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Direito nas escolas de niveís fundamental e médio:

um manifesto em favor dos Projetos de lei 6.954/13 e 403/15

Agenda 27/11/2021 às 19:00

Comentamos a importância de projetos de lei que incluem noções de direito na grade curricular do ensino fundamental e médio.

A Emenda Constitucional 104 de 2019 inseriu no corpo da Carta Republicana a polícia penal como mais uma modalidade de força voltada à segurança pública em nosso País, o que fez com que diversos cargos fossem criados pelas Constituições e Leis dos Estados, com salários que chegam a atingir o patamar de R$ 5.000,00 iniciais, inaugurando a abertura de uma serie de concursos públicos voltados à contratação desses profissionais. O teto nacional do salário de professor do nível médio é de R$ 2.872,00 (https://ead.univali.br/blog/salario-professor). Já de inicio percebe-se uma disparidade financeira entre essas duas classes de servidores, mas não estamos aqui para entrar no mérito das desigualdades sociais, econômicas e culturais que secularmente afetam a sociedade brasileira, muito menos para criticarmos a louvável iniciativa de criação de mais uma carreira no âmbito da Administração Pública com o surgimento de novos cargos e salário razoável para os policiais. Todavia, bons professores de certa forma reduzem o número de detentos e isso é questão de lógica e política criminal preventiva, enquanto alguns policiais também o reduzem só que de modo arbitrário e com uso da força letal, ou seja, repressivamente e com atrocidades.

Vivemos uma espécie de síndrome de Estocolmo, cuja sociedade é tão deturpada e carente de educação que chega a aplaudir e carregar nos braços políticos que saqueiam o erário público, traficantes de drogas, homicidas e tantas outras classes a que deveria ser aplicada a teoria do direito penal do inimigo de Günther Jakobs, como um direito paralelo para determinados crimes que afrontam gravemente o Estado enquanto sociedade politicamente organizada e que necessitaria de penalidades mais severas. Isso sem contar a cifra negra proveniente do temor fundado na ineficiência do Estado quanto ao dever de promoção de segurança e proteção das vitimas diretas e indiretas de crimes praticados à mercê de um sistema frágil, corrompido e brando.

Assim, o cerne da questão posta resulta numa crítica aos investimentos realizados em segurança pública repressiva em detrimento da formulação de políticas relacionadas à educação e à formação do inconsciente coletivo para fatores que de modo emergente necessitam de maior atenção por parte dos Poderes Legislativo e Executivo.

Neste ínterim, trataremos do Projeto de Lei nº 6.954 de 2013, de autoria do Deputado e ex-jogador Romário, que, visando aparelhar jovens e adultos, propugna a inclusão do estudo da Constituição Federal (Direito Constitucional) nas escolas de nível fundamental e médio e no intuito de alterar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96), bem como da proposta no ano de 2015 do Deputado do PSD-BA, Fernando Torres, ou seja, o Projeto de Lei nº 403/2015, cuja ementa é a seguinte: "Torna-se Obrigatória a inclusão no Currículo Oficial de Ensino fundamental e médio as disciplinas Direito Administrativo, Direito Constitucional e Direito do Consumidor.

Tanto o Projeto de Romário, quanto o do Deputado Fernando Torres, encontram-se tramitando no Senado Federal e na Câmara dos Deputados, respectivamente. Um dos principais argumentos de Romário é que o jovem ao completar 16 anos adquire o direito de votar e consequentemente eleger seus representantes, o que é somado à necessidade de conscientização acerca dos direitos civis e políticos, bem como à formação de cidadãos conscientes no que diz respeito aos direitos e deveres individuais, sociais e coletivos. Já o PL 403 inclui outras matérias também de interesse da população e que a nosso ver não esvaziam o conteúdo do curso de direito.

Permissa venia para ir além, pois não apenas estes fatores se apresentam como argumentos fortes, como também a necessidade de conhecimento acerca da estrutura do Estado, dos Poderes da República e outros temas de grande relevância para a sociedade.

A Carta de 1988 completou 33 anos de vigência em 2021 e grande parcela da população não sabe sequer que possui o direito de impetrar habeas corpus sem advogado, que a Constituição fica no topo do vértice da pirâmide Kelseniana e que podem formular projeto de lei; aliás, limitam-se a tachar esse ou aquele político de ladrão, associando a corrupção ao crime de roubo ou furto previstos no Código Penal, sem que se atentem aos crimes de responsabilidade por absoluto desconhecimento da força normativa da Lei Maior.

No âmbito do direito administrativo, desconhecem a obrigatoriedade de resposta fundamentada a requerimentos administrativos protocolados diretamente no Ente Público, a possibilidade de denuncia aos Tribunais de Contas, os princípios regentes da administração pública e sua divisão didática e instrumental em direta e indireta. Ainda neste ramo do direito, entendemos necessário o incentivo à participação em audiências públicas e nos debates que envolvam interesses coletivos afetos ao administrado, tal como os orçamentos e a prestação de serviços públicos.

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No que diz respeito aos direitos do consumidor como parte de um pacote destinado à conscientização geral acerca daquilo que se pode exigir dos fornecedores e comerciante podemos destacar a possibilidade de queixa direta nos juizados especiais, a vulnerabilidade, os prazos de reflexão (já que a era digital faz com que compras sejam realizadas pela internet e via telefone), as praticas comerciais abusivas e os direitos básicos dos consumidores.

Lado outro, pelos investimentos destinados ao setor de segurança pública, diga-se de passagem, bastante relevantes, percebe-se nitidamente que não há interesse em instruir a população acerca de direitos relacionados à saúde, à educação, ao meio ambiente, a cultura etc. Se realizarmos uma pesquisa para se questionar o que é dignidade da pessoa humana e qual a diferença entre pessoa e cidadão, mais da metade da população dirá que não sabe.

No ramo da advocacia, nos deparamos com inúmeros profissionais que possuem renda abaixo do salário dos policiais militares por exemplo, basta olhar a remuneração de advogados e procuradores nos editais de concursos públicos, obviamente que sem desmerecer o trabalho desse guardiões da incolumidade pública, mas vivemos numa democracia participativa excludente, de modo que a criação de matérias em que os profissionais do direito fossem contemplados certamente promoveria valorização profissional, inclusão e justiça social, sem contar que investimento em educação é sempre o melhor remédio para a formação intelectual do povo brasileiro. O art. 205 do Carta Magna ao estabelecer que a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Constitui-se em norma programática de eficácia plena, pelo que não é uma faculdade do Estado e sim um dever, por se constituir num mandamento objetivo e de ordem imperativa.

É fácil ludibriar o povo em épocas de campanha eleitoral, como também o é perpetuar um sistema cujas pessoas vivem achando que não podem fazer nada para solucionar problemas estruturais ou mesmo participar diretamente da vida política e administrativa. Ademais, é simples o legislador previr que ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece ou o desconhecimento da lei é inescusável. Contudo, esse desconhecimento pode ser utilizado como excludente da culpa para a ceara do direito penal, considerando-se o homem médio e sua impossibilidade de tecnicamente compreender os ditames legais.

Conclui-se assim que a educação de jovens e adultos não é uma prioridade do governo brasileiro e que há uma desigualdade socioeconômica entre as classes policiais e dos professores. Relativamente aos advogados públicos temos uma enorme disparidade de salários que variam de um salário mínimo até o teto remuneratório previsto como limite, afetando significativamente os profissionais que ficam a mercê do Chefe do Poder Executivo local em determinados Entes municipais e em relação a condições condignas de vida, que no mais das vezes são chantageados a perder sua independência técnica e isenção profissional em troca de melhoria econômica em sua remuneração. O problema da educação é sistemático e histórico, não há investimentos na qualidade de vida dos professores, ocorrendo que alguns se deslocam quilômetros para lecionar em sítios, vilas e lugares inóspitos meramente por amor ao que faz. Desta forma, louvável as iniciativas dos Deputados Romário e Fernando Torres, que lutam para aprovar os Projetos de Lei 6.954 de 2013 e 403 de 2015, para fins de implementar alterações na Lei de Diretrizes e Bases da Educação com a inclusão das disciplinas Isso é uma luta que deve ser abraçada pelos advogados e a OAB, posto que representa a criação de posto de trabalho fixo, valorização profissional e curricular e, principalmente, o cumprimento do dever ético e cívico que deve nortear nossa atividade de implementação de uma consciência voltada à formação critica, intelectual e participativa da sociedade. Registre-se assim nosso manifesto público pela aprovação dos supracitados Projetos.

Sobre o autor
Paulo Silva Lima Wu

Advogado, Procurador Municipal. Especialização em Direito Constitucional; Especialização em Direito Processual Penal. Aprovado em 9 concursos públicos dentro das vagas. Consultor Jurídico para prova da segunda fase da OAB em Direito Constitucional. E-mail paul@wu3@yahoo.com.br e Telefone 081-996382475.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

WU, Paulo Silva Lima. Direito nas escolas de niveís fundamental e médio:: um manifesto em favor dos Projetos de lei 6.954/13 e 403/15. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6723, 27 nov. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/94996. Acesso em: 5 nov. 2024.

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