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Poder de direção do empregador como cláusula restritiva de direitos fundamentais do trabalhador

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O poder organizacional, de controle e disciplinar não podem se confundir com desmandos. Assim como os direitos fundamentais de que tratamos não são absolutos, também não é absoluto o poder diretivo do empregador.

1. DIREITOS FUNDAMENTAIS – UMA INTRODUÇÃO

Para tratarmos do tema "cláusulas restritivas de direitos fundamentais", atinente ao Direito do Trabalho, em especial ao poder de direção e fiscalização que empregadores exercem sobre trabalhadores, urge fazermos algumas breves considerações sobre os direitos fundamentais no plano constitucional vigente.

Nos dizeres de Vidal Serrano Nunes Júnior e Luiz Alberto David Araújo, direitos fundamentais podem ser conceituados como a "... categoria jurídica instituída com a finalidade de proteger a dignidade humana em todas as dimensões". [01]

Os direitos fundamentais são históricos, universais (porém não são ilimitados, nem absolutos), irrenunciáveis e cumulativos por excelência.

Históricos porque possuem caráter histórico, desenvolvimento na história da humanidade, subsistência no tempo – e podemos citar a Magna Charta Libertatum de 1215 (Carta do Rei João Sem Terra), a Declaração do Bom Povo de Virgínia de 1776 e a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 como parte desta historicidade dos direitos fundamentais.

Universais porque são destinados a todos os seres humanos, à raça humana enquanto gênero, não podendo ficar restrito a um grupo, classe ou categoria de pessoas.

Irrenunciáveis porque não podem os indivíduos deles dispor. Temporariamente, ao seu alvitre, podem deixar de exercê-los, mas não renunciá-los.

Também são os direitos fundamentais não-absolutos, no sentido de que quando houver colisão de direitos fundamentais, aplicar-se-á o princípio da cedência recíproca (concordância prática ou harmonização), segundo o qual os direitos em colisão devem ceder reciprocamente, permitindo a existência de um ponto de convivência entre eles.

Aos direitos fundamentais, outrossim, deve-se dar máxima efetividade, de tal modo que, havendo colisão entre um direito fundamental e um direito constitucional que não seja fundamental, deve o operador do direito ampliar o primeiro e restringir o segundo. Os direitos fundamentais podem e devem ser acumulados, sempre que possível, sem nenhum impedimento.

Importante neste momento trazer as sempre sábias palavras de José Afonso da Silva, conforme transcrição ipsis litteris:

"No qualificativo fundamentais acha-se a indicação de que se trata de situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive; fundamentais do homem no sentido de que a todos, por igual, devem ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concretamente e materialmente efetivados". [02]

A doutrina nacional, como Alexandre de Moraes, José Afonso da Silva, entre outros, apresenta uma classificação de direitos fundamentais em primeira, segunda e terceira dimensão. [03] Os direitos de primeira dimensão são os direitos individuais (também conhecidos como civis ou liberdades públicas) e os políticos. Os direitos de segunda dimensão são os direitos sociais, econômicos e culturais. O direito de terceira dimensão é a solidariedade internacional ou fraternidade (paz no mundo, desenvolvimento dos países subdesenvolvidos, etc.). Alguns sustentam a existência de uma quarta dimensão de direitos, como Paulo Bonavides e Celso Lafer, que seria a proteção do indivíduo frente à existência da tecnologia e seu avanço, além da comunicação em massa (apontamento este feito por Paulo Bonavides, somente). Na Europa fala-se em uma quarta dimensão de direitos para significar a proteção ao patrimônio genético.

Em linhas gerais, temos desta forma os direitos fundamentais no sistema jurídico nacional.


2. DIREITOS FUNDAMENTAIS NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO APLICÁVEIS AO DIREITO DO TRABALHO

Em verdade, todos os direitos fundamentais, exatamente porque fundamentais e atinentes à raça humana, são aplicáveis ao Direito do Trabalho, uma vez que este disciplina as relações laborais, dentre outros assuntos. O trabalho é a atividade humana aplicada à obtenção da riqueza, seja patrimonial, seja moral, seja intelectual. Posto isso, elegeremos alguns direitos fundamentais para discorrermos, essenciais para o completo entendimento do tema que nos propomos a tratar no presente trabalho.

2.1. Tratamento isonômico entre homens e mulheres

O artigo 5º, I da Carta Magna afirma que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos da Constituição. Alexandre de Moraes ensina que é inaceitável o discrimem sexo, sempre que o mesmo seja eleito com o propósito de desnivelar materialmente o homem da mulher, aceitando-o quando a finalidade pretendida for atenuar os desníveis. [04]

2.2. Legalidade

O artigo 5º, II da Carta Magna preceitua que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Vidal Serrano e Luiz Alberto Araújo ensinam que a norma jurídica ou obriga, ou proíbe ou permite, não havendo uma quarta possibilidade. [05]

Celso Ribeiro Bastos diz que "o princípio da legalidade mais se aproxima de uma garantia constitucional do que de um direito individual...". [06]

2.3. Inviolabilidade à intimidade, vida privada, honra e imagem

Conforme Alexandre de Moraes, os direitos à intimidade e a própria imagem formam a proteção constitucional à vida privada, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas. [07] O tema é tratado no artigo 5º, que estabelece ser invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Trataremos o tema com mais abrangência e acurácia no capítulo 6.

2.4. Sigilo de correspondência e de comunicação e inviolabilidade de dados

É tratado no artigo 5º, XII da Magna Carta Republicana, no sentido de que é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual. Devemos ter sempre em mente que o sigilo aqui tratado não pode constituir instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal. [08]

Também trataremos melhor deste tema quando cuidarmos do capítulo atinente ao poder de direção do empregador e suas espécies, no capítulo 7.

2.5. Liberdade de Associação

A Constituição, em seu artigo 5º, incisos XVII, XVIII, XIX, XX e XXI, trata do direito de associação, em síntese, dizendo que é plena a liberdade de associação, de tal forma que ninguém poderá ser compelido a associar-se ou mesmo permanecer associado. Alexandre de Moraes aponta que, o preceito é válido, desde que a associação seja "para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar, sendo que sua criação e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, vedada a interferência estatal em seu funcionamento...". [09]

O artigo 8º da Constituição menciona como aponta José Afonso da Silva, dois tipos de associação, as profissionais e as sindicais, elucidando que ambas são profissionais, com a diferença de que as sindicais são associações profissionais com prerrogativas especiais, tais como defender os direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, até em questões judiciais e administrativas, dentre outras. Já a associação profissional não sindical se limita a fins de estudo, defesa e coordenação dos interesses econômicos e profissionais de seus associados. [10]


3. CLÁUSULAS RESTRITIVAS DE DIREITOS FUNDAMENTAIS

Como já dissemos anteriormente (Capítulo 01, página 02), os direitos fundamentais não são absolutos, nem ilimitados. Dependendo do caso concreto, eles podem e por vezes deverão ser restringidos, até mesmo para se buscar justiça.

Como exemplo, podemos citar o fator de discrimem, explanado por Celso Antonio Bandeira de Mello. A regra é a igualdade – o caput do artigo 5º da Constituição proclama isso, ao impor que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza – mas por vezes será necessário desigualar as pessoas para fazer justiça no caso concreto.

Bandeira de Mello ressalta que somente as pessoas, fatos ou situações podem ser desequiparados, pois neles e somente neles podem residir diferenças. [11] Ensina o citado autor:

"O que autoriza discriminar é a diferença que as coisas possuam em si e a correlação entre o tratamento desequiparador e os dados diferenciais radicados nas coisas". [12]

Basicamente, o que queremos deixar bem claro é que podem existir cláusulas restritivas de direitos fundamentais, e esta restrição nunca poderá ser total, ainda mais na seara dos direitos fundamentais. Mas sempre deverá o intérprete e o julgador usar do princípio da proporcionalidade para resolver o caso concreto. O princípio da proporcionalidade é princípio constitucional implícito – art. 5º, XLVI, segunda parte, no sistema positivado brasileiro. Não se pode escolher um direito, um princípio em detrimento do outro: eles devem se auto-limitar, buscar um ponto de convivência entre ambos, especialmente no que tange aos direitos fundamentais da pessoa humana.

Devemos ter em mente que são os direitos fundamentais que limitam a atuação do empregador, ao mesmo tempo em que o poder de direção restringe os direitos fundamentais. Poderíamos dizer que há aqui algo parecido com o sistema de freios e contrapesos. É uma via de mão dupla.

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4. DEFINIÇÃO DE EMPREGADOR E EMPREGADO

Empregador, conforme o artigo 2º, caput da Consolidação das Leis do Trabalho, é a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo o risco da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços. Empresa é interpretação ampliativa – seja qual for a forma de organização do negócio, ele se presta a figura de empregador. A forma de estrutura do capital também não importa nesse ínterim.

Empregado, conforme o artigo 3º, caput da CLT, é toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. Os requisitos da relação de emprego que devem existir entre as figuras aqui tratadas são a pessoalidade, a habitualidade, a subordinação e a onerosidade. Sérgio Pinto Martins ainda acrescenta a alteridade, mas para a doutrina majoritária a alteridade é classificada como requisito do empregador.

Trataremos com maior profundidade da subordinação – tema relevantíssimo para o trabalho em tela – no capítulo 8 do presente trabalho.


5. A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Abstrairemos do presente trabalho a discussão sobre se é a dignidade da pessoa humana um valor ou um princípio, uma vez que não é este o objeto a ser tratado (apesar de defendermos ser a dignidade um valor). Sempre que nos referirmos à dignidade da pessoa humana, a trataremos como um princípio, no esteio da doutrina majoritária.

Primeiramente, não é possível falar em sistema jurídico legítimo que não esteja fundado na garantia da intangibilidade da dignidade da pessoa humana, conforme aponta Rizzatto Nunes. [13] Este mesmo professor aponta que o principal direito fundamental constitucionalmente garantido é a dignidade da pessoa humana. [14]

A dignidade da pessoa não pode ser relativa. Ela nasce com a pessoa. É inerente à essência da pessoa. Rizzatto Nunes ensina que a dignidade da pessoa humana é um princípio absoluto. [15] Porém, a dignidade só é garantia ilimitada se não ferir outra. [16] Quando no início do presente trabalho alegamos que todo direito fundamental pode ser restringido, ao trazer à lume os ensinamentos de Rizzatto Nunes, especialmente os citados neste parágrafo, confirmamos nossa tese, de que realmente todos os direitos fundamentais podem ser restringidos, porém jamais totalmente eliminados.

Para começar a respeitar a dignidade da pessoa humana, ensina mais uma vez Rizzatto Nunes, "tem-se de assegurar concretamente os direitos sociais previstos no art. 6º da Carta Magna, que por sua vez está atrelado ao caput do art. 225, normas essas que garantem como direitos sociais a educação, a saúde, o TRABALHO...".

Enfim, a dignidade da pessoa humana torna-se medida de justiça. Ela deve ser o farol na aplicação do direito e guia para a justiça, sob pena de não se fazer a justiça. Ela busca, assim como o Direito em si considerado, em ultima ratio, o bem comum.


6. DIREITOS DA PERSONALIDADE

6.1. Direito à privacidade

O direito à privacidade no nosso sistema constitucional é um dos 04 (quatro) direitos da personalidade de que trata o artigo 5º, X da Constituição Federal. São eles: privacidade, intimidade, honra e imagem. O Juiz Americano Cooly, em 1873, identificou a privacidade como o direito de ser deixado tranqüilo, em paz, de estar só (right to be alone). [17]

Esquematicamente, temos que a vida social do indivíduo divide-se em duas esferas, a pública e a privada. O direito de privacidade é o direito de ocultar do conhecimento alheio relações marcadas pela confidencialidade, dentre eles a vida familiar, o lazer, os segredos dos negócios etc. José Afonso da Silva considera o direito à privacidade como uma direito conexo ao direito à vida. [18] A vida do indivíduo possui o espaço público, o privado (que é a privacidade, propriamente dita) e o íntimo (que é a intimidade, próximo tema a ser tratado).

6.2. Direito à intimidade

O direito à intimidade é terminologia derivada do direito anglo-americano (right of privacy), abrangendo o direito à inviolabilidade do domicilio e o sigilo da correspondência. Assim como o direito à vida, este é um direito supremo do homem, que garante, ao final, nada mais do que a própria dignidade da pessoa humana, conexa ao direito à vida.

Há aqui um nucleio mais centrado, um espaço impenetrável, em comparação com a privacidade. O direito de intimidade, como preceitua Vidal Serrano e David Araújo, "tem importância e significação jurídica na proteção do indivíduo exatamente para defendê-lo de lesões a direitos dentro da interpessoalidade da vida privada". [19] Enfim, privacidade e intimidade são coisas distintas. [20] José Afonso da Silva, citando o professor italiano Adriano de Cupis, define a intimidade como o "modo de ser da pessoa que consiste na exclusão do conhecimento de outrem de quanto de refira à pessoa mesma". [21]

6.3. Direito à honra

A honra é o conjunto de qualidades que caracterizam a dignidade da pessoa, o bom nome, a reputação. Acreditamos que a honra possui um aspecto mais interior que a reputação.

6.4. Direito à imagem

O direito à imagem possui duas variações, conforme apontam Vidal Serrano e David Araújo: "De um lado, deve ser entendido como o direito relativo à reprodução gráfica (retrato, desenho, fotografia, filmagem etc.) da figura humana. De outro, porém, a imagem assume a característica do conjunto de atributos cultivados pelo indivíduo e reconhecidos pelo conjunto social. Chamemos a primeira de imagem-retrato e a segunda de imagem-atributo". [22]

Pode-se afirmar, nesse ínterim, que a proteção constitucional da imagem-retrato está no art. 5º, X da CF, enquanto a imagem-atributo vem protegida no art. 5º, V da Carta Constitucional.


7. PODER DE DIREÇÃO DO EMPREGADOR

O empregado (já tratado no capítulo 4) é um trabalhador subordinado, e, como tal, está sujeito ao poder de direção de seu empregador. O fundamento legal deste poder de direção, conforme aponta Sérgio Pinto Martins, é o artigo 2º da CLT. [23] Este poder não é ilimitado, pois a própria lei o limita. Ademais, os direitos fundamentais da pessoa também o limitarão. Como afirma o citado autor, "compreende o poder de direção não só o de organizar suas atividades, como também de controlar e disciplinar o trabalho, de acordo com os fins do empreendimento". Amauri Mascaro Nascimento define o poder de direção do empregador como "a faculdade atribuída ao empregador de determinar o modo como a atividade do empregado, em decorrência do contrato de trabalho, deve ser exercida". [24]

O poder de direção é tanto poder de organização (escolha da atividade, cargos e regulamentos, por exemplo), quanto o poder de controle (marcação de ponto, câmeras, revistas etc.) como também o poder disciplinar (advertência, suspensão e demissão, por exemplo).

A subordinação vem do poder de comando do empregador, que dirige a prestação do serviço. Pode ser de duas espécies: disciplinar e subordinativo (hierárquico). As espécies de subordinação são a hierárquica (ordens determinadas pelo superior hierárquico), a econômica (decorre do fato do empregado depender da estrutura econômica desenvolvida pelo empregador, sem a qual ele não conseguiria desenvolver a sua atividade), a técnica (poder de supervisão, poder decisório – parecida com a hierárquica) e a jurídica [25] (esta defendida por Otávio Bueno Magano, que ocorreria quando o trabalhador está afeto a regras que limitam a pretensa autonomia, restringindo a liberdade na prestação do serviço).

É um direito de o empregador fiscalizar e controlar as atividades de seus empregados, enquanto estiverem à disposição daquele. A própria marcação do cartão de ponto, conforme ressalta Sérgio Pinto Martins, [26] é decorrente do poder de fiscalização do empregador sobre o empregado, para fiscalizar o correto horário de trabalho deste.

O empregador também poderá (e isso já é, de fato, utilizado, como aponta Sérgio Pinto Martins [27]) monitorar a atividade do empregado no computador, como o controle de produção por toques no teclado, verificação de entrada e saída de dados por registros feitos pelo próprio computador. Porém, é uma ressalva que Pinto Martins faz a questão, qual seja, não poderá o controle feito pelo empregador ser vexatório, vale dizer, empregar meios vexatórios quanto à pessoa do empregado, em respeito à dignidade da pessoa humana. A proporcionalidade é peça chave nesse quesito.

Durante o horário de trabalho, como já ressaltamos, o empregado está à disposição do empregador, e logicamente poderá ser fiscalizado por este. O empregado, nesse ínterim, poderá ser advertido ou suspenso por seu empregador, mas esse poder de punir, como assevera Sérgio Martins, deve ser exercido com boa-fé, pois o objetivo da punição deverá ser pedagógico. Assevera o mesmo jurista:

"O uso do poder de punição por parte do empregador em desacordo com suas finalidades implica excesso ou abuso de poder". [28]

Nunca é demais dizer que o Poder Judiciário poderá revisar a pena aplicada pelo empregador, quando o empregado sentir-se lesado em seus direitos fundamentais. O poder de direção do empregador restringe os direitos fundamentais do empregado, porém não os extingue; a pessoa humana, em qualquer hipótese e em qualquer pretexto, deverá sempre ser respeitada.

Caso o empregador atue com ilicitude ou arbitrariamente, também poderá e deverá o funcionário socorrer-se das vias legais. Mas como adverte Sérgio Pinto Martins, o Judiciário não poderá graduar a penalidade. [29] Marcelo José Ladeira Mauad e Nei Frederico Cano Martins ressaltam que a suspensão superior a 30 dias importa rescisão injusta do contrato de trabalho. [30] Os mesmo autores também ressaltam que não precisa o empregador advertir para suspender, nem suspender para somente após demitir o funcionário; dependendo da falta cometido, ele poderá sem demitido por justa causa de plano. [31]

O Código Civil, em seu artigo 21, ressalta que: "A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma".

O empregador não poderá impedir a manifestação do pensamento do empregado (conforme preceito emanado do art. 5º, IV da CF), muito menos submetê-lo a tortura ou a tratamento desumano ou degradante (art. 5º, III da CF – e a própria dignidade da pessoa humana), não pode violar sua liberdade de consciência e crença (art. 5º, VI da CF), dentre outros direitos fundamentais.

Sintetizando: o empregador tem o poder diretivo sobre o empregado e pode exercê-lo, desde que respeitada a dignidade do trabalhador.

7.1. Uso da Internet no trabalho

Como já dito neste capítulo 7, o empregado durante o horário de trabalho, está à disposição do empregador. Desta feita, seu uso da Internet poderá ser fiscalizado pelo patrão, pois deverá estar fazendo uso desta para fins laborais, já que é pago para trabalhar. Sérgio Pinto Martins, com muita propriedade, assevera que pode o funcionário ser fiscalizado para verificar se não está enviando e-mails para outras pessoas sem qualquer relação com o serviço. [32] Claro que o empregador deverá atuar com proporcionalidade, pois uma coisa é o funcionário que labora com computador todo seu horário, e tem boa produtividade, um ou dois e-mails rápidos para familiares; outra bem diferente é aquele funcionário relapso e improdutivo, que perde horas a fio frente ao computador de seu patrão, fingindo que trabalha.

7.2. Rastreamento de e-mails

O e-mail, como ressalta Patrícia Peck, podem expandir-se infinitamente, ainda mais os caluniosos. [33] O e-mail coorporativo pertence à empresa, não ao empregado. Deve ser utilizado para a finalidade laboral. Já o e-mail pessoal pertence ao empregado, à pessoa do empregado. Este não poderá ser rastreado pelo empregador, pois não possui ligação nenhuma com a função laboral. Porém seu acesso no local de serviço poderá ser vetado pelo empregador. Patrícia Peck ressalta que se a origem do e-mail for rastreada e apontar para um e-mail coorporativo, caso sejam enviados por alguém e-mails caluniosos, a empresa poderá ser responsabilizada pelo crime. [34]

Como ressalta Sérgio Pinto Martins, o empregador pode monitorar os e-mails do empregado, desde que digam respeito ao serviço. [35] O sigilo de comunicações de dados, como o é o e-mail, também é inviolável, segundo mandamento constitucional. Mas a regra possui exceções, não é princípio absoluto. O interesse no rastreamento deve ser relevante, como assevera o citado professor. [36]

Patrícia Peck ensina no tocante ao rastreamento de e-mails que:

"... é importante que as empresas que disponibilizem e-mails coorporativos deixem claro para seus funcionários qual a política de privacidade a ser adotada em relação ao seu uso: o funcionário deve saber se suas mensagens estão ou não sujeitas à monitoração da empresa. Na Inglaterra, tal medida já é adotada pelo ordenamento costumeiro como lícita. Para isto é importante o funcionário tomar ciência por escrito do documento que trata do assunto no ato de sua contratação ou no ato da disponibilização do serviço de e-mail coorporativo, devendo ser cancelado e inutilizado após a saída do funcionário da empresa, para evitar mau uso ou continuidade de uso pelo próprio ou por terceiros". [37]

O empregador poderá verificar a utilização de e-mails, visando constatar se o computador não está sendo usado para outros fins em horário laboral, para fins pessoais do empregado, ainda mais se houver a proibição expressa para uso pessoal do equipamento.

A jurisprudência também se guia neste sentido, vejamos:

"Não se constitui prova fraudulenta e violação de sigilo de correspondência o monitoramento pelo empregador dos computadores da empresa. E-mail enviado a empregado no computador do empregador e relativo a interesses comerciais da empresa não pode ser considerado correspondência pessoal. Entre o interesse privado e o coletivo de se privilegiar o segundo. Limites razoáveis do entendimento do direito ao sigilo. Apelo provido." (TRT 3ª Região, 1ª Turma, Rec. Ordinário, Relator: Plinio Bolivar de Almeida, Revisora: Maria Ines Moura Santos Alves da Cunha, Acórdão nº: 20050881099, Processo nº: 02771-2003-262-02-00-4, ano: 2005).

"PROVA ILÍCITA. "E-MAIL" CORPORATIVO. JUSTA CAUSA. DIVULGAÇÃO DE MATERIAL PORNOGRÁFICO.

1. Os sacrossantos direitos do cidadão à privacidade e ao sigilo de correspondência, constitucionalmente assegurados, concernem à comunicação estritamente pessoal, ainda que virtual ("e-mail" particular). Assim, apenas o e-mail pessoal ou particular do empregado, socorrendo-se de provedor próprio, desfruta da proteção constitucional e legal de inviolabilidade.

2. Solução diversa impõe-se em se tratando do chamado ‘"e-mail" corporativo, instrumento de comunicação virtual mediante o qual o empregado louva-se de terminal de computador e de provedor da empresa, bem assim do próprio endereço eletrônico que lhe é disponibilizado igualmente pela empresa. Destina-se este a que nele trafeguem mensagens de cunho estritamente profissional. Em princípio, é de uso corporativo, salvo consentimento do empregador. Ostenta, pois, natureza jurídica equivalente à de uma ferramenta de trabalho proporcionada pelo empregador ao empregado para a consecução do serviço.

3. A estreita e cada vez mais intensa vinculação que passou a existir, de uns tempos a esta parte, entre Internet e/ou correspondência eletrônica e justa causa e/ou crime exige muita parcimônia dos órgãos jurisdicionais na qualificação da ilicitude da prova referente ao desvio de finalidade na utilização dessa tecnologia, tomando-se em conta, inclusive, o princípio da proporcionalidade e, pois, os diversos valores jurídicos tutelados pela lei e pela Constituição Federal. A experiência subministrada ao magistrado pela observação do que ordinariamente acontece revela que, notadamente o "e-mail" corporativo, não raro sofre acentuado desvio de finalidade, mediante a utilização abusiva ou ilegal, de que é exemplo o envio de fotos pornográficas. Constitui, assim, em última análise, expediente pelo qual o empregado pode provocar expressivo prejuízo ao empregador.

4. Se se cuida de "e-mail" corporativo, declaradamente destinado somente para assuntos e matérias afetas ao serviço, o que está em jogo, antes de tudo, é o exercício do direito de propriedade do empregador sobre o computador capaz de acessar a INTERNET e sobre o próprio provedor. Insta ter presente também a responsabilidade do empregador, perante terceiros, pelos atos de seus empregados em serviço (Código Civil, art. 932, inc. III), bem como que está em xeque o direito à imagem do empregador, igualmente merecedor de tutela constitucional. Sobretudo, imperativo considerar que o empregado, ao receber uma caixa de "e-mail" de seu empregador para uso corporativo, mediante ciência prévia de que nele somente podem transitar mensagens profissionais, não tem razoável expectativa de privacidade quanto a esta, como se vem entendendo no Direito Comparado (EUA e Reino Unido).

5. Pode o empregador monitorar e rastrear a atividade do empregado no ambiente de trabalho, em "e-mail" corporativo, isto é, checar suas mensagens, tanto do ponto de vista formal quanto sob o ângulo material ou de conteúdo. Não é ilícita a prova assim obtida, visando a demonstrar justa causa para a despedida decorrente do envio de material pornográfico a colega de trabalho. Inexistência de afronta ao art. 5º, incisos X, XII e LVI, da Constituição Federal.

6. Agravo de Instrumento do Reclamante a que se nega provimento." (TST, 1ª Turma, PROC. Nº TST-ED-RR-613/2000-013-10-00.7, Ministro relator: João Oreste Dalazen) [38] grifos nossos

7.2. Instalação de Câmeras e microfones

O empregador pode instalar câmeras e microfones no local de trabalho para fiscalizar seus empregados, em função de seu poder diretivo. Mas não poderá, de forma alguma, violar a privacidade e a intimidade do trabalhador (art. 5º, X da CF e art. 21 do CC), nem deixa-lo em uma situação vexatória, como aponta Sérgio Pinto Martins. [39] Por exemplo, não pode o empregador instalar tal maquinário em banheiros, refeitórios e vestiários.

7.3. A revista pessoal

Sérgio Pinto Martins aponta que os empregados poderão ser revistados no final do expediente pelo empregador, pois a revista funciona como uma salvaguarda do patrimônio da empresa. [40] Esta revista não pode ser feita de forma vexatória ou abusiva, devendo ser moderada e respeitosa. A revista jamais poderá violar a intimidade do empregado, devendo ser realizado em local apropriado. Revistas de caráter íntimo estão terminantemente proibidas, nesse sentido – e vale dizer: seja para empregados do sexo feminino, seja para empregados do sexo masculino. Também não enxergamos a possibilidade de revistas que não sejam feitas no horário de saída do funcionário, somente. Não se justifica revistas feitas no funcionário na sua entrada diária ao serviço.

Vejamos a jurisprudência acerca do tema:

"REVISTA PESSOAL. PODER DIRETIVO DO EMPREGADOR. RESPEITO À EMINENTE DIGNIDADE HUMANA. Com suporte nos poderes de direção, disciplinamento e fiscalização da prestação de serviços, ante a ausência de legislação trabalhista à espécie, os empregadores costumeiramente utilizam-se das revistas pessoais nos seus empregados, durante o expediente, argumentando que estão em defesa de seu patrimônio, o que admitimos como correto. Porém, invariavelmente, alguns procedimentos de revistas extrapolam os limites de atuação e atingem a dignidade do ser humano trabalhador. Ora, a dignidade humana é um bem juridicamente tutelado, que deve ser preservado e prevalecer em detrimento do excesso de zelo de alguns maus empregadores com o seu patrimônio. O que é preciso o empregador conciliar, é seu legítimo interesse em defesa do patrimônio, ao lado do indispensável respeito à dignidade do trabalhador. A Constituição Federal (artigo 5º, incisos V e X) e a legislação sub-constitucional (artigo 159 do Código Civil Brasileiro de 1916, vigente à época dos fatos) não autorizam esse tipo de agressão e asseguram ao trabalhador que sofrer condições vexaminosas, a indenização por danos morais. Importante frisar, ainda, que a inserção do empregado no ambiente do trabalho não lhe retira os direitos da personalidade, dos quais o direito à intimidade constitui uma espécie. Não se discute que o empregado, ao ser submetido ao poder diretivo do empregador, sofre algumas limitações em seu direito à intimidade. O que é inadmissível, sim, é que a ação do empregador se amplie de maneira a ferir a dignidade da pessoa humana". (TRT 3ª Região. 6ª Turma. Recurso ordinário, Relator: Valdir Florindo, Revisora: Ivani Contini Bramante. Acórdão nº: 20050598583, Processo nº: 02635-2003-016-02-00-7. Ano: 2004).

A revista em armários, gavetas, arquivos etc., também podem ser realizadas. Tudo o que dissemos acerca da revista pessoal poderá ser aplicada aqui. A proporcionalidade, a razoabilidade e a extrema necessidade para salvaguardar o patrimônio da empresa devem estar totalmente presentes.

7.4. Critérios para admissão de emprego

Conforme a Lei n. 9.029/95 proíbe-se a exigência de atestados de gravidez e esterilização, e outras práticas discriminatórias, para efeitos admissional ou de permanência no emprego. Conforme aponta Alexandre de Moraes, fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Carta Republicana, constituindo crime a exigência de teste, exame, perícia, laudo, atestado, declaração ou qualquer outro procedimento relativo à esterilização ou a estado de gravidez; a adoção de quaisquer medidas do empregador, que configurem indução ou instigamento à esterilização genética; promoção do controle de natalidade, assim não considerado o oferecimento de serviços e de aconselhamento ou planejamento familiar, realizados através de instituições públicas ou privadas, submetidas às normas do SUS. [41]

O que dissemos no parágrafo anterior pode ser aplicado aos casos de empregados portadores do vírus HIV/AIDS. Aliás, em razão da dignidade da pessoa humana e do direito à intimidade, pode o empregado até mesmo não revelar ao seu empregador que possui o vírus supra citado, conforme aponta Oscar Ermida Uriarte. [42]

Nesta mesma linha de raciocínio, claro está que, com o avanço da tecnologia, não poderá também haver uma seleção com base em padrões genéticos, com possíveis requerimentos de exames para se identificar anomalias genéticas, como já ocorreu na Europa. O requerimento de exames antidoping também extrapola o poder de direção do empregador, provocando injustificada lesão ao direito à intimidade e à privacidade do empregado.

7.5. Segredo de empresa e os empregados

É para proteger o patrimônio e os segredos lícitos da sociedade empresária que o empregador atua fortemente na fiscalização de seus funcionários. Fábio Ulhoa Coelho ensina que a lei tipifica como crime de concorrência desleal a exploração, sem autorização, de "conhecimentos, informações ou dados confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto", e o acesso ao segredo foi fraudulento ou derivou de relação contratual, conforme o artigo 195, XII e XI da Lei de Propriedade Industrial, Lei n. 9.279/96. [43]

Pode o empregador fazer inserir cláusulas que proíbam que em empregado labore para outro empregador que trabalhe no mesmo ramo de atuação, desenvolvendo produtos parecidos, justamente para proteger o segredo de empresa, nunca por um prazo superior a três anos, e sempre respeitando-se os direitos fundamentais.

Sobre os autores
Adriana Rossetti

bacharelanda do curso de direito pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo/SP, estagiária concursada da Procuradoria do Município de São Bernardo do Campo/SP

Thiago Pellegrini Valverde

Bacharel e Mestre em Direito. Professor de Teoria Geral do Direito, Direito Constitucional, Administrativo, Internacional e Direitos Humanos. Autor da obra "Fontes do Direito, Hermenêutica Jurídica e os Tratados Internacionais de Direitos Humanos".

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROSSETTI, Adriana; VALVERDE, Thiago Pellegrini. Poder de direção do empregador como cláusula restritiva de direitos fundamentais do trabalhador. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1203, 17 out. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9053. Acesso em: 23 dez. 2024.

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