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Inconstitucionalidade do Fundo Garantidor das Parcerias Público-Privadas.

Art. 8º da Lei nº 11.079/04

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Agenda 25/02/2005 às 00:00

Parecer elaborado a pedido da OAB/SP, pela inconstitucionalidade parcial do art. 8º da Lei nº 11.079/04, que criou o Fundo Garantidor das Parcerias Público-Privadas (FGP), o qual servirá para assegurar o pagamento das dívidas da União com os referidos credores, ficando imune ao pagamento de precatórios e ao controle do Tribunal de Contas.

P A R E C E R

: Comissão de Precatórios da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo

Assunto: Artigo 8º da Lei nº 11.079/04, conhecida como Lei das PPPs, que permite a vinculação de receitas públicas e instituição ou utilização de fundos especiais

previstos em lei

A Comissão de Precatórios da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo por seu ilustre Presidente, Dr. Flávio José de Souza Brando, pede o exame da matéria em epígrafe sob o prisma constitucional.

Entende o esforçado e combativo Presidente da Comissão de Precatórios que a reserva de dinheiro público para garantir futuros, possíveis e eventuais credores, em detrimento dos atuais credores por precatórios judiciais é imoral e inconstitucional.

Com a argúcia que lhe é peculiar, vislumbrou no dispositivo legal em referência uma forma de blindar o Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas - FGP - contra eventuais seqüestros de valores referentes a precatórios judiciais descumpridos.

A Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, conhecida como Lei das PPPs, instituiu normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, aplicáveis aos órgãos da Administração Pública, aos fundos especiais, às autarquias, às fundações públicas, às empresas públicas, às sociedades de economia mista e às demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 1º de parágrafo único).

O art. 2º da referida lei define a parceria público-privada como um contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa, típica categoria de direito público.

Nos termos do § 1º do art. 2º a concessão patrocinada é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei nº 8.987, de 13-02-95, [1] quando envolver adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado. O § 2º do mesmo artigo conceitua concessão administrativa como sendo o contrato de prestação de serviços de que a administração pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens.

O art. 8º da Lei nº 11.079/2004 instituiu um peculiar sistema de garantias das obrigações pecuniárias contraídas pela administração, nos seguintes termos:

‘Art. 8º As obrigações pecuniárias contraídas pela Administração Pública em contrato de parceria público-privada poderão ser garantidas mediante:

I – vinculação de receitas, observado o disposto no inciso IV do art. 167 da Constituição Federal;

II – instituição ou utilização de fundos especiais previstos em lei;

III – contratação de seguro-garantia com as companhias seguradoras que não sejam controladas pelo Poder Público;

IV – garantia prestada por organismos internacionais ou instituições financeiras que não sejam controladas pelo Poder Público;

V – garantias prestadas por fundo garantidor ou empresa estatal criada para essa finalidade;

VI – outros mecanismos admitidos em lei.’

Para efeitos do inciso II supra, o art. 16, de antemão, autorizou a instituição de fundo, nos seguintes termos:

‘Art. 16. Ficam a União, suas autarquias e fundações públicas autorizadas a participar, no limite global de R$6.000.000.000,00 (seis bilhões de reais), em Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas – FGP, que terá por finalidade prestar garantia de pagamento de obrigações pecuniárias assumidas pelos parceiros públicos federais em virtude das parcerias de que trata esta Lei.

§ 1º O FGP terá natureza privada e patrimônio próprio separado do patrimônio dos cotistas, e será sujeito a direitos e obrigações próprios.

§2º O patrimônio do Fundo será formado pelo aporte de bens e direitos realizado pelos cotistas, por meio da integralização de cotas e pelos rendimentos obtidos com sua administração.

§ 3º Os bens e direitos transferidos ao Fundo serão avaliados por empresa especializada, que deverá apresentar laudo fundamentado, com indicação dos critérios de avaliação adotados e instruído com os documentos relativos aos bens avaliados.

§ 4º A integralização das cotas poderá ser realizada em dinheiro, títulos da dívida pública, bens móveis dominicais, bens móveis, inclusive ações de sociedade de economia mista federal excedentes ao necessário para manutenção de seu controle pela União, ou outros direitos com valor patrimonial.

§ 5º O FGP responderá por suas obrigações com os bens e direitos integrantes de seu patrimônio, não respondendo os cotistas por qualquer obrigação do Fundo, salvo pela integralização das cotas que subscreverem.

§ 6º A integralização com bens a que se refere o § 4º deste artigo será feita independentemente de licitação, mediante prévia avaliação e autorização específica do Presidente da República, por proposta do Ministro da Fazenda.

§7º O aporte de bens de uso especial ou de uso comum no FGP será condicionado a sua desafetação de forma individualizada.’

Finalmente, o art. 17 prescreve que o FGP será criado, administrado, gerido e representado judicial e extrajudicialmente por instituição financeira controlada, direta ou indiretamente, pela União, com observância das normas a que se refere o inciso XXII do art. 4º da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964.

É o breve relatório. Passemos a examinar a matéria consultada.

Em razão da mistura generalizada entre os interesses, público e privado, um e outro, regidos por princípios opostos, comentando o projeto de lei das PPPs assim nos manifestamos:

´Esse projeto legislativo é um desastre total do ponto de vista jurídico-constitucional. Representa, sem sombra de dúvida, um outro instrumento poderoso de desmontar a administração pública, como a terceirização e a privatização de serviços públicos não terceirizáveis nem privatizáveis´ (Revista Jurídica Consulex, Ano VIII, nº 185, setembro/04, p. 30).

Não se trata de condenar as PPPs enquanto modernos instrumentos de desenvolvimento econômico, por propiciar a execução e manutenção de uma infra-estrutura razoável. O que se questiona é a sua implantação em uma conjuntura inapropriada e a afronta à nossa ordem jurídica, que não é igual a de outros Países onde as PPPs floresceram. Realmente, no mínimo, é bastante estranho o fato de um Estado, que promove a transferência brutal de 38% do PIB, lançar mão de parcerias público-privadas para execução de obras e serviços públicos de sua responsabilidade. E mais, as PPPs, como estão previstas na lei em questão, pressupõe novas transferências para o setor público, sem revestir a denominação de tributos, para ulterior redistribuição direcionada. O critério de escolha do parceiro privado difere daquele esposado pelo Estatuto da Licitação, Lei nº 8.666/93.

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Entretanto, no âmbito da matéria consultada interessa-nos apenas o exame dos incisos I e II do art. 8º da Lei nº 11.079/04, que têm implicações com as normas de Direito Financeiro. Examinemo-los separadamente.


Da vinculação de receitas públicas

O art. 8º, inciso I permite a vinculação de receitas públicas para garantir obrigações pecuniárias contraídas pela Administração Pública em contrato de parceria público-privada, respeitada a proibição do art. 167, IV da CF.

Prescreve o citado dispositivo constitucional:

‘Art. 167. São vedados:

...............................

IV - a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde e para a manutenção e desenvolvimento do ensino, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, e 212, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo;´ [2]

O legislador ordinário partiu da equivocada premissa de que, respeitada a vedação do art. 167, IV da CF, restrita à vinculação da receita de impostos, todas as demais receitas públicas poderiam ser vinculadas para garantia de quaisquer obrigações pecuniárias contraídas pelo poder público.

Nada mais absurdo.

Em primeiro lugar, as garantias mencionadas no texto constitucional referem-se exclusivamente às operações de crédito por antecipação de receita. Essas operações de crédito, previstas no § 8º do art. 165 da CF, conforme escrevemos, "constituem uma modalidade de empréstimo de curto prazo a serem devolvidos no mesmo exercício financeiro. Para tanto a Constituição até abre exceção ao princípio da vedação da vinculação do produto de arrecadação de impostos a órgãos, fundos ou despesas, permitindo a utilização de receitas futuras como instrumento de garantia nas ´operações de crédito por antecipação de receitas´ (art. 167, IV)" [3]. Logo, é o próprio texto excepcional que veda a prestação de garantias para outros fins. Atualmente, as operações de crédito por antecipação de receitas (AROs) só podem ser realizadas nos estritos termos do art. 38 da Lei de Responsabilidade Fiscal, Lei Complementar nº 101/2000.

Em segundo lugar, a expressão ´prestação de garantia´ utilizada no texto da Carta Política não tem o sentido emprestado pelo legislador infraconstitucional, que confundiu noções de direito público com noções de direito privado. Na verdade, nenhum tipo de receita pública pode ser dada em garantia no sentido regulado pelo Código Civil, como veremos mais adiante.

O gênero receita pública, desdobra-se em três espécies: (a) receita originária (a patrimonial mobiliária e imobiliária, e, a industrial, comercial e de serviços); (b) receita tributária (as taxas, os impostos, a contribuição de melhoria, as contribuições sociais de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas; as contribuições sociais de seguridade social e o empréstimo compulsório); (c) receita creditícia (o crédito público ou a dívida pública, interna e externa).

A vedação constitucional do art. 167, IV diz respeito à vinculação da receita de impostos, subespécie do gênero receita pública, no pressuposto de que o produto da arrecadação de imposto destina-se ao custeio de serviços públicos gerais, assim entendidos, aqueles desenvolvidos pelo Estado debaixo do regime jurídico de direito público. Daí, a divisão doutrinária dos tributos, em vinculados e desvinculados da atuação específica do Estado. Os impostos pertencem à categoria de tributos desvinculados de qualquer atuação específica do Estado, [4] ao passo que, a taxa, por exemplo, é tributo vinculado à atuação específica do Estado. O imposto é tributo de destinação extrínseca, ao passo que, as demais espécies tributárias são tributos de destinação intrínseca, isto é, o produto de sua arrecadação é vinculado à despesa que fundamentou sua instituição. Por isso, a utilização de receitas do INSS, por exemplo, para construção de estradas, como já aconteceu, caracteriza gravíssimo desvio acarretando sanções políticas, administrativas e penais.

O direcionamento do produto de arrecadação tributária, principal e regular fonte de receita pública, dá-se por meio da Lei Orçamentária Anual, aprovada pela Casa do Povo (art. 165, III e §§ 5º, 6º, 7º e 8º da CF). Por isso, o princípio da legalidade das despesas públicas é corolário do princípio da legalidade tributária. Tanto a receita compulsória, como a despesa pública hão de ser previamente aprovadas pelo povo, por meio do Parlamento. Não há como o legislador ordinário, fora a Lei Orçamentária Anual, vincular receitas públicas estimadas à esta ou àquela finalidade, com total esvaziamento das funções, política e econômica do Orçamento Público, verdadeiro instrumento de exercício da cidadania à medida em que o povo decide onde, quanto e como gastar.

A vedação do art. 167, IV da CF sob exame, ainda que se refira, em sua parte final, a ´prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita´ (AROs) nada tem a ver com o sistema de garantia no sentido utilizado pelo direito privado (penhor, por exemplo) e muito menos com garantia de obrigações outras, decorrentes de contrato celebrado pela Administração Pública com particulares. Nessa hipótese, como é sabido, preceitos de ordem pública impõem exatamente o contrário: o particular é quem deve prestar garantia. O credor particular, vitorioso em demanda judicial contra o Estado, recebe o montante da condenação na forma do art. 100 da CF. É a regra.

Uma leitura apressada da parte final do inciso IV do art. 167 do CF pode conduzir à equivocada conclusão de que a ´prestação de garantias´ aí referida corresponde àqueles institutos regulados pelo Código Civil, ou seja, de que é possível a garantia pignoratícia de receitas tributárias previstas na Lei Orçamentária Anual.

Ora, toda e qualquer receita pública, não apenas a de impostos, configura bem público indisponível, inegociável e irrenunciável porque existe como instrumento necessário ao cumprimento dos fins do Estado. Receitas públicas, estimadas na lei de meios, não se prestam ao oferecimento de garantias a permitir sua excussão pelo credor, na hipótese de inadimplemento. É pacífico na doutrina e na jurisprudência a impenhorabilidade de bens públicos. Assim sendo, as receitas públicas, como bens públicos que são, não se prestam à execução direta, consectário lógico do vínculo de natureza real, que se estabelece entre a coisa e a ação do credor pignoratício, hipotecário ou anticrético. Por isso, sustenta o festejado Hely Lopes Meirelles:

´Desde que a Constituição da República retirou a possibilidade de penhora de bens da Fazenda Pública Federal, Estadual e Municipal, retirou, também, a possibilidade de oneração de tais bens, uma vez que a execução de toda garantia real principia pela penhora, na ação executiva correspondente, para a subseqüente satisfação da dívida, mediante praceamento ou adjudicação do bem dado em garantia. Uma garantia real que não contasse com a execução direta da coisa onerada, deixaria de satisfazer aos seus fins, desgarantindo o direito do credor. Não seria de modo algum garantia real´. (5)

Esse consagrado publicista, em outra passagem, pontifica:

‘....não importa, por igual, o fim a que se destine a garantia real. Desde que os bens públicos das entidades estatais são insuscetíveis de penhora, sendo a penhora consectário legal da execução para satisfação do crédito, objeto de garantia real, ressalta a impossibilidade de constituir penhor ou hipoteca sobre bens e rendas públicas de qualquer natureza ou procedência. Para a garantia de empréstimo, há o recurso à emissão de títulos e outros mais postos, à disposição da Administração pelo direito financeiro, sem necessidade de o Estado recorrer a institutos de direito civil, que impliquem execução direta sobre os bens vinculados à dívida’. [6]

O não menos festejado jurista, Francisco Campos, também, sustenta que ´o oferecimento de determinados impostos ou garantias de empréstimo público não significa hipoteca dos mesmos impostos ou do substrato do fundo constituído pela sua arrecadação, mas tão somente que os impostos em questão constituem rubrica permanente do orçamento enquanto durar a obrigação resultante do empréstimo. [7]

Com base na lição desses renomados juristas afirmamos que essa ´vinculação tem o sentido de preservar o equilíbrio entre o montante do empréstimo público (dívida pública) e o valor da receita antecipada, evitando-se situações de desequilíbrio orçamentário. Por isso, a entidade política mutuante é obrigada a manter, permanentemente, na lei orçamentária anual dotação específica para garantia do pagamento da dívida, enquanto esta perdurar´. [8]

Não há, portanto, possibilidade jurídica de a receita pública em geral garantir obrigações pecuniárias contraídas pelo poder público em face deste ou daquele particular. Do contrário violados restariam os princípios da impessoalidade e da moralidade, insertos no art. 37 da CF e que são de observância impositiva, nos precisos termos do art. 100 caput da Carta Política:

‘À exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim’.

A jurisprudência de nossos tribunais também não discrepa do quanto exposto. Na apelação civil nº 168.220-1 de que foi Relator o Des. Régis de Oliveira, a E. 8ª Câmara do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo decretou a rescisão parcial do contrato de execução de obra pública, para excluir a cláusula que vinculava as receitas do ICMS para garantia do pagamento. Nos autos do AI nº 722.535-3, de que foi Relator o Juiz Antonio de Pádua Ferraz Nogueira, o 1º TAC manteve a liminar concedida em medida cautelar preventiva, requerida pela Municipalidade de Araçariguama, para suspender os poderes outorgados ao Banco credor (BANESPA) para recebimento do ICMS em pagamento de mútuo decorrente de contrato firmado entre as partes. Esse tema foi ventilado, também, no mandado de segurança impetrado pela Municipalidade de São Paulo contra ato do Presidente do Banespa, que destinava diretamente ao credor, o produto da arrecadação das cotas do ICMS vinculadas em garantia do mútuo. A liminar foi concedida, porém, ao final, o processo foi extinto sem julgamento de mérito a pretexto de irregularidade na representação processual da impetrante. Foi provida a apelação da impetrante anulando a decisão monocrática para determinar a apreciação do mérito (Apelação Cível nº 135.447-1-SP, 8ª Câmara do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Rel. Des. Jorge de Almeida). Antes da decisão de mérito houve acordo das partes e o Município recebeu de volta os valores do ICMS indevidamente compensados com os seus débitos resultantes de operações de empréstimo. Quanto à indisponibilidade da receita pública é de ser lembrada, ainda, no âmbito do Município de São Paulo, a Lei nº 11.713/94, que autorizou o Executivo aumentar o capital social da EMURB mediante, entre outras modalidades, a ´cessão de créditos ou direitos de qualquer natureza´. Com base nessa lei, o Decreto nº 34.798/95 transferiu à EMURB créditos tributários inscritos na dívida ativa, no valor total de R$100.00.000,00. Após concessão da liminar no bojo da ação popular (Proc. nº 145/95 da 7ª VFP), o Decreto nº 34.798/95 foi revogado.

Ora, se a própria vinculação de receita de impostos, permitida pela Constituição Federal, em caráter excepcional, para prestação de garantias visando a obtenção de receita creditícia, de natureza temporária, não pode ser interpretada em sentido amplo, permitido pelo direito privado, o que não dizer de vinculação de receita pública para garantia de obrigações outras, decorrentes de contratos de parcerias público-privadas?

Evidente que não se pode invocar a regra excepcional do art. 167, IV da CF para concluir que demais receitas públicas não estão abrangidas pela proibição. A regra geral, que decorre do sistema constitucional, é a não vinculação das receitas públicas para garantia dessas ou daquelas obrigações contraídas pelo poder público. A exceção contida no inciso IV do art. 167 da CF não tem o sentido emprestado pelo legislador infraconstitucional que, por meio de uma interpretação literal e isolada, ignora em bloco os rígidos princípios de direito público. Aliás, o referido inciso, ao excepcionar a vinculação para um fim específico, ipso fato, afastou a vinculação para fim outro.

Absolutamente inconstitucional o inciso I do art. 8º da Lei nº 11.079/04, que permite a vinculação de receitas públicas, para garantia das obrigações pecuniárias genéricas contraídas pelo Poder Público perante os particulares. Isso é uma verdadeira inversão da ordem pública, que afronta os princípios da moralidade e da impessoalidade, insertos no art. 37 da Constituição Federal, de observância impositiva na forma do seu art. 100, caput. Ironicamente, esse art. 8º atenta, como vimos, contra o art. 167, IV da CF, que ele próprio manda observar em seu inciso I, in fine.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

. Inconstitucionalidade do Fundo Garantidor das Parcerias Público-Privadas.: Art. 8º da Lei nº 11.079/04. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 597, 25 fev. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/16615. Acesso em: 23 nov. 2024.

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