PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Processo nº 50/02
Vistos.
OSMAR MARTINS CERIONI, JOÃO FERNANDES FONTES e VITTORIO MARIA FOGACCIA promovem a presente ação declaratória de inexistência de relação jurídica c.c. repetição de indébito com pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional contra o MUNICÍPIO DE JARINU aduzindo, em síntese, que o réu lhes promoveu a cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU e de taxas de serviços públicos relativos aos exercícios de 1997 a 2002 de maneira irregular porquanto fora dos limites estabelecidos pelo ordenamento jurídico: a. o imposto abrigou ilegais progressividades de alíquotas e de base de cálculo; b. as taxas são indevidas porquanto têm como fato gerador serviço público de natureza universal e c. ambos – impostos e taxas – foram vinculados a determinado índice de variação do valor da moeda nacional. Pediram a desconstituição dos lançamentos mencionados e bem assim a condenação do réu à repetição daquilo por eles indevidamente pago. Apresentaram documentos (fls. 24/119).
A antecipação da tutela jurisdicional foi indeferida (fls. 121/123) – decisão essa mantida pelo v. acórdão proferido em 12.03.02 pela Colenda 7ª Câmara do Egrégio Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo nos autos do Agravo de Instrumento nº 1.075.166-5, relator o e. Juiz Nelson Ferreira (fls. 345/346 e 347/348).
Citado, o réu apresentou contestação em sede da qual argüiu preliminar de carência de ação por falta de interesse processual e, no mérito, sustentou a. a inexistência, na espécie, de progressividades do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU, quer relativamente às alíquotas quer em relação à base de cálculo; b. as taxas de serviços públicos têm natureza uti singuli, sendo constitucional sua cobrança e c. era regular a indexação dos impostos e taxas cobrados aos autores. Requereu, pois, seja afastada sua pretensão, inclusive no que diz respeito à repetição do quanto pago (fls. 264/269).
Apresentada réplica (fls. 315/319).
As partes postularam o julgamento antecipado da lide (fls. 355 e 359).
É o relatório.
DECIDO.
Conheço diretamente do pedido – ora examinado sob o pálio do princípio da aproveitabilidade da petição inicial – na medida em que desnecessária a produção de prova em audiência, o que faço com fundamento no artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil.
A preliminar argüida pelo réu não é passível de acolhimento porquanto não obstante rotulada de ação declaratória a hipótese revela pedido constitutivo negativo cumulado com pedido condenatório.
Ademais, entende-se aplicável à espécie o princípio processual da mihi factum, dabo tibi jus, impondo-se o conhecimento da ação pelo mérito (1º TACSP – 7ª Câmara Extraordinária – Apelação nº 712.698-5 – Santo André – relator o juiz SEBASTIÃO ALVES JUNQUEIRA – j. 22.09.97 – votação unânime).
No mérito, o pedido é improcedente na medida em que, respeitadas as considerações que o fundamentam, não se identificam no Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU cobrado pelo MUNICÍPIO DE JARINU as progressividades abstratamente vislumbradas pela demanda. Não configura violência às regras de direito, ademais, a vinculação do valor do tributo – transitória, como na espécie – a determinado índice de variação monetária.
As Taxas de Manutenção da Iluminação Pública, de Limpeza de Vias e Logradouros Públicos e de Remoção de Lixo instituídas pela Lei Complementar nº 24, de 14.12.95 – Código Tributário do Município de Jarinu, eram, realmente, inconstitucionais, mas a declaração de tal fato em juízo não conduz necessariamente ao direito à repetição do indébito, tudo nos termos das razões adiante expostas.
1.Da inexistência de progressividade no Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU no Município de Jarinu e sua consonância, ao contrário, com a ordem normativa constitucional.
A história do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU revela que, em sua origem, ele se dividia em dois tributos distintos: o imposto predial e o territorial. Sua unificação ocorreu quando do ingresso, na ordem normativa pátria, da Constituição de 1946, que passou a denominá-lo como hoje o conhecemos (artigo 24, inciso II).A Constituição de 1967 e bem assim a Emenda Constitucional nº 1, de 1969 – nos artigos 157 e 160, inciso III, respectivamente – inovaram ao assinalar que a propriedade deveria cumprir função social, norma programática esta que foi repetida pela atual Constituição da República em seu artigo 5º, inciso XXIII.
Guardando coerência com a regra antes mencionada, o artigo 156, § 1º, incisos I e II, da Constituição Federal, com a redação que lhe foi dada pela Emenda Constitucional nº 29, de 13.09.00, dispôs que o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana – sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o artigo 182, § 4º, inciso II – pode ser progressivo em razão do valor do imóvel e ter alíquotas diferentes de acordo com sua localização e uso.
Progressividade – de conceito doutrinário universalmente aceito – é a majoração da alíquota na medida em que cresce o valor da matéria tributável, constituindo instrumento de política tributária utilizado em todo o mundo moderno visando à redistribuição da riqueza – tanto que preconizado até mesmo no Manifesto do Partido Comunista, de MARX e ENGELS – sem malferir, porém, os princípios da igualdade e da proporcionalidade.
O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, todavia, em manifestações anteriores à Emenda Constitucional nº 29, de 13.09.00, vinha entendendo inconstitucional a possibilidade de instituição de imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana como instrumento de redistribuição da riqueza (Recurso Extraordinário nº 153.771-0-MG – Plenário – relator o ministro MOREIRA ALVES – j. 20.11.96).
O caso concreto. Superadas as considerações de natureza geral – divisando os limites do instituto objurgado pela ação – e examinada a hipótese em julgamento, não me convenci de que a ordem tributária local o tenha contemplado.
Em primeiro lugar porque, diferentemente das leis declaradas inconstitucionais pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, a Lei Complementar nº 24, de 14.12.95 – Código Tributário do Município de Jarinu jamais previu qualquer progressividade de alíquotas relativamente ao mesmo imóvel – esta a conditio sine qua non da pretendida analogia aos julgados referidos pela ação –, conclusão a que se chega da simples leitura de seus artigos 11 e 45, verbis:
"Art.11 –A base de cálculo do Imposto Sobre a Propriedade Territorial Urbana é o valor venal do terreno, ao qual se aplica a alíquota de 3% (três por cento). Parágrafo único. Para os terrenos edificados, a alíquota mencionada no caput deste artigo será reduzida para 2,5% (dois e meio por cento)".
"Art. 45 – A base de cálculo do Imposto Sobre a Propriedade Predial é o valor venal do imóvel construído, abrangendo as construções existentes, ao qual se aplica a alíquota de 1% (um por cento)".
A diferença de alíquotas do imposto sobre a propriedade territorial existente para imóveis edificados (2,5% – dois e meio por cento) e não edificados (3% – três por cento), a par de constituir legítimo instrumento de estímulo à construção, não caracteriza progressividade, mas seletividade, institutos jurídicos diversos.
Impostos seletivos são aqueles que oneram diferentemente – com base em determinados critérios e com objetivos extrafiscais – os bens sobre os quais incide.
A lei tributária sob exame revela, pois, que a alíquota do imposto sobre a propriedade territorial incidente sobre imóveis edificados, menor à razão de meio ponto percentual relativamente àquela que incide sobre imóveis sem construção, tem como lastro axiológico – legítimo – o necessário ordenamento da ocupação do solo urbano.
O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL já se pronunciou sobre a matéria nos autos do Recurso Extraordinário nº 229.233-7-SP, relator o ministro ILMAR GALVÃO, verbis:
"IPTU – Município de São José do Rio Preto – Lei nº 5.447/93, artigo 25, redação da Lei nº 5.722/94 – Alegada ofensa ao artigo 156 da CF. Simples duplicidade de alíquotas, em razão de encontrar-se, ou não, edificado o imóvel urbano, que não se confunde com a progressividade do tributo, que o STF tem por inconstitucional quando não atendido ao disposto no artigo 156, parágrafo primeiro, aplicado com as limitações expressamente constantes dos parágrafos segundo e quarto do artigo 182 da Carta de 1988" (STF – 1ª Turma, Diário da Justiça da União de 25.06.99).
Não há falar-se, ainda, pudessem os descontos concedidos pela Lei Complementar nº 24, de 14.12.95, em seu artigo 2º, caracterizar aquilo que a demanda denominou de "progressividade disfarçada" (fls. 06, § 1º).
A uma porque, em se cuidando de isenções parciais, como afirma a ação, eles – os descontos – não podem constituir progressividade na medida em que são institutos diferentes e incompatíveis entre si: esta representa sanção imposta pelo aproveitamento inadequado da propriedade e aquelas, insertas no âmbito de competência do poder tributante, dizem respeito à observância da capacidade contributiva do contribuinte (STF – 2ª Turma – Agravo em Recurso Extraordinário nº 239.163 – relator o ministro MAURÍCIO CORRÊA, Diário da Justiça da União de 02.06.00).
É inaceitável, ainda, a tese de impossibilidade de vinculação do valor dos impostos a índices de variação do poder liberatório da moeda nacional, como autorizava a lei tributária local em exercícios passados.
A indexação dos tributos, de emprego facilmente compreensível em época de rápida desvalorização da moeda por causa da inflação, encontrou suporte primeiro no artigo 3º do Código Tributário Nacional e, segundo, por analogia (Código Tributário Nacional, artigo 108, inciso I), no artigo 1º da Lei nº 8.383, de 30.12.91.
O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL já assentou, realmente, que a atualização de dívida tributária pela Unidade Fiscal de Referência – UFIR não representa inconstitucionalidade e tampouco configura modificação da base de cálculo e do fato gerador (Recurso Extraordinário nº 208.388-7-PR – 1ª Turma – relator o ministro ILMAR GALVÃO, Diário da Justiça de União de 01.08.97).
O PRIMEIRO TRIBUNAL DE ALÇADA CIVIL DO ESTADO DE SÃO PAULO, cuidando especificamente do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana, também já entendeu válida a indexação:
"IMPOSTO – Predial e territorial urbano – Município de Santos – Fixação do valor do tributo em Ufir – Irrelevância – Circunstância que não vislumbra falta de liquidez ou certeza no montante do tributo a recolher, pelo só fato de vir expresso em Ufir – Oscilação da alíquota em razão da faixa de valor venal e da localização do imóvel – Inadmissibilidade da progressividade fiscal – Validade do lançamento – Segurança concedida – Recurso provido" (1º TACSP – 12ª Câmara – Apelação nº 753.415-2).
Por fim, deixo de conferir ao julgamento – neste ponto específico – a extensão pretendida pela demanda na medida em que o libelo, vazado em modelo aparentemente padronizado para alcançar situações diversas, faz alusão a fatos e a fenômenos tributários inocorrentes na realidade sob exame, suficientemente avaliada na espécie.
2.Da inconstitucionalidade das Taxas de Manutenção da Iluminação Pública, de Limpeza de Vias e Logradouros Públicos e de Remoção de Lixo anteriormente constantes da Lei Complementar nº 24, de 14.12.95 – Código Tributário do Município de Jarinu.
A Constituição da República Federativa do Brasil dispõe, em seu artigo 145, inciso II, que "A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I. (...) II. taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; III. (...)."São de duas categorias, pois, as taxas: a. de serviço público e b. de polícia.As taxas de serviço decorrem da utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição, enquanto as taxas de polícia justificam-se em face de seu regular exercício.A taxa é um tributo que tem, portanto, como hipótese de incidência uma atuação estatal diretamente relacionada ao contribuinte, razão por que é chamado de tributo vinculado.As taxas de polícia são decorrentes do exercício do respectivo poder-dever, cuja definição vem positivada no artigo 78 do Código Tributário Nacional: "considera-se poder de polícia a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do poder público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos".Não havendo falar-se, na espécie, de taxa de polícia, atém-se a presente decisão ao exame da taxa de serviço público.Os serviços públicos, conforme ensina ROQUE CARRAZZA, "se dividem em gerais e específicos. Os serviços públicos gerais, ditos também universais, são os prestados uti universi, isto é, indistintamente a todos os cidadãos. Eles alcançam a comunidade, como um todo considerada, beneficiando número indeterminado (ou pelo menos indeterminável) de pessoas. É o caso dos serviços de iluminação pública, de segurança pública, de diplomacia, de defesa externa do País, etc." Tais serviços, salienta o e. tributarista, são custeados pelos impostos (in Curso de Direito Constitucional Tributário, Malheiros, 11ª ed., 1998, p. 327).Os serviços públicos específicos, na esteira do mesmo autor, "também chamados singulares, são os prestados uti singuli. Referem-se a uma pessoa ou a um número determinado (ou, pelo menos, determinável) de pessoas. São de utilização individual e mensurável. Gozam, portanto, de divisibilidade, é dizer, da possibilidade de avaliar-se a utilização efetiva ou potencial, individualmente considerada. É o caso dos serviços de telefone, de transporte coletivo, de fornecimento domiciliar de água potável, de gás, de energia elétrica, etc. Estes, sim, podem ser custeados por meio de taxas de serviço" (ROQUE CARRAZZA, idem, ibidem).A especificidade e a divisibilidade – requisitos essenciais dos serviços remunerados por taxas – vêm prescritas na ordem jurídica nacional por meio do artigo 79, incisos II e III, do Código Tributário Nacional, verbis:"Artigo 79. (omissis). I...; II. específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade, ou de necessidades públicas; III. divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários".Sendo assim, o serviço específico é o que pode ser destacado em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou de necessidade pública, não podendo ser genérico, ou seja, deve ser destinado a determinados usuários e não prestado com caráter geral, a toda a coletividade. Se o serviço for prestado dessa forma, impõe-se seja remunerado por imposto. Divisíveis, por sua vez, são os serviços prestados uti singuli, de utilização individual e mensurável (cf. HELY LOPES MEIRELLES, Direito Municipal Brasileiro, Malheiros, 11ª ed., 2000, pp. 152-153).O caso concreto. Feitas todas as considerações anteriores – de caráter geral –, passo ao exame específico da validade jurídica ou não das Taxas de Manutenção da Iluminação Pública, de Limpeza de Vias e Logradouros Públicos e de Remoção de Lixo instituídas pela Lei Complementar nº 24, de 14.12.95 – Código Tributário do Município de Jarinu, segundo o texto vigente quando da impetração da demanda.
A validade da norma local em foco atrai necessariamente a verificação de sua obediência ou não à superior diretriz fixada pelo já mencionado artigo 145, inciso II, da Constituição Federal, de maneira que deve se perquirir se o serviço de iluminação pública – em primeiro lugar – é um serviço individual ou geral, i.e., uti singuli ou uti universi, na dicção já consagrada pela doutrina administrativa.E, sem embargos das judiciosas considerações municipais, não encontrei nos compêndios doutrinários nem nos repertórios de jurisprudência resposta outra senão a seguinte: o serviço de iluminação pública é um serviço destinado à coletividade toda, não um serviço passível de divisão em unidades autônomas para cada contribuinte.Trata-se, na realidade, de um serviço uti universi e não uti singuli, como vem de dizê-lo ROQUE CARRAZZA nas lições antes invocadas.É bem de ver que HELY LOPES MEIRELLES, antes defensor da constitucionalidade da taxa de iluminação pública, reconheceu posteriormente seu equívoco dizendo que "não é cabível a cobrança de taxa pelo calçamento de via pública ou pela iluminação de logradouro público, que não configuram serviços específicos, nem divisíveis, por serem prestados uti universi, e não uti singuli,..." (in Direito Municipal Brasileiro, idem, ibidem).
Aliás, o próprio Professor HELY dá conta de sua revisão de posicionamento: "Relativamente ao serviço de iluminação, já defendemos a tese da legalidade da taxa para seu custeio. Evoluímos para a posição atual por verificarmos que esse serviço não é prestado uti singuli, mas sim uti universi, insuscetível, portanto, de utilização individual e mensurável" (idem, ibidem, p. 153, nota 14).
Desse entendimento não dissente RUY BARBOSA NOGUEIRA, que preleciona: "se é, por sua natureza (ontológica) comum (iluminação pública ou do povo) e por sua finalidade (teleológica) a todos, indistintamente (iluminação pública ou para o povo), de acordo com a própria qualificação jurídico-normativa constitucional e da legislação nacional ou complementar sobre o factum, isto é, do serviço público suscetível de ser pressuposto fático da taxa (relação fática), vê-se que esta é insuscetível de ser fato gerador de taxa, porque não é serviço ou prestação de serviço específico, nem destacável em unidades autônomas de utilidade, nem prestado individualmente ao contribuinte (mas a todos), nem individualmente por ele usufruído (mas indistintamente por todos). Em resumo, é um serviço de uso comum (uti universi)" (in Taxas de Serviço e Suas Limitações Constitucionais, citado pelo desembargador ÁLVARES CRUZ, do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO nos autos da Representação Interventiva por Inconstitucionalidade nº 9.318-0 – voto vencedor publicado na Revista dos Tribunais nº 642/103).Perfilhando tal entendimento, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL tem assinalado da "ilegitimidade da taxa, dado que o serviço de iluminação pública é um serviço prestado à coletividade toda, prestado uti universi e não uti singuli (STF – Agravo de Instrumento nº 231.132, relator o ministro CARLOS VELLOSO, j. 25.05.99, entre outras decisões).
À mesmíssima conclusão vem de chegar este juízo quanto às taxas relativas à limpeza pública e à coleta de lixo domiciliar, ainda que em dissonância dos respeitáveis argumentos deduzidos pelo órgão exator e bem assim contrariamente ao entendimento dos v. arestos por ele trazidos à colação.
Com efeito, tendo examinado a jurisprudência relativa ao tema, verifiquei a existência de inúmeras decisões que entenderam válida a cobrança das taxas de limpeza pública e de coleta de lixo.
A primeira delas, colhida na Revista dos Tribunais nº 724/275, relativa ao v. acórdão proferido pelo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA nos autos do Recurso Especial nº 64.651/0-SP, diz o seguinte: "TAXA – Conservação e limpeza pública – Legitimidade da cobrança – Serviço específico e divisível prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição. Ementa oficial: Legalidade da cobrança da Taxa de Limpeza Urbana em função do serviço específico e divisível prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição" (STJ – Recurso Especial nº 64.651-0-SP – 1ª Turma – j. 14.06.95, relator o ministro GARCIA VIEIRA, Diário da Justiça da União de 14.08.95).Outra decisão, do mesmo tribunal nacional, conquanto mais antiga:"TAXA – LIMPEZA PÚBLICA – CONSERVAÇÃO DE VIAS E LOGRADOUROS – FATO GERADOR – FRUIÇÃO DOS SERVIÇOS DE CONSERVAÇÃO E LIMPEZA, INCLUSIVE COLETA DE LIXO – SERVIÇOS ESPECÍFICOS E DIVISÍVEIS, PRESTADOS AOS CONTRIBUINTES OU POSTOS A SUA DISPOSIÇÃO – EXEGESE DO ARTIGO 77, CAPUT, DO CTN – TRIBUTOS DEVIDOS – RECURSO ESPECIAL PROVIDO" (Recurso Especial nº 00010142-4/00 – AC 402.038-0 – São Paulo – 1ª Turma – 02.12.92 – relator o ministro GARCIA VIEIRA, votação unânime).
O fato, porém, é que a matéria ostenta natureza essencialmente constitucional – porque relacionada ao artigo 145, inciso II, da Constituição Federal – e, por isso, foi ao SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL a quem coube dar a última palavra a seu respeito.O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, chamado então a se pronunciar, fixou entendimento quanto ao tema quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 199.969-SP – relator o ministro ILMAR GALVÃO, Diário da Justiça da União de 06.02.98:
"IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO. Taxas de limpeza pública e de conservação de vias e logradouros públicos. Lei nº 11.152, de 30.12.91, que deu nova redação aos artigos 70, I e II; 87, I e II, e 94, da Lei nº 6.989/66, do Município de São Paulo. Inconstitucionalidade declarada dos dispositivos sob enfoque. (...) Os demais, por haverem violado a norma do artigo 145, parágrafo segundo, ao tomarem para base de cálculo das taxas de limpeza e conservação de ruas elemento que o STF tem por fator componente da base de cálculo do IPTU, qual seja, a área do imóvel e a extensão deste no seu limite com o logradouro público. Taxas que, de qualquer modo, no entendimento deste Relator, tem por fato gerador prestação de serviço inespecífico, não mensurável, indivisível e insuscetível de ser referido a determinado contribuinte, não sendo de ser custeado senão por meio do produto da arrecadação dos impostos gerais".
O Plenário do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, em acórdão unânime relatado pelo ministro ILMAR GALVÃO, entendeu, pois, inconstitucionais as taxas ora sob exame na medida em que elas "têm por fato gerador prestação de serviço inespecífico, não mensurável, indivisível e insuscetível de ser referido a determinado contribuinte, não sendo de ser custeado senão por meio do produto da arrecadação dos impostos gerais".A partir de então, até mesmo o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, por sua Primeira Turma, veio de reexaminar seu entendimento, não quanto à questão em si, mas dando-se por incompetente para apreciar a matéria, de exame superior cabível exclusivamente pela instância máxima da justiça brasileira.É o que se verifica do julgamento do Recurso Especial nº 168.944-RJ, em sede do qual aquela corte decidiu o seguinte:"CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. TAXA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA (TIP) E DA TAXA DE COLETA DE LIXO E LIMPEZA URBANA (TCLLP). MATÉRIA DE CUNHO CONSTITUCIONAL EXAMINADA NO TRIBUNAL ´A QUO´. DECISÕES A RESPEITO PROFERIDAS PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO DO APELO EXCEPCIONAL. 1. Não se conhece de recurso especial quando a decisão atacada basilou-se, como fundamento central, em matéria de cunho eminentemente constitucional, reportando-se, ainda, em decisão proferida pela Excelsa Suprema Corte. 2. A ilegitimidade da instituição e cobrança, pelo Município recorrido, da Taxa de Iluminação Pública (TIP) e da Taxa de Coleta de Lixo e Limpeza Urbana (TCLLP) é matéria que foge da alçada deste Tribunal Superior, tendo em vista que a Colenda Corte Máxima pronunciou-se sobre o tema em comento ao examinar os RE´s nºs 232.393/SP, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJU de 23/09/1999, e 220.316/MG, Relator o Ministro Ilmar Galvão, DJU de 23/08/1999. 3. Recurso não conhecido" (STJ – 1ª Turma, relator o ministro MILTON PEREIRA, Diário da Justiça da União de 10.04.00, p. 68).
No mesmo sentido o Recurso Especial nº 144.255-SP: não conheceram do recurso, votação unânime, também relator o ministro MILTON PEREIRA, Diário da Justiça da União de 28.02.00, p. 43.
Desnecessária, pois, a meu sentir, a ampliação do debate quando já encontrado pelo juízo o fundamento de direito apto a dirimir a controvérsia neste ponto específico: tendo as taxas sob exame por fato gerador a prestação de serviços inespecíficos, não mensuráveis, indivisíveis e insuscetíveis de serem referidos a determinado contribuinte, eles não podem ser custeados senão por meio do produto da arrecadação dos impostos gerais, sendo inviável sua cobrança – como estou convencido – por meio diverso.
Estes são os motivos porque, à luz do artigo 145, inciso II, da Constituição Federal c.c. o artigo 79, incisos II e III, do Código Tributário Nacional, entendo sem validade jurídica o disposto nos artigos 149 et seq e 167 et seq da Lei Complementar Municipal nº 24, de 14.12.95 – Código Tributário do Município de Jarinu, a esta altura já expressamente revogados pelo artigo 6º da Lei Complementar nº 71, do último dia 05.12.02.