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Embriaguez: justa causa para extinção do contrato de trabalho?

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Agenda 07/03/2007 às 00:00

3. EMBRIAGUEZ

Considerando que o objetivo central deste trabalho é verificar se ainda hoje é possível considerar a embriaguez como justa causa para a extinção do contrato de trabalho, faz-se imperiosa uma investigação, ainda que superficial, sobre os efeitos do consumo desenfreado do álcool 101 e qual o papel da bebida em nossa sociedade, desde os primórdios.

3.1. A bebida através dos tempos

Segundo uma corrente científica da Universidade de Berkeley, a relação da humanidade com a bebida remonta aos ancestrais pré-humanos. Os primatas ancestrais do Homo sapiens, por terem uma dieta alimentar em grande parte constituída de frutas, teriam desenvolvido uma considerável atração pelo etanol, presente em frutas muito maduras 102.

A percepção dos vapores de etanol, desprendidos pelas frutas maduras, teria ajudado a sobrevivência destes primatas, pois a atração por esta substância os teria levado às florestas úmidas nos trópicos, onde haveria melhores condições de obterem comida 103, 104.

Fósseis de Vitis vinifera datados de cinqüenta milhões de anos foram encontrados na Groelândia, Europa Central, Inglaterra, América do Norte e Japão 105. Já a ingestão de bebidas alcoólicas surge no período Neolítico, com a fixação dos primeiros nômades que se lançaram à agricultura. É provável que o vinho, originário do Oriente, na região do Cáucaso, cerca de 7000 a.C., tenha sido descoberto ao acaso: há uma lenda persa que assim relata 106:

Jamsheed era um rei persa em cuja corte as uvas eram conservadas em jarros para que pudessem ser comidas fora da estação. Certa ocasião, um dos jarros começou a exalar um cheiro estranho, e as uvas nele contidas espumavam, por isso o jarro foi posto de lado para que ninguém se envenenasse. Uma jovem do harém, sofrendo dores de cabeça terríveis, resolveu suicidar-se bebendo o "veneno", só que, em vez de provocar sua morte, a beberagem lhe trouxe paz e um sono que lhe devolveu as forças. O rei, depois de ouvir a história da jovem, mandou que se fizesse uma quantidade maior de vinho, para que ele e sua corte pudesse tomá-lo 107.

A Bíblia também se refere ao consumo desta bebida: "Noé, que era agricultor, plantou uma vinha. Tendo bebido vinho, embriagou-se, e apareceu nu no meio de sua tenda" 108 (Gênesis, 9:20-21).

Na Grécia, à época das colheitas, o povo promovia festas por cinco dias em homenagem a Dionísio, deus do vinho, até que se alcançasse a embriaguez coletiva 109. Em Roma, todos os dias havia um consumo per capita de cerca de meio litro de vinho 110, que era objeto de culto e cuja fruição não era permitida às mulheres 111. O Código Justiniano fixava como parte da ração dos soldados a posca, espécie de vinho azedo 112.

No Egito, era atribuída a Osíris a criação do vinho e este era utilizado tanto para beber quanto para purificar o altar e as vítimas dos sacrifícios religiosos 113, sendo que as ânforas que guardavam a bebida continham a indicação do ano e local de engarrafamento, qualidade do vinho e do "chefe viñatero, ou seja, um rudimento do enólogo de hoje" 114.

Com a difusão do Cristianismo, o vinho passou a ter conotação religiosa: era o sangue de Cristo e indispensável na celebração de missas 115.

As bebidas destiladas somente passaram a ser consumidas a partir do século XVI; antes disso eram utilizadas apenas por suas propriedades medicinais 116.

Nesta época, os economistas passaram a considerar o consumo excessivo do álcool como causa da pobreza, pois o vício seria responsável pela incapacidade de autocontrole, inclusive no que tange ao crescimento populacional 117.

Já Marx e Engels viam o álcool como algo natural na classe trabalhadora, pois seria a única forma de dissipar a dor decorrente da jornada de trabalho excessiva 118.

Ao fim do século XIX, surgiu nos Estados Unidos uma frente pela proibição da venda de bebida alcoólica, o que chegou a se consumar com a Lei Seca. Entretanto, o surgimento de novas drogas ilícitas no século XX fez a "cruzada" contra o álcool perder sua importância 119.

Atualmente, o consumo de bebida alcoólica não só é considerado normal na sociedade, como poder-se-ia dizer que é incentivado pela sociedade, na medida em que a lei brasileira surpreendentemente permite a propaganda de cerveja e vinhos na mídia 120.

A cerveja possui papel de destaque entre as bebidas alcoólicas consumidas no Brasil. Dos cerca de US$ 106,000,000 gastos em propaganda de álcool na mídia em 2001, 80% foi em cerveja. Da mesma maneira, o consumo de cerveja representa 85% das bebidas alcoólicas consumidas. [...] Uma das pesquisas mais interessantes investigou por vários anos e comprovou o impacto que apreciar propagandas de cerveja aos 18 anos tinha sobre o consumo de álcool e o comportamento agressivo relacionado ao uso de álcool aos 21 anos. Outro estudo, dirigindo-se à faixa etária dos 10-17 anos, encontrou que gostar de propaganda e assistir propagandas com maior freqüência assocou-se [sic] com a expectativa de beber mais no futuro. Além disso, muitos dos jovens entrevistados sentiram que as propagandas de álcool os encorajavam a beber, especialmente os meninos de 10-13 anos, que aceitavam as propagandas como realísticas. No entanto, qualquer pessoa que já tenha assistido a alguma propaganda de álcool na televisão brasileira, verifica a agressiva utilização da sexualidade nas propagandas, especialmente no caso da cerveja. Também é fácil verificar que os (muito) jovens são certamente alvos das propagandas, com temas evidentemente voltados a eles (ex.: desenhos animados, festas rave, etc.). além disso, as indústrias têm desenvolvido produtos voltados a essa faixa etária (os produtos "ice", destilados misturados com refrigerantes ou sucos), e oferecido patrocínio a festas exclusivamente desse público-alvo (ex.: Skol Beats [sic]). Mas tão importante como as estratégias descritas acima, é a utilização do Brasil e de símbolos nacionais para a venda de álcool. Um exemplo bem recente e evidente dessa técnica ocorreu durante a Copa Mundial de Futebol, com a criação de uma tartaruga de desenho animado associada a uma marca de cerveja que foi denominada como a "torcedora símbolo da seleção brasileira" 121 122.

Com o advento da Lei n. 10.167, de 27 de dezembro de 2000, que restringiu a propaganda de cigarros apenas aos postos de venda, previa-se que o mesmo se desse com o álcool, o que até então não ocorreu, apesar de em 2002 haver mais de cinqüenta projetos de lei neste sentido 123.

Em nome desses para quem beber é uma perdição, deveríamos suspender tais propagandas, duas das quais [apresentam] mensagem turva e [de] mau gosto: um marido, entediadíssimo enquanto a mulher compra comida para os filhos, ao escutar algo que lhe lembra "bebida", anima-se, enche o carrinho, e ouve-se o comentário (cínico, no caso): "Beba com moderação".

Na outra, engraçada para um olhar desavisado, depois de beber as pessoas começam a se cumprimentar passando a mão no traseiro umas das outras. Quando sóbrias, cumprimentavam-se apenas com um simples abraço rápido. Recado para os desprevenidos: "Bêbados, ficamos mais ousados, mais interessantes, a vida é mais gostosa...".

[...] [É angustiante] a negligência com uma questão tão grave, que para alguns nunca chega a ser um drama, porém para outros funciona como uma arma contra si e contra todos – tão fatal quanto balas perdidas ou tiros intencionais 124.

3.2. Dependência química: efeitos físicos e psicológicos

A ingestão de bebidas alcoólicas, por si só, não significa vício, embriaguez, alcoolismo. Parte significativa daqueles que consomem bebidas alcoólicas o fazem "socialmente", ou seja, em reuniões familiares ou de amigos, solenidades, brindes, como forma de "aquecer-se" nas regiões de clima frio, entre outras possibilidades de integração social. A bebida também pode ser utilizada como aperitivo, se consumida antes das refeições, ou digestivo, se após, além de também fazer parte das "normas de etiqueta" oferecer algo para as visitas beberem, como uísque ou licor 125.

O consumo moderado de bebida alcoólica corresponde a uma dose diária para as mulheres e duas para os homens – os números se reduzem à metade para os maiores de 65 anos 126. Uma dose equivale a cerca de 10 a 14 gramas de álcool, o que significa, por exemplo, uma taça de 150 ml de vinho, uma lata de cerveja ou um copo de 40 a 50 ml de bebida destilada 127.

A quantidade ingerida deve ser menor para as mulheres, pois elas têm maior dificuldade para diluir o álcool e o metabolizam mais lentamente. Ademais, as mudanças hormonais no período pré-menstrual aceleram a intoxicação alcoólica e o uso de pílulas anticoncepcionais reduz a eliminação da substância pelo organismo 128.

O que separa, então, o consumidor eventual – ou mesmo o habitual que não apresenta os sintomas da doença – do alcoólatra? A resposta está na dependência química gerada pelo álcool, cujo grau varia de pessoa para pessoa, embora ainda hoje muitos psiquiatras acreditem que o alcoolismo seja um problema decorrente da falta de força de vontade 129.

Contudo, não se pode olvidar que o álcool é uma droga 130 psicotrópica, e como tal pode alterar os estados mentais ou psíquicos do indivíduo, agindo no cérebro e alterando suas sensações, pensamentos e comportamento 131. Neste passo, o álcool pode levar à dependência física e psicológica, mas as causas que determinam quem irá se tornar dependente ainda são controvertidas 132.

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Parte da comunidade científica crê que a razão pela qual algumas pessoas são mais suscetíveis ao alcoolismo que outras é genética: pesquisadores da Universidade de Illinois publicaram em maio de 2004 na revista Jornaul of Neuroscience um estudo que indica que uma deficiência no gene que processa uma proteína denominada CREB aumenta a ansiedade pela ingestão de álcool e, liberado o acesso à bebida, também aumenta o consumo 133.

A dependência é caracterizada pelo modo distorcido empregado por um indivíduo para utilizar uma substância, é um impulso incontrolável de utilizar uma droga de forma contínua ou periódica com o objetivo de obter prazer 134, ou ainda de evitar a dor 135.

A dependência química se apresenta sob duas formas: a dependência física e psicológica da substância. A dependência física é caracterizada pela presença de sintomas físicos extremamente desagradáveis que surgem quando o indivíduo interrompe ou diminui de forma abrupta o uso da droga, o que constitui na síndrome de abstinência. Quanto à dependência psicológica, as principais características compreendem um intenso mal estar psíquico, levado por sintomas de ansiedade, depressão, dificuldades de concentração, entre outros, a partir do momento em que o indivíduo pára de ingerir a droga na freqüência e quantidades habituais. Nesse caso, o dependente tem a sensação de ser incapaz de realizar qualquer atividade cotidiana sem o consumo da droga, mesmo que não tenha nenhum sintoma físico característico da abstinência 136.

Há constatação científica de que o álcool influencia o sistema mesolímbico, ativando o sistema de recompensa cerebral por meio dos transmissores dopamina e endorfina, razão pela qual, após a adesão à utilização inicial de drogas, o indivíduo não mais pode exercer normalmente o autocontrole para se livrar do vício, em razão da dependência biológica do álcool 137.

Ao contrário do que comumente se pensa, o álcool age como depressivo no sistema nervoso central (SNC), e não como estimulante – embora nas fases iniciais apresente características de estimulante. Como substância depressora do SNC, diminui a sensação de dor, além de passar uma sensação de tranqüilidade e desligamento da realidade 138.

A dependência física leva à síndrome da abstinência alcoólica (SAA) no caso de interrupção abrupta da ingestão de álcool. A cada vez que um dependente passa por um período de abstinência, os sintomas se tornam mais graves, podendo levar até mesmo à morte nos casos sem tratamento 139. No início, a SAA caracteriza-se, via de regra, pelos seguintes sintomas e sinais: "agitação, ansiedade, alterações de humor (disforia), tremores, náuseas, vômitos, taquicardia e hipertensão arterial" 140. Com a repetição do quadro de abstinência, passa a estar relacionada a convulsões 141, alucinações, delirium tremens 142 e síndrome de Wernicke-Korsakoff (SWK) 143, 144.

A necessidade do álcool, para os alcoolistas, é de tamanha importância que, na falta de bebida alcoólica, eles ingerem o que lhes chegue às mãos, por exemplo: perfumes, água-de-colônia, extratos, álcool puro, etc., o que mostra que o álcool não é fonte de prazer, de gosto, mas de necessidade 145.

Mas se por um lado a supressão do consumo de álcool pode causar graves conseqüências para o dependente, é certo que a ingestão excessiva de bebidas alcoólicas gera sérios danos à saúde física e mental do indivíduo:

Dessa forma, para evitar o agravamento das complicações de sua saúde, sem passar pela síndrome da abstinência, deve o indivíduo procurar auxílio médico, geralmente fazendo uso de uma das seguintes substâncias, ou combinação delas: naltrexona – bloqueia o prazer do álcool –, acamprosato – reduz a sensação de diminuição da dor –, ondansetrona – inibe o vômito –, dissulfiram – causa mal estar no caso de ingestão de álcool 147 – ou topiramato – diminui o desejo de consumir álcool 148.

A dependência psicológica não é menos grave que a física. Como a ingestão de álcool geralmente causa uma sensação de bem-estar, é comum associar-se equivocadamente seu consumo "ao alívio de tensões emocionais ou preocupações do indivíduo" 149, razão pela qual a pessoa passa a acreditar não ser capaz de enfrentar as tribulações diárias sem consumir bebidas alcoólicas, sob pena de aumentar sua ansiedade, causando-lhe angústia 150.

Sobre as causas da dependência psicológica, muito embora as conclusões relatadas por médicos e psicólogos se afigurem preconceituosas, não se pode negar que a maior parte considera que os alcoólicos, via de regra, têm baixa estima, dificuldades para se relacionar – principalmente com indivíduos do sexo oposto –, apresentam sinais de imaturidade e pouca resistência à frustração, além de serem geralmente descritos como pouco sociáveis, deprimidos, retraídos e oriundos de lares desfeitos ou têm relação conturbada com os pais 151.

Segundo a teoria da gratificação narcísica, a busca pelo prazer por meio do álcool seria determinada pela vontade de obter satisfação sem a necessidade de participação de outro indivíduo 152.

Em Lacan, a melhor definição da droga vem ensinar que ela é aquilo que serve "para romper com o pequeno pipi", indicando assim um dispositivo para romper com o gozo que não passa pelo Outro, um gozo ex-sexo. "O que é lamentável, evidentemente, é que, de um objeto de gozo que não é metaforizado, que não é regido pelo significante, fica-se escravo vem mais ainda que de qualquer outro objeto" 153.

Para os adeptos da teoria da oralidade, os alcoólicos seriam pessoas presas à fase oral do desenvolvimento humano, sendo que "a relação com a droga representaria a satisfação das necessidades orais [...] com sentimento de triunfo sobre outros indivíduos 154.

A teoria das relações maníacas combina as idéias das teorias anteriormente descritas, afirmando que a personalidade oral, com destaque para as relações narcisistas de objeto, levaria à utilização de substâncias psicotrópicas como forma de se sentirem superiores às demais pessoas 155.

Segundo Freud, o consumo do álcool teria por objetivo tornar o indivíduo desinibido e libertaria a libido homossexual. Assim, a teoria das perversões relaciona o uso de bebidas alcoólicas com a perda das barreiras da homossexualidade e do sadomasoquismo 156.

Vaillant (1983/95) também estudou o impacto da figura da mãe [...]. Concluiu que mães que proporcionaram cuidados inadequados não aumentaram a chance de ter filhos alcoolistas, e mais, que mais que proveram relações calorosas não tiveram menos alcoolismo do que as demais na prole. Tais achados se contrastam com os relativos a [sic] figura paterna pois claramente uma relação calorosa com o pai foi capaz de gerar menos alcoolismo, e inversamente, foi marcante a prevalência de abuso alcoólico entre aqueles que tiveram má relação com o pai 157.

É verdade que o ambiente e a criação são capazes de influenciar a relação do indivíduo com a bebida. Entretanto, afirmar que todos os alcoólicos tiveram "mães insuficientemente boas, problemas orais, homossexualidade latente, caracter [sic] perverso, ou uma particular forma de distúrbio de humor parece escapar ao bom senso" 158.

Os fatores sociais que mais interferem na dependência do indivíduo são:

[Entre os jovens, já se popularizou o ritual do esquenta balada, que se] inicia em casa, na rua, lojas de conveniência, postos de gasolina e estacionamentos de supermercados 24 horas, antes de entrarem para os bares e casas noturnas, pois de acordo com os jovens, com o dinheiro de uma garrafa de uma [sic] cerveja na balada, compra-se até cinco nestes outros lugares 163.

A embriaguez simples ou patológica subdivide-se em três fases: incompleta – também conhecida como fase do macaco ou da excitação – completa – fase da confusão ou do leão – e comatosa – fase superaguda ou do porco 164.

A respeito das fases da embriaguez, há interessante lenda no folclore israelita:

Noé, logo após o dilúvio, resolveu dedicar-se à agricultura.

Estava de cócoras, preparando a terra para o plantio, quando lhe apareceu o diabo e perguntou com ar de deboche:

– Que estás a fazer, nessa grotesca posição, ó velho?

– Vou organizar aqui uma vinha – responde o patriarca, imperturbável.

O diabo quis saber ainda mais:

– Esperas uma boa colheita? Como são os frutos?

– Oh, sim. Os frutos são deliciosos, um verdadeiro manjar dos deuses. Tanto podem ser saboreados maduros, como secos. Além disso, pode-se extrair deles um caldo precioso que se transforma numa bebida de excelente paladar: o vinho, que é um poderoso estimulante e proporciona ao homem sonhos paradisíacos.

– Então, quero ser teu sócio na lavoura – diz autoritariamente o Maligno.

Noé aceitou a proposta, com a condição de ficar o seu parceiro encarregado de regar e adubar a terra.

Astuto e maldoso como ele só, o diabo fez a adubagem com o sangue de quatro animais retirados da Arca: o cordeiro, o leão, o porco e o macaco.

Por isso, com freqüência, estamos a presenciar o procedimento irregular daqueles que se embriagam. Uns tornam-se mansos e inofensivos como o carneiro; outros, valentes e agressivos como o leão; muitos, indolentes e estúpidos como o porco. Há, finalmente, os que, com seus trejeitos e estroinices, assumem a atitude perfeita do macaco 165.

Doutrinariamente, na fase de embriaguez incompleta, a pessoa torna-se falante, agitada, divertida, mas ainda tem consciência de seus atos e é capaz de determinar seus próprios atos. Na fase completa, o indivíduo torna-se agressivo, podendo ofender ou agredir fisicamente outras pessoas e não se lembrar do ocorrido no dia seguinte. Já na fase comatosa, o alcoolista somente causa mal a si próprio, pois permanece letárgico 166.

Com a intensificação da dependência, o organismo do indivíduo se torna mais tolerante ao álcool. Isso significa que a pessoa passa a sentir de necessidade de aumentar o consumo de bebidas alcoólicas para obter o mesmo efeito de embriaguez obtido nas primeiras doses. Por exemplo, se antes uma dose de uísque era o bastante para transmitir uma sensação de tranqüilidade, após duas semanas são necessárias duas doses para assegurar tal sensação. A dependência e a tolerância estão interligadas. Quanto maior a dependência, maior a tolerância à bebida e vice-versa 167.

Neste passo, a verificação de quem é dependente químico do consumo de bebidas alcoólicas é fundamental, pois o alcoolismo somente pode ser considerado doença na hipótese de conjugar tolerância ao álcool, síndrome de abstinência – ainda que leve – e perda do controle sobre a vontade de não beber 168.

A Classificação Internacional de Doenças 169, atualmente na décima revisão (CID-10), inclui como doença as seguintes formas de alcoolismo:

Delirium tremens (induzido pelo álcool)

A evolução clínica do alcoolismo 171 pode ser constatada pelos seguintes fatores:

A Organização Mundial de Saúde estabelece que um diagnóstico definitivo de dependência pode ser feito se constatados três ou mais dos seguintes requisitos nos últimos doze meses:

Desta forma, enquadrando-se o indivíduo nos quadros de alcoolismo-doença, torna-se evidente que a prioridade em relação a ele é prescrever um tratamento adequado para a minimização dos efeitos do consumo desregrado de bebidas alcoólicas, não apenas para proteger sua saúde física e mental, mas para reinseri-lo na sociedade, proporcionando-lhe a oportunidade de se reconciliar com sua família, como também de reconquistar sua dignidade por meio do trabalho.

Sobre a autora
Flavia Ferreira Pinto

bacharel em Direito pelo Centro Universitário de Brasília

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PINTO, Flavia Ferreira. Embriaguez: justa causa para extinção do contrato de trabalho?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1344, 7 mar. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9575. Acesso em: 23 nov. 2024.

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