4. TRATAMENTO NORMATIVO DA REPATRIAÇÃO
4.1. AS NORMAS E RESOLUÇÕES DO BANCO CENTRAL
A Circular 3.978/2020, do Banco Central [42], que entrou em vigor em 1º de outubro de 2020, estipula as regras atuais sobre essa questão tão importante que é a prevenção à lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo, com a sigla de PLD-FT. O PLD-FT traz as novas regras que devem ser adotadas pelas instituições reguladas pelo Banco Central (BACEN) para “endurecer” o rastreamento das atividades financeiras ilícitas.
Conforme o BACEN, essas novas regras estipulam que aquelas instituições reguladas pela instituição possam identificar e avaliar os riscos envolvidos em suas transações financeiras – Avaliação Interna de Risco (AIR). Serão analisados os seguintes perfis com potencial de riscos: clientes, instituições, operações e os funcionários. Os analisados tanto podem ser aqueles que são parceiros da instituição como aqueles que são os prestadores de serviços terceirizados.
Todos os procedimentos devem ser documentados e aprovados pelo diretor do PLDFT, e revisado a cada dois anos.
Essas diretrizes estão de acordo com as recomendações do GAFI, que em 2012 destacou como fundamental a Abordagem Baseada em Risco (ABR), que tem por objetivo um tratamento diferencial – tratar diferencialmente os desiguais, na medida de suas diferenças. As instituições reguladas pelo BACEN deverão adotar políticas, procedimentos e controles de PLD-FT, com base no risco.
A Instrução Normativa da RFB nº 1627 de 11 de março de 2016, bem como a Lei 13.254/2016, em seu artigo 1º, caput e do parágrafo 2º determina:
Art. 1º É instituído o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT), para declaração voluntária de recursos, bens ou direitos de origem lícita, não declarados ou declarados com omissão ou incorreção em relação a dados essenciais, remetidos ou mantidos no exterior, ou repatriados por residentes ou domiciliados no País, conforme a legislação cambial ou tributária, nos termos e condições desta Lei. [...]
§ 2º Os efeitos desta Lei serão aplicados aos titulares de direito ou de fato que, voluntariamente, declararem ou retificarem a declaração incorreta referente a recursos, bens ou direitos, acompanhados de documentos e informações sobre sua identificação, titularidade ou destinação.
Essa Lei não fala dos ativos ilícitos, portanto, presume-se que os recursos e os outros bens devem ser lícitos. Essa situação deixou os possuidores de bens legais no exterior preocupados. Ficaram com receito de declarar seus recursos e pertences, pois temiam que não pudessem comprovar a origem daqueles recursos.
4.2. O CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL (SONEGAÇÃO FISCAL)
O Direito Penal assim como Direito tributário tem características comuns. Ambos têm como prerrogativa a punição do indivíduo que não cumpre com o que a sociedade considera como correto, tanto pode ser na área penal ou como com relação à sonegação fiscal. A Lei 8.137/90, define os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e assim esclarece os crimes tributários:
Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas.
I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;
II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;
Rodrigo Silveira da Rosa, em seu artigo publicado no Conjur “Sonegação fiscal não consiste em infração antecedente da lavagem” [43], em 30 de novembro de 2014, diz que essa “discussão é saber se o crime de sonegação fiscal poderia desencadear uma conduta de lavagem de capitais. Isso porque, na lavagem, pressupõe-se que há uma conduta criminosa, decorrente dos proveitos ilegais que assumem aparência lícita diante dos mecanismos utilizados pelo agente “lavador”.
Os crimes tributários não necessariamente são provenientes de ausência de declarações ao fisco sobre os bens do indivíduo. A sonegação pode ser motivada por outras razões. Falta de capital, o desconhecimento que um determinado recebimento, como por exemplo, o recebimento de uma indenização, o cachê pago aos artistas, músicos, e aos demais profissionais que vivem da arte.
Por pressuposto, esses valores também deverão ser declarados ao fisco, pois tem uma obrigação fiscal. Mas nem todos entendem dessa maneira.
De acordo com o Artigo de Eduardo Salomão Neto, publicado no Boletim de novembro de 2012 pelo escritório LEVY & SALOMÃO ADVOGADOS [44] diz que
“A lavagem de dinheiro, crime previsto no artigo 1º da Lei nº 9.613/98, exige que os recursos lavados sejam provenientes de infrações penais. Ocorre que diversamente de delitos como o tráfico de drogas, gestão fraudulenta de instituição financeira e fraudes em geral, a sonegação fiscal não produz recursos. Evita sim a diminuição com impostos de recursos provenientes da atividade da empresa sonegadora”.
Ele aduz que “Outros possíveis delitos que igualmente não podem levar a lavagem de dinheiro por não produzirem qualquer riqueza são a realização de operação de câmbio não autorizada com o fim de evasão de divisas e a manutenção de depósitos não declarados no exterior, ambos previstos no artigo 22 e parágrafo único da na Lei nº 7.492/86 (Lei dos Crimes do Colarinho Branco)”.
A Lei 12.683/1245 alterou algumas regras anteriores visto que ao sonegar os tributos os indivíduos poderão estar incorrendo em delito de lavagem de dinheiro, quando o delito antecedente se tratar de Sonegação Fiscal.
O artigo 1º da lei tem a seguinte redação:
“Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.
Segundo o artigo “A Sonegação Fiscal face a nova lei de Lavagem de Dinheiro” [46] “... tanto um simples furto, quanto um grande esquema de Sonegação Fiscal, poderão figurar no rol dos delitos antecedentes à Lavagem de Dinheiro, uma vez que o rol dos delitos antecedentes passou a inexistir, admitindo-se qualquer infração penal que acarrete vantagem econômica.
Sendo assim, todas as empresas que incorrerem em Sonegação Fiscal, poderão responder pelo delito de Lavagem de Capitais, se houver comprovação da vontade do agente de dar aparência lícita ao dinheiro ilícito, previsto na Lei 12.683/12, uma vez que obtiveram vantagem econômica de forma indevida.”
Em 26 de junho de 2015 foi publicado no Diário da União o Decreto Legislativo nº 146,47 de 25 de junho de 2015, da Receita Federal, que aprovou o texto do Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América para Melhoria da Observância Tributária Internacional e Implementação do FATCA (FATCA – Foreign Account Tax Compliance Act ) celebrado em Brasília, em 23 de setembro de 2014, cujo objetivo é a redução da evasão fiscal por parte dos cidadãos e entidades americanas, cuja conformidade segue nos artigos a seguir:
Art. 1º Fica aprovado o texto do Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América para Melhoria da Observância Tributária Internacional e Implementação do FATCA, celebrado em Brasília, em 23 de setembro de 2014. Parágrafo único. Ficam sujeitos à aprovação do Congresso Nacional quaisquer atos que possam resultar em revisão do referido Acordo, bem como quaisquer ajustes complementares que, nos termos do inciso I do art. 49 da Constituição Federal, acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.
Art. 2º Este Decreto Legislativo entra em vigor na data de sua publicação. Senado Federal, em 25 de junho de 2015.
Pode-se dizer, pois, que distinguir a ilicitude nos negócios e nas finanças de um indivíduo ou de uma empresa é deveras difícil, pois nesse patrimônio se confundem a licitude com a ilicitude e, portanto, não será fácil rastrear quais bens, ou parte deles, é oriunda do crime.
Assim, o fisco não consegue separar o “joio do trigo”. Seria necessária uma comprovação real e legal para ser possível fazer essa distinção.
5- CASOS CONCRETOS:
5.1. Alguns casos citados pelo COAF:
Como já abordado neste trabalho de pesquisa, o combate à lavagem de dinheiro e à corrupção tornou-se uma preocupação constante para as autoridades fiscalizadoras. É um processo que requer a colaboração de diversos players para que se possa chegar a um ideal desejável, não final, já que o crime organizado desenvolve cada vez mais mecanismos de ocultação dos delitos, criando obstáculos, cada vez mais sofisticados, para àqueles que rastreiam e monitoram as atividades das organizações e de seus membros.
Graças à colaboração entre as agências fiscalizadoras como o COAF, o Ministério Público, a Polícia Judiciária, a Justiça e outros órgãos igualmente importantes nessa interação, é possível investigar e rastrear esses atos criminosos e fraudulentos.
O COAF [48], através de sua Unidade de Inteligência Financeira, organizou em tópicos as atividades ilícitas mais comuns identificadas durante esse processo:
- Crimes de corrupção e desvio de recursos públicos;
- Crimes contra o sistema financeiro;
- Crimes envolvendo atividades e profissões não financeiras designadas e crimes de sonegação fiscal; e,
- Crimes de tráfico de drogas e de pessoas.
- A seguir, alguns exemplos:
1) Remessa ao Exterior por meio de Importações Fictícias
O primeiro caso que vale discutir é o da remessa ao exterior por meio de importações fictícias. Nessa situação, a empresa importadora faz contratos de câmbio para pagamento de importação, e o banco denominará a operação de “remessa sem saque” que dispensa a verificação de sua validade e lisura. Quem recebe esses valores não são aqueles que supostamente deveriam recebê-los. “Laranjas” são contratadas que recebem os valores através de DOCs lavando o dinheiro antes de repassá-lo à empresa. Através do rastreamento da operação não é possível provar ou constatar quem participou desse conluio.
2) Compra de Imóveis com Dinheiro em Espécie originado por Tráfico Internacional de Drogas por meio de Fraude Cambial
Um estrangeiro deseja comprar um imóvel cujo valor é alto e ele deseja fazer o pagamento em espécie e em moeda estrangeira. Chama à atenção das autoridades fiscalizadoras que chegam à conclusão de que, na realidade, essa quantia elevada é proveniente do tráfico de drogas, e, possivelmente, esse comprador é um traficante. Isso acontece quando a quadrilha se dissolve e os membros têm a necessidade de transformar esse dinheiro ilícito em lícito, e nada mais fácil do que o investimento em imóveis.
3) Dólar Cabo
Essa operação se refere às remessas feitas por brasileiros que residem no exterior. Essas pessoas fazem transferências de numerário do exterior para o Brasil através de contas correntes que não tem vínculo com os remetentes. Esses recursos, se lícitos, deveriam ser transferidos por meios oficiais, e, se verifica que esses valores saem das contas no Brasil e que pertencem a indivíduos que atuam como “doleiros”. Essas remessas fogem totalmente do controle oficial e dificulta o monitoramento das atividades ilícitas de lavagem de dinheiro. Eles atuam em empresas de fachada cuja existência é curta, já que se transformam em outras para não chamar atenção das autoridades.
4) Evasão de divisas por meio de Sistema Financeiro Paralelo (dólar-cabo)
São operações efetuadas pelo que se chama “câmbio paralelo” feitas para pessoas físicas ou jurídicas. Duas casas de câmbio remetem ilegalmente numerário para o exterior e cobram por seus serviços. Esses valores são enviados para contas correntes de bancos no exterior. Entretanto, verifica-se que essas duas casas de câmbio têm conexão com outras espalhadas pelo
Brasil, que são responsáveis por operações ilegais feitas com a utilização das contas correntes desses clientes para evitar que se descubram os ilícitos já que as operações fraudulentas e as lícitas se misturam para confundir as autoridades.
5) Recursos do Tráfico de Drogas remetidos ao Exterior por meio de Doleiros
Uma empresa, em uma pequena sala comercial movimenta recursos financeiros incompatíveis com a capacidade de seus sócios, que são empregados na construção civil, ou seja, recebendo somente um salário-mínimo mensal. Como se observa, seria impossível cidadãos com baixa remuneração serem detentores de cotas de uma sociedade com capacidade financeira razoável. O representante da empresa só é visto quando vai à agência bancária. Aparentemente só há um empregado na empresa e no seu interior não se verifica qualquer estoque de mercadorias. Verificou-se então que essa empresa recebe numerário de uma variedade de pessoas relacionadas ao tráfico de drogas. Esses valores são transferidos para empresas de importação e exportação controladas por “doleiros” e, posteriormente enviadas para o exterior por essas casas de câmbio de fachada, para enviar o lucro aos traficantes e para pagamento da compra de drogas ilícitas.
5.2. Alguns casos publicados pela mídia
Diariamente, ao ler os jornais, ouvir e ver as notícias veiculadas nos meios de comunicação como TV, rádio, internet, e outros canais e plataformas similares, encontramos notícias, algumas vezes manchetes de maior relevância, informado sobre uma operação policial que está fazendo uma busca e apreensão de algum ou vários indivíduos que se envolveram em corrupção ou em lavagem de dinheiro.
Outras vezes recebemos informações sobre ataque a cargas de caminhões, assaltos a bancos, invasões de propriedades para ocultação de drogas, assassinatos de queima de arquivo daqueles que desrespeitaram as regras da quadrilha ou da “corporação”, e tantos outras manchetes que nos chocam e surpreendem por sua ousadia.
Notícias que desnudam a realidade ilegal perpetrada por indivíduos sem escrúpulos que encontram no crime uma maneira fácil e simples de obter vantagens, lucro, e viver abastadamente com recursos provenientes do crime e da usurpação de recursos públicos ou privados.
A seguir reportamos algumas notícias [49] que nos chamaram atenção e foram amplamente divulgadas pela mídia.
a) O Caso do Propinoduto
O caso do Propinoduto [50] envolveu um grupo de auditores da Receita Estadual do Rio de Janeiro e da Receita Federal.
De acordo com a reportagem de Amaury Ribeiro Jr, publicada em 15/10/2020 no Uol Notícias [51], esse grupo é suspeito de enviar ilegalmente pelo menos US$ 33,4 milhões para contas no banco suíço DBTC (Discount Bank and Trust Company, hoje Union Bancaire Privée).
Somente em 2002 o caso, que ficou conhecido como Propinoduto, e o envolvido principal era Rodrigo Silveirinha Corrêa, ex-Subsecretário de Administração Tributária no governo de Anthony Garotinho (PSB). Em 2003, ele foi condenado a 15 anos de prisão pelo juiz Lafredo Lisboa, da 3ª Vara Federal Criminal. Além dele, foram condenadas outras 23 pessoas.
Apesar de já terem transcorrido 17 anos, esse caso ainda tramita no STJ, e com algumas liminares no STF e está longe de terminar. Teme-se que prescreva por conta dos diversos recursos que serão impetrados por seus advogados. A prescrição ocorrerá em 2023.
De acordo com a matéria, a Justiça da Suíça só aceitará fazer o repatriamento do dinheiro depois que forem esgotados todos os recursos na Justiça brasileira. E, em caso de prescrição, a Suíça devolverá o dinheiro aos fiscais que foram acusados de cobrar propina de empresas de grande porte no Rio.
A Procuradoria-Geral, respaldando a Secretaria de Cooperação Internacional do MPF tenta convencer a Suíça a repatriar esse dinheiro para o Brasil.
Ainda, conforme a reportagem, o ex-sócio do doleiro Dario Messer, Vinícius Claret, que fez acordo de delação premiada com o Ministério Público, disse ao UOL que todo o dinheiro da propina era enviado para Suíça por uma espécie de "operação a cabo" feita entre os correntistas do DBTC.
b) O Caso do Doleiro
De acordo com a reportagem de Marcelo Gomes, GloboNews,52 em 17/08/2020, publicado pelo G1 do Rio de Janeiro, o Doleiro Dario Messer foi condenado a mais de 13 anos de prisão em regime fechado.
É a primeira condenação do 'doleiro dos doleiros' na Operação Lava Jato. Ele se comprometeu a devolver R$ 1 bilhão aos cofres públicos. A defesa de Messer diz que a sentença se baseou no depoimento prestado pelo doleiro durante um acordo de colaboração premiada.
O doleiro é conhecido como o “doleiro dos doleiros”.
Ele foi condenado pela Justiça Federal do Rio a 13 anos e 4 meses de prisão em regime fechado pelo crime de lavagem de dinheiro, no processo da Operação Marakata, que é um desdobramento da Lava Jato no Rio.
A defesa diz que "a sentença proferida nos autos da operação Marakata se embasou, dentre outras provas, no depoimento prestado por Dario, a comprovar a eficácia e relevância dos dados apresentados pelo colaborador".
Segundo as investigações, a empresa Comércio de Pedras O. S. Ledo usou os serviços de Messer para enviar ilegalmente 44 milhões de dólares ao exterior, entre 2011 e 2017. As pedras eram extraídas de minas de Campo Formoso, na Bahia.
Segundo a denúncia, os dólares ocultos no exterior eram trazidos para Brasil, mas não eram declarados. O MPF ainda diz que o dinheiro era utilizado para pagar garimpeiros e atravessadores com os quais a empresa negociava as pedras.
c) O Caso do furto ao Banco Central em Fortaleza
Conforme matéria postada no G1 Ceara53, o crime do roubo ao Banco Central em Fortaleza aconteceu há quase 15 anos, no dia 5 de agosto de 2005, e subtraiu R$ 164 milhões. Esse furto estava programado pelos criminosos para ocorrer uma semana depois, segundo o delegado da Polícia Federal (PF), Antônio Celso.
Entre sexta-feira e sábado, a quadrilha entrou no caixa-forte do Banco Central e levou o dinheiro. Mas o crime só foi descoberto pelas autoridades na segunda-feira, dia 8 de agosto, na reabertura do banco.
Como foi o furto:
Na madrugada de 5 para 6 de agosto de 2005, a quadrilha entrou no caixa-forte do Banco Central através de um túnel, levando mais de três toneladas em notas de R$ 50. Para retirar o dinheiro, o grupo passou por baixo de uma das mais movimentadas vias do Centro de Fortaleza, a Avenida Dom Manuel. O túnel partia de uma casa alugada pela quadrilha. "Não era para ter ocorrido naquele dia. Deu uma 'zebra' entre eles. O furto estava sendo programado para uma semana depois. Iam ter mais tempo para levar mais dinheiro e fugir. Eles estavam preparando o fundo do caixa-forte para deixar uma fina camada, para romper só no dia que eles quisessem", conta o delegado.
De acordo com Celso, "quando foi sexta-feira anterior à descoberta, eles deixando preparado, cometeram um erro e fizeram um furo no buraco. Isso, eles mesmo nos contaram. 'Vamos ter que fazer rápido. Se não, quando chegar segunda-feira, os “caras” vão ver esse buraquinho e pronto, já era'".
"Chamaram todo mundo às pressas para, na própria sexta-feira, para sábado, começar. Sábado eles pararam, porque queriam ter o domingo para fugir. Tanto que pegamos as passagens compradas no domingo, pagas em dinheiro, e viajando para São Paulo", completa o investigador.
Entre sexta-feira e sábado, a quadrilha entrou no caixa-forte do Banco Central e levou o dinheiro. Mas o crime foi descoberto pelas autoridades apenas na segunda-feira, na reabertura do banco.
Outro erro cometido pelo grupo criminoso, que ajudou na investigação policial, segundo o delegado Antônio Celso, foi o uso de documentos falsos, mas com as fotografias verdadeiras. "Em São Paulo, eles compram aquele kit pronto: identidade, CPF e carteira de habilitação (falsos). Mas a foto tem que ser a sua. Senão, cai em uma blitz e a foto não é a sua. O nome pode mudar", conta.
"O que fizemos: como já tínhamos levado um delegado de São Paulo, encaminhamos aquelas fotos para ver quem reconhecia. Dois deles foram reconhecidos como assaltantes de banco. A gente levantou quem eram as quadrilhas em que eles estavam envolvidos e, a partir dali, a gente já tinha a foto de quase todo mundo", finaliza.
Nos meses seguintes, a PF realizou dezenas de prisões de suspeitos, mas recuperou apenas cerca de R$ 30 milhões. A suspeita dos investigadores é que o dinheiro tenha sido utilizado principalmente na compra de bens móveis e imóveis.
Dos R$ 164,7 milhões furtados, a Polícia Federal estima que, no máximo, R$ 60 milhões foram recuperados, por meio da venda de bens dos participantes ou pelo resgate de quantias em espécie durante as investigações.
Esses são alguns dos muitos casos que ocorrem, com muita frequência, e que colocam a Polícia Federal sempre em alerta para desmantelar as quadrilhas que surgem com as mais diversas atividades. Os jornais trazem quase que diariamente matérias sobre desvios financeiros de instituições públicas, compras e outras aquisições não justificadas do setor público, e desmandos dos mais variados feitos por quadrilhas que muitas vezes são auxiliadas por funcionários da administração pública.
Recentemente, uma das muitas matérias publicadas pelo jornal Correio Braziliense de 1º de outubro de 2020, relatava a investigação que estava sendo efetuada pela Polícia Federal sobre um esquema que “lavou” 30 bilhões de reais, ocorrido em São Paulo. A Operação foi chamada de Operação Rei do Crime.
De acordo com a matéria, o alvo eram empresas que operavam um “importante braço financeiro” de uma facção criminosa, usada para lavagem de dinheiro. O alvo focava empresários do setor de combustíveis e, inclusive, também procurava um dos indivíduos que participou do roubo do Banco Central de Fortaleza. Foram interditadas 70 empresas nessa operação.
A Justiça bloqueou um valor das contas bancárias que supera os 730 milhões de reais, e sequestrou uma grande quantidade de bens valiosos, de alto valor.