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Liminar suspende CPMF no Estado de São Paulo

Agenda 01/10/1999 às 00:00

Liminar da juíza Marta Isabel Prado, de São Paulo, em ACP, determinando que as operações financeiras realizadas no Estado fossem isentas da cobrança da CPMF.

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL - SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO

3ª. VARA FEDERAL—1ª SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA

AÇÃO CIVIL PUBLICA - AUTOS Nº 1999.61.00.036601

AUTOR: Ministério Público Federal

REU: UNIÃO FEDERAL


D E C I S Ã O

O Ministério Público Federal propõe Ação Civil Pública contra a União Federal, com pedido de liminar, objetivando a impugnação da cobrança da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), no pertinente às operações bancárias realizadas no Estado de São Paulo.

Aduz, em síntese, a inobservância ao processo legislativo, uma vez que "o bicameralismo adotado no âmbito do Poder Legislativo federal implica a apreciação das propostas e projetos de normas legislativas por ambas as Casas congressuais. "(sic)'

Afirma que a Câmara dos Deputados, in casu, não possibilitou a manifestação legislativa pelo Senado Federal após a alteração da Emenda Constitucional n°21, infringindo, assim, princípios constitucionais assegurados na Constituição Federal.

Sustenta que tal procedimento "ofende direito público subjetivo titularizado difusamente pela coletividade, a par da titularidade específica que caiba aos demais sujeitos determinados". (sic).

Ressalta ainda que " o asseguramento constitucional do tramite legislativo a ser seguido para a modificação formal da Constituição apresenta-se, pois, sob o ângulo objetivo, como garantia institucional, protetora do direito de cidadania, derivação do estado de direito democrático, conferindo ainda, sob viés subjetivo, direito público subjetivo de dimensão transindividual (difusa)". (sic).

Defende a legitimidade do Ministério Público Federal ao caso ora tratado, tendo em vista que o bem jurídico afrontado em concreto, com a violação do processo legislativo constitucional (art. 65, parágrafo único, da Constituição da República), pertence a cada um e a todos os cidadãos brasileiros, caracterizando-se pela nota da transindividualidade e configurando-se, assim, na precisa definição legal do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90, art. 81, parágrafo único, I), como autêntico interesse difuso" (sic).

Pleiteia, desta feita, a condenação da União na obrigação de não- fazer (Lei 7347/85, art. 3°), consistente em abster-se da cobrança da contribuição provisória sobre movimentação ou transmissão de valores e de créditos de natureza financeira - CPMF, de que trata a Emenda Constitucional 21/99, em relação às operações bancárias realizadas no Estado de São Paulo (Lei 7347/85, art.16), bem como o estabelecimento de multa diária em caso de descumprimento, no valor de R$1.000.000,00 (um milhão de reais), a ser recolhido ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos, nos termos do art. 11 e 13 da Lei 7347/85 e do Decreto 1 306/94.

Com a inicial vieram os documentos (fls. 25/1 52).

Instada a prestar informações (fls. 154), a União Federal, após um breve escorço histórico e a descrição de alguns artigos da Constituição concernentes ao tema, bem como a citação de decisões relacionadas à CPMF, propugnou pela constitucionalidade da cobrança da exação(fls. 150/167).

É a síntese do necessário.


Examinados. DECIDO.

Impende realçar, primeiramente, antes de analisar os requisitas ensejadores da concessão dos efeitos da tutela jurisdicional, algumas questões processuais relevantes .

É importante esclarecer, ab initio, o posicionamento deste Juízo sobre o controle de constitucionalidade das leis.,,

Lapidar, nesse tema, o magistério sempre erudito e irrepreensível de Alexandre de Moraes, que desenvolve o meu pensar:

No direito constitucional brasileiro em regra foi adotado o controle de constitucionalidade repressivo jurídico ou judiciário em que é o próprio Poder Judiciário quem realiza o controle da lei ou do ato normativo já editados perante Constituição Federal para retirá-los do ordenamento jurídico desde que contrários à Carta Magna.

Há dois sistemas ou métodos de controle Judiciário de Constitucionalidade repressiva. 0 primeiro denomina-se reservado ou concentrado (via de ação) e o segundo difuso ou aberto (via de exceção ou defesa).

......................

No Brasil o controle de constitucionalidade repressivo judiciário é misto ou seja e exercido tanto da forma concentrada quanto da forma difusa.

O art. 102 1 a da CF afirma competir ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição cabendo-lhe processar e julgar originariamente a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal.

Por sua vez o art. 97 estende a possibilidade do controle difuso também aos Tribunais, estabelecendo porém uma regra ao afirmar que somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo Órgão poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.

...........................

Também conhecido corno controle por via de exceção ou defesa caracteriza-se pela permissão a todo e qualquer juiz ou tribunal realizar no caso concreto a análise sobre a compatibilidade do ordenamento jurídico a Constituição Federal.

A idéia de controle de constitucionalidade realizado por todos os órgãos do Poder Judiciário nasceu do caso Madison versus Marbary (1803), em que o Juiz Marshall da Suprema Corte Americana afirmou que é próprio da atividade jurisdicional interpretar e aplicar a lei. E ao fazê-lo, em caso de contradição entre a legislação e a Constituição, o tribunal deve aplicar esta ultima Ir ser superior a qualquer lei ordinária do Poder Legislativo.

Na via de exceção, a pronúncia do Judiciário, sobre a inconstitucionalidade, não é feita enquanto manifestação sobre o objeto principal da lide, mas sim sobre a questão prévia, indispensável ao julgamento do mérito Nesta via, o que é outorgado ao interessado é obter a declaração de inconstitucionalidade somente para o efeito de isentá-lo, no caso concreto, do cumprimento da lei ou ato, produzidos em desacordo com a Lei Maior. Entretanto, este ato ou lei permanecem válidos no que se refere à sua força obrigatória com relação a terceiros.

........................

O controle difuso caracteriza-se, principalmente. pelo fato de ser exercitável somente perante um caso concreto a ser decidido pelo Poder Judiciária Assim, posto um litígio em juízo, o Poder Judiciário deverá solucioná-lo e para tanto, incidentalmente, deverá analisar a constitucionalidade ou não da lei ou do ato normativo "(os grifos não são do original).

Portanto, entendo ser este Juízo- competente para a apreciacão do tema uma vez que não se trata, in casu, de ação direta de inconstitucionalidade, de competência privativa do Supremo Tribunal Federal, e sim de controle difuso de constitucionalidade, que pode ser cogitado pelas partes e que se encontra dentro das atribuições constitucionalmente asseguradas para apreciação.

Convém, ainda, denotar algumas considerações relacionadas à competência deste Juízo para a análise do presente feito.

Preceitua o artigo 16 da Lei 7347/85, com a redação dada pela Lei 9494/97:

Art. 16 - A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova."

Logo, de acordo com a preceituacão legal, e como muito bem salientaram os Ilustres Doutrinadores Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery , a liminar também deve produzir seus efeitos de forma estendida, alcançando todos aqueles que tiverem de ser atingidos pela autoridade da coisa julgada".

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Assim, observo que, consoante determinação legal, a decisão será válida nos limites de sua competência territorial, ou seja, todo o Estado de São Paulo.

Adentrando a questão da legitimidade do Ministério Público Federal para propor ações coletivas lato sensu em matéria tributária, consigno, já de logo que, a solidez dos fatos e a abrangência da lesão (Estado de São Paulo), ultrapassa, indubitavelmente, a peculiaridade do interesse individual homogêneo lesado.

Com efeito, o Ministério Público Federal, seguindo o regramento do artigo 129, lIl, do Estatuto Supremo; artigo 1°, IV, da Lei 7347/85; e art. 6°, Vll, "a" e "d", da Lei Complementar 75/93 objetiva a proteção jurídica do universo de pessoas físicas e jurídicas prejudicadas com a cobrança da CPMF, tendo em vista a inconstitucionalidade formal da referida exação.

De conseguinte, o desiderato do Ministério Público é restabelecer a ordem jurídica e o principio democrático, dos quais é guardião, malferidos com a aprovação da Emenda Constitucional 21/99, aprovada sem a observância do devido processo legislativo insculpido na Carta Maior .

Outrossim, tendo em vista a grande repercussão na vida de todas as pessoas e, portanto, toda a sociedade, revela-se a presente questão em autêntico interesse difuso, merecendo salvaguarda, portanto, na presente ação.

Merecem pleno apoio, a propósito, os precisos ensinamentos de Rodolfo de Camargo Mancuso, a respeito do tema:

          Na ordem escalonada dos interesses em geral, estabelecida pelo critério de sua coercitividade ou atributividade verifica-se que se encontram em extremos opostos os interesses simples e os interesses "juridicamente protegidos" (direitos subjetivos).Entre esses dois termos se situa o interesse legitimo, que é mais do que o interesse simples (na medida em que recebe uma certa proteção estatal e se afigura consentâneo com o sistema jurídico como um todo), e é menos do que o direito subjetivo (isto que se não constitui, propriamente, uma prerrogativa, privilégio ou situação jurídica diferenciado).Ainda tornando esse mesmo critério, ternos que o interesse " difuso" se coloca " entre" o interesse simples e o interesse legitima ele é "mais" do que o interesse simples, por isso que o Estado não pode adotar uma postura de indiferença com relação a ele; (ao contrário: o interesse difuso é res omnium, e não res nullius, donde decorre sua relevância social a justificar a tutela eficaz). De outra parte, o interesse difuso não é exatamente assimilável ao interesse legítimo, porque este supõe uma dada situação jurídica subjacente, afetada a um universo de indivíduos determinados ou determináveis, ao passo que o interesse difuso exsurge de uma situação de fato, homogeneamente esparsa em um número indefinido de indivíduo " (os grifos não são do original)."

Demais disso, irrefutáveis as palavras do D. Representante do Ministério Público Federal ao aduzir que "o bem jurídico afrontado em concreto, com a violação do processo legislativo constitucional (art. 65, parágrafo único, da Constituição da República), pertence a cada um e a todos os cidadãos brasileiros, caracterizando-se pela nota da transindividualidade e configurando-se, assim, na precisa definição legal do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90, art. 81, parágrafo único, p, como autêntico interesse difuso" (sic).

Corolário indispensável deste asserto são as considerações expendidas por Reis Friede, acerca do tema:

"A ação civil pública - objeto do presente tópico- encaixa-se na fase denominada por Cappelletti de " segunda onda de abertura do acesso à justiça' que procura traduzir um momento retirado do processo histórico que o fez possivel no qual a atuação em juízo passa a ser feita também pelas entidades intermediadoras dos interesses difusos e coletivos:

" A visão individualista do devido processo judicial está cedendo lugar rapidamente ou melhor está se fundindo com uma concepção social coletiva. Apenas tal transformação pode assegurar a realização dos direitos públicos relativos a interesses difusos" (Mauro Cappelletti transcrito por L. Guimarães em artigo citado).

Portanto, no moderno Estado Democrático de Direito claramente adotado pela Constituição Federal de 1988. 0 poder público não só está limitado pelas garantias fundamentais dos indivíduos (art. 5° e seus incisos), como recebe encargos específicos de agir para tornar efetivas as liberdades positivas ou as dimensões prestacionais da ação estatal (Canotilho) (Lázaro Guimarães, artigo citado).

Ainda que se pudesse cogitar da existência de interesse individual homogêneo como supedâneo à presente ação, a legitimidade do Ministério Público Federal para submetê-lo à tutela jurisdicional seria indiscutível.

Por oportuno, cumpre invocar a Súmula n° 07 do Conselho Superior do Ministério Público, in verbis:

          O Ministério Público está legitimado a defesa de interesses individuais homogêneos que tenham expressão para a coletividade como: a) os que digam respeito à saúde ou à segurança das pessoas ou ao acesso das crianças e adolescentes à educação; h) aqueles em que haja extraordinária dispersão dos lesados; c) quando convenha à coletividade o zelo pelo funcionamento de um sistema econômico, social ou jurídico (os grifos não são do original).

Nesta orientação, transcrevo as lúcidas ponderações firmadas pelo eminente Relator Ministro Maurício Corrêa em seu voto, preferido no RE 163.231-3/SP, acerca da legitimidade do Ministério Público para propor ação civil pública, inclusive na defesa dos chamados interesses individuais homogêneos:

RE 163.231-3 (provimento unânime)

Fonte: Informativo do STF de 12.03.97, pg.03

EMENTA: MINISTÉRIO PUBLICO ESTADUAL, LEGITIMIDADE ATIVA, AÇÃO CIVIL PUBLICA EM DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS E COLETIVOS. MENSALIDADES ESCOLARES. ADEQUAÇÃO ÀS NORMAS DE REAJUSTE FIXADAS PELO CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO. ARTIGO 129 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Perfilha igual orientação o E. Superior Tribunal de Justiça no julgamento preferido em Recurso Especial, Processo N°147907/CE, registrado sob n°9700643417:

Processo N°147907/CE Tipo de documento: Acórdão. Órgão Julgador Sexta Turma (Te) Data de decisão: 16/06/1998. Ministro Relator: Luiz Vicente Cernicchiaro Fonte: DJ de 24.087.1998, pag. 00112 EMENTA: RESP — CONSTITUCIONAL INTERESSE DIFUSO—INTERESSE COLETIVO MINISTÉRIO PUBLICO - LEGITIMIDADE. " O Ministério Público, artigo 129, Ill, "in fina", da Constituição da República, tem legitimidade para atuar, em havendo interesse difuso, ou seja, relativo a grupo indeterminado de pessoas e no caso de interesse coletivo, referente a número determinado de pessoas".

Nessa mesma esteira, temos os seguintes julgados:

Processo n° 109013/MG, registrado sob n°9600606455- Recurso Especial.

Tipo de documento: Acórdão.

Data da decisão: 17.06.1997

Ministro Relator: Humberto Comes de Barros. Fonte: DJ de 25 08.1997, pg.392998

EMENTA: PROCESSUAL - AÇÃO CIVIL PUBLICA - CANCELAMENTO DE TAXA ILEGAL -LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PUBLICO -DECLARAÇAO INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE.

" O Ministério Público está legitimado para o exercício de ação civil pública, no objetivo de proibir a cobrança de taxa ilegal. É viável, em processo de ação civil pública, a declaração incidente de inconstitucionalidade.

Processo n° 49272/RS, registrado sob n°9400163223 - Recurso Especial.

Tipo do documento: Acórdão.

Órgão Julgador primeira Turma (T1).

Data da decisão: 21.09.1994

Fonte: DJ de 17.10.1994.

Fonte: DJ de 17.10.1994, pg. 27868.

Ministro Relator: Demócrito Reinaldo

EMENTA: PROCESSO CIVIL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA DEFESA DE INTERESSES E DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. TAXA DE ILUMINAÇÃO PUBLICA. POSSIBILIDADE."

Postas estas premissas fundamentais, cumpre-me agora analisar os requisitas ensejadores da concessão da tutela.

Preceitua 0 artigo 273 "caput", do Código de Processo Civil, que os efeitos do provimento jurisdicional pretendido poderão ser antecipados se a alegação do autor for verossímil e estiver fundada em prova inequívoca, observado, ademais, o disposto nos incisos I e 11 do mesmo dispositivo.

R Reis Friede, com precisão, complemento:

          Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia.

          A concessão de Medida liminar prevista no artigo 12 da Lei de Ação Civil Pública, condiciona-se à existência do periculum in mora e do fumus boni júris, agora expressamente com a atenção que recebeu da disposição legal destacada da Lei de Defesa do Consumidor."

Resta cristalino, no caso presente, a verossimilhança da alegação.

A plausibilidade do direito invocado resulta da inconstitucionalidade formal da Emenda Constitucional n°21, bem como do malferimento a muitos outros princípios basilares agasalhados na Carta Maior.

Deveras, abordarei alguns contornos acerca do tema, a seguir delineados.

Como inevitável ponto de partida, é importante salientar o que dispõe o artigo 60, § 2°, da Constituição Federal:

Art.60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

............................

§ 2°. A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros. (os grifos não são do original).

O versículo sub examine é complementado pelo artigo 65, parágrafo único da Constituição Federal, que preceitua:

Art. 65 - O projeto de lei aprovado por uma Casa será revisto pela outra, em um só turno de discussão e votação e enviado à sanção ou promulgação, se a Casa revisora o aprovar, ou arquivado, se o rejeitar.

Parágrafo único. Sendo o projeto emendado, voltará à Casa iniciadora. (os grifos não são do original).

De fato, consoante dessumo dos documentos acostados à inicial, bem como da análise da legislação referente à questão, o projeto aprovado no Senado Federal sofreu uma modificação pela Câmara dos Deputados.

Entrementes, referida modificação não foi reapreciada pelo Senado Federal.

Desdobrando melhor esta idéia, impende destacar um quadro comparativo para melhor elucidação dos fatos:

PROJETO APROVADO PELO SENADO (ORIGEM), EM 19 DE JANEIRO DE 1999

ART.75,

.........................

§ 1°. Observado o disposto no § 6° do art. 195 da Constituição, a alíquota da contribuição será de trinta e oito centésimos, nos meses subseqüentes, facultado ao Poder Executivo reduzi-la ou restabelecê-la total ou parcialmente, nos limites aqui definidos.

.........................

§ 3°. É a União autorizada a emitir titulas da divida pública interna, cujos recursos serão destinados ao custeio da saúde e da Previdência Social, em montante equivalente ao produto da arrecadação da contribuição, prevista e não realizada em 1999, hipótese em que o resultado da arrecadação verificado no exercício financeiro de 2002 será integralmente destinado ao resgate da divida pública federal".

PROJETO APROVADO PELA CAMARA (REVISORA), EM 18 DE MARÇO DE 1999

"Art.75

........................

§ 1°. Observado o disposto no § 6° do art. 195 da Constituição, a alíquota da contribuição será de trinta e oito centésimos, nos meses subseqüentes, facultado ao Poder Executivo reduzi-la total ou parcialmente, nos limites aqui definidos.

..................

§ 3°. É a União autorizada a emitir titulas da divida pública interna, cujos recursos serão destinados ao custeio da saúde e da Previdência social, em montante equivalente ao produto da arrecadação da contribuição, prevista e não realizada em 1999."

Dentro dessa perspectiva, verifico que restaram alterados os parágrafos primeiro e terceiro do artigo 75 do Ato das Disposições Constitucionais Transitarias pela Câmara, sendo que, sem retornar a proposta para nova votação no Senado Federal, consoante preceitua o artigo 60, parágrafo 2° da Constituição Federal, foi promulgada a Emenda Constitucional n° 21 ao texto constitucional.

Não se pode olvidar também que, em que pese a falha legislativa em questão, a Emenda Constitucional n° 21 objetivou u prorrogará, malgrado não se encontrarem mais em vigor, as Leis 9311 e 9539, editadas com prazo de validade temporária e destinação específica.

Para que nenhuma dúvida persista na análise do tema, é importante ressaltar a linha exegética percorrida para a cobrança da referida exação.

A CPMF foi originalmente prevista pela Emenda Constitucional n° 12, que introduziu o artigo 74 no Ato das Disposições Constitucionais Transitarias.

No entanto, em que pese a EC 12/96 ter sido publicada no mês de agosto, a cobrança da exação só veio a ser instituída através da Lei 9.311/96 , publicada com tempo de vigência expressamente estabelecido, é dizer, treze meses.

Posteriormente, a Lei 9.539/97 prorrogou a sua eficácia por mais vinte e quatro meses, ou seja, até 22 de janeiro de 1999.

Vale dizer, a partir desta data não mais existia a contribuição, por absoluta ausência de lei ou disposição constitucional.

Contudo, sobreveio ao mundo jurídico a EC 21/99, com o real escopo de "prorrogar" novamente o prazo de cobrança da exação por mais trinta e seis meses.

Donde ser intuitiva a inferência de que, sob o aspecto hermenêutico, as Leis 9.311/96 e 9.539/97 perderam a vigência, resultando inadmissível a prorrogação das mesmas, até por Emenda Constitucional.

A propósito, é de todo pertinente a incisiva citação de Gabriel Lacerda Troianelli acerca do tema:

          Tendo terminado em janeiro de 1999 o período de vigência da CPMF tal como prevista na Emenda Constitucional n°12, de 15.08.96, e nas Leis 931/ 96 e 9539'97, pretendeu o governo prorrogar a seta incidência Miado ao Congresso Nacional para tanto projeto de emenda constitucional que aprovado se converteu na Emenda Constitucional 21/99, com o seguinte texto:

...............................

Todavia, o projeto de emenda constitucional demorou mais para ser aprovado do que o Governo pretendia e acabou a Emenda Constitucional 21/99 por prorrogar contribuição extinta.

Não há dúvida de que só se pode prorrogar, a sigla, o que existe, e o que já não mais existe não pode ser prorrogado, mas unicamente reinstituído, sendo, portanto, inegável a imprecisão terminológica contida no inicio do ADCT.

Dada tal impropriedade, alguns entendem que, por ser impossível a prorrogação de contribuição inexistente, inviável se tornaria, a Respeito da Emenda Constitucional 21/99, a exigência da CPMF nos três anos subseqüentes à sua prorrogação (os grifos não são do original).

Por tudo quanto até aqui ficou consignado, é absolutamente irrefutável que a instituição ou majoração de tributo por emenda constitucional, independentemente de lei, afronta o principio insculpido no artigo 150 da Constituição Federal , que preconiza:

Art.150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

(...) (grifei)

Com efeito, o come da questão ora posta em apreciação possui como arquétipo genérico a homenagem ao principio da estrita legalidade ou da reserva absoluta da lei formal.

Desta forma, no âmago da vexata quaestio exsurge o vicio formal de que padece a instituição da referida exação pela Emenda Constitucional 21/99, que, ao par de infringir o processo legislativo conforme as normas postas pela Carta Magna, prorrogou legislação que não mais existia.

Na sempre lapidar lição de J.J. Comes Canotilho:

          "O princípio da legalidade da administração sobre o qual insistiu sempre a teoria do direito público e a doutrina da separação de poderes foi erigido muitas vezes em "cerne essencial" do Estado de direito. Postulava por sua vez dois princípios fundamentais: o principio da supremacia ou prevalência da lei (Vorrang des Gesetzes) e o principio da reserva de lei (Vorbehalt des Gesetzes). Estes princípios permanecem validos pois num Estado democrático- constitucional a lei parlamentar é, ainda, a expressão privilegiada do princípio democrático (daí a sua supremacia) e o instrumento mais apropriado e seguro para definir os regimes de certas matérias, sobretudo dos direitos fundamentais e da vertebração democrática do Estado (dai a reserva de lei). De uma forma genérica, o principio da supremacia da lei e o principio da reserva de lei apontam para a vinculação jurídico- constitucional do Poder Executivo."

Não é demasiado assentir que a argumentação relacionada à tese da inconstitucionalidade afigura-se suficiente para consubstanciar a mácula e os efeitos deletérios de que a mencionada Emenda Constitucional padece

Forçoso admitir, entrementes, que a cobrança da CPMF afronta ainda muitos outros princípios constitucionais, cujo teor não se harmoniza com a sistemática normativa pátria, a saber :

"a)princípio da proibição do confisco;

b) art. 60, § 4° da Carta Maior, que veda a instituição de emenda constitucional que venha a abolir direitos e garantias individuais;

c) art. 1 SO,II, CF (princípio da isonomia);

d)proibição à bitributação;

e) direito de propriedade;

f) art.7°, Vi (irredutibilidade salarial);

g)devido processo legal;

h)princípio da anterioridade;

i)princípio da capacidade contributiva;

j) princípio da competência residual tributaria da União;

k)princípio da segurança jurídica;

m) princípio da moralidade."


Inquestionável, outrossim, a presença de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação na prestação jurisdicional na medida em que, sem a concessão da tutela, restará aos lesados submeterem-se tão-somente às agruras da via demorada da repetição do indébito.

Ademais, a exigência da retenção do tributo flagrantemente indevido pela Requerida, bem como a relevância dos fundamentos delineados, complementam a situação de perigo deflagradora da concessão da tutela jurisdicional.

Outrossim, além de absolutamente irreparável, o dano afigura-se atual, uma vez que a cada momento realizam-se inúmeras operações bancárias sujeitas à contribuição.

Observo, ainda, nas palavras do D. Representante Ministerial, que ~ não há o menor perigo de irreversibilidade, visto que os registros informatizados do sistema bancário permitem eventual dedução fatura da contribuição devida"(sic).

Exsurge, portanto, inconsteste, a necessidade de que a pretensão formulada seja acolhida.


Pelo exposto, CONCEDO A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA (art.12 da Lei 7347/85 e art.273 do Código de Processo Civil) para determinar à União Federal que se abstenha da cobrança da contribuição provisória sobre movimentação ou transmissão de valores e de créditos de natureza financeira -CPMF, consubstanciada na Emenda Constitucional nó 21/99, em relação às operações bancárias realizadas no Estado de São Paulo (Lei 7.347/85, art.16).

Determino também, em caso de descumprimento, o estabelecimento de multa diária à demandada, no valor de R$1.000.000,00 (um milhão de reais), a ser recolhido ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos, nos termos dos artigos 11 e 13 da Lei 7.347/85 e do Decreto 1.306/94.

Oficie-se à Secretaria da Receita Federal (Superintendência da Receita Federal em São Paulo), o Ministério da Fazenda bem como ao Banco Central do Brasil para que determinem aos agentes dos sistemas bancários no Estado que não descontem das contas correntes e demais operações a respectiva contribuição.

Cite-se.

Oficie-se e intime-se.

São Paulo, 09 de agosto de 1999.

Marta Isabel ao Prado
          Juíza Federal Substituta
          3a Vara Federal

Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PRADO, Marta Isabel. Liminar suspende CPMF no Estado de São Paulo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 35, 1 out. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/jurisprudencia/16358. Acesso em: 22 nov. 2024.

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