VISTOS ETC.
ONLINE - AGENCIAMENTOS TURÍSTICOS LTDA propôs a presente ação, de rito ordinário, em face de IBÉRIA - LÍNEAS AÉREAS DE ESPAÑA S/A, objetivando a condenação desta ao pagamento: (a) de indenização pela rescisão do contrato de agenciamento geral de vendas que entre si mantinham, incluindo lucros cessantes; (b) das comissões devidas pelas vendas efetuadas pendentes de quitação; (c) das comissões devidas pelas vendas feitas diretamente pela ré às agências de viagens sediadas no território e/ou de agenciamento pertencente à autora; e (d) de indenização para composição de dano moral sofrido, decorrente da lesão comercial pelos atos ilícitos praticados.
Alega a autora, em resumo, que após a constituição da sociedade, - que se deu em atenção a pedido da ré com a finalidade de incrementar as vendas de seus produtos na Cidade de Niterói -, a ré formalizou com a autora, em março/86, contrato de agente-geral de vendas para aquela região, tendo a última se aparelhado para tanto, logrando conquistar considerável clientela.
Porém, em maio de 1993, a autora recebeu comunicação de rescisão do contrato por justa causa, aduzindo ter esta apresentado relatório incompleto por faltar cheque de uma Agência de Viagens, - o que sustenta ser inverídico, pois jamais cometeu a autora falta contratual e sempre entregou regularmente os relatórios das vendas efetuadas, - e que a questão poderia se cingir sobre a solicitação verbal da ré no sentido de que a autora promovesse junto às agências do Município do Rio de Janeiro o recolhimento de cheque referente ao ISS devido à Prefeitura do Rio de Janeiro, solicitação esta que foi feita sem a devida orientação por parte da ré e que gerava controvérsias entre as agências de viagens com relação ao pagamento do tributo, por isso que até um mês antes da rescisão do contrato o pagamento do tributo não era exigido pela IBÉRIA às agências de viagens.
Por fim, diz a autora que a empresa-ré, verificando o crescimento das vendas efetuadas pela ONLINE, passou gradativamente a retirar da intermediação desta algumas das agências de viagens de maior movimento, infringindo norma contratual (anexo A, parg. 2º) ao deixar de transferir à autora a comissão de 3% devida sobre as vendas por ela efetuadas diretamente.
A inicial vem instruída com mandato e documentos de fls. 17/72.
Custas recolhidas através das guias de fls. 73/75.
Regularmente citada (fls.82v), a ré ofereceu contestação por escrito (fls. 84/91) na qual, em resumo, sustenta: (1) a falta de legitimidade da autora, uma vez que não fora ela a contratada para funcionar como Agente-Geral de Vendas da empresa-ré; (2) a prescrição qüinqüenal da suposta verba indenizatória anterior a 19/08/88; (3) que, superada as preliminares, nada deve à autora e que o contrato foi legalmente rescindido, de conformidade com os ditames das cláusulas III (fls.28) e 12ª (fls.44/44v), por ter a autora cometido falta grave, qual seja: o descumprimento da obrigação de retenção do valor do ISS sobre as vendas; (4) não ter a autora exclusividade de representação na região (1ª cláusula, "a" (fls.40v) e 3ª, "b" (fls.41)); (5) a inexistência de dano moral a ser indenizado, porque não praticado qualquer ilícito pela ré no exercício de seu direito de rescindir o contrato com o legítimo Agente-Geral de Vendas e (6) não restar constatada a perda de vendas já programadas. Por fim, pede que a ação seja julgada improcedente.
Com a contestação vieram mandato e documentos de fls. 92/127.
Réplica às fls. 144/156.
Novo pronunciamento da ré às fls. 163/164.
Saneador irrecorrido às fls. 175, afastando a preliminar de ilegitimidade ativa, rejeitando a prejudicial de mérito e deferindo a produção das provas requeridas, inclusive a pericial.
Laudo pericial às fls. 223/245.
Pronunciamento da autora às fls. 248/250.
Às fls. 252/255, esclarecimentos do Sr. Perito.
Designada a AIJ, a mesma se realizou conforme o termo de fls. 269.
É O RELATÓRIO. DECIDO.
O cerne da questão reside em saber se houve, ou não, infração contratual por parte da autora que justificasse a rescisão do contrato de agenciamento celebrado entre os litigantes.
A ré, a quem coube a iniciativa do desfazimento do contrato, sustenta que houve falta grave da autora, porque não teria calculado e lhe repassado o ISS devido ao Município do Rio de Janeiro pelas comissões recebidas em decorrência das vendas de passagens aéreas; a autora, por sua vez, argumenta que houve dito repasse e, se o recolhimento se fez a destempo, se deve à falta de orientação da própria ré, que lhe passou a exigir há apenas um mês da rescisão contratual.
Penso, porém, que a razão está com a autora por isso que, em tema de ISS, a ré não poderia exigir da autora o pagamento de tributo a Município diverso daquele em que ocorreu o fato gerador, seria indevido portanto. Tendo a autora prestado seus serviços no Município de Niterói, só este Município lhe poderia reclamar o imposto sobre serviços, - e não o do Rio de Janeiro. E tanto isso é verdade que o próprio Decreto 10.514/91, do Município do Rio de Janeiro, a que a ré se apega, para impor-lhe o repasse, enuncia em seu artigo 7º, parágrafo 9º:
As hipóteses de responsabilidade previstas nos incisos XII a XXI deste artigo só se aplicam quando as fontes pagadoras e as empresas prestadoras de serviços forem estabelecidas no município.
Aliás, o Superior Tribunal de Justiça quando chamado a decidir casos semelhantes, assim se posicionou:
TRIBUTÁRIO. ISS. SUA EXIGÊNCIA PELO MUNICÍPIO EM CUJO TERRITÓRIO SE VERIFICOU O FATO GERADOR. INTERPRETAÇÃO DO ART. 12 DO DECRETO-LEI Nº 406/68. Embora a Lei considere local da prestação de serviço o do estabelecimento prestador, ela pretende que o ISS pertença ao Município em cujo território se realizou o fato gerador. É o local da prestação do serviço que indica o Município competente para a imposição do tributo (ISS) para que se não vulnere o princípio constitucional implícito que atribui aquele (Município) o poder de tributar as prestações ocorridas em seu território. A lei municipal não pode ser dotada de extraterritorialidade, de modo a irradiar efeitos sobre um fato ocorrido no território do Município onde não se pode ter voga. Recurso a que se nega provimento, indiscrepantemente (1ª T, Resp. 54002/94-PE, Rel. Min. DEMÓCRITO REINALDO, dec. un., publ. DJU 08-05-95, pág. 12309. No mesmo sentido: Resp 41867/93-RS).
TRIBUTÁRIO. ISS. COMPETÊNCIA PARA SUA EXIGÊNCIA SEDE DO ESTABELECIMENTO PRESTADOR. A competência para exigir o ISS é do Município onde estabelecida a empresa prestadora. Recurso improvido (1ªT, Resp 17648/92-SP, Rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA, dec.un., publ. DJU 07-02-94, pág. 1130).
Outro não é o entendimento de ROQUE ANTÔNIO CARRAZA sobre o tema: "O Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) é sempre devido no município onde o serviço é positivamente prestado. É nesse Município, também, que devem ser cumpridos, pelo contribuinte, ou por terceiros a ele relacionados, os deveres instrumentais tributários". (Breves comentários sobre o art. 12 do Decreto Lei nº 406/68, em RDT 6/158).
E não há nos autos (CPC, art.337) notícia de que o Município de Niterói tivesse disciplinado sobre o assunto.
Mas, apesar disso, o imposto, tal como queria a ré, foi, depois de calculado, pela autora repassado para aquela nas 48 horas seguintes à interpelação feita cobrando o repasse, consoante se vê do confronto entre os documentos que constituem as peças de fls. 65 e 253/254.
Justa causa portanto para rompimento do contrato de agenciamento não houve, e, se não ocorreu, o dever de indenizar surge, restando saber contudo a extensão dos danos provocados pela tantas vezes mencionada rescisão, eis que bastante nos autos a prova realizada de que a autora contribuiu, e muito, para o aumento das vendas de passagens e de fretes aéreos de interesse da empresa-ré, prestando serviços de boa qualidade e formando grande clientela no Município de Niterói (fls. 272).
No exame do dimensionamento do dano, forçoso registrar desde logo que a autora não tinha exclusividade, como procura fazer crer, para promover as vendas de passagens e de fretes, mas comissão garantida por alíquotas diferenciadas, caso a venda se efetivasse diretamente por ela ou por outras agências, inclusive pelos estabelecimentos da própria ré. Vale dizer: 12% e 3% respectivamente na venda de passagens e 5% e 2,5% respectivamente nos fretes produzidos (fls. 60/51).
A indenização, a ser imposta à ré em favor da autora em decorrência de ato menos medido, deve consistir, além do pagamento de perdas e danos pelo inconseqüente rompimento do contrato, alcançando o dano moral, no pagamento das comissões, nos precisos termos do mesmo contrato, devidas pelas vendas de passagens e fretes da companhia-ré realizadas no Município de Niterói.
Assim pagará a ré à autora, na forma do que ficar apurado em liquidação de sentença por arbitramento, comissão no valor de 12% e 5% respectivamente pelas vendas de passagens e fretes da companhia-ré feitas diretamente pela autora, servindo como base de cálculo o valor da operação; e comissão no valor de 3% e 2,5% respectivamente pelas vendas de passagens e fretes da companhia-ré produzidos por qualquer agência ou estabelecimento, da ré ou não, no Município de Niterói, durante todo o tempo do contrato, deduzidos os valores já pagos a esse título, tudo corrigido monetariamente e com juros de mora, se for o caso.
Ainda na forma do que ficar apurado em liquidação de sentença, pagará a ré à autora comissão, nas mesmas condições acima, pelas vendas de passagens e de fretes da companhia-ré realizadas em todo Município de Niterói nos 90 (noventa) dias que se seguiram ao rompimento do contrato, de forma a compensar financeiramente a autora pela perda do negócio para o qual tanto se empenhou.
E, para reparar o dano moral causado à autora, resultante da rescisão gravosa, a ponto de insinuar no mercado a desídia inexistente da autora, pagará também a ré àquela a quantia equivalente a duzentos salários-mínimos.
Dessa maneira, restabeleço o equilíbrio rompido, obrigando a ré a reparar o prejuízo da autora.
DAÍ PORQUE JULGO PROCEDENTE A PRETENSÃO AUTORAL. CONDENANDO A RÉ A PAGAR A AUTORA A QUANTIA A SER APURADA EM LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO NOS PRECISOS TERMOS DESTA SENTENÇA. CUSTAS E HONORÁRIOS DO ADVOGADO DA AUTORA, QUE ARBITRO EM 10% SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO, POR CONTA DA RÉ.
P.R.I.
RIO DE JANEIRO, 02 DE FEVEREIRO
DE 1998
ANDRÉ CÔRTES
VIEIRA LOPES
Juiz de Direito