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Chamamento público

Agenda 08/05/2017 às 11:42

Trata-se de parecer sobre a dispensa de licitação para compras de gêneros alimentícios de pequenos produtores locais, com chamamento público na espécie.

CHAMADA PÚBLICA nº - 01/2017

Processo Adm nº 0329-020/2017

Consulente - Comissão Permanente de Licitação.

Assunto – Análise de minuta do edital e contrato, certame Chamada Pública.

PARECER – NOTA TÉCNICA– PROCURADORIA MUNICIPAL

PROCESSO DE DISPENSA DE LICITAÇÃO – CHAMADA PÚBLICA. ANÁLISE DA MINUTA DO EDITAL E CONTRATO (artigo nº 38 da Lei 8.666/93, Lei 11.947/2009, e Resolução do FNDE/CD nº 26/2013.


I – CONSULTA

A Comissão, por meio de seu presidente, WENDEL DE SÁ SANTOS, nomeado através da Portaria de nº 023/2017, requer a elaboração de Parecer Jurídico acerca das Minutas do Edital e do Contrato, referentes ao Procedimento de Chamada Pública nº 01/2017.

A presente Chamada Pública tem como objeto a compra de gêneros alimentícios da agricultura familiar.

Anexo aos autos, constam os seguintes documentos:

- Solicitação de informações de Disponibilidade Orçamentária (fls. ___);


II – FUNDAMENTAÇÃO

2.1 – DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO E DA NECESSIDADE DO EXAME DAS MINUTAS PELA ASSESSORIA JURÍDICA DA ADMINISTRAÇÃO.

Observe-se o que determina o Parágrafo Único do art. 38, da Lei nº 8.666/93, in verbis:

“Art. 38. O procedimento da licitação será iniciado com a abertura do processo administrativo, devidamente autuado, protocolado e numerado, contendo a autorização respectiva, a indicação sucinta de seu objeto e do recurso próprio para a despesa, e ao qual serão juntados oportunamente:

(...)

Parágrafo Único. As minutas de editais de licitação, bem como as dos contratos, acordos, convênios ou ajustes devem ser submetidas, previamente, à análise da assessoria jurídica da Administração. (Redação dada pela Lei nº 8.883 de 08/06/94).” (negritamos)

Desta forma, percebemos que o artigo invocado ordena que as minutas do Edital e respectivo Contrato, sejam analisados previamente pela assessoria jurídica da Administração Pública, no caso em especial, pela Procuradoria do Município.

Para corroborar o que diz o parágrafo único do artigo 38 da Lei 8.666/93, urge trazer à baila o entendimento de JUSTEN FILHO (2014, p. 548)[1] “O parágrafo único determina a obrigatoriedade da prévia análise pela assessoria jurídica das minutas de editais e de contratos (ou instrumentos similares)”.

Além disso, observamos por meio dos documentos arrolados ao processo, que os mesmos estão em conformidade com o disposto na legislação aplicável, atendendo aos parâmetros jurídicos legais pertinentes, especialmente a Lei nº 8.666/93, quais sejam:

a) verificação da necessidade da contratação do serviço;

b) presença de pressupostos legais para contratação, dentre eles, disponibilidade de recursos orçamentários;

c) autorização de licitação pelo Chefe do Executivo;

d) prática de atos prévios indispensáveis à licitação (cotação de preços e justificativa para contratação);

e) definição clara do objeto (termo de referência);

f) solicitação de abertura do certame e definição da modalidade licitatória; e

g) minuta do ato convocatório e contrato.

No que se refere especialmente às Minutas do Edital e do Contrato, referente ao Procedimento de Chamada Pública em comento, depreende-se que as mesmas estão aptas a produzirem seus efeitos normativos, atendendo aos parâmetros jurídicos legais, especialmente a Lei Federal a Lei 8.666/93.

2.2 – Da Chamada Pública em casos de aquisição de gêneros alimentícios par agricultura familiar para a alimentação escolar:

Inicialmente, cabe evidenciar que todas as aquisições governamentais, em regra, devem se submeter a um processo licitatório, conforme preceitua a Constituição Federal de 1988:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

(...)

XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras       e alienações     serão    contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas  que estabeleçam  obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. (grifou-se)

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No sentido de regulamentar o aludido dispositivo constitucional foi editada a Lei nº 8.666/93, que assim estatui em seu artigo 2º:

Art. 2o As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses  previstas nesta Lei. (grifou-se)

Cabe evidenciar, ainda, que as aquisições governamentais também podem ser realizadas sob o regramento especificado pela Lei nº 10.520/2002 (Lei do Pregão).

Neste contexto, observa-se que a Lei nº 8.666/93, em seus artigos 17, 24 e 25, prevê os casos e hipóteses em que os processos licitatórios poderão ser, respectivamente: dispensados, dispensáveis ou inexigíveis.

Importante salientar que, mesmo existindo hipóteses que dispensam ou inexigem o processo licitatório, isso não desobriga a Administração Pública de observar procedimentos pertinentes a essas formas de licitar. Ou seja, mesmo para as hipóteses de licitações dispensadas ou inexigíveis a Lei trás formalidades indispensáveis e que devem ser prontamente atendidas pelos órgãos/entidades públicas licitantes, sob pena de incursão em crime.

Neste contexto, é pertinente registrar que a Lei nº 11.947/2009, em seu artigo 14, introduziu no ordenamento jurídico que rege as aquisições governamentais e as contratações públicas uma nova hipótese de licitação dispensável, ou seja, estatuiu outra hipótese de dispensa de licitações além daquelas previstas no artigo 24 da Lei nº 8.666/93, literis:

Art. 14. Do total dos recursos financeiros repassados pelo FNDE, no âmbito do PNAE, no mínimo 30% (trinta por cento) deverão ser utilizados na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações, priorizando-se os assentamentos da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas e comunidades quilombolas.

§ 1o A aquisição de que trata este artigo poderá ser realizada dispensando-se o procedimento licitatório, desde que os preços sejam compatíveis com os vigentes no mercado local, observando-se os princípios inscritos no art. 37 da Constituição Federal, e  os alimentos atendam às exigências do controle  de qualidade estabelecidas pelas normas que regulamentam a matéria. (grifou-se)

Assim, pela análise ao texto normativo acima apresentado, pode-se chegar às seguintes conclusões: a) no mínimo 30% dos recursos repassados no âmbito do PNAE, para a aquisição de gêneros alimentícios da merenda escolar, deverão ser destinados aos fornecimentos realizados pela Agricultura Familiar e/ou pelo Empreendedor Familiar Rural poderão ser realizadas por meio de licitação dispensável b) as aquisições junto à Agricultura Familiar e/ou ao Empreendedor Familiar Rural poderão ser realizadas por meio de licitação dispensável.

Conclui-se, portanto, que as aquisições de gêneros alimentícios por meio de licitação dispensável é uma faculdade, não havendo nenhum óbice para que os gêneros alimentícios possam ser adquiridos por meio de regular processo licitatório, respeitando- se, claro, o percentual reservado à Agricultura Familiar e/ou ao Empreendedor Familiar.

Neste sentido, é importante registrar que o Conselho Deliberativo do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – CD/FNDE, regulamentando a Lei nº 11.947/2009, mais recentemente editou a Resolução nº 26/2013, que assim disciplinou a aquisição de gêneros alimentícios no âmbito do PNAE:

Art. 18 Os recursos financeiros repassados pelo FNDE no âmbito do PNAE serão utilizados exclusivamente na aquisição de gêneros alimentícios.

Parágrafo único. A aquisição de qualquer item ou serviço, com exceção dos gêneros alimentícios, deverá estar desvinculada do processo de compra do PNAE.

Art. 19 A aquisição de gêneros alimentícios, no âmbito do PNAE, deverá          obedecer         ao        cardápio          planejado pelo nutricionista, observando as diretrizes desta Resolução e deverá ser realizada, sempre que possível, no mesmo ente federativo em que se localizam as escolas, priorizando os alimentos orgânicos e/ou agroecológicos. Art. 20 A aquisição de gêneros alimentícios para o PNAE deverá ser realizada por meio de licitação pública, nos termos da Lei nº            8.666/1993 ou da Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, ou, ainda, por dispensa do procedimento licitatório, nos termos do art. 14 da Lei nº 11.947/2009.

§1º Quando a EEx. optar pela dispensa do procedimento licitatório, nos termos do art. 14, §1º da Lei nº 11.947/2009, a aquisição será feita mediante prévia chamada pública.

§2º Considera-se chamada pública o procedimento administrativo voltado à seleção de proposta específica para aquisição de gêneros alimentícios           provenientes   da         Agricultura     Familiar e/ou Empreendedores  Familiares  Rurais  ou  suas  organizações. (grifou- se)

Desta forma, constata-se que a Resolução CD/FNDE nº 26/2013 vinculou a faculdade pela dispensa do procedimento  licitatório  às  aquisições  realizadas  junto  à Agricultura Familiar e/ou a Empreendedores Familiares Rurais ou suas organizações, estabelecendo para este fim o procedimento administrativo  denominado  chamada pública.

Neste rastro, o próprio § 2º do artigo 20 da Resolução CD/FNDE nº 26/2013 define chamada pública como “o procedimento administrativo voltado à seleção de proposta específica para aquisição de gêneros alimentícios provenientes da Agricultura Familiar e/ou Empreendedores Familiares Rurais ou suas organizações.”

Importante mencionar que o FNDE, por meio do Manual de Aquisição  de Produtos da Agricultura Familiar para a Alimentação Escolar2, estabelece, passo a passo, todos os procedimentos a serem observados pelas Entidades Executoras do PNAE – EEx. quando optarem pela utilização da dispensa do procedimento licitatório, definindo a chamada pública como:

“O procedimento administrativo voltado à seleção de proposta específica para aquisição de gêneros alimentícios provenientes da agricultura familiar e/ou empreendedores familiares rurais ou suas organizações. É um instrumento firmado no âmbito das estratégias de compras públicas sustentáveis, que assegura o cumprimento dos princípios constitucionais da legalidade e da eficiência, ao passo que possibilita a veiculação de diretrizes governamentais importantes, relacionadas ao desenvolvimento sustentável, ao apoio à inclusão social e produtiva local e à promoção da segurança alimentar e nutricional.

Assim, em relação ao pregão e a outras formas de licitação, apresenta maior possibilidade de atender às especificidades necessárias à aquisição da agricultura familiar. Em outras palavras, entende-se que a Chamada Pública é a ferramenta mais adequada porque contribui para o cumprimento das diretrizes do Pnae, no que se refere à priorização de produtos produzidos em âmbito local de forma a fortalecer os hábitos alimentares, a cultura local e a agricultura familiar, aspectos fundamentais na garantia do segurança alimentar e nutricional.

Ainda, as Entidades Executoras podem realizar mais de uma Chamada Pública por ano se, por razões de conveniência e oportunidade, facilitar o processo de compra, em respeito à sazonalidade dos produtos, bem como a problemas climáticos ou de outra ordem.

A Chamada Pública, desta forma, é o instrumento mais adequado para atender ao limite mínimo obrigatório de 30% de aquisição de alimentos da agricultura familiar. E mais: o procedimento da Chamada Pública poderá ser ampliado para até a totalidade dos recursos da alimentação escolar repassados pelo FNDE, desde que voltados para a aquisição de produtos da agricultura familiar, e em acordo com as mesmas normas aqui apresentadas.”

Ademais, é oportuno evidenciar que a Resolução CD/FNDE nº 26/2013 estabelece todos os requisitos e procedimentos para a aquisição de produtos da agricultura familiar para a alimentação escolar mediante a dispensa de processo licitatório, dentre eles:

1º – ORÇAMENTO: levantamento dos recursos orçamentários disponíveis.

2º – ARTICULAÇÃO ENTRE OS ATORES SOCIAIS:   mapeamento

dos produtos da agricultura familiar.

3º – CARDÁPIO: o nutricionista responsável técnico elabora os cardápios da alimentação escolar, incluindo alimentos  regionais, com respeito às referências nutricionais e aos hábitos alimentares locais, e conforme a safra.)

4º – PESQUISA DE PREÇO: Os preços dos produtos a serem adquiridos da agricultura familiar deverão ser previamente estabelecidos pela Entidade Executora e publicados no edital da Chamada Pública.

5º – CHAMADA PÚBLICA

6º – ELABORAÇÃO DO PROJETO DE VENDA: O projeto de   venda é o documento que formaliza o interesse dos agricultores familiares em vender sua produção para a alimentação escolar.

7º – RECEBIMENTO E SELEÇÃO DOS PROJETOS DE VENDA :

apresentação dos documentos exigidos para a habilitação  do produtor fornecedor.

8º – AMOSTRA PARA CONTROLE DE QUALIDADE

9º – CONTRATO DE COMPRA

10º – ENTREGA DOS PRODUTOS, TERMO DE RECEBIMENTO E PAGAMENTO DOS AGRICULTORES


III – CONCLUSÃO

Em face do exposto, opinamos no sentido de que o objeto em questão pode ser adquirido mediante a dispensa de licitação por meio do CHAMAMENTO PÚBLICO, desde que seja para a aquisição de gêneros alimentícios da agricultura familiar e desde que os preços sejam compatíveis com os vigentes no mercado local, além de que sejam cumpridas todas as normas anteriormente já explicitadas neste parecer para, só assim, estar apto a produzir seus devidos efeitos.

Quanto às minutas do edital e contrato da Chamada Pública nº 01/2017, após análise, entendemos que as mesmas encontram-se aptas a produzirem seus devidos efeitos.

Por derradeiro, cumpre salientar que a Procuradoria emite parecer sob o prisma estritamente jurídico, não lhe competindo adentrar a conveniência e à oportunidade dos atos praticados no âmbito da Administração, nem analisar aspectos de natureza eminentemente técnico-administrativa, além disso, este parecer é de caráter meramente opinativo, não vinculando, portanto, a decisão do Gestor Municipal (TCU, Acórdão nᵒ 2935/2011, Plenário, Rel. Min. WALTON ALENCAR RODRIGUES, DOU de 17/05/2011). Como diz JUSTEN FILHO (2014. p. 689) “o essencial é a regularidade dos atos, não a aprovação da assessoria jurídica”, ou seja, o gestor é livre no seu poder de decisão.

É o parecer. S.M.J.

Água Branca-AL, 07 de abril de 2017.

WAGNER TINÔ DE CARVALHO

Procurador do Município

Portaria nº 251/2013


Nota

[1] Justen Filho, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 16. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.

Sobre o autor
Wagner Tinô

Procurador Municipal efetivo na cidade de Água Branca-AL; especialista em Direito Público pela Universidade Anhanguera - UNIDERP. Membro da Associação dos Procuradores Municipais de Alagoas - APROMAL;

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