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Interpretação do § 1º do artigo 840 da CLT:

da iliquidez do pedido inicial no processo do trabalho

Agenda 14/11/2017 às 08:38

Sob pena de afronta ao princípio da Inafastabilidade da Jurisdição, o §1º do art. 840 da CLT deve ser interpretado com razoabilidade para que se aplique subsidiariamente o art. 324 do CPC, diante de situações que impedem a liquidação imediata do pedido.

PARECER

REQUISITANTE: SINDICATO DOS TRABALHADORES EM EMPRESAS DO RAMO FINANCEIRO NO ESTADO DO CEARÁ – SINTRAFI/CE

Em resposta a solicitação da coordenação do departamento jurídico da entidade sindical acima referenciada, segue opinativo técnico acerca da necessidade de liquidação de todos os pedidos veiculados em reclamações trabalhistas, a serem ajuizadas a partir do início da vigência da lei que institui a denominada reforma trabalhista.

 É cediço que em 11 de novembro do corrente ano, a Lei nº 13.467, iniciou sua vigência, passando a integrar o ordenamento jurídico pátrio e trazendo consigo uma série de retrocessos na caminhada de afirmação dos direitos fundamentais dos trabalhadores.

 Ao Judiciário caberá, mais do que nunca, a tutela das garantias constitucionais e a interpretação legal conforme a Constituição. Com efeito, as alterações trazidas pela reforma trabalhista hão de ser aplicadas a partir de processo hermenêutico que exige olhar sistêmico, histórico e sociológico, porquanto, há visível inversão e deturpação dos princípios que informam e alicerçam o Direito do Trabalho, bem como o Direito Processual do Trabalho.

 Um dos exemplos da idiossincrasia valorativa trazida pela Lei 13.467 consiste na regra insculpida no § 1º do art. 840 que estabelece que a reclamação escrita “deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante.” 

Assim o faz, exigindo a nova redação do artigo 840, sob pena de extinção do pedido sem julgamento de mérito (§3º). Porém, a diversidade de circunstancias que envolvem as relações de trabalho impede em inúmeros casos que a liquidação do pedido seja efetivada de logo na petição inicial.

 Com efeito, por vezes a liquidação do pedido depende necessariamente da juntada aos autos de documentos que se encontram na posse da parte adversa, ou de situações a serem colhidas e examinadas na fase de conhecimento, ou, ainda, quando os próprios limites de liquidação devam surgir da interpretação da norma aplicada ao caso concreto, dentre outras possibilidades.

 Como usualmente as reclamações trabalhistas ajuizadas pelo departamento jurídico da referida entidade sindical veicula reclamações trabalhistas que projetam seus efeitos a parcelas vincendas, depara-se com situação que não se compatibiliza com a nova regra processual do §1º do artigo 840, da CLT. Pode-se, ainda, por amor ao argumento, ser relembrado que algumas ações tratam exclusivamente de obrigação de fazer ou não fazer, nas quais não se comporta liquidação.

De modo que, parece lógico que a regra insculpida no §1º do artigo 840 da CLT fora projetada para aplicação nas situações em que inexiste qualquer impedimento para a liquidação do pedido. Sendo manifesta a inexistência de qualquer previsão acerca das circunstâncias excepcionais apontadas acima no texto celetista.

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Entender de outro modo significa negar efetividade ao princípio da Inafastabilidade da Jurisdição, insculpida no inciso XXXV do artigo 5º da Constituição Federal, obstruindo-se de forma definitiva o amplo acesso à Justiça.

Portanto, a aplicação da exceção contida no art. 324, III, do CPC é inegável, face à omissão apontada. Por ser assim, a autorização para pedidos ilíquidos nessas hipóteses, prevista na norma processual civil, justificasse exatamente diante da lacuna da lei processual trabalhista que não versa sobre as exceções ao pedido liquidável. Assim, a aplicação da exceção do processo comum não encontra qualquer óbice.

Evidente, assim, aplicam-se ao processo do trabalho as exceções que autorizam pedidos genéricos na forma do art. 324, do CPC, especialmente nas hipóteses de seus incisos II e III, que apesar de serem corriqueiras no processo do trabalho, fugiram da perspectiva legislativa que reformou a lei processual celetista.

Por ser assim, entende-se que as ações a serem ajuizadas com a assistência do departamento jurídico do SINDICATO DOS TRABALHADORES EM EMPRESAS DO RAMO FINANCEIRO NO ESTADO DO CEARÁ – SINTRAFI/CE nas quais emerge qualquer hipótese de impossibilidade de liquidação imediata do pedido, as quais devem ser indicadas especificamente, há de ser produzida preliminar requerendo admissão da peça inicial, apesar da iliquidez do pedido exordial, tendo em vista tratar o respectivo caso de circunstância excepcional, com aplicação do artigo 324, do CPC.

Esse é o entendimento da subscritora, salvo melhor juízo.

ANA VIRGINIA PORTO DE FREITAS

OABCE Nº 9.078

Sobre a autora
Ana Virginia Porto de Freitas

Advogada trabalhista e sindical. Professora. Especialista em Direito Processual Civil e Direito do Trabalho.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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