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Alienação parental e os reflexos sociojurídicos

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3 SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL

A alienação parental é um termo geral usado para identificar situações em que o menor está sofrendo de abuso psíquico na seara familiar. Este abuso poderá ser desencadeado pelos pais ou parentes próximos.

Nas síndromes relacionadas ao exercício parental, as mães aparecem como as principais figuras adoecidas ou as que mais provocam adoecimento nos filhos (DANTAS, 2011).

O que se vê é um movimento de “descoberta” ou catalogação de síndromes relacionadas ao exercício parental. Dos quadros relacionados ao puerpério, Disforia puerperal, Psicose pós-parto e Depressão Pós-Parto são os mais conhecidos (CANTILINO, 2010). Daqueles relacionados à estreita relação materno-filial, destaca-se a Síndrome da Alienação Parental, a Síndrome da Mãe Maliciosa e a Síndrome de Munchausen por Procuração. Os transtornos relacionados. Nesta seção será explicada a Síndrome da Alienação Parental (SAP) (AMENDOLA, 2009).

A alienação parental é um fenômeno que foi a princípio relatado pela psiquiatria, quando em conflitos familiares decorrentes da separação passou-se a identificar dificuldade de diferenciar o exercício da conjugalidade do exercício da parentalidade. Foi Richard Gardner, psiquiatra norte-americano, quem nos anos 80 identificou este fenômeno patológico ao observar conflitos parentais que levava um dos genitores a promover verdadeira campanha alienatória contra o genitor que não se encontra na guarda (GARDNER, 2002). 

Gardner relata situação em que o guardião dificulta os encontros dos filhos com o outro genitor e impõe diversos empecilhos às visitas, a exemplo da alegação de que o filho está doente. Também, o genitor alienante esconde informações sobre a saúde ou vida escolar da criança e em casos mais extremos, até mesmo muda-se de cidade, somente no intuito de ver afastado o menor do outro consorte, em uma clara manifestação de vingança (CAMPOS, 2019).

Conforme dados catalogados por Richard Gardner, 90% das crianças envolvidas em disputa de guarda litigiosa sofrem dessa síndrome. O referido autor atestou ter identificado a SAP em sua experiência de análise científica e catalogação profissional (GARDNER, 2002). 

A atualidade desse instituto reside no interesse científico e nas recentes pesquisas das áreas da psicologia e do direito, haja vista a alienação parental ser prática recorrente das relações familiares. 

As primeiras pesquisas sobre a alienação parental surgiram em 1987 nos EUA e na Europa, em 2001. O Brasil foi um país pioneiro em positivar o instituto da alienação parental. Em muitos países, como a Itália, a alienação fica restrita a estudos acadêmicos e quando há questões judiciais, até porque falta de previsão expressa no ordenamento jurídico, não são realizadas tomando como base a alienação, trazendo, indubitavelmente, consequências drásticas na vida da criança que vivencia (MADALENO; MADALENO, 2017)  

Em 05.09.2006 ocorreu o primeiro simpósio que abordava o tema da alienação parental e depois de discussões acadêmicas, jurídicas e científicas que levaram o Brasil, em 2010, através da Lei 12.318 positivar o instituto (DIAS, 2015). 

A expressa determinação trouxe o embasamento jurídico que faltava, trazendo o conceito de AP: 

Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este (BRASIL, 2010, s.p). 

O § único do art. 2º traz, ainda, um rol exemplificativo de condutas, a exemplo da desqualificação da conduta do genitor, dificuldade em exercer a autoridade parental, entre outros. 

As primeiras decisões verificando possíveis casos de alienação parental ocorreram na década de 80, muito antes da publicação da Lei 12.318/2010. Isso mostra uma preocupação de alguns juristas em decidir com base não só na lei, na previsão expressa, mas sim, trazendo um humanismo em suas decisões e preocupados com o princípio que rege a criança e adolescente the best interest of the child, o melhor interesse da criança. Devido a um processo legislativo burocrático, a lei, muitas vezes, não consegue acompanhar a evolução da sociedade, diante disso, as decisões garantistas são o alento para casos tão especiais quanto nesse instituto (CAMPOS, 2019). 

O alienador é o sujeito ativo da alienação parental. Na maioria das vezes, o Alienador é o próprio genitor que possui a guarda do menor, e abusando deste poder busca afastá-lo do outro genitor, criando inúmeras formas de atrapalhar a convivência de ambos. Por diversas vezes o alienador busca distanciar o filho do alienado por atos simples, que podem até passar despercebidos, como por exemplo, convidar outras crianças para irem à casa do filho justamente nos dias em que este deve estar junto com o genitor não detentor da guarda, ou, ainda, perguntar frequentemente à criança se ela quer mesmo ver o outro genitor no dia estipulado (SILVA; OLIVEIRA, 2017). 

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O comportamento do alienador tende a ser muito criativo, sendo impossível criar uma lista fechada de suas condutas. O que pode se afirmar com certeza é que o alienado não respeita as regas e costuma não obedecer às sentenças judiciais (DIAS, 2016). 

O alienador pensa e trata o filho como se fosse uma propriedade sua, não levando em consideração que para um desenvolvimento psicológico saudável a criança precisa na mesma proporção de ambos os genitores, esquece-se o alienador que somente o seu carinho e cuidado não contribui de forma satisfatória para que a criança se sinta plenamente feliz. 

Ainda na atualidade é comum que a guarda do filho menor fique com a mãe e por essa razão as mulheres são as maiores causadoras da Alienação Parental, entretanto tal atitude não pode ficar restrita a elas já que também existem pais guardiões, avós e tios. 

Já os sujeitos passivos da Alienação Parental, suas vítimas, são em geral o filho menor e o cônjuge que não possui a guarda, podendo também estender-se a outros membros da família e terceiros. 

O genitor que não possui a guarda do filho em primeiro lugar enfrenta as dificuldades e tristezas de não ter o filho consigo na mesma proporção que outro genitor, restando-o apenas vê-lo nos dias de visitas estipulados, encontrando assim dificuldades em manter com o filho vínculo forte e verdadeiro que possuía antes do divórcio. 

O genitor alienado às vezes acaba contribuindo de forma inconsciente com a Alienação Parental, quando ao se sentir impedido de participar ativamente da vida do filho acaba se afastando, diminuindo o número de visitas e ligações, afastando-se pouco a pouco do filho. 

Este afastamento acaba por reforçar a ideia de que o guardião/alienador é o único capaz de atender a todas as necessidades do filho, ficando o outro genitor/alienado rotulado como incapaz, irresponsável, e sem amor, o que consequentemente traz ao filho um sentimento de abandono. 

Desta feita a maior vítima da Alienação Parental é o filho que em meio ao conflito é procurado para opinar de quem mais gosta. A criança ou adolescente vítima de Alienação Parental tem o vínculo com o alienado prejudicado, ou até mesmo rompido, o que por si só pode lhe acarretar sérios problemas emocionais, já que alimentada e embasada pelos discursos do alienado passa a ter uma péssima imagem do outro genitor, chegando até a odiá-lo (SILVA, 2009). 


4 OS EFEITOS JURÍDICOS E PSICOLÓGICOS DA ALIENAÇÃO PARENTAL 

Tratando-se de novel texto legal, a cautela no manejo dos dispositivos ali contemplados é imperativa como meio de se coibir equívocos na interpretação com consequente cometimento de equívocos ou mesmo de conferir inefetividade á lei pela prática imatura. 

No que tange à competência para processamento das causas concernentes à alienação parental, tem-se que não há alteração na previsão que toca ao domicílio da criança, destacando o seu caráter absoluto em razão do interesse maior da defesa desta. 

Tal questão está salva de eventuais questionamentos contrários quanto à relativização, inclusive, sob o amparo do artigo 8° da lei 12.318, o qual prescreve que a alteração do domicílio é irrelevante quando se trate da competência da ação que aborde o direito de convivência, a menos que haja consenso dos pais a respeito, ou seja, a temática alvo de decisão judicial. 

Por tais mecanismos, coíbe-se a adoção de práticas pelos genitores que tenham como alvo a confusão processual ou dificultar a apuração da verdade dada a dificuldade decorrente da distância das partes com o foro no qual encontre-se o processo em trâmite. 

A anterior discussão não tem lugar ao se tratar da alienação parental invocada em caráter incidental, ocasião em que estará o processo já em trâmite perante inconteste foro competente. 

Nos termos estampados pela própria lei, a alienação parental pode ser invocada como causa principal ou de forma incidental no processo em que se discuta interesse de menor. Desta forma, por exemplo, pode ser suscitada a questão no bojo de uma ação de alimentos ou numa regulamentação de visitas. 

Ato contínuo, ainda ilustrativamente, poderá o pai invocar o Judiciário para que de forma exclusiva se manifeste acerca de eventual alienação praticada pela mãe detentora de guarda unilateral. Em ambos os casos, será o processo dotado de tramitação prioritária. 

Neste momento é necessário destacar que a alegação da alienação de forma incidental poderá gerar determinadas discussões, quando se trate de ação de alimentos. A celeuma diz respeito à incompatibilidade entre o procedimento contemplado pela lei 5.478/68 e as providências necessárias à apuração da alienação parental, a exemplo da elaboração de laudos complexos, que, embora sejam elaborados em tempo pré-estabelecido pela lei, comportam manifestação das partes, de forma que se estenderia demasiadamente o trâmite dos alimentos (DIAS, 2015). 

Adiante, a polêmica envolve a composição dos polos, que no caso de alimentos não enquadra o cônjuge, supostamente alienador, que estará a representar o menor. 

Assim sendo, revela-se prudente o pleito pela sujeição de tal questão a um processo específico, a fim de que não comprometa a celeridade do rito de alimentos nem seja violado pela mora do procedimento ordinário.

Contudo, registra-se outra possibilidade de aproveitamento da relação processual na ação de alimentos que requer tão somente a autorização do Juiz para que o representante (e alienador) passe a integrar o polo da demanda. 

Este quadro importa em determinado alarido em razão da duplicidade de relações, sendo que um sujeito passivo diverge daquele presente no início da relação, bem como a não coerência com princípio informativo que legitima que sejam acumulados pedidos, dada a ausência de conexão entre os seus fundamentos. 

Assim sendo, não resta obstaculizada a suscitação da alienação parental na ação de alimentos, mas, faticamente, inspira maiores cuidados em razão de determinadas incompatibilidades que poderão expor a risco a efetiva proteção da criança e adolescente proposta no texto legal pertinente. 

Prossegue-se ainda na listagem das possibilidades da inauguração de tal discussão em juízo, destacando a ocasião em que o próprio magistrado determine a adoção de determinadas medidas para que se averigue a suspeita prática de alienação. 

Muito embora alguns estudiosos da temática entendam pelo caráter excepcional de tal medida, diante da regra da adstrição (quanto à limitação da vontade das partes à manifestação jurisdicional), fato é que determinadas matérias restam imaculadas à tal limitação, dada a sua relevância. 

Oportunamente, assevera-se a desnecessidade de consentimento do réu no caso em que o autor traga em voga a discussão da alienação parental, sendo também o requerido legitimado para tanto. Uma vez mais, nota-se o caráter primordial do interesse do menor, sendo os pais alcançados, via de consequência, mas na condição de exercerem deveres com relação aos filhos, decorrentes do poder familiar. 

Na ausência de tratativa a respeito da invocação da alienação parental em sede recursal, pontua-se o entendimento da sua impossibilidade por estrita observância à rechaçada supressão de instância. Sendo o caso de o próprio Tribunal suscitar a questão de oficio, não poderá expedir decisão imediata, dada a inconteste necessidade de produção de provas pelo juízo de origem. 

Desta forma, impõe-se o retorno dos autos á primeira instância e a adoção de todas as medidas necessárias à averiguação da veracidade de tal situação, por parte do juízo primevo, com base em que estará legitimado a proferir decisão. 

4.1 Procedimento judicial da ação de alienação parental

Referente ao procedimento judicial da ação de alienação parental, quando não se chegar à composição dos conflitos familiares decorrentes da prática da alienação parental valendo-se da mediação, o genitor alienado deverá buscar pela jurisdição para solucionar a demanda. A justiça competente para julgar conflitos referentes às questões de família é a Justiça Estadual, juízo da criança e do adolescente (SANDRI, 2013). 

O juiz pode adotar medidas as medidas que julgar necessárias para preservar a integridade psicológica do menor, estando, pois, autorizado por lei, a agir de ofício, em benefício do menor, adotando, inclusive, medidas preventivas (CARVALHO, 2017). 

Do exposto percebe-se que a legitimidade para a propositura da ação de alienação parental é ampla, podendo figurar no polo ativo não apenas os pais, mas, também algum familiar, o Ministério Público e até o magistrado, que de ofício, poderá instaurar o processo. A seu turno, os legitimados passivos serão aqueles que estiverem praticando os atos de alienação parental. Assim, o alienador não é necessariamente um dos pais, podendo ser também outra pessoa próxima da criança, a exemplo dos avós (CARVALHO, 2017).

Em caso de o genitor alienado estar sendo impedido de ter contato com o filho, há a possibilidade de requerer a antecipação da tutela, de forma a antecipar os efeitos da sentença desejada, e, possibilitando, deste modo, que o direito tutelado seja efetivo (SANDRI, 2013).

No que tange à possibilidade de cumulação de pedidos, além de buscar-se pelo direito de conviver com o filho, próprio da restrição que a alienação parental promove, havendo nexo de causalidade é possível que o pedido de fixação de indenização por danos morais seja cumulado (FIGUEIREDO; ALEXANDRIDIS, 2011).

No entanto, mesmo que o processo corra pelo rito ordinário, tornando possível a cumulação de pedidos, importa destacar que o processo terá prioridade em sua tramitação, nos termos do art. 4º da Lei 12.318/2010 (SANDRI, 2013).

Referente aos recursos cabíveis, a Lei 12.318/2010 não tratou sobre o tema em face do ato do magistrado que julga questão e, por esta razão, aplica-se o CPC complementarmente.

O recurso a ser interposto está vinculado à forma como a ação for ajuizada: se incidental ou autônoma. Se a ação for distribuída de forma incidental a natureza da decisão será interlocutória e, portanto, é cabível o agravo de instrumento. Em caso de a ação ser autônoma, deve-se ingressar com recurso de apelação (BARUFFI, 2019).

É inegável o avanço e destaque que o tema ganhou, trazendo, por fim, o reconhecimento da prática alienadora e dos efeitos devastadores que tal acarreta na formação da criança. No entanto, ainda é necessária que se faça certas adequações a legislação, com o intuito de se ter maior efetividade para inibir a prática. Uma alteração desejável seria a criminalização da prática.

A Lei nº 12.318/2010, em seus artigos 4º e 5º, dispõe sobre a possibilidade do magistrado declarar a requerimento ou mesmo de ofício, a existência de indícios de atos de alienação parental, em qualquer momento processual, seja em ação autônoma ou incidentalmente, que tramitará com prioridade, sendo ouvido o Parquet para que as medidas necessárias sejam tomadas, a fim de evitar danos psicológicos ao menor, assegurar seu convívio com o genitor ou tornar possível que estes se reaproximem, se for o caso.

Surge, assim, uma alternativa ao juiz criminal, que poderá valer-se desta medida judicial antes de proferir uma sentença, podendo, inclusive, determinar que seja realizada perícia psicológica ou biopsicossocial por equipe multidisciplinar, composta por assistentes sociais, psicólogos e psiquiatras, naquele incidente ou ação autônoma, que constatará, ou não, atos de alienação parental que tornaram viável uma acusação que versa sobre estupro.

Por outro lado, diversas críticas surgiram em face da Lei nº 12.318/10, ensejando, inclusive, o Projeto de Lei nº 10.639/2018, de autoria do Deputado Flavinho (Partido Social Cristão – SP), que tem o objetivo de revogar a Lei da Alienação Parental, sob a justificativa que a referida legislação viabilizou um meio de os pais que praticaram abusos sexuais contra os filhos pudessem exigir que a convivência com a criança fosse mantida.

Segundo o Deputado Flavinho: “abusadores que ainda não foram condenados por insuficiência de provas inequívocas seguem a usufruir da convivência com a criança, mesmo com todos os sinais de alerta sendo evidenciados em estudos psicossociais [...]” (MACHADO, 2018, s.p). O Projeto de Lei nº 10.639/2018 encontra-se no momento arquivado por determinação da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. 

Sobre os autores
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TORQUETTE, Alexandra Junia Paula; SILVA, Alexandre Alves. Alienação parental e os reflexos sociojurídicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6568, 25 jun. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/91117. Acesso em: 22 nov. 2024.

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