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Mandado de injunção para regulamentação dos moto-táxis

Agenda 01/06/1999 às 00:00

Mandado de injunção contra o Município, reclamando a regulamentação da profissão do moto-táxi, com base no direito constitucional ao trabalho e na auto-aplicabilidade dos direitos fundamentais.

EXMO. SR. JUIZ DE DIREITO DA _ VARA CÍVEL DESTA COMARCA DE NOVA ANDRADINA – ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL.

XXXX, firma individual inscrita no CGC n. XXXX, estabelecida na rua XXXX, nesta cidade, via de seu advogado "in fine" firmado, com escritório profissional na Av. Antonio Joaquim de Moura Andrade, n. 551, 1º. andar, vem, com o devido acatamento perante a augusta presença de V. Exa., ajuizar o presente

MANDADO DE INJUNÇÃO

contra o MUNICÍPIO DE NOVA ANDRADINA - MS, pelos motivos fáticos e jurídicos adiante articulados:


OS FATOS E FUNDAMENTOS JURÍDICOS DO PEDIDO

A requerente, empresa prestadora de serviços de transportes via motocicleta, teve indeferido pela autoridade impetrada, em data de 18 de novembro de 1997, pedido de ALVARÁ DE LICENÇA para a exploração da atividade denominada "moto-táxi".

Tal se deu pelo fato desta atividade não ter sido ainda regulamentada neste município, haja vista a Resolução do CETRAN / MS n. 009 de 31 de março de 1997, e publicado no Diário Oficial n. 4.498 de 03 de abril de 1997, que, em seu art. 1º, estabelece o que segue:

"Art. 1º Fica proibido o serviço de transporte individual de passageiros prestado por motocicletas, de forma remunerada, no Estado de Mato Grosso do Sul até que seja regulamentado nos termos do art. 42 do Código Nacional de Trânsito".

Por seu turno, apregoa o art. 42 do CTN, atual 107:

"Art. 42. Os veículos de aluguel, destinados ao transporte individual de passageiros, ficarão subordinados ao regulamento baixado pela autoridade local e, nos Municípios com população superior a cem mil habitantes, adotarão exclusivamente o taxímetro como forma de cobrança do serviço prestado."

Corolário disso, o Secretário do Planejamento, Sr. Brandão, atendendo a requerimento da Secretaria Municipal de Obras e Serviços Urbanos desta cidade, expediu parecer (doc. anexo) contrário à concessão do ALVARÁ DE LICENÇA pleiteado pela requerente, tendo nele deixado consignado o seguinte:

"Para conceder alvará é preciso a criação do serviço no âmbito do Município, o que ainda não foi feito."

Cumpre-nos lembrar, Exa., que este não foi o primeiro requerimento pleiteando ALVARÁ DE LICENÇA para possibilitar o exercício da atividade mencionada.

Com efeito, já em 24 de julho de1997, foi denegado um pedido no mesmo sentido (doc. anexo), desta vez levado a efeito pela empresa "XXXX".

Na época, a referida empresa – "XXXX" – tentou, junto ao Poder Executivo e Legislativo local, a regulamentação de tal serviço, não tendo logrado o mínimo de êxito em razão do "lobby" efetivado pelos taxistas locais, que se sentiram e se sentem, até hoje, ameaçados com a possibilidade da referida atividade ser regulamenta, haja vista que em ocorrendo tal fato a população desta cidade não mais precisaria se submeter aos preços não acessíveis cobrados pelos mesmos, que malgrado, acreditamos, sejam lícitos, estão distantes do importe permitido pela lógica e pelo bom senso.

Estes obstáculos, é da sabença geral, não são exclusivos desta cidade. Tal resistência é e foi percebida em todas as cidades brasileiras onde se tentou regulamentar tal ofício.

Ora, a bem do Estado Democrático de Direito e dos mais comezinhos preceitos constitucionais, o Poder Judicante não pode permitir que a requerente seja prejudicada por esta omissão, que acreditamos voluntária, por parte principalmente do Poder Legislativo local, que, "no passo que anda", pode chegar ao segundo milênio sem ter possibilitado o exercício desta profissão em nossa urbe, enquanto que na cidade de Dourados, Campo Grande e em várias outras de nosso Estado e de todo o país, tal atividade já é comum, sendo certo que tem em muito beneficiado a população, notadamente a mais carente, pois, se por um lado propicia uma prestação de serviço eficiente e de baixos custos, por outro oferece empregos.

A requente, cumpre lembrar, vem bater às portas do Poder Judiciário no escopo único e exclusivo de conseguir a chance de exercer a função que, segundo brocardo antigo, "dignifica o homem", o trabalho. Isto quando, é forçoso reconhecer, muitos neste país tentam, e no mais das vezes conseguem, viver do ilícito, à margem da lei.

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Com efeito, não nos permite o bom senso deixar de olvidar as palavras da Lex Legum pátria, que preconiza:

"Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Município e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I – soberania;
II – a cidadania;
III – a dignidade da pessoa humana;
IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;..."
(grifo nosso)

Ainda, sob o título de DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS, reza a CF/88:

"Art. 5º. (Omissis)
"XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;"
(grifo nosso)

E incisivamente estabelece o seguinte:

"Art. 5º (omissis)
§1ºAs normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata."
(grifo nosso)

Outrossim, o art. 6º da CF erige o direito ao trabalho como um direito social, senão vejamos:

"Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição."
(grifo nosso)

Em seu art. 170 e 193, prega a CF:

"Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e da livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social,..".
(grifo nosso)

"Art. 193. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais."
(grifo nosso)

No celebrado "Curso de Direito Constitucional Positivo", do ilustre JOSÉ AFONSO DA SILVA, 8ª edição, Ed. Malheiros, 1992, encontramos os seguintes ensinamentos:

"O art. 6º define o trabalho como direito social, mas nem o art. 7º trazem norma expressa conferindo o direito ao trabalho. Este, porém, ressai do conjunto de normas da Constituição sobre o trabalho. Assim, no art. 1º, IV, se declara que a República Federativa do Brasil tem como fundamento, entre outros, os valores sociais do trabalho; o art. 170 estatui que a ordem econômica se funda na valorização do trabalho, e o art. 193 dispõe que a ordem social tem como base o primado do trabalho. Tudo isso tem o sentido de reconhecer o direito social ao trabalho, como condição da efetividade de uma existência digna (fim da ordem econômica) e , pois, da dignidade da pessoa humana, fundamento, também, da República Federativa do Brasil (art. 1º, III). E aqui se entroncam o direito individual ao livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, com o direito social ao trabalho, que envolve o direito de acesso a uma profissão, à orientação e formação profissional, à livre escolha do trabalho, ..."
(grifo nosso)

Outrossim, como para cada direito há uma ação correspondente e como, também, a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito, a Carta da República previu que quando um direito, in casu o direito ao trabalho, não puder ser exercitado em função da ausência de uma norma regulamentadora, é cabível o MANDADO DE INJUNÇÃO, senão vejamos.

A Carta da República, em seu art. 5º, inciso LXXI, estabelece o seguinte:

"Art. 5º ... (omissis)
LXXI – conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania;"

À respeito, encontramos respaldo, dentre outros, nos sábios ensinamentos de HELY LOPES MEIRELLES, in MANDADO DE SEGURANÇA, Ed. Malheiros, 14ª edição, onde ensina:

"Mandado de injunção é o meio constitucional posto à disposição de que se considerar prejudicado pela falta de norma regulamentadora, que torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania (CF, art. 5º, LXXI)."

"O objeto, portanto, desse mandado é a proteção de quaisquer direitos e liberdades constitucionais, individuais ou coletivos, de pessoa física ou jurídica, e de franquias relativas relativas à nacionalidade, à soberania popular e à cidadania, que torne possível sua fruição por inação do Poder Público em expedir normas regulamentadoras pertinentes."

"Entendemos cabível, eventualmente, até mesmo a medida liminar como providência cautelar para evitar lesão a direito do impetrante do mandado de injunção, desde que haja possibilidade de dano irreparável se se aguardar decisão final da Justiça. Se tal medida é cabível para a defesa de direito individual ou coletivo amparado por lei ordinária, com mais razão há de ser para proteger os direitos e prerrogativas constitucionais asseguráveis pelo mandado de injunção, desde que ocorram os pressupostos do fumus boni iuris e do periculum in mora."

"A liminar não é uma liberalidade da justiça, é medida acauteladora do impetrante, que não pode ser negada quando ocorrem os seus pressupostos".

O E. Ministro Eduardo Ribeiro, ainda no TRF, nos agracia com o ensinamento seguinte:

"Consoante tenho explicitado em diversos outros casos, a lei estabelece que a liminar será deferida, uma vez presentes os pressupostos exigidos"
(MS n. 121.078 – fls. 202)

Isto posto, MM. Juiz, comprovado que está que a requerente teve e tem restringido seu direito ao trabalho pela injustificável inação do Poder Público local em regulamentar tal atividade, é de rigor a concessão do MANDADO DE INJUNÇÃO LIMINARMENTE, inaudita altera parte, a fim de que possa a mesma, desde já, exercer sua atividade.


 OS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR

Se revela nas normas invocadas e está assentado no direito ao trabalho agasalhado por preceitos constitucionais, in casu restringidos pela falta de uma norma regulamentadora da atividade da requerente, consoante já demonstrado.

"Periculum in mora"

Reside na possibilidade de lesão irreparável ou de difícil reparação caso não seja deferido liminarmente o mandamus requerido, haja vista que em razão da mora do Poder Legislativo local, não pode a requerente laborar e colher os frutos de sua atividade, ainda mais após ter montado toda uma estrutura para servir de modo proficiente a população desta cidade e circunvizinhas, sendo que é certa, ainda, a presença do lucro cessante.

Se consubstancia, ainda mais, na impossibilidade de exercício dos direitos fundamentais previstos na carta magna, o direito ao trabalho.


O PEDIDO E REQUERIMENTOS

Ante ao todo exposto, requer:

  1. seja concedida a medida liminar, "inaudita altera parte", autorizando a requerente a exercer sua atividade ("moto-táxi") até que seja a mesma regulamentada;
  2. seja o presente mandado de injunção julgado procedente, condenando-se a suplicada nas custas processuais, honorários advocatícios e demais cominações legais;
  3. seja citado o representante legal da suplicada para, querendo, contestar a presente;
  4. Provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos;

Dá-se a causa o valor de R$ 100,00 (cem reais).

Termos em que,
Pede e espera deferimento.

Nova Andradina - MS, 20/05/99.

WALTER AP. BERNEGOZZI JUNIOR
OAB/MS n. 7.140

Sobre o autor
Walter Ap. Bernegozzi Junior

advogado e professor universitário em Nova Andradina (MS)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BERNEGOZZI JUNIOR, Walter Ap.. Mandado de injunção para regulamentação dos moto-táxis. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 32, 1 jun. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16163. Acesso em: 24 dez. 2024.

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