09. Combate.
Apenas a título de arremate, fica a pergunta que não quer calar: como combater o assédio moral?
A melhor forma, respondemos nós, somente pode ser uma: prevenção.
Sem sombra de dúvida, "é melhor prevenir do que remediar".
Esta máxima, fruto da sabedoria popular, é perfeitamente adequada para o problema do assédio moral.
O ideal é que haja uma política - pública e/ou privada - de combate ao assédio moral, política esta de caráter, obviamente, preventivo, o que evitará, por certo, muita "dor de cabeça" de empregadores e trabalhadores.
A importância da atividade de prevenção é evidente, não somente pelas altas quantias arbitradas comumente a título de indenizações por danos morais e materiais decorrentes do assédio moral, mas também pelo fato de o próprio tempo despendido, bem como o pessoal dedicado à investigação de condutas já tornadas públicas, terem um valor econômico não desprezível, sendo conveniente adotar medidas de precaução.
O mais importante a destacar, porém, no que toca à atividade de prevenção ao assédio moral, não exclusivamente em relação ao vínculo trabalhista, é que ela passa necessariamente por dois enfoques básicos, a saber, educação e fiscalização.
No que diz respeito à educação, a organização de campanhas esclarecedoras, seja por organismos públicos, seja por entidades não-governamentais, é uma iniciativa extremamente válida na prevenção desta doença social.
De fato, a informação prévia evidencia que determinados comportamentos, às vezes comuns em certos meios sociais – como, por exemplo, certas "liberdades" no trato entre amigos - não podem ser tolerados no ambiente de trabalho.
Esta atividade de educação possibilita, também, o afastamento de eventuais alegações dos assediadores de desconhecimento às restrições da conduta adotada, o que é um aspecto de grande relevância.
O exercício diuturno da liberdade, por incrível que pareça, deve ser ensinado, pois o convívio social é, em última análise, como já observado, a disciplina das restrições à liberdade individual.
Exemplificando de forma simplista, mas didática, as regras de comportamento social em um campo de nudismo são e devem ser obviamente diferentes das regras a ser adotadas em um convento ou em uma academia de ginástica (para utilizar paradigmas bem distintos).
Já a atividade de fiscalização deve ser exercida pelo empregador diretamente (ainda que, subjetivamente, possa ser feita pelo Estado), uma vez que implica necessariamente em uma atuação mais efetiva na própria relação de direito material.
Como o assédio moral deteriora o relacionamento entre as pessoas e a imagem da empresa e dos protagonistas do caso, comprometendo a atividade empresarial (o que afeta a produção, custos, vendas, despesas etc), não há a menor sombra pálida de dúvida de que o interesse primordial do combate ao assédio é do próprio empregador, sendo, inclusive, uma prerrogativa do seu poder de direção.
No desenvolvimento da fiscalização do assédio, a própria vítima pode ter um papel ativo, na advertência (e – por que não dizer? – confronto) ao assediador de que determinadas atitudes não são bem recebidas no caso concreto.
As atividades de fiscalização, porém, podem ser atribuídas, inclusive, aos prepostos da empresa. Recomendamos, porém, que esta atividade de fiscalização não seja exercida por um único preposto, pela circunstância óbvia de que este indivíduo pode ser, eventualmente, o próprio agente violador da liberdade e dignidade dos demais empregados, o que lhe retiraria a isenção de ânimo para atuar como fiscal do empregador.
10. Considerações Finais.
Estas são algumas rápidas considerações que consideramos conveniente trazer à baila, tendo em vista as atuais discussões doutrinárias sobre o problema do assédio moral.
Sem qualquer pretensão de que sejam encaradas como verdade absoluta, colocamo-nos à inteira disposição de todos aqueles que se propuserem a enfrentar (e combater) o assédio moral na sociedade brasileira.
Para um eventual aprofundamento no estudo do tema, elencamos, ao final, uma pequena bibliografia, onde o leitor poderá encontrar outros subsídios para o debate, bem como as principais fontes de consulta para o desenvolvimento deste artigo.
11. Referências.
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AGUIAR, André Luiz Souza. Assédio moral: o direito à indenização pelos maus-tratos e humilhações sofridos no ambiente do trabalho. São Paulo: LTR, 2005.
ALKIMIN, Maria Aparecida. Assédio moral na relação de emprego. Curitiba: Juruá, 2005.
BARRETO, Margarida Maria Silveira. Violência, saúde e trabalho: uma jornada de humilhações. São Paulo: EDUC, 2003.
Barros, Alice Monteiro de, "O assédio sexual no Direito do Trabalho Comparado" in "Genesis – Revista de Direito do Trabalho", vol. 70, Curitiba, Genesis Editora, outubro/98, p.503.
BARROS, Renato da Costa Lino de Góes. Assédio Moral: caracterização de prova. Monografia (inédita) apresentada sob a orientação do Prof. Dr. Rodolfo Pamplona Filho no curso de Direito da UNIFACS, 2005.
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GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. V. 3. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
GUEDES, Márcia Novaes. Terror psicológico no trabalho. São Paulo: LTR, 2003.
HIRIGOYEN, Marie France. A violência perversa do cotidiano. Tradução: Maria Helen Huhner. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.
_______________. Mal estar no trabalho: redefinindo o assédio moral. Tradução: Rejane Janowitzer. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.
MENEZES, Claudio Armando C. "Assédio Moral e seus Efeitos Jurídicos" in "Revista de direito trabalhista". São Paulo, ano 8, n. 10, p. 12-14, out. 2002.
NASCIMENTO, Sônia A. C. Mascaro. "Assédio moral no ambiente do trabalho" in "Revista LTR", São Paulo, v. 68, n. 08, p. 922-930, ago. 2004.
PAMPLONA FILHO, Rodolfo, "Orientação Sexual e Discriminação no Emprego" in "Discriminação" (coordenação de Márcio Túlio Viana e Luiz Otávio Linhares Renault), São Paulo, LTr Editora, 2000.
__________________________, O Assédio Sexual na Relação de Emprego, São Paulo, LTr, 2001.
__________________________, O Dano Moral na Relação de Emprego, 2ª ed., São Paulo, LTr Editora, 1999.
__________________________, "Responsabilidade Civil nas Relações de Trabalho e o Novo Código Civil Brasileiro" in "Revista LTr", São Paulo/SP, ano 67, edição de maio/2003, págs.556/564; Repertório IOB de Jurisprudência, nº 10, 2º quinzena de maio/2003, volume II, pág.259/268, RTDC – Revista Trimestral de Direito Civil, ano 4, vol. 13, jan/mar/2003, p.177/197; Revista de Direito do Trabalho, São Paulo/SP, Editora Revista dos Tribunais, nº 111, ano 29, julho-setembro/2003, págs.158/176; "Revista da Academia Nacional de Direito do Trabalho", ano XI, nº 11, São Paulo, LTr Editora, 2003, p.78/92; "Revista do Tribunal Superior do Trabalho", ano 70, nº 1, jan a jun/2004, p.101/118; e "Revista Trabalhista Direito e Processo", vol. XII, Rio de Janeiro/RJ: Forense, outubro/novembro/dezembro/2004, p.183/202;
Teixeira Filho, Manoel Antonio, Litisconsórcio, Assistência e Intervenção de Terceiros no Processo do Trabalho, 2ª ed., São Paulo: LTr, 1993, p.196.
Notas
01 HIRIGOYEN, Marie France. A violência perversa do cotidiano. Tradução: Maria Helen Huhner. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001, p. 65.
02 NASCIMENTO, Sônia A. C. Mascaro. Assédio moral no ambiente do trabalho. Revista LTR, São Paulo, v. 68, n. 08, p. 922-930, ago. 2004.
03 Vocábulo derivado do verbo to mob que significa cercar, assediar, agredir, atacar. "Collana" Mobbing é uma experiência dirigida pelo pequisador alemão Herald Ege que reúne obras de estudiosos do assédio moral e argumentos conexos ao fenômeno.
04 Barros, Alice Monteiro de, "O assédio sexual no Direito do Trabalho Comparado" in "Genesis – Revista de Direito do Trabalho", vol. 70, Curitiba, Genesis Editora, outubro/98, p.503. Maiores informações podem ser obtidas no minucioso artigo de Jane Aeberhard-Hodges ("Womem Workers and the Courts" in "International Labour Review", v. 135, nº 5, 1996).
05 NASCIMENTO, Sônia A. C. Mascaro. Assédio moral no ambiente do trabalho. Revista LTR, São Paulo, v. 68, n. 08, p. 922-930, ago. 2004.
06 Calvo, Maria del Mar Serna, "Acoso Sexual en las relaciones laborales" in "Relasur – Revista de Relaciones Laborales en America Latina – Cono Sur", nº 2, España, OIT/Ministerio de Trabajo y Seguridad Social, s/d.., p. 34
07 Alice Monteiro de Barros destaca que uma "hipótese de dano material ou patrimonial, decorrente do assédio, seria a impossibilidade de permanecer a trabalhadora no emprego ou de conseguir outro em razão de má reputação conseqüente ao assédio." (Barros, Alice Monteiro de, ob. cit., p. 510).
08 "Na hipótese de o assédio sexual por chantagem ser praticado por prepostos (gerente, supervisor, etc.) do empregador, a legislação de alguns países (Austrália, Canadá, EUA, Reino Unido e Nova Zelândia) considera este último responsável solidário, por ter delegado poderes para aquele tomar decisões que afetem a situação do empregado no ambiente de trabalho, com efeitos tangíveis". (Barros, Alice Monteiro de, "O assédio sexual no Direito do Trabalho Comparado" in "Genesis – Revista de Direito do Trabalho", vol. 70, Curitiba, Genesis Editora, outubro/98, p.509).
09 "RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DO TRABALHO. EMPREGADOR. PERDA DO OLHO ESQUERDO. BRINCADEIRA DE ESTILINGUE DURANTE O ALMOCO. PENSIONAMENTO. DANO MORAL. 1) Ato Ilicito: Empregado Atingido No Olho Esquerdo, Durante O Horario Do Almoco No Estabelecimento Industrial, Por Bucha De Papelao Atirada Com Estilingue Feito Com A Borracha De Luva. Perda Da Visao Do Olho Esquerdo. 2) Culpa Da Empresa Demandada: Presenca Da Culpa Da Empresa Requerida "In Vigilando" (Falta De Controle Dos Funcionarios A Sua Disposicao) E "In Omittendo" (Omissao Nos Cuidados Devidos). 3) Culpa Concorrente Da Vitima: Nao Reconhecimento Da Culpa Concorrente Da Vitima No Caso Concreto. 4) Pensionamento: Reducao Da Capacidade Laborativa Caracterizada Pela Necessidade De Dispendio De Maior Esforco, Em Funcao Da Visao Monocular (Art-1539 Do Cc). Fixacao Do Percentual Da Pensao Com Base Na Pericia Do Dmj (30%) A Incidir Sobre A Remuneracao Do Empregado Acidentado Na Data Da Ocorrencia Do Acidente. Reducao Do Valor Arbitrado Na Sentenca. 5) Dano Moral: Caracterizacao Do Dano Moral Pela Grave Ofensa A Integridade Fisica Do Empregado Acidentado. Manutencao Do Valor Da Indenizacao Arbitrado Na Sentenca, Que Abrangeu Os Danos Morais E Esteticos. Sentenca De Procedencia Modificada. Apelacao Parcialmente Provida." (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, APELAÇÃO CÍVEL Nº 70003335924, NONA CÂMARA CÍVEL, RELATOR: DES. PAULO DE TARSO VIEIRA SANSEVERINO, JULGADO EM 12/12/01)
10 "Art. 934. Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz."
11 Teixeira Filho, Manoel Antonio, Litisconsórcio, Assistência e Intervenção de Terceiros no Processo do Trabalho, 2ª ed., São Paulo: LTr, 1993, p.196.
12 Sobre o tema, confira-se PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Assédio Sexual na Relação de Emprego, São Paulo: LTr, 2001.