XII - UM PROJETO DE LEI SENSATO
O substitutivo apresentado, com parecer favorável, pelo Deputado Federal Alexandre Cardoso ao PL 2.753 de autoria do Deputado ALBERTO FRAGA (apensado ao PL 3287/2000, do PL 4537/2001, do PL 5494/2005, e do PL 5858/2005, à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados, em 21.10.2005), "a contrario sensu", prevê o uso de algemas como regra, na prática de ato policial. Durante "a prática de qualquer ato judicial", contudo, o ato de algemar foi posto como exceção:
"Art. 3° O emprego de algemas durante a prática de qualquer ato judicial é exceção e deve ser devidamente fundamentado".
O substitutivo do Projeto de Lei é de clarividência notável, adequado à casuística policial e sensato ao coibir o uso arbitrário de algemas e recomendar a parcimônia no seu uso. A práxis policial tem indicado que o preso tem tendência à fuga e põe em risco a vida e a segurança da equipe policial e terceiros, caso não seja adequadamente imobilizado, podendo, inclusive, se autolesionar ou cometer suicídio, daí que o uso de algemas também é uma garantia para a integridade física do preso. Em recente operação, durante procedimento de busca e apreensão, um jovem se atirou pela janela do 6º andar em prédio da zona norte do Rio de Janeiro (http://www.link.estadao.com.br/index.cfm?id_conteudo=6560).
Por tais razões, recomenda-se o uso de algemas, na esteira do substitutivo do Projeto de Lei, na forma abaixo:
"Art. 2° É permitido o emprego de algemas quando o preso, custodiado, conduzido ou detido:
I – resistir ou desobedecer à ordem de prisão.
II – tentar fugir ou der indícios de que pretende fugir.
III – pode por em risco a própria integridade física ou de outrem.
Parágrafo único. É permitido, ainda, o emprego de algemas quando o efetivo policial for menor do que o numero de pessoas a serem contidas ou quando o preso, condenado ou custodiado deva ser levado à presença de alguma autoridade ou transportado para outro estabelecimento prisional".
XIII - A SÍNTESE DO USO DE ALGEMAS PARA A SEGURANÇA PÚBLICA
Em síntese, a Segurança Pública no Estado Democrático de Direito deve:
- coibir o uso arbitrário de algemas que vise à humilhação, perseguição, prejulgamento e discriminação do preso ou conduzido em detrimento da preservação da sua dignidade;
- usar algemas com a finalidade de prevenir, desestimular e coibir a reação do preso ou conduzido, através de sua imobilização e contenção, independentemente do enquadramento típico-penal da conduta censurada, pois a avaliação do estado anímico do réu/investigado é feita no ato da prisão e não só pelos fatos pretéritos cometidos;
- estabelecer o momento adequado para imobilização e contenção do preso, recomendado o uso de armas não-letais, desde a abordagem com a vocalização da ordem de prisão ("voz de prisão") até a entrega do preso em estabelecimento prisional, ultimados os atos de polícia judiciária;
- colocar algemas
a) para impedir, prevenir ou dificultar a fuga ou reação indevida do preso, desde que haja fundada suspeita ou justificado receio de que tanto venha a ocorrer; b) para evitar agressão do preso contra os próprios policiais, contra terceiros ou contra si mesmo; c) na condução de preso por ordem judicial ou em flagrante delito, salvo determinação justificada em contrário, sem prejuízo da avaliação da situação de risco no momento da prisão; d) para não comprometer o planejamento operacional ou fragilizar a vida e a segurança de terceiros, da vítima do delito apurado, da equipe policial e do preso ou conduzido;
- ter em mente que o manejo de algemas é uma alternativa ao uso de armas letais e ao uso de força desmedida e ocorrerá, em diversos níveis de gradação, mediante: a) a colaboração do preso ou conduzido; b.) a utilização de técnica policial adequada; c.) o recurso proporcional e razoável da força, com finalidade de imobilização e contenção.
XIV - CONCLUSÃO
Conclui-se que a função policial transpassa a repressão à criminalidade. É também essencial que a vida seja preservada, como regra. E para que seja regra, e não exceção, o uso de algemas, desde que consciente e não arbitrário, deve ser incentivado e não reprimido.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Notas
01Ramalho, Joaquim Ignácio. "Elementos do processo criminal para uso das Faculdades de Direito do Império". São Paulo, L. Dois de Dezembro, 1856, § 149, p 70-1.
02Pimenta Bueno, José Antonio "Apontamentos sobre o processo criminal pelo júri". Rio de Janeiro, L. Imperial e Const. de J. Villeneuve, 1849, § 41, item 3, p 47. O mesmo tópico acha-se repetido na segunda edição, que recebeu o nome de "Apontamentos sobre o processo criminal brasileiro" (Rio de Janeiro, Emp. Nac. do Diário, 1857, p 95). Em Portugal, na época a preocupação com as cautelas e cuidados, durante a execução de qualquer ordem de custódia, ou prisão, emergia a mesma. Ensinava Duarte Nazareth: "O oficial da diligência deve conduzir-se com moderação e é-lhe proibido fazer algum insulto ou violência aos presos; e, no caso de resistência, lhe será lícito usar da necessária para repelir a agressão e efetuar a diligência". Nazareth, Francisco J. Duarte: "Elementos do processo criminal" (Coimbra, Imp. da Universidade, 4ª ed., 1861, § 148, p. 151-2).
03 O Regulamento no. 120, de 31 de janeiro do ano seguinte, que lhe facilitou e reforçou a execução, dava aos inspetores de quarteirão competência para prender infratores, em flagrante delito e, também, réus pronunciados não afiançados, bem como sentenciados à prisão (art. 66, no. 3). O anotador de então, arrimado em Aviso de 06 de março de 1834, asseverava: "Para o desempenho destas atribuições, poderão empregar os oficiais de justiça, os quais podem, sendo preciso, usar dos meios, que têm em suas atribuições. Paulo Pessoa,Vicente Alves de "Código do Processo Criminal", anotado, Rio de Janeiro, L. AA da Cruz Coutinho, 1882, nota 2.397, p. 391, o grifo é nosso).
04 : http://www.sergio.pitombo.nom.br/files/word/algemas_1.doc
05 Sobre o tema há artigo do Promotor de Justiça de São Paulo, RONALDO BATISTA PINTO, intitulado: "Da possibilidade de ser o réu mantido algemado durante o plenário do júri." Disponível: <http://www5.mp.sp.gov.br:8080/caexcrim/artigos/ anexos/DA%20POSSIBILIDADE%20DE%20SER%20O%20R%C3%89U%20MANTIDO%20 ALGEMADO%20DURANTE%20O%20PLEN%C3%81RIO%20DO%20J%C3%9ARI.doc>
Além de inúmeros acórdãos:
"Não há constrangimento ilegal no fato de ter sido o recorrente algemado durante o julgamento perante o tribunal do júri. Art. 497, I do CPP. (RHC 16808, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, 5ª TURMA DO STJ, publ. no DJ de 07.03.2005, p. 283). No mesmo sentido: HC 25856, Rel. Ministro GILSON DIPP, 5ª Turma do STJ, publ. no DJ de 25.08.2003, p. 336.
PROCESSUAL PENAL. HABEAS-CORPUS. USO DE ALGEMAS DURANTE O JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JURI. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INEXISTÊNCIA.
- A jurisprudência pretoriana tem afirmado o entendimento de que não configura constrangimento ilegal a manutenção do réu algemado durante a sessão plenária do tribunal do júri se esta medida for necessária ao bom andamento e segurança do julgamento, bem como das pessoas que nele intervêm.
- Enquanto não regulamentado por lei o uso de algemas, o emprego deste meio de contenção, em nada incompatível com o princípio da inocência, deve ficar ao prudente arbítrio do juiz-presidente do júri, a quem compete a polícia das sessões.
- Inteligência do art. 497, I, do Código de Processo Penal. (RHC 6922, Rel. Ministro VICENTE LEAL, 6ª Turma do STJ, publ. no DJ de 09.12.1997, p. 64777).
"Não constitui constrangimento ilegal o uso de algemas por parte do acusado, durante a instrução criminal, se necessário à ordem dos trabalhos e à segurança das testemunhas e como meio de prevenir a fuga do preso". (RHC 56465, Relator Min. CORDEIRO GUERRA, 2ª Turma do STF, publ. no DJ de 06-10-1978). No mesmo sentido: HC 71195, Rel. Min. FRANCISCO REZEK, 2ª Turma do STF, publ. no DJ de 04-08-1995, p. 22442.