texto da lei de benefícios objetivando delimitar a classificação do Segurado Especial. Como exemplo de limitação apresentada pela lei modificadora, tem-se a exigência de que se considera segurado especial o indivíduo que exerce o labor rural em propriedade de até 4 (quatro) módulos fiscais, extrapolando tal limite o trabalhador rural deve ser qualificado como contribuinte individual.

Além da limitação espacial, a lei modificadora também trouxe a possibilidade de afastamento do rurícola, sem que este perca a qualidade de segurado especial, por até 120 (cento e vinte) dias no ano, ou seja, a lei abre margem para que estes indivíduos possam exercer uma atividade diversa da atividade rural, como um trabalho formal, até o limite de cento e vinte dias no intervalo de um ano, considerando que ocorrendo a ultrapassagem desse limite a qualidade de segurado especial é desconsiderada.

Tais definições apresentadas pela Lei 11.718 de junho de 2008, conforme apresentadas acima, tiveram significativo avanço no sentido de evitar as arbitrariedades praticadas pelo ente administrativo e judiciário durante a concessão dos benefícios.  Pelo entendimento de Boone & Pierozan (2014) a caracterização do segurado especial foi um avanço primordial “resolvendo questões que geravam conflitos nas demandas previdenciárias, tanto no aspecto da jurisprudência como na doutrina.” (p. 133)

Fala-se na existência de conflitos pelo fato de que, anteriormente à regulamentação dos requisitos que qualificam o segurado especial, havia a possibilidade de os órgãos administrativos e o próprio judiciário julgar os casos que lhes eram apresentados conforme entendimento subjetivo. Pode-se considerar que, com advento da lei regulamentadora que instituiu uma exigência erga omnes[9], em relação à sua aplicação, surge a possibilidade de afastar a discricionariedade no estudo de cada caso concreto referente às concessões de benefícios previdenciários.

Frente ao problema da completude, se desejarmos um certo tipo de ordenamento jurídico como o italiano, caracterizado pelo princípio de que o juiz deve julgar cada caso mediante uma norma pertencente ao sistema, a completude é algo mais que uma exigência, é uma necessidade, quer dizer, é uma condição necessária para o funcionamento do sistema (BOBBIO, 1995, p.117)  

Percebe-se, pois, que o complemento legislativo de normas esparsas condiz com a possibilidade de melhor aplicação da lei, visto que a norma incompleta é, teoricamente, impossível de ser aplicada. Tal suposição condiz com a necessidade de completude que deve existir na lei, retirando obscuridades que possibilitem entendimento diverso que possa gerar arbitrariedades por parte dos seus executores.

A conceituação do Segurado Especial ainda é vista com ressalvas pelo fato de ser um tema relativamente novo e recheado de polêmicas envolvendo o ente administrativo e o judiciário. Por se tratar de um trabalhador informal, as provas que evidenciam o exercício do labor desses indivíduos são escassas, sendo este um problema que pode comprometer a concessão dos benefícios previdenciários pretendidos. Uma das diferenças fundamentais entre o trabalhador formal e o Segurado Especial/trabalha (dor) rural diz respeito ao direito que este possui de obter os benefícios previdenciários sem a necessidade de contribuir com a previdência[10].

Neste sentido, observa-se acerca do Segurado Especial:

O conceito de segurado especial apresenta uma complexidade, por ser um tema polêmico na via administrativa e também na via judiciária. Isso se apresenta, especialmente, pelo fato de o segurado especial ter a característica diferenciada dos demais segurados: ele possui acesso ao benefício previdenciário, mesmo que não tenha contribuído de forma direta. (LIMA, 2016, p. 31)

Ressalta-se que as características previdenciárias atribuídas aos Segurados Especiais são diferenciadas daquelas conferidas aos demais segurados, pois, para eles, o acesso aos benefícios independente de contribuição junto à previdência, sendo esta a característica marcante que difere o segurado especial dos demais. Portanto, não é um tema fácil de ser abordado, mesmo que possua uma definição legal apresentada pela Lei 8.213/91.

Destaca-se que a alteração mais profunda na legislação, e que significa um novo aspecto sobre a agricultura familiar e o seu papel econômico e social, veio através da Lei 11.718/2008, que deu nova redação, dentre outros dispositivos, ao art. 11, inc. VII, da Lei 8.213/1991. O referido inciso considera como segurado especial a pessoa física que reside em imóvel rural ou mesmo em aglomerado urbano ou rural próximo a ele, podendo ser de maneira individual ou em regime de economia familiar. Assim, observa-se que o exercício do labor rural na condição de Segurado Especial não deve ser, obrigatoriamente, realizado pela família.

Segundo Ávila (2016) é fundamental compreender que, para ser segurado especial, o indivíduo não precisa constituir família, já que pode trabalhar sozinho, conforme está expresso claramente no inciso VII do art. 11 (...). Assim, é possível compreender que o termo “individualmente” deixa explicito que não necessariamente o sujeito precisa constituir família para ser qualificado como um segurado especial, podendo exercer o seu labor rural de forma individual e sem auxílio de terceiros. 

A partir dessas definições, depreende-se que a subsistência está relacionada, essencialmente, ao sustento, à sobrevivência, ao alimento. No entanto, não se pode pressupor, a partir disso, que a agricultura exercida em regime de economia familiar seja sinônimo de agricultura exclusiva para consumo. Isso porque o segurado especial é um contribuinte, e a Constituição, no artigo 195, §8º, bem como a Lei de Custeio, no artigo 25 e seus incisos e parágrafos, preveem que a contribuição desse segurado incide sobre a comercialização da produção, o que faz presumir a existência de produção excedente. Logo, não há amparo legal para se excluir do conceito de segurado especial o agricultor que comercializa o excesso da produção. (RIBEIRO, 2014, p. 27)

Através da análise do texto, é possível perceber que não necessariamente o trabalho no campo deve ter como único fim a subsistência, o sustento e a sobrevivência do trabalhador e daqueles que dele necessitam, levando a crer que não se deve pressupor que a agricultura em regime de economia familiar seja exclusiva para o consumo, considerando o fato de que o Segurado Especial é um segurado obrigatório, que pode vir a contribuir com a previdência através da comercialização do excesso da sua produção.

É necessário compreender que o segurado especial é um contribuinte, sendo que a contribuição do mesmo se dá por meio da comercialização de sua produção. O inciso I da Lei de Custeio, art. 25, dispõe que em caso de comercialização a contribuição se dá por meio de 1,2% (um inteiro e dois décimos por cento) da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção.

Goes (2015) relata que o contexto do regime de economia familiar se dá por meio de atividade em que o trabalho dos componentes da família é imprescindível para a “própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem utilização de empregados permanentes.” (p. 98)

É importante observar que o sentido conceitual de Segurado Especial é utilizado por alguns doutrinadores por meio de diversos termos, sendo ampla a quantidade de termos que podem ser utilizados a fim de que não haja dúvida acerca de quem se enquadra nesta categoria. Escl   arece acerca desses termos utilizados para definir o segurado especial:

É possível perceber que são utilizados vários termos para se referir à atividade prestada no meio rural e para que este fato não gere dúvidas, observa-se que o art. 12, inciso VII, nº 1 da Lei 11.718/08 faz referência à exploração de atividade agropecuária pelo segurado especial. (...) esclarece que o termo “agropecuária” se equivale ao termo “rurais”, ou seja, a produção rural vem a ser agropecuária, englobando a atividade agrícola (produção vegetal) e pecuária (produção animal). (ÁVILA, 2017, p. 40)

Ressalta-se que o trabalhador rural é um segurado especial que pode exercer sua função em atividades agropecuárias, sendo as tais compreendidas como agrícolas, por meio da produção vegetal, a pecuária, e a produção animal, todas enquadradas no rol de definição de atividades rurais que qualificam o trabalhador rural como segurado especial.

“Uma das principais características desta categoria é que esta classe de trabalhadores labora de forma autossustentável, em regime de economia familiar, realizando pequena produção com a qual mantém a sua subsistência.” (ÁVILA, 2016, p. 28). Nesse sentido, é possível observar que o trabalhador agrícola não possui um vínculo empregatício formal, tampouco a confiança de sucesso auferido do seu labor, sendo dependente daquilo que produz para subsistência própria e da família.

Faz-se Importante ressaltar que o segurado especial é a única classe de segurado que tem seu conceito delimitado na CF/88, podendo ser considerado que tal finalidade possui o condão de propiciar a tal classe trabalhadora uma maior segurança jurídica, retirando a chance de o legislador ordinário instituir um tratamento desigual em relação aos trabalhadores formais.

Continuamente com a finalidade de caracterizar o segurado especial, Goes (2015) traz:

Para efeito da caracterização do segurado especial, entende-se por: I. Proprietário – aquele que tem a faculdade de usar, gozar e dispor do imóvel rural, e o direito de reavê-lo do poder de quem quer que injustamente o possua ou detenha. (CC, art. 1.128). II. Usufrutuário – aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural, tem direito à posse, ao uso, à administração ou à percepção dos frutos, podendo usufruir o bem em pessoa ou mediante contrato de arrendamento, comodato, parceria ou meação. III. Possuidor – aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade de imóvel rural (CC, art. 1.196). E, assim, aquele que possui o imóvel rural como seu, não em nome de outrem. IV. Assentado – é o beneficiário do programa de reforma agrária. V. Parceiro outorgado – aquele que tem contrato, escrito ou verbal, de parceria como proprietário da terra ou detentor da posse e desenvolve atividade agrícola, pastoril ou hortifrutigranjeira, partilhando lucros ou prejuízos. VI. Meeiro outorgado – aquele que tem contrato, escrito ou verbal, com o proprietário da terra ou detentor de posse e da mesma forma exerce atividade agrícola, pastoril ou hortifrutigranjeira, partilhando rendimento ou custos. (p. 99-100)

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É possível observar, portanto, que a caracterização para o devido enquadramento legal na condição de segurado especial carece de alguns requisitos formais que guarnecem a comprovação de que o sujeito está inserido no meio rural e que faz jus, desta forma, aos benefícios previdenciários destinados aos Segurados Especiais, dentre os quais a aposentadoria por idade rural.

Entre as provas rurais que podem ser apresentadas como comprovação do exercício laboral do rurícola, destacam-se documentos que demonstrem a condição de proprietário de imóvel rural, auferindo o seu sustento da terra; usufrutuário, que não é dono legalmente do imóvel, mas faz uso do imóvel mediante arrendamento, comodato, dentre outros.

Atentando-se aos conceitos e características dadas ao Segurado Especial, pode-se dizer que tal grupo corresponde ao trabalhador rural em suas mais variadas funções no labor agrícola, isto é, o trabalhador rural que exerce a sua atividade, em terra com área não superior a quatro módulos fiscais, em regime de economia familiar, sem vínculo empregatício e possuindo o trabalho agrícola como atividade principal, qualifica-se como Segurado Especial, sendo detentor, na questão previdenciária, dos mesmos benefícios assegurados aos trabalhadores formais.

Berwanger (2018) afirma que o conceito de segurado especial passou por evoluções que objetivaram promover cada vez mais a inclusão desta categoria a um contexto social atual, atendendo à nova realidade, como também, a uma releitura do meio rural. Destaca-se ainda que essas modificações sofridas na legislação visam atender “a nova realidade e a uma releitura do meio rural, especialmente considerando a importância da agricultura familiar para a produção de alimentos e, consequentemente, para a segurança alimentar.” (p. 113)

O segurado especial, resumidamente, pode ser caracterizado como pessoa maior de 16 anos de idade que trabalha em imóvel rural ou aglomerado próximo a ele, individualmente ou em regime de economia familiar, podendo haver eventual auxílio de terceiro a título de colaboração mútua, nas condições das alíneas do inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991. (BOONE & PIEROZAN, 2014, p. 136)

É possível visualizar que o segurado especial pode ser qualquer pessoa com idade superior a 16 anos que trabalhe em imóvel rural ou mesmo aglomerado próximo a ele, ressaltando, ainda, que pode haver, de maneira eventual, a ajuda de outrem, desde que respeitadas às condições dispostas nas alíneas do inciso VII do art. 11.

Da contribuição previdenciária do rurícola

Conforme observado anteriormente, o trabalhador rural se configura como um segurado obrigatório da previdência social e, como tal, deve prestar a devida contribuição junto à previdência. Acontece que a contribuição do Segurado Especial incide sobre a comercialização do excedente produzido. Desta forma, quando o segurado realiza a agricultora de subsistência, produzindo somente para o consumo familiar, não há que se falar em excedente e tampouco comercialização da produção. Assim, é possível extrair a noção de proteção conferida ao Segurado Especial pelo fato de que este pode ser dispensado da obrigação contributiva.

Nesse sentido, a ideia de proteger o segurado especial possui um condão de garantir o cumprimento constitucional das garantias mínimas que devem ser asseguradas ao trabalhador, visto que o trabalho do rurícola em muito se distancia do trabalho formal, onde é possível despedir esforços em prol de uma remuneração certa e determinada.

Por sua vez, o trabalhador rural sobrevive dos frutos da terra e, portanto, depende de fatores climáticos como chuva, sol, frio, calor, para auferir uma boa produção agrícola. Por tais fatos, é possível observar que tal exercício laborativo carece de proteção especial em relação à contribuição previdenciária, uma vez que não há recebimento de valores pela contraprestação de serviço prestado, sendo que na maioria dos casos o trabalho é exercido unicamente para subsistência.  Vale retomar que:

O segurado especial recebe essa denominação em razão de ter tratamento favorecido em relação aos demais segurados: (a) enquanto os outros segurados pagam suas contribuições previdenciárias incidentes sobre seus salários de contribuição, o segurado especial contribui com uma alíquota reduzida (2,1%) incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção; (b) para os demais segurados terem direito aos benefícios previdenciários, é necessário cumprir a carência, que corresponde a um número mínimo de contribuições mensais, para o segurado especial, a carência não é contada em número de contribuições, mas em número de meses de efetivo exercício de atividade rural ou pesqueira, ainda que de forma descontínua. (GOES, 2015, p. 97)

Assim, pode-se observar a existência de uma significativa diferenciação entre a forma contributiva do trabalhador forma e do segurado especial, considerando que enquanto aquele contribui de acordo com seus proventos derivados do trabalho formal, o segurado especial presta a sua contribuição pagando uma porcentagem sobre os produtos rurais, frutos do seu labor, que porventura venha a comercializar, sendo esta uma alíquota reduzida de (2.1%) que está inserida em contexto de comercialização de sua produção.

Como o enunciado legal deixa claro que a contribuição do segurado especial somente será devida mediante uma alíquota fixa sobre aquilo que o segurado vier a comercializar, pode ser constatado que o fato de não existir excedentes para comercialização gere a desincubência do ônus de contribuir, sendo que, ainda assim, haverá a qualidade de segurado inerente ao trabalhador rural.

Dando ênfase ao tratamento diferenciado dado ao segurado especial e ainda observando quesitos como a aplicação da justiça ou da igualdade social, temos a seguinte colocação de Bobbio (1997) que discorre acerca das justiças comutativo e distributiva:

A esfera de aplicação da justiça, ou da igualdade social e politicamente relevante, é a das relações sociais, ou dos indivíduos ou grupos entre si, ou dos indivíduos com o grupo (e vice-versa), segundo a distinção tradicional, que remonta à Aristóteles, entre justiça comutativa (que tem lugar nas relações entre as partes) e justiça distributiva (que tem lugar nas relações entre o todo e as partes, ou vice-versa). Mais especificamente, as situações nas quais é relevante que exista ou não igualdade são sobretudo duas: a) aquela na qual estamos diante de uma ação de dar (ou fazer), da qual se deva estabelecer a correspondência anterior com um ter ou posterior com um receber, de onde resulta a sequência ter-dar-receber-ter; b) aquela qual nos encontramos diante do problema de atribuir vantagens ou desvantagens, benefícios ou ônus, direitos ou deveres (em termos jurídicos), a uma pluralidade de indivíduos pertencentes a uma determinada categoria. (BOBBIO, 1997, p. 16-17)

A presente explanação acerca do princípio da igualdade é apresentada através de um viés dualista.  Bobbio (1997) afirma o quanto este princípio é fundamental para as relações sociais e relaciona a igualdade e justiça como institutos uníssonos, apresentando dois tipos de justiça: a comutativa, que está presente nas relações entre as partes e a distributiva, que tem lugar entre o todo e as partes.

Esses dois tipos de justiça apontados pelo autor são relevantes em contextos em que se observa que existe ou não igualdade, sendo possível destrinchar, nesse conjunto, dois momentos distintos, quais sejam: ter-dar-receber-ter[11], ou seja, para o trabalhador contribuinte há a sequência ter (relação de trabalho), dar (contribuição à previdência), receber (momento de impossibilidade laborativa em que recebe o benefício) e a partir do receber é possível observar que se volta ao ter.

No segundo momento apontado por Bobbio (1997) há a problematização em relação à atribuição de vantagens e/ou desvantagens, benefícios ou ônus, direitos ou deveres. Entende-se que as Leis versam por igualar os desiguais, portanto, por todas as características já mencionadas no decorrer do trabalho, é possível compreender que a lei que vislumbra o atendimento ao Segurado Especial, diferenciando a forma de contribuição deste aos demais segurados, visa oferecer a esse o acesso aos benefícios previdenciários, igualando-o em direitos ao trabalhador formal.

Berwanger (2015) afirma que “a Lei 8.213/1991 prevê que a contribuição do produtor rural deve incidir sobre a “receita bruta proveniente da comercialização da sua produção.” Assim, o fato gerador é a comercialização da produção.” (p. 61). Portanto, entende-se que a contribuição do segurado especial se dá por meio da comercialização, não bastando unicamente à produção para fins de consumo.

É importante ressaltar que essa maneira de contribuição não se trata de isenção de recolhimento, mas sim de, a partir da observação da necessidade, possibilitar o acesso aos benefícios por meio de uma contribuição justa, compatível com os fatores que envolvem o segurado especial, tornando a contribuição mais acessível à classe.

Vale apontar que Bobbio (1995) afirma que “a Ciência do Direito precisa estabelecer novos e chegados contatos com as Ciências Sociais, superando-se a formação jurídica deparmentalizada, com sua organização” (p. 18).  Sendo assim, é importante que o direito compreenda e busque melhorar aspectos que viabilizem o bem social em seu contexto atual, considerando o dinamismo do direito e a necessidade de enquadramento aos novos acontecimentos que se fazem presentes quando surge uma norma tipificadora de condutas humanas.

Diante dessa lógica, pode-se apresentar a questão da contribuição do segurado especial, a qual carece de um reconhecimento evolutivo do direito, pois é necessário ponderar as inúmeras dificuldades que se apresentam a tais trabalhadores, como os impactos ambientais causados pelo homem e que refletem diretamente no mecanismo de produção rural. Assim, tem-se que a relação que deve existir entre o direito e o contexto social atual visa proteger os indivíduos que estão em iminência de terem seus direitos fundamentais transgredidos.

Nunca é demais lembrar que o legislador, ao prever a contribuição do segurado especial sobre a comercialização desses produtos, o fez porque previu excedente. Não há previsão legal de contribuição sobre a produção (simplesmente), mas sobre a produção comercializada. Por obvio, o segurado somente vende o que não consumiu, ou seja, a venda de produtos é permitida, porque é sobre ela que vai incidir a contribuição. Dessa forma, crer que o segurado especial esteja submetido a uma economia de subsistência é contraditório à expectativa de que ele tenha contribuições. (BERWANGER, 2015, p. 52)

Salienta-se que a contribuição do segurado especial, baseada sobre sua produção, ocorre por interpretação do legislador de que a comercialização do produto se opera a partir do que é excesso para o consumo, portanto a contribuição do trabalhador rural está interligada à comercialização do seu produto. Vale ressaltar que, partindo-se do entendimento de que apenas o que não é consumido pelo rurícola pode ser comercializado por ele, é inviável impor ao trabalhador rural a exigência de contribuição pelos mesmos modos que ocorrem com o trabalhador formal.

Destaca-se que de acordo com o art. 25 incisos I e II a contribuição do trabalhador rural se dá por meio de 2% da receita bruta, levando-se em consideração a comercialização do produto e de um décimo por cento da receita bruta em cima do produto comercializado para fins de complementação das prestações por acidente de trabalho, totalizando 2,1% de contribuição do trabalhador rural.

Na atividade rural, é bastante comum a venda de produtos em feiras, diretamente para o consumidor. Com isso, o próprio produtor-vendedor é quem faz o recolhimento das contribuições, para isso, ele deve se cadastrar no Cadastro Específico do INSS – CEI e somar a produção comercializada do mês e fazer o recolhimento da contribuição previdenciária. (LIMA, 2016, p. 41-42)

A colocação de Lima (2016) é primordial no tocante à forma de constatação da contribuição do trabalhador rural, uma vez que demonstra a possibilidade do segurado especial produzir e vender diretamente ao consumidor final a sua produção. Sendo assim, é importante que este faça seu cadastro junto ao Cadastro Específico do INSS (CEI), onde mensalmente o produtor deverá somar o que foi comercializado no decorrer do mês e efetuar o devido recolhimento.

Valadares & Galiza (2016) afirmam que a lógica que vincula a concessão de benefício à capacidade contributiva tem por aspecto a presunção do assalariamento formal e a estabilidade no emprego, desse modo, não convenciona efetivamente a realidade do trabalhador rural que, por sua vez, é caracterizada pela “sazonalidade dos rendimentos, pelo trabalho a prazo determinado e pelo predomínio de modalidades não assalariadas de ocupação, sobretudo no âmbito da agricultura familiar(...). ” (p. 8)

Nessa lógica, é possível observar o disposto no Art. 25 da Lei de Custeio, no que se refere à contribuição do Segurado Especial, vejamos:

A contribuição do empregador rural pessoa física, em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22, e a do segurado especial, referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta Lei, destinada à Seguridade Social, é de:

I - 1,2% (um inteiro e dois décimos por cento) da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção; 

II - 0,1% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para financiamento das prestações por acidente do trabalho.

§ 1º O segurado especial de que trata este artigo, além da contribuição obrigatória referida no caput, poderá contribuir, facultativamente, na forma do art. 21 desta Lei.

Compreende-se, portanto, que a maneira estabelecida para a contribuição do Segurado Especial difere em muitos aspectos da que é exigida para o trabalhador formal, considerando que a incidência da alíquota de contribuição depende diretamente do quantum[12] fora comercializado pelo segurado. Outrossim, não havendo a contribuição, nada obsta a qualidade de Segurado Especial do indivíduo, pois, para ser beneficiário da previdência social, esta espécie de trabalhadores é dispensada da exigência contributiva que impera sobre o trabalhador formal.

Comprovação da atividade rural e previsão legislativa

É necessário tecer, ainda, acerca dos mecanismos de comprovação do exercício da atividade rural, apontando as provas exigidas pela lei e observando os fatores que dificultam tal comprovação. Atualmente, inexiste um cadastro que possa comprovar o exercício da atividade rural pelos rurícolas, tampouco há consenso taxativo quanto às provas que devem constituir o requerimento administrativo ou judicial dos benefícios previdenciários prestados a tais grupos de trabalhadores.

Com base nesse contexto, pode ser entendido que se impera uma verdadeira discricionariedade dos entes administrativos e judiciais na consecução do pedido de benefícios previdenciários aos segurados especiais, uma vez que inexistem fatores legais que assegurem um entendimento lógico-jurídico acerca da comprovação do exercício do labor rural pelo tempo determinado na lei.

Assim, considerando a ausência legal de mecanismo que guarneça o mínimo probatório suficiente para acarretar na concessão dos benefícios inerentes aos trabalhadores rurais, frisando-se que o trabalhador rural pode ser um segurado especial, pode-se constatar que o recebimento de um benefício previdenciário fica ao bel prazer do ente político que recebe a solicitação, gerando, destarte, injustiça social em relação aos julgados desiguais que porventura surgirão.

Nesse raciocínio, Valadares & Galiza (2016) discorrem que através da “inexistência de um cadastro que comprove a atividade rural, os trabalhadores em regime de economia familiar se mantêm sujeitos à discricionariedade dos operadores da política no processo de reconhecimento de seus direitos.” (p. 19).

Como já explanado, sabendo que não existe um cadastro que tenha por finalidade comprovar o labor rural, a comprovação se dá por meios diversificados, como a apresentação de documentos das terras onde se dá o labor rural, contratos de comodato, arrendamento, atividade como meeiro, e, também, pela comprovação efetiva do exercício, admitindo-se, inclusive, a prova testemunhal. Vale salientar:

Além disso, ao estabelecer que o benefício previdenciário cubra o risco de perda de renda em virtude da perda da capacidade laboral, a Constituição enfatizou que o direito à proteção previdenciária decorre, antes de tudo, do trabalho, isto é, da comprovação, pelo trabalhador, do exercício de certa atividade produtiva por determinado tempo. Esse primado do trabalho confere às aposentadorias rurais o caráter de benefícios previdenciários e as distingue dos benefícios assistenciais, cujo critério de concessão é o estado de necessidade. Além disso, o valor da contribuição previdenciária ou a capacidade contributiva de um trabalhador é apenas o critério que define o valor de seu benefício de aposentadoria: o critério constitucional que determina o direito à aposentadora é o trabalho, cuja comprovação se dá, para cada categoria, segundo regulação específica. (VALADARES & GALIZA, 2016, p. 16)

O direito de acesso aos benefícios previdenciários faz parte de uma observação da necessidade de proteger o indivíduo quando este, porventura, venha a se encontrar incapacitado para exercer suas atividades laborativas diante do acometimento de doença ou pela idade. Assim, a previdência funciona como uma segurança social que garante a plena sobrevivência pessoal e familiar, mesmo diante de uma incapacidade laborativa, pela idade avançada ou pela morte do segurado.

 Por conseguinte, para a consecução dos benefícios previdenciários, faz-se necessário o cumprimento dos períodos de carência exigidos pela lei, isto é, o segurado deve demonstrar que exerceu determinada atividade pelo tempo requerido pela lei para a concessão do benefício em questão.  

Em relação aos segurados especiais, no tocante ao período de carência, por não haver um cadastro que identifique o sujeito como trabalhador rural para fins de aposentadoria, é constatado que esta subsiste mediante a comprovação do exercício do labor rural em número de meses determinados. Como exemplo, é possível apontar a exigência de um período de 180 (cento e oitenta) meses para a concessão da aposentadoria por idade do segurado especial, conforme disposição do Art. 25, II, da Lei de Benefícios.

Faz-se necessário destacar que não há relação entre os benefícios assegurados aos trabalhadores rurais, por serem estes segurados especiais, e aqueles referentes aos planos assistenciais da previdência social. A assistência social possui o fito de atender às demandas dos deficientes e idosos reconhecidamente pobres, que vivem em condições de miséria e não possuem nenhuma ajuda da família, dependendo unicamente da assistência do estado para sobreviver.

O segurado especial, por sua vez, é compreendido como um segurado obrigatório, gozando de todos os direitos inerentes aos trabalhadores formais, como assegura a CF/88 e, portanto, não necessitam comprovar ou alegar a existência de insuficiência financeira para que seja garantida a concessão dos seus benefícios previdenciários.         

No Direito Previdenciário, a prova começa a ser produzida no âmbito administrativo. A Lei nº 9.784/99 regula a instrução do processo administrativo e, para isso, também deve observar todos os princípios da Administração Pública para que exista uma forma justa de produção de provas, sejam eles o da Legalidade, Finalidade, Razoabilidade, Motivação, entre outros. (LIMA, 2016, p. 44)

A Lei 9.784/99 é responsável por estabelecer normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, dispondo-se, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração. Sendo assim, como coloca Lima (2016) é no contexto administrativo que se inicia o processo de produção de provas para o Direito Previdenciário.

Frise-se que para se ter a produção de provas ocorrendo de maneira justa, faz-se uso dos princípios que norteiam o ordenamento jurídico da previdência social. Ressalta-se que há a exigência da congruência das leis aos princípios que resguardam direitos e deveres, assegurando a justiça. Assim, no contexto de produção de provas, devem ser observados os princípios da Legalidade, Finalidade, Razoabilidade, Motivação, dentre outros.

Tendo como ênfase a comprovação do trabalhador rural para fins de aposentadoria, ressalta-se a Lei 11.718/08 que “ampliou o rol de documentos para comprovação da atividade rural que são arrolados no art. 106, da Lei nº 8.213/91.” (LIMA, 2016, p. 47)

Sobre a comprovação do trabalhador rural o art. 106 da Lei 11.718/08 delimita:

“Art. 106.  A comprovação do exercício de atividade rural será feita, alternativamente, por meio de: 

I – Contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social; 

II – Contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural; 

III – declaração fundamentada de sindicato que represente o trabalhador rural ou, quando for o caso, de sindicato ou colônia de pescadores, desde que homologada pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS; 

IV – comprovante de cadastro do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar; 

V – bloco de notas do produtor rural; 

VI – notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata o § 7o do art. 30 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, emitidas pela empresa adquirente da produção, com indicação do nome do segurado como vendedor; 

VII – documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola, entreposto de pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante; 

VIII – comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da comercialização da produção; 

IX – cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da comercialização de produção rural; ou 

X – licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra.” (NR) (PLANALTO, 2010)

Os incisos do art. 106 expõem que o trabalhador rural deve apresentar, para fins de comprovação de atividade rural, contratos de trabalho individual ou carteira de trabalho, arrendamento ou comodato rural, declaração de sindicato que represente o trabalhador rural, dentre outros mencionados no decorrer do artigo citado.

Quanto aos documentos expostos como necessários para apresentação, com a finalidade de comprovar o labor rural, salienta-se que o STJ os entende apenas como exemplificativos e não como taxativos. O STJ já se revelou pela aceitação, “a título de início de prova material, de documentos relativos à qualificação do então marido da autora, mesmo diante da separação ou do divórcio do casal, quando as informações contidas na documentação foram confirmadas pela prova testemunhal.” (GOES, 2015, P. 107)

Ressalta-se que a colocação de Goes (2015) está direcionada aos documentos que devem ser apresentados referentes ao parceiro(a)/cônjuge do requerente à aposentadoria qualificado como lavrador. Assim, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) aceita, com a finalidade de comprovação, como prova material dos documentos relativos ao marido, mesmo que haja separação ou divórcio do casal. Entretanto, é importante mencionar que, além dos documentos necessários, as informações devem ser confirmadas por prova testemunhal.

“Ainda é necessário salientar que a prova testemunhal é de grande relevância para firmar o convencimento do órgão gestor. No entanto, a prova exclusivamente testemunhal não é aceita como meio de comprovação da atividade rural.” (LIMA, 2016, p. 53). Portanto, as provas materiais e a prova testemunhal trabalham para complementar-se e não de maneira exclusiva.

Não obstante, quando surgem controvérsias relativas à residência do segurado, em processos judiciais, observa-se que, frequentemente, a importância desse aspecto é minorada, priorizando-se a comprovação do efetivo exercício de atividade agrícola, em detrimento do local em que o segurado reside, a não ser que se verifique, no caso concreto, que a distância entre a residência e o local de trabalho são incompatíveis com deslocamentos frequentes. (RIBEIRO, 2014, p. 26)

Como dito em parágrafo anterior, é necessário que sejam apresentados os documentos elencados no art. 106, como também a prova testemunhal, para fins de comprovação da atividade rural. Nesse ínterim, é imprescindível que, na avaliação dos documentos, sejam observadas questões referentes à distância entre a residência e o local de trabalho, uma vez que pode haver controvérsias quanto a esse aspecto.

Ávila (2016) aponta que o critério de morar em residência rural ou em aglomerado urbano que fique situado próximo ao segurado é crucial para se comprovar o exercício da atividade rural, “tendo em vista que, se o segurado reside distante da propriedade em que alega laborar, fica difícil crer que o trabalho se dá de forma habitual.” (p. 41)

(...) por outro lado, instrui que a prova da atividade rural deve ser apreciada levando-se em conta a informalidade que prevalece no trabalho rural, sob a pena de inviabilizar-se o direito material. Dito de outra forma, se o direito garantido pela Constituição não tem encontrado plena efetivação na esfera administrativa, é preciso considerar que a questão central reside, antes, em aperfeiçoar o processo relativo à concessão das aposentadorias aos segurados especiais – reduzindo sua margem de discricionariedade -, que em rever os critérios de acesso são definidos pela legislação previdenciária. (VALADARES & GALIZA, 2016, p. 18 -19)

É importante ressaltar a informalidade do trabalho rural, exigindo-se que as provas devem ser apreciadas considerando tal fato. A Constituição garante ao Segurado Especial o direito à aposentadoria, entretanto há critérios de acesso que são definidos pela legislação previdenciária, como a caracterização desta categoria e a forma de comprovação de que se enquadra como Segurado Especial. Tais fatores, quando presentes em lei taxativa, podem diminuir a discricionariedade durante a apreciação dos requerimentos, seja administrativamente ou na via judicial, uma vez que a lei ainda possui obscuridade no tratamento destinado ao Segurado Especial.

Fala-se em obscuridades na lei de benefícios à medida que ela não consegue incorporar toda a tipificação que possibilite uma aplicação igual para todos, zelando pelo princípio da equidade e eliminando qualquer possibilidade de julgamento arbitrário por parte do estado. Podemos apontar como exemplo de obscuridade a ausência de posicionamento fixo em relação ao período descontínuo do labor rural, o qual será abordado de maneira mais aprofundada em capítulo posterior.

Berwanger (2015) retrata o art. 48, em seu parágrafo 2º, dispondo que o trabalhador rural deve comprovar o exercício da atividade rural:

De todos os dispositivos transcritos, pode-se constatar que a lei exige comprovação de efetivo exercício da atividade rural. Não se exige prova de contribuição, tampouco de venda de produção. Não se quer dizer que não há previsão legal para a contribuição, podendo, inclusive, o segurado ser autuado pela Receita Federal caso não recolha as contribuições, quando essa obrigação for dele. (BERWANGER, 2015, p. 66)

Demonstra-se que a lei exige a comprovação do exercício rural a partir de documentos referentes à moradia e o local do labor. Assim, é possível compreender que tais mecanismos são utilizados como comprovantes laborativos do trabalhador informal, com o objetivo de qualificar tal indivíduo como um Segurado Especial. Desse modo, a preocupação não está voltada à comprovação de contribuição, mas sim à comprovação da atividade rural em si.

As exigências de demonstração do exercício laborativo rural, pelo Segurado Especial, ainda não possui um requisito concreto que defina a qualidade de segurado desses indivíduos. Assim, mesmo cumprindo as exigências da lei e apresentando os documentos necessários à comprovação da atividade rural, o trabalhador rural pode não ser atendido em sua solicitação pelo benefício pretendido. Vejamos:         

Embora as normas que versam sobre o assunto relacionem uma série de documentos para comprovar a atividade rural, é preciso ressaltar que nenhum deles é considerado suficiente para confirmar que o solicitante tenha, de fato, trabalhado na condição de segurado especial. Os documentos apresentados pelo demandante são, em geral, encarados pelo INSS como indícios de prova, e por isso precisam ser complementados pela entrevista do potencial segurado e por oitiva de testemunhas. (...). Essa subjetividade no processo de reconhecimento do direito tem gerado insegurança na concessão do benefício previdenciário ao segurado especial, o que se manifesta no elevado número de aposentadorias concedidas via judicial: nos últimos anos, (...), cerca de 30% das aposentadorias rurais concedidas foram indeferidas na via administrativa, mas asseguradas pela Justiça. (VALADARES & GALIZA, 2016, p. 18)

Há uma lista de documentos que devem ser apresentados como provas materiais, respeitando a informalidade do trabalho rural. Entende-se que tais documentos exigidos constituem mera subjetividade, sendo insuficientes para afirmar com precisão a inserção do trabalhador ao meio rural. Nesse contexto, o INSS encara tais documentos como indícios de provas, o que os leva à necessidade de um complemento, como entrevista ao potencial segurado e a oitiva de testemunhas.

Ressalta-se que esses aspectos referentes ao trabalho informal do Segurado Especial dificultam o reconhecimento do direito do trabalhador rural na via administrativa, isso vem sendo apresentado por meio de números que apontam elevado percentual de aposentadoria rural concedida por meio judicial, sendo apresentado que nos últimos anos 30% das aposentadorias por idade rural foram indeferidas na esfera administrativa e concedidas pela Justiça.

Após a observação neste capítulo de todos os critérios que qualificam o Segurado Especial, a forma de contribuição desta categoria e de comprovação para fins de benefício, o próximo capítulo tratará, de maneira mais aprofundada, acerca do período descontínuo e as implicações que este período traz à aposentadoria por idade rural.

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