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Tratamento normativo da repatriação de ativos na lavagem de dinheiro

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Agenda 19/10/2021 às 17:38

3. REPATRIAÇÃO INTERNACIONAL DE PRODUTO DO CRIME

Conforme o Decreto 5687 34, de 31 de janeiro de 2006, o Estado brasileiro assim determinou e ratificou sob a Convenção da Nações Unidas contra a Corrupção – Convenção de Mérida que:

Art. 1o A Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, adotada pela Assembleia-Geral das Nações Unidas em 31 de outubro de 2003 e assinada pelo Brasil em 9 de dezembro de 2003, apensa por cópia ao presente Decreto, será executada e cumprida tão inteiramente como nela se contém.

Art. 2o São sujeitos à aprovação do Congresso Nacional quaisquer atos que possam resultar em revisão da referida Convenção ou que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional, nos termos do art. 49, inciso I, da Constituição.

A finalidade da Convenção, conforme o artigo 1 é:

a) Promover e fortalecer as medidas para prevenir e combater mais eficaz e eficientemente a corrupção;

b) Promover, facilitar e apoiar a cooperação internacional e a assistência técnica na prevenção e na luta contra a corrupção, incluída a recuperação de ativos;

E, em seu artigo 3, com relação ao âmbito de aplicação:

1. A presente Convenção se aplicará, de conformidade com suas disposições, à prevenção, à investigação e à instrução judicial da corrupção e do embargo preventivo, da apreensão, do confisco e da restituição do produto de delitos identificados de acordo com a presente Convenção.

A Convenção de Mérida, no México [35], explicita várias condutas, conforme pode-se ver em alguns artigos descritos no rodapé.

3.1. REPATRIAÇÃO DOS ATIVOS ILÍCITOS

Em 20 de março de 2012, Camila Colares Bezerra [36]. Diretora-Adjunta do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional – DRCI, durante uma palestra afirmou que, “o que dá fôlego às organizações criminosas são seus ativos ilícitos e, portanto, o trabalho na recuperação desses valores é essencial. Ter foco nos ativos traz vários benefícios: o primeiro, tirar dessas organizações sua maior motivação para delinquir, o lucro; o segundo, acabar com o fôlego da organização, já que ela usa dinheiro para corromper pessoas e continuar a praticar as ilicitudes; o terceiro, poder utilizar esses bens na investigação, na persecução penal, equipando os agentes públicos, por exemplo”.

Disse ainda, naquela ocasião, que são “impressionantes o volume de recursos ilícitos gerado por essas organizações. O tráfico de 140 mil pessoas para a exploração sexual rende US$ 3 bilhões por ano aos exploradores da atividade na Europa. O mercado de armas ilícitas, entre US$ 170 e 320 milhões. O fluxo global de ativos gerados por organizações criminosas geraria de 1 a 1.6 trilhões por ano”. Imaginemos esses números atualmente, devem ter aumentado consideravelmente.

Em 29 de agosto de 2016 [37], “O Ministério da Justiça e Cidadania defendeu que a melhor forma de enfrentar os crimes econômicos é retirar de seu autor as vantagens que obteve com a conduta ilícita, sejam bens, direitos ou valores. O tema foi tratado na 7ª Sessão do Grupo de Trabalho de Prevenção da Corrupção e 10ª Sessão do Grupo de Trabalho de Recuperação de Ativos da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (Uncac), em Viena, Áustria, nos dias 25 e 26 de agosto”.

A publicação do DRC 10 anos [38], publicado pelo Ministério da Justiça, diz que

“Muitas vezes, os produtos da prática de crimes cometidos no Brasil são enviados ao exterior como forma de ocultá-los ou dissimulá-los para tentar afastá-los da origem criminosa. É necessário que, por meio da cooperação jurídica internacional, as autoridades solicitem o bloqueio e o posterior repatriamento desses valores ao Estado brasileiro. Nos dez anos de atuação do DRCI/SNJ, retornaram aos cofres públicos brasileiros cerca de 35 milhões de reais, que foram desviados de nosso país em decorrência da prática de crimes, tais como corrupção e lavagem de dinheiro. Além disso, foram repatriados bens culturais e históricos, como obras raras, cujo valor não é mensurável, e que haviam sido roubados e enviados ao exterior”.

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Ainda, de acordo com a publicação, “entre os anos de 2004 e 2013, foram tramitados pelo DRCI/SNJ cerca de 13.500 pedidos de cooperação em matéria penal, merecendo destaque aqueles referentes a crimes financeiros, lavagem de dinheiro, corrupção e tráfico de drogas”.

A cartilha COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL EM MATÉRIA PENAL, publicada pelo MINISTÉRIO DA JUSTIÇA,39, nos esclarece sobre como são efetuadas essas parcerias para a repatriação de ativos ilícitos: o “asset sharing agreement” que é o último estágio de uma cooperação bem-sucedida para a recuperação de ativos no exterior e corresponde ao acordo de divisão firmado entre o Estado requerente e o Estado requerido.

"A divisão desses ativos poderá ser regida pela legislação interna dos Estados envolvidos, pelos tratados de cooperação ou por promessa de reciprocidade em casos concretos. De acordo com essas regras os países acertam, em cada caso, quanto será repatriado ao Estado requerente”.

Segundo o artigo 51 da Convenção das Nações Unidas contra a corrupção, está previsto que os recursos dos ativos ilícitos deverão ser devolvidos integralmente ao país de origem do criminoso. No Brasil, as negociações são feitas pela Autoridade Central que faz parte Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça.

A repatriação dos ativos ilícitos, cujo total é de grande monta, é de suma importância para o Estado, pois, além de combater à corrupção e a lavagem de dinheiro esses recursos vão contribuir para diminuir o déficit público, e consequentemente ajudar no crescimento da economia do país. Os valores apropriados e os impostos arrecadados serão de grande valia para que o Estado possa cobrir os grandes gargalos existentes na economia.

As autoridades brasileiras têm grandes dificuldades em rastrear e localizar onde estão depositados os ativos ilícitos e como repatriá-los. Nesse sentido, a cooperação internacional é fundamental na ajuda para fazer esses rastreamentos.

Conforme nos diz Luiz Maria Pio Corrêa, membro do GAFI, Grupo de Ação Financeira Internacional),

"Resultado principal da atuação do GAFI (Grupo de Ação Financeira Internacional) é a existência, em diferentes países, de leis e instituições similares, que conformam sistemas nacionais voltados ao combate à lavagem de dinheiro, reforçando e modernizando o arsenal do Estado no combate ao crime, de maneira geral." (CORRÊA; GAFI, 2013, p. 12)

A repatriação dos ativos ilícitos e a aplicação da lei é sumamente importante para punir os indiciados, combatendo as organizações criminosas que, muitas das vezes são grandes financiadoras do tráfico de drogas ilícitas, do terrorismo, e de outras formas criminosas. A sociedade está esperando a ação para combater tais desvios e precisa ter certeza de que a lei está sendo cumprida e que serve para todos, inclusive para os poderosos que, apesar de aparentarem um comportamento exemplar, acima de qualquer suspeita, nem sempre são o que representam já que estão envolvidos em atividades criminosas.

A   repatriação desses ativos é um desafio enfrentado por todos os Estados. É necessário que os países membros desenvolvam mecanismos inovadores de longo termo para inibir as ações criminosas.

Combatendo essas organizações e a consequente aplicação da lei para punir os seus membros é o primeiro passo. O uso de inteligência e a utilização de novas tecnologias tornase cada vez essencial para conhecer quem são os grandes financiadores do tráfico de drogas ilícitas, do terrorismo e de outras atividades criminosas.

A cooperação internacional é fundamental para que os métodos de rastreamento e controle das atividades ilícitas permita que se recupere e se repatrie bens que estavam depositados ou ocultos em transações de aparência legal. Essas relações bilaterais e multilaterais contribuem para que seja possível algo que, sem a participação dos Estados membros, será bem difícil para que esses ativos ilícitos possam ser recuperados, ou então, sem essa colaboração, poderá levar uma eternidade para que isso aconteça.

Macorin, em seu artigo “Cooperação em Pauta” [40], relata: “O incremento dos fluxos migratórios de pessoas, informações, capitais e outros, em proporção e velocidade vertiginosas, oportunizou a expansão da macro criminalidade.

Nesse cenário, ganha destaque o tema da cooperação jurídica internacional em matéria penal, considerada a crescente demanda da comunidade internacional para consecução do jus puniendi estatal, como solução aos ideais universais de paz social e justiça penal global.”

Um caso de sucesso anunciado em 10 de agosto de 2010 pela UNODC (United Nations Office on Drugs and Crime) – Escritório de Ligação e Parceria no Brasil, feito pelo secretário nacional de Justiça, Pedro Vieira Abramovay, em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, menciona que

"Desde que foi instituído, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional do Brasil conseguiu repatriar apenas US$ 2,6 milhões relativos ao caso Banestado. Entre os países mais procurados pelo crime organizado para a lavagem de dinheiro estão Estados Unidos, Suíça, Reino Unido, Ilhas Cayman, França, Luxemburgo, Uruguai, Bahamas e China." (ABRAMOVAYO, 2010, p.1.)

A repatriação dos ativos ilícitos, cujo total é de grande monta, é de suma importância para o Estado, pois, além de combater à corrupção e a lavagem de dinheiro esses recursos vão contribuir para diminuir o déficit público, e consequentemente ajudar no crescimento da economia do país. Os valores apropriados e os impostos arrecadados serão de grande valia para que o Estado possa cobrir os grandes gargalos existentes na economia.

Em 2015 foi instituído o PL 2960 para permitir que quem tivesse dinheiro no exterior pudesse repatriá-lo. É um projeto sobre o RERCT - Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária de recursos, bens ou direitos de origem LÍCITA, não declarados ou declarados incorretamente por cidadãos que residem ou tem domicílio no exterior.

Esse PL também foi um mecanismo criado para controlar a Recuperação de Ativos e Controle de Capitais no Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro, conforme a Rede Nacional de Laboratórios de Tecnologia.41

O Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), do Ministério de Justiça, através das autoridades brasileiras, tem agido com presteza e rastreado a movimentação ilícita dos recursos. Essas ações combatem atos de corrupção e lavagem de dinheiro, que, na maioria das vezes, financiam o tráfico de drogas ilícitas e o terrorismo.

O Brasil faz parte do Grupo dos 20 países que tem economia pujante – o G-20. Esse grupo pretende criar políticas internacionais de cooperação para que se possa combater a lavagem de dinheiro e a consequente evasão fiscal.

Entretanto, a sociedade não tem muita clareza sobre a relevância que o assunto requer e nem imagina como o governo lida com esses problemas. Falta conhecimento de como essas ações são desenvolvidas e como é feita a repatriação desses ativos.

A sociedade precisar receber informações claras sobre o papel dos organismos nacionais e internacionais e a sua importância na tentativa de solucionar esses problemas. Também é importante que a sociedade tenha ciência do empenho e desempenho das nossas autoridades e de todos os riscos que sofrem.

Acredita-se que com as novas tecnologias e os recursos cada vez mais avançados da internet e de outras tecnologias, as autoridades possam monitorar o “tráfico” de recursos no mundo e acompanhar e seguir o caminho do dinheiro e quem o possui. Esse acompanhamento “remoto” dará celeridade a resolver e solucionar os casos e facilitará o desenvolvimento dos procedimentos essenciais para que as autoridades possam rastrear os capitais que, indiretamente, são recursos oriundos de atividades escusas e que prejudicaram o Estado.

3.2.  APROVEITAMENTO DE NORMAS INTERNACIONAIS PARA A REPATRIAÇÃO NO ESTRANGEIRO

As ações conjuntas das autoridades brasileiras e estrangeiras na solução desses delitos, por meio da cooperação e da reciprocidade entre os países, seguindo os princípios norteadores conforme prescrito no art. 26 e parágrafos e incisos do CPC tem tido sucesso já que o crime organizado, seja ele de que nacionalidade for, é considerado uma ameaça comum.

Tomando como referência Dipp, em seu livro “A “delação” ou colaboração premiada: uma análise do instituto pela interpretação da lei”, abaixo listamos as convenções e protocolos internacionais que norteiam e normatizam as questões relacionadas ao crime organizado e seus aspectos.

  1. Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, promulgada pelo Decreto nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006;
  2. Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, promulgada pelo Decreto nº 5.015, de 12/03/2004;
  3. Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional relativo à Prevenção, 14 Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças, promulgado pelo Decreto nº 5.017, de 12/03/2004;
  4. Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, relativo ao combate ao Tráfico de Migrantes por via terrestre, marítima e aérea, promulgado pelo Decreto nº 5.016, de 12/03/2004;
  5. Protocolo contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito de Armas de Fogo, suas Peças e Componentes e Munições, complementando a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, promulgado pelo Decreto nº 5.941, de 26/10/2006;
  6. Convenção para a Supressão do Financiamento do Terrorismo; promulgado pelo Decreto nº 5.640, de 26/12/2005;
  7. Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança referente à venda de crianças, à prostituição infantil e à pornografia Infantil, promulgado pelo Decreto nº 5.007, de 08/03/2004 e depositado na Secretaria Geral da ONU;
  8. Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas, Decreto nº 154, de 26 /07/1991;
  9.  Convenção sobre a Prevenção e Punição de Crimes contra Pessoas que Gozam de Proteção Internacional, inclusive Agentes Diplomáticos, Decreto nº 3.167, de 14/09/1999;
  10. Convenção Internacional contra a Tomada de Reféns, Decreto nº 3.517, de 20/06/2000;
  11. Convenção sobre a Proteção Física de Materiais Nucleares, Decreto nº 95, de 16/04/1991;
  12. Convenção para a Repressão aos Atos Ilícitos contra a Segurança da Aviação Civil, Decreto nº 2.611, de 02/06/1998; 
  13. Convenção para a Supressão de Atentados Terroristas com Bombas, Decreto nº 4.394, de 26/09/2002 [4].

Nesse contexto, é muito importante o país fazer parte desses organismos internacionais e poder trocar experiências com outros países que também sofrem com problemas similares. Foram criados muitos acordos e tratados internacionais com um número relevante de países com o intuito de resolver questões importantíssimas de interesse mútuo, bem como na te condições de repatriar ativos ilícitos, bem como discutir tratativas sobre outros problemas penais.

Em virtude de cada vez mais as organizações criminosas criarem mecanismos cada vez mais sofisticados para “disfarçar” a origem de seus ativos, a comunidade internacional se viu obrigada a encontrar maneiras para se ajudarem mutuamente criando redes de cooperação jurídica a fim de poderem encontrar soluções para controlar esses malfeitos.

Essa cooperação jurídica internacional prevê que os Estados se auxiliem prestando informações relevantes com relação aos processos de interesse comum e que os auxiliarão a entender a legislação jurídica de cada Estado envolvido.

O principal objetivo da cooperação internacional é oportunizar aos responsáveis dos Estados membros que lidam com essas questões penais que possam dialogar com seus parceiros para criar estratégias no combate ao crime organizado nacional, internacional e transnacional e suas ramificações, discutir maneiras de recuperar ativos ilícitos depositados em paraísos fiscais depositados em bancos de fachada, conhecer o modus operandi das organizações criminosas e o tráfico de drogas, prender seus líderes, descobrir como esses grupos se organizam e cooptam seus “peões”, confiscar seus bens comprados com o produto do crime, conhecer seus métodos de “lavar” o dinheiro sujo, entre outros.

Sobre a autora
Angelina Lago Alonso Smid

Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Instituto de Educação Superior de Brasília - IESB.

Informações sobre o texto

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