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Imunidade tributária a templos religiosos uma análise crítica

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Agenda 18/02/2022 às 15:06

A imunidade tributária a templos de qualquer culto vem sendo alvo de críticas ante os inúmeros casos de enriquecimento ilícito e outras fraudes.

Resumo: O presente artigo tem como objetivo analisar a concessão da imunidade tributária a templos de qualquer culto, conforme previsão do artigo 150, VI, da Constituição Federal de 1988, de forma que se evidencie a necessidade da desoneração a este tipo de atividade, assim como visa delimitar o alcance desta benesse tributária. A imunidade tributária a templos de qualquer culto tem sido constantemente abordada na mídia diante dos inúmeros casos de enriquecimento ilícito e outras fraudes, de modo que passou a ser alvo de discussões quanto a sua concessão e sua real importância, sendo, inclusive, alvo de tentativas de supressão no texto normativo. Diante desta perspectiva, se constrói a análise histórica no contexto das Constituições Brasileira, seu impacto social e moral. O objetivo geral consiste em compreender a imunidade tributária a templos religiosos uma análise crítica. A abordagem é qualitativa, e método dedutivo. Os resultados demonstram que a partir da imunidade tributária o legislador constituinte buscou garantir o livre exercício a templos e seitas religiosas, de modo que não fossem criados obstáculos ao seu funcionamento.

Palavras-Chave: Imunidade Tributária, Templos Religiosos, Impostos


INTRODUÇÃO

Oficialmente, o Brasil é considerado um país laico e teísta, ou seja, é um país que busca a liberdade religiosa, para que seus cidadãos profetizem sua fé em cultos ou templos de sua escolha, assim como podem ainda optar por não seguir qualquer religião.

Sabbag (2018) reforça que apesar de ser um Estado Laico, não quer dizer que deixou de ser teísta. Isso pode ser constatado no próprio preâmbulo da Constituição Federal de 1988, quando seu texto menciona à proteção de Deus sobre os representantes brasileiros. Assim, cabe ressaltar que a intenção dos legisladores constituintes não foi a de aproximar Estado e igreja, independente de religião, mantendo-se desta forma distante e garantindo a seus cidadãos o pluralismo religioso.

Apesar desse distanciamento do Estado e igreja, a Constituição Federal de 1988 garante ao cidadão sua liberdade de professar sua fé, assim como, garante o livre exercício de templos religiosos, não podendo o Estado vir a criar embaraços ao seu funcionamento. Foi pensando nestas garantias e direitos dos cidadãos, que surge a benesse da imunidade tributária.

A aplicação da imunidade tributária a templos de qualquer culto mostra-se um tema cada vez mais atual e de grande relevância social, vez que existe um crescimento das atividades religiosas e uma facilitação na criação de novos templos. Deste modo, cabe salientar que a Constituição Federal de 1988 tem sob sua proteção da imunidade o patrimônio, serviços e renda, que sejam advindos de finalidades consideradas essenciais dos templos, conforme destaca o § 4º do art. 150, da CF/88.

Por conseguinte, cabe mencionar que conforme a sociedade avança em sua evolução, fica cada vez mais fácil a propagação e a disseminação de templos e cultos religiosos, por isso se faz necessário um estudo mais aprofundado do tema para que se possa evitar que a concessão da imunidade a templos de qualquer culto, não seja utilizada com desvio de finalidade, buscando proteger, conforme estipulado pelo legislador constituinte, valores morais e éticos, não podendo permitir que se utilize contrariamente ao que estipula a Carta Maior.

Destarte, o presente trabalho visa estudar a imunidade tributária concedida pela Constituição Federal de 1988, a templos de qualquer culto, de modo que se possa compreender a imunidade tributária a templos religiosos numa análise crítica. Além disso, o estudo pretende conceituar a imunidade tributária, assim como também, explicar a imunidade a templos de qualquer culto e, por fim, demonstrar a imunidade religiosa como uma análise crítica perante essa desoneração e os impactos que ela produz.


1 IMUNIDADE TRIBUTÁRIA

Conforme explica Medeiros (2020), a doutrina traz diversos posicionamentos acerca do conceito de imunidade tributária, sendo que uns posicionam-se no sentido de que a imunidade é a limitação constitucional ao poder de tributar e outras correntes entendem que se trata de uma regra excludente ao poder de tributar. Havendo também quem defenda ser um princípio emanado da própria constituição, que se traduz como vedação impositiva, com direcionamento específico aos entes federados, aduz Rocha (2018).

Nos ensinamentos de Sabbag (2018), a imunidade se revela como norma constitucional, tratando-se de uma dispensa legal, ao que diz respeito ao dever de tributar. Corrobora (MACHADO, 2012, p.287) Imunidade é o obstáculo decorrente de regra da Constituição à incidência de regra jurídica de Tributação.

Almeida (2018) destaca que a imunidade tributária vem expressa no artigo 150, da Constituição Federal de 1988, com o intuito de impedir que União, Estados, Distrito Federal, assim como os Munícipios, deste modo limitando a competência no que tange a tributação de impostos de instituições que constam no rol descritos nos incisos do artigo 150, da CF/88.

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Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

[...]

VI. instituir impostos sobre:

(BRASIL, 1988).

Ainda neste ínterim, Sabbag (2018) enfatiza que tal imunidade irá afetar somente a obrigação tributária principal, ou seja, irá atingir somente a obrigação de pagamento patrimonial do tributo, não podendo este se estender as obrigações chamadas acessórias, que são deveres do contribuinte que permanecem intocáveis. Deste modo, entende-se que imunidade vem a ser uma proibição para o Estado, ao seu poder tributante, pois a constituinte pôs uma barreira, limitando desta forma o surgimento de impostos sobre fatos que estejam determinados na carta maior.

Ademais, Moraes (2018) aduz o quão essencial se mostra a limitação constitucional ao poder de tributar, vez que demonstra o cuidado relacionado a garantias jurídicas, assim como garante também direitos individuais, visando evitar possíveis abusos e deste modo garantindo uma boa relação entre o contribuinte e o fisco.

Por fim, destaca-se que a utilização da imunidade tributária não busca privilegiar alguns em detrimento de outros, e sim é instrumento para que se possa propiciar a proteção, assim como a promoção de valores vistos como essenciais em meio a sociedade, conforme destaca Almeida (2018).

A Constituição Federal de 1988, traz em seu texto expressamente as imunidades tributárias, assim Medeiros (2020), discorre que existem cinco espécies de tributos, ao qual essa classificação serve como base para o afastamento de possíveis vícios. Deste modo, é necessário se ater aos seguintes tributos: impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições.

De acordo com Rocha (2018), o alcance da imunidade tributária para templos de qualquer culto, não se baseia somente aos impostos de patrimônio, mas também renda e serviços considerados de finalidade essenciais advindas de organizações religiosas, mas afeta também qualquer imposto que venha a aumentar o patrimônio da entidade, é o caso do IOF.

Neste ínterim, Taiar (2017) descreve que a norma imunizante irá recair somente sobre bens patrimoniais, rendas e serviços que devem demonstrar sua finalidade essenciais ligadas as entidades religiosas, desta forma, quando não comprovado que tais atividades de serviços ou rendas, não são provenientes, ou com destinação a promover manifestações religiosas, não é possível que seja atribuído a imunidade tributária.

Percebe-se, assim, que, em todas as imunidades elencadas pelo constituinte, há um claro interesse de assegurar direitos ou incentivar atividades necessárias e vitais à sociedade. Por serem referidos direitos e atividades de altíssima relevância, têm os Tribunais entendido que, aos comandos constitucionais instituidores de imunidade tributária, somente pode se aplicar a interpretação extensiva, uma vez que, dado ao fato de o Estado estar sempre necessitando de recursos, tendo em vista seu permanente déficit operacional, se se adotasse uma interpretação restritiva dos comandos do art. 150, VI, abrir-se-ia a possibilidade de o Poder Tributante, em suas constantes necessidades fiscais, atingir as atividades e direitos garantidos pelo Texto Supremo, sob a alegação de que as normas instituidoras de imunidade tributária devem ser interpretadas restritivamente (MARTINS, 1994, p. 46).

Do mesmo modo, Medeiros (2020) retrata a previsão constitucional em seu artigo 150, VI, alíneas a a e, onde o texto normativo é explícito ao vedar a cobrança de impostos com incidência sobre patrimônio, renda e serviços de templos de qualquer culto, entes e partidos políticos, entidades sindicais dos trabalhadores, assim como as instituições de educação e aquelas que prestam assistência social sem fins lucrativos, veda a tributação sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão, são elencados também fonogramas e videofonogramas musicais que são produzidos no país.

Inclusive, conforme Alvino (2017) a norma constitucional que estipula a desoneração de impostos a templos, não alcança a não tributação relativa a contribuições de melhoria, taxas e demais tributos, devendo estes serem pagos, não havendo previsão constitucional para essa imunização.

Insta registrar o entendimento do STF, em súmula vinculante nº 52:

Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo artigo 150, inciso VI, alínea c, da Constituição Federal, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades para as quais tais entidades foram constituídas.

Deste modo, como aponta Moraes (2018), não somente vinculado ao patrimônio, imóveis utilizados pelas entidades religiosas, deve ser interpretado como beneficiário da imunidade tributária, bens que são utilizados por essas entidades, é o caso de conventos, residências de religiosos, sacristias etc., devendo ter provas dessa relação.


2 A IMUNIDADE A TEMPLOS DE QUALQUER CULTO

2.1 A Laicidade no Brasil

Conforme destaca Sabbag (2018), o Brasil é um país expressivamente em sua maioria católico, porém é também um país laico, ou seja, desde que foi proclamado a República, o Estado não se manifesta de maneira religiosa. Como lembra Medeiros (2020), iniciado o período do Brasil Império, houve a edição de uma nova Constituinte em 1824, que trouxe de forma implícita imunidade as igrejas católicas, pois a carta magna reconhecia o catolicismo como sendo a religião oficial da era do império, portanto não havia o que se falar em cobrar impostos das igrejas.

Vale ressaltar que no Brasil, a primeira Constituição a trazer em seu texto normativo expressamente sobre a imunidade quanto a tributação de templos religiosos foi a Constituição de 1937, em seu artigo 32, b.

Art. 32 É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

  1. criar distinções entre brasileiros natos ou discriminações e desigualdades entre os Estados e Municípios;
  2. Estabelecer, subvencionar ou embaraçar o exercício de cultos religiosos;

[...] (BRASIL, 1937).

Assim, antes da promulgação da constituinte de 1937, a impossibilidade de tributação de entidades religiosas se deu através de legislação ordinária, e a não incidência somente veio a possuir estatura constitucional após a Constituição de 1946 acrescenta Sabbag (2018).

Art. 31 A União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios é vedado:

[...]

V lançar impostos sobre:

  1. bens, rendas e serviços um dos outros, sem prejuízo da tributação dos serviços públicos concedidos, observado o disposto no parágrafo único deste artigo;
  2. templos de qualquer culto bens e serviços de Partidos Políticos, instituições de educação e de assistência social, desde que as suas rendas sejam aplicadas integralmente no País para os respectivos fins;

[...] (BRASIL, 1946).

A laicidade no Brasil, permitiu que houvesse um distanciamento entre Estado, suas instituições públicas e as relações da sociedade. Dessa forma, como discorre Sabbag (2018), o Estado conseguiu manter sua independência na tomada de decisões, sem se apegar a dogmas religiosos, assim buscando evitar, pelo menos na teoria que pudesse vir a existir uma intromissão por parte de organizações religiosas.

Para Rocha (2018), a imunidade dos templos de qualquer culto, tem como intuito a preservação e escolha da fé, sem que haja uma interferência do Estado, essa separação da igreja e Estado veio a ocorrer com a promulgação da Constituição Republicana de 1891. Ainda neste sentido, Almeida (2018), aduz que após a promulgação da Constituição de 1891, estabeleceu no Brasil o princípio da generalidade, dando início a uma nova era de destituições fiscais, bem como isenção e imunidade a pagamento de tributos.

Salienta-se ainda, através das palavras de Moraes (2018), que a Constituição Federal de 1988, ao trazer em seu preâmbulo a evocação à proteção de Deus, permite e reitera a laicidade do Brasil, com isso afastando qualquer possiblidade de ingerências no Estado, bem como garante aos cidadãos a liberdade de profetizar sua crença, assim como traz proteção jurídica aqueles que optam por não cultuar sua fé, como é caso dos ateus e agnósticos.

Segundo interpretação de Novelino (2018), é preciso que um Estado laico não seja conivente com qualquer manifestação ou referências de cunho religioso, ou antirreligiosos em declarações políticas, ou ainda em cerimônias oficiais. Devendo o Estado saber separar os deveres pátrios, com qualquer movimento de viés religioso ou contrário a ele.

Deste modo, o Estado tem o dever de se manter neutro mediante manifestações religiosas, de modo que não cause obstáculos, ou influência no seu livre exercício, é o que mostra o artigo 19, da Constituição Federal de 1988.

Art. 19 É vedada à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvenciona-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração do interesse público.

[...] (BRASIL, 1988).

Para Novelino (2018), havendo interferência do Estado em assuntos relacionados a liberdade religiosa, sem que haja uma justificativa constitucional, de modo que tal iniciativa venha a prejudicar suas práticas religiosas, ou beneficiar alguma religião especifica, deve então ser declarada uma medida violadora de direitos e liberdade.

Por fim, visando proteger a livre escolha do cidadão em profetizar sua fé, ou ainda sua escolha em não crer em um Ser Superior, é que a Constituição de 1988, assegura em seu artigo 150, VI, b, a impossibilidade de tributação dos templos.

2.2 Imunidade religiosa: templo e culto

Precipuamente, Harada (2018) reforça que expressão utilizada templos de qualquer culto, não se refere somente ao local, edifício onde são realizados os cultos e outras práticas religiosas, mas destaca também que a expressão se refere ao próprio culto e todos os ritos a ele ligados.

Logo se faz necessário compreender os significados de culto e templo. Carraza (2017), define como templo o edifício principal onde se realiza celebrações, assim como os anexos, que seriam locais que auxiliam na concretização e viabilizam a realização do culto. Aliomar Baleeiro inclui na imunidade o convento, os anexos inclusive a residência do pároco ou pastor, assim como a embarcação, o avião ou o veículo utilizado como templo móvel exclusivamente para a prática do culto, citado por (HARADA, 2018, p. 402).

No entendimento de Sabbag (2018), o culto deve enaltecer e propagar a fé, fazendo com que o cidadão tenha a liberdade para expressa-la sem colocar em risco sua dignidade, ou ferindo a existência de outros. Assim como, não pode vir a ferir outros preceitos inclusive aqueles impostos pelo Estado, devendo partir da premissa que as organizações religiosas se manterão atentas a moral e valores de cunho religiosos, correndo o risco caso de descumprimento de não ser reconhecido a imunidade tributária.

O dicionário da língua portuguesa traz como definição de culto:

Reverência ou veneração que se presta a um santo ou a uma divindade em qualquer religião.

Conjunto de práticas e ritos organizados por uma religião que são dedicados a uma divindade; ritual.

Cerimônia religiosa na maioria das igrejas protestantes.

Expressão religiosa considerada como um todo, do ponto de vista da fé ou de suas manifestações externas.

Veneração ou intensa admiração que se tem por alguém ou por alguma coisa.

[...] (MICHAELIS, 2020).

Desta forma, Sabbag (2018) é claro ao dizer que os cultos devem enaltecer seus valores e a propagação da sua fé, sem que sua prática venha a impactar de forma a denegrir a dignidade da pessoa humana, ou que venham de encontro a se opor a pilares que foram estabelecidos pelo Estado. Segundo Novelino (2018), o culto é uma das formas de expressar sua crença, podendo essa liberdade ser exercida em locais abertos, devendo seguir certos limites, ou ainda podem ser exercidos em templos, sendo que estes são garantidos a imunidade tributária.

Neste sentido, é claro dizer que a Constituição Federal não protege, menos ainda reconhece, a existência de seitas satânicas e demoníacas, tampouco aquelas que possuam elementos atípicos que venham a propagar discurso de ódio, violência, descriminação. Moraes (2018) aduz que mesmo tendo garantido constitucionalmente a liberdade religiosa, assim como outras liberdades garantidas pelo texto constitucional, deve-se atentar a não cometer atos que possam ferir a dignidade da pessoa humana, pois as práticas desses atos podem vir a sofrer consequência de penalização civil e criminal.

Sobre a autora
Bianca Larissa Dias de Freitas

Bacharel do Curso de Direito da Universidade da Região de Joinville Univille (2020); Pós Graduação Lato Sensu Especialização em Direito e Gestão Corporativa na Instituição de Ensino UniAmérica; Pós Graduação Lato Sensu Especialização em Direito Público: Licitações e Contratos na Instituição de Ensino UniAmérica; Pós Graduação Lato Sensu Especialização em Direito Digital e Compliance na Instituição de Ensino UniAmérica; Pós Graduação Lato Sensu Especialização em Direito Tributário na Instituição de Ensino Cenes

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FREITAS, Bianca Larissa Dias. Imunidade tributária a templos religiosos uma análise crítica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 6806, 18 fev. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/96430. Acesso em: 21 nov. 2024.

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