A figura do "quinto Constitucional" surgiu na Constituição Federal de 1934, acabando, assim, com a via única ao ingresso na magistratura, que até então se dava através de concurso público.
O art. 104, parágrafo 6 º, daquela Carta fora disciplinado nos seguintes termos:
"Na composição dos Tribunais superiores serão reservados lugares, correspondentes a um quinto do número total, para que sejam preenchidos por advogados, ou membros do Ministério Público de notório merecimento e reputação ilibada, escolhidos de lista tríplice, organizada na forma do § 3º".
O sentido daquele texto constitucional fora mantido durante o regime de 1937, in verbis:
"Na composição dos Tribunais superiores, um quinto dos lugares será preenchido por advogados ou membros do Ministério Público, de notório merecimento e reputação ilibada, organizando o Tribunal de Apelação uma lista tríplice".
Monofazendo-se uma análise literal dos sobreditos preceitos constitucionais, observa-se que eles não defendiam a paridade nas vagas destinadas ao quinto. Em outras palavras, para os mencionados sistemas a lista tríplice poderia ser formada simultaneamente por membros da OAB e do MP. É o que observou o erudito Pontes de Miranda:
"Como se vê, era total a comunicabilidade, dentro do quinto, entre os lugares ocupados por advogados ou membros do Ministério Público, sendo sempre franqueada a escolha de uns ou outros, até mesmo por meio de organização de listas mistas."
Foi com intuito de dirimir o conflito e estabelecer equilíbrio às oportunidades oferecidas às classes da OAB e do MP, a Constituição Federal de 1946 prescreveu no art. 124, V:
"Na composição de qualquer Tribunal, um quinto dos lugares será preenchido por advogados que estiverem em efetivo exercício da profissão e membros do Ministério Público, de notório merecimento e reputação ilibada, com dez anos, pelo menos, de prática forense. Para cada vaga, o Tribunal, em sessão e escrutínio secretos, votará lista tríplice. Escolhido um membro do Ministério Público, a vaga seguinte será preenchida por advogado" (Redação dada pela Emenda nº 16 de 1965).
No entanto, como se vê esse texto constitucional ainda não assegurava a coexistência permanente e paritária dos representantes de ambas as classes, sempre que o quinto se mostrasse superior. Com a intenção de sanar essa deficiência o Constituinte de 1967, dispôs em seu art. 144, IV, que:
"Na composição de qualquer Tribunal, um quinto dos lugares será preenchido por advogados, em efetivo exercício da profissão, e membros do Ministério Público, todos de notório merecimento e idoneidade moral, com dez anos, pelo menos, de prática forense. Os lugares reservados a membros do Ministério Público ou advogados serão preenchidos, respectivamente, por membros do Ministério Público ou advogados, indicados em lista tríplice".
Muito embora tenha o constituinte derivado tentado garantir a paridade constitucional, através das Emendas supracitadas, ele não o fez, já que não havia solução explícita para hipóteses de provimento das vagas em Cortes que possuíssem número ímpar. Assim, é evidente que a aplicação somente da alternância não trazia resguardava o cumprimento do "quinto constitucional".
Foi somente em 1979, com o advento da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar nº 35), que o legislador infraconstitucional regulamentou o "quinto constitucional", e enterrou de vez o embate entre as duas classes. Neste sentir é o art. 100, parágrafo 2 º da LOMAN, in verbis:
"§ 2º. Nos tribunais em que for ímpar o número de vagas destinadas ao quinto constitucional, uma delas será, alternada e sucessivamente, preenchida por advogado e por membro do Ministério Público, de tal forma que, também sucessiva e alternadamente, os representantes de uma dessas classes superem os da outra em uma unidade.
Como visto, o legislador infraconstitucional regulamentou eficientemente o princípio do "quinto constitucional", a partir do momento em que privilegia a paridade e a alternância entre as classes envolvidas. Também, o mencionado dispositivo legal, garantiu equilíbrio de oportunidades entre concorrentes da OAB e do MP, equilíbrio na igualdade do número de representantes, e somente aplicando-se a hipótese de alternância no art. 100, parágrafo 2 o, da LOMAN.
O Constituinte de 1988 manteve o "quinto constitucional" em seu art. 94 [01], assegurando, assim, um quinto das vagas dos tribunais para membros do Ministério Público e da Ordem dos Advogados do Brasil, e também recepcionou a Lei Orgânica da Magistratura Nacional, que conforme já dito regulamentou esta matéria constitucional.
A Carta Magna de 1988 extinguiu o Tribunal Federal de Recursos, e criou o Superior Tribunal de Justiça e cinco Tribunais Regionais Federais. No entanto, no âmbito deste artigo, apenas nos convém tratar do Tribunal Regional da Terceira Região, que abrange os Estados de Mato Grosso do Sul e de São Paulo.
Inicialmente o TRF da 3º Região era composto, apenas, por 18 (dezoito) Desembargadores Federais, sendo 14 (quatorze) magistrados, e as outras 4 (quatro) vagas, preenchidas por membros do Ministério Público Federal e da Ordem dos Advogados do Brasil. Posteriormente este número fora elevado à 27 (vinte e sete) Desembargadores Federais.
Em 2000 fora promulgada a Lei n. 9.968, que criou 16 (dezesseis) cargos de Desembargadores Federais, e elevou de 27 para 43 o número assentos na mencionada Corte. Com efeito, o Regimento Interno do Tribunal foi alterado, passando a ter a seguinte redação (publicado no DJ de 07/07/2003, Seção 2, p. 231):
"O Tribunal Regional Federal da 3º Região, com sede na Capital do Estado de São Paulo e jurisdição sobre às Seções Judiciárias de São Paulo e Mato Grosso do Sul, compõe-se de quarenta e três Desembargadores Federais vitalícios, nomeados trinta e quatro dentre Juízes Federais vitalícios, cinco dentre advogados e quatro dentre membros do Ministério Público Federal. Em cada caso, a nomeação será feita pelo Presidente da República, por escolha em lista tríplice, formada pelo Tribunal, à exceção dos casos de promoção de Juiz Federal pelo critério e antiguidade, em que não há elaboração de lista". (Grifo nosso)
Fazendo-se uma análise literal da referida norma, verifica-se que o Tribunal Regional da 3º Região, menosprezou in tottum o princípio do "quinto constitucional" prestigiado pela Constituição Cidadã de 1988, e, inobservou a regra contida no art. 100, parágrafo 2 o, da LOMAN.
Assim, o Tribunal ao quantificar as vagas existentes para cada classe feriu os mencionados preceitos legais. Em outras palavras, por ter passado a ter novamente número ímpar de Desembargadores Federais, não poderia jamais ter gravado a clientela de cada classe, sob pena de ferir o princípio geral da paridade e da alternância entre as classes.
Acolhendo o dispositivo inconstitucional do Regimento Interno, o Tribunal Regional Federal da Terceira Região acabou por adotar a mesma sistemática dos Tribunais de Contas, que preservam regidamente a clientela de cada classe. Grosso modo, nos Tribunais de Contas, sejam dos Estados ou da União, não há a figura do quinto constitucional, o que existe é uma rígida demarcação das vagas de cada clientela (art. 73 a 75 da CF).
Devemos ressaltar que este artigo não tem o condão de trazer insatisfação aos nossos, pares interessados em concorrer a vaga destinada ao quinto constitucional, mas tão somente fazer valer o dever de todo advogado, que é defender o Estado Democrático de Direito (art. 2 º do Código de Ética e Disciplina da OAB).
Nota
01
Art. 94. Um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios será composto de membros, do Ministério Público, com mais de dez anos de carreira, e de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes.Parágrafo único. Recebidas as indicações, o tribunal formará lista tríplice, enviando-a ao Poder Executivo, que, nos 20 dias subseqüentes, escolherá um de seus integrantes para nomeação.