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Ação de impugnação de mandato eletivo por compra de votos

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Agenda 01/11/2001 às 01:00

CONCLUSÃO

Infere-se, pois, que os representados abusaram do poder econômico, político ou de autoridade, beneficiando-se destas práticas ilícitas.

Protesta e requer provar o alegado por todos os meios de prova admitidos no ordenamento jurídico pátrio, mormente através de documentos - juntados nesta oportunidade e aqueles que ainda serão anexados aos autos – bem como, através dos depoimentos dos personagens abaixo arrolados, requerendo desde já, a notificação dos mesmos para comparecerem à audiência a ser designada por V. Exª.

Ex positis,

o MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL requer:

1. o recebimento da presente ação de impugnação de mandato eletivo e a citação dos representados para oferecerem defesa;

2. notificação das pessoas abaixo arroladas para comparecerem à audiência de instrução a ser designada por V. Exª.;

3. a cassação dos diplomas, bem como, dos mandatos eletivos dos representados, com espeque no art. 41-A e § 5.º, do art. 73, ambos da Lei n.º 9.504/97 e do art. 14 §§ 10 e 11 da CF;

P. deferimento.

Gararu, 26 de dezembro de 2000

Félix Carballal Silva

1. Recurso 9.104 – Natal – TSE.

2. In Instituições de Direito Eleitoral, Editora Del Rey, 3.ª edição, Belo Horizonte, 2.000.

3. Citado por Djalma Pinto in Direito Eleitoral : Temas Polêmicos, Rio de Janeiro, Forense, 1994, págs. 43 e seg.

4. Luiz Djalma Barbosa Bezerra Pinto, in Direito Eleitoral : Temas Polêmicos, Rio de Janeiro, Forense, 1994, págs. 43 e seg.

5. Ob. Cit.

6. Ob. Cit. p. 49.

7. In Código de Processo Civil Comentado, Editora Revista dos Tribunais, 4.ª Edição, São Paulo, 1999, p. 794.

8. In Instituições de Direito Eleitoral, Editora Del Rey, 3.ª edição, Belo Horizonte, 2.000, págs. 312 e 313.

9. Ob. Citada, p. 309.

10. In IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, Atlas, 2.ª edição, págs. 50 e 51.

11. Ob. Citada, págs. 117 e 118.

12. DJALMA PINTO, in Direito Eleitoral, Temas Polêmicos, Editora Forense, 1.ªedição, 1994,, págs. 50 e 51.

13. ADRIANO SOARES DA COSTA, Ob. Cit. p. 309.

14. Ob. Cit. p. 470.


A seguir, o memorial de razões finais apresentado pelo Ministério Público, autor da ação:

ofereceu AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO em face de A A DE R J diante dos seguintes fatos, in verbis:

      "Poucos dias antes das últimas eleições municipais o ora representado doou dinheiro à família do Sr. JOÃO MARQUES VIEIRA DA SILVA - "JOÃO BOLA" - a fim de obter-lhe o voto, entregando à Sra. ANA CLEIDE DOS SANTOS, companheira daquele, a importância de R$ 30,00 (trinta reais).

      Além disso, ainda no período de campanha, o representado doou à eleitora JEANE DOS SANTOS, uma cesta básica contendo arroz, feijão, massa de milho, dentre outros gêneros alimentícios, a fim de obter-lhe o voto.

      Dando continuidade ao "seu trabalho", o representado doou à eleitora MARIA DE FÁTIMA DOS SANTOS um fogão de duas bocas, bem como, um vale no valor de R$ 10,00 (dez reais) - o qual foi trocado por alimentos - com o escopo de obter-lhe o voto.

      Como se não bastasse, o representado, no dia 29 de setembro do ano em curso, por volta das 19:00 h., ofereceu e entregou ao eleitor JOSÉ AILTON DOS SANTOS uma cesta básica contendo alimentos, com o fito de obter-lhe o voto.

      Com efeito, muitos foram os comentários, às vésperas das eleições municipais, a respeito da distribuição de cestas básicas. Foram, inclusive, apreendidas inúmeras bolsas contendo os produtos da refeição elementar no armazém do Sr. ALAIN SANTONE, mas as peças de informação foram arquivadas por falta de prova da distribuição de tais alimentos - documentos em anexo.

      Agora, aliada aos elementos probatórios apresentados nesta peça, tal apreensão revela indícios contra o representado, na medida em que há ligações íntimas entre este e o Sr. Alain, porquanto a esposa deste é prima do representado.

      Enfim, com tais condutas, o representado entregou bens a eleitores, em busca, é claro, de votos."

Devidamente notificado, o representado ofereceu "CONTESTAÇÃO" às fls. 44 usque ad 48, argüindo - preliminarmente - "LITISPENDÊNCIA - EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO". No mérito, asseverou que não praticou os fatos descritos na inicial.

Manifestamo-nos a respeito da preliminar suscitada e requeremos a rejeição da mesma pelos motivos esposados às fls. 52/53.

A fls. 54 este Juízo saneou o processo, determinou a reunião do presente feito ao de n.º 270/2000 (AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL POR ABUSO DE PODER ECONÔMICO contra o mesmo representado e sobre os mesmos fatos) e designou audiência de instrução.

No referido ato solene foi ouvido o representado, bem como, as testemunhas arroladas na exordial (fls. 56/64 - autos n.º 270/00). A defesa desistiu da oitiva das testemunhas que indicou.

Cumpridas as diligências solicitadas pelo Parquet, vêm os autos para pronunciamento conclusivo.

Eis, em suma, o relato da marcha processual.


Compulsando acuradamente os elementos de prova emanados dos autos, cremos que restaram integralmente corroborados os fatos descritos na exordial. Senão vejamos.

As pessoas ouvidas na instrução processual asseveraram de forma contundente, peremptória, ipsis litteris:

ANA CLEIDE DOS SANTOS - fls. 56: "Que recebeu do representado a importância de R$ 30,00 (trinta reais) (...) Que quando o representado foi a casa da depoente, esta lhe pediu dinheiro e o mesmo lhe disse que entregaria o dinheiro na quarta feira anterior as eleições."

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JOÃO MARQUES VIEIRA DA CRUZ - fls. 58: "Que a sua companheira de nome Ana Cleide recebeu do representado a importância de R$ 30,00 (trinta reais) (...) Que o dinheiro foi entregue na quarta feira que antecedeu as eleições. Que mandou Ana Cleide dizer a Toinho que iria votar no mesmo, pois o mesmo iria dar os trinta reais para comprar remédio para sua filha."

JEANE DOS SANTOS - fls. 59: "Que recebeu uma cesta básica a mando do representado contendo: arroz, feijão, farinha na quarta feira que antecedeu as eleições (...) Que quando o representado entregou o papelzinho a depoente perguntou se a mesma poderia ajudá-lo."

JOSÉ AILTON DOS SANTOS - fls. 61: "Que foi procurado pelo representado na fazenda onde trabalha e indagou do mesmo o que este lhe daria em troca do voto já que só é procurado pelos candidatos às vésperas das eleições, então este lhe ofereceu a importância de R$ 40,00 (quarenta reais), tendo o depoente recebido na sexta feira que antecedeu as eleições, em troca do voto. Que o representado deu a Jeane uma bolsa de alimentos e um fogão com botijão a esposa do depoente, de nome Maria de Fátima."

MARIA DE FÁTIMA DOS SANTOS - fls. 62: "Que foi procurada pelo representado que lhe prometeu um fogão de duas bocas a fim de obter-lhe o voto, tendo recebido o citado fogão na véspera da eleição. Que recebeu a importância de R$ 10,00 (dez reais) na véspera da eleição do representado...". - Incluímos os destaques.

Consoante demonstram os documentos de fls. 16, 19, 21, 63, 64 e 67 (autos n.º270/00), tais personagens (com exceção de Ana Cleide) são eleitores de Gararu e votaram nas últimas eleições.


Por outro lado, as condutas praticadas pelo representado importam abuso de poder econômico, conforme demonstrado na peça vestibular, especialmente às fls. 12 à 14. Os ensinamentos doutrinários ali transcritos, amoldam-se como uma luva ao caso concreto sub judice.

Complementando tais lições, importante trazer à colação o magistério de OLIVAR CONEGLIANM, in "Propaganda Eleitoral Aspectos Legais", Juruá Editora, Curitiba -1992, pp. 63/65, ipsis verbis:

"59 Qual ação caracterizaria abuso de poder econômico?

      Caracterizar abuso de poder econômico é fácil. O difícil, para a Justiça Eleitoral tem sido provar esses abusos. Assim, o simples ato de dar dinheiro para um cabo eleitoral para ajudar nas eleições já se constitui em abuso de poder econômico. A colocação de cartazes de um único candidato a vereador ou a deputado, sem igualdade com os demais candidatos do mesmo partido, também pode caracterizar abuso de poder econômico, pois fica claro que o candidato isolado fez despesas não permitidas.

      60. Nem se há de falar em compra de eleitor, de oferta de emprego, ou oferta de bens, de entrega de objetos, como botinas, cestas básicas, carro, óculos, dentaduras, etc. Da mesma forma constitui abuso de poder econômico a instituição de prêmios, shows com distribuição de brindes, etc. Há candidatos que mandam fazer brindes pequenos, como canetas, réguas, isqueiros, camisetas, bonés. Apesar do pouco valor desses brindes, sua distribuição é proibida e pode trazer problemas para os candidatos.

Ainda sobre o tema, valioso o entendimento do Desembargador Augusto Falcão Lopes, ao apreciar questão atinente a abuso de poder econômico e de autoridade, verbo ad verbum:

Claro, pois, que se patrocinava a candidatura de alguém, e assim agia distribuindo bens à população carente, inclusive com a presença física de seu candidato, evidente que manifesta a influência no recebimento de tais favores de quem os recebia, no momento do voto; não há necessidade de que o Prefeito peça o voto em contrapartida ao oferecimento do favor, basta que ele pratique o favor porque se estabelece o elo entre o oferecimento ilegal e o resultado voto[1]. - Inovamos com destaques.

Por amor ao debate, refutamos, desde logo, tese no sentido de que não se configura o abuso de poder (político ou econômico) quando a conduta não é "capaz de influenciar o resultado do pleito".

Não podemos concordar com tal pensamento, porquanto apenas prestigia infratores em detrimento da aplicação correta da lei e da justiça, sem encontrar respaldo na legislação.


Observe-se que as normas legais que combatem o abuso de poder, não exigem a ocorrência do resultado para sua incidência ao caso concreto. Este (resultado) poderá ou não ocorrer, é indiferente. Em matéria de direito penal, é o que se denomina infração formal, isto é, aquela que se consuma "antecipadamente, sem dependência de ocorrer ou não o resultado desejado pelo agente[2]". Vejamos alguns exemplos:

Código Eleitoral: 

"Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro ou dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita".

Lei n.º 9.504/97: 

"Art. 41 - A -... constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza..." - inovamos com negrito.

O TSE, em diversos julgados, já seguiu por esta mesma trilha, ad verbum:

      Jurisprudência do TSE

      Número do Processo Tipo do Processo 1314 RAREG - AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO Tipo do Documento Nº Decisão Município - UF Origem Data 1 - Acórdão 1314C RJ 24/06/1999 Relator COSTA PORTO Relator designado PublicaçãoDJ - Diário de Justiça, Data 13/08/1999, Página 85

      Ementa

      AGRAVO DE INSTRUMENTO. AGRAVO REGIMENTAL. PROVIMENTO. RECURSO ESPECIAL. INVESTIGACAO JUDICIALABUSO DE PODER ECONOMICO.NAO SE EXIGE PARA A CONFIGURACAO DO ABUSO DE PODER ECONOMICO A RELACAO DE CAUSA E EFEITO ENTRE O ATO E ORESULTADO DAS ELEICOES (RESPS. NS. 11.469, 12.282, 12.394 E 12.577).

      Jurisprudência do TSE

      Número do Processo Tipo do Processo 12577 RESP - RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Tipo do Documento Nº Decisão Município - UF Origem Data 1 - Acórdão 12577C PR 02/04/1996 Relator TORQUATO JARDIM Relator designado - Publicação RJTSE - Revista de Jurisprudência do TSE, Volume 8, Tomo 1, Página 222. DJ - Diário de Justiça, Data 03/05/1996, Página 13948

      Ementa

      ABUSO DE PODER ECONOMICO OU POLITICO.

      1. PRATICAS ILEGAIS JUDICIALMENTE APURADAS (ALICIAMENTO DA VONTADE POPULAR ATRAVES DA DISTRIBUICAO DE DINHEIRO E PROMOCAO DE TRATAMENTOS MEDICOS CUSTEADOS PELA MA QUINA ADMINISTRATIVA) HABEIS A PROVOCAR UM DESEQUILIBRO NO PROCESSO DE DISPUTA POLITICA, CARACTERIZANDO ABUSO DE DIREITO, QUE NAO EXIGE COMPROVACAO DE NEXO ENTRE CAUSA E EFEITO.

       2. RECURSOS CONHECIDOS E PROVIDOS.

       Precedentes/Sucessivos

       (Prec.) RO Nº:9104 (CC) - RN, Rel.: BUENO DE SOUZA

       (Prec.) RESP Nº:11841 (CC) - RJ, Rel.: TORQUATO JARDIM

       No mesmo sentido:

       Jurisprudência do TSE

       Número do Processo Tipo do Processo 15161 RESP - RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Tipo do Documento Nº Decisão Município - UF Origem Data 1 - Acórdão 15161C - SP 16/04/1998 Relator EDUARDO RIBEIRO Relator designado Publicação

       DJ -, Data 08/05/1998, Página 69

       RJTSE - Revista de Jurisprudência do TSE, Volume 10, Tomo 02, Página 202

A propósito, merece encômios recente decisão emanada do Juízo Eleitoral da 33.ª Zona Eleitoral deste Estado (Comarca de Poço Verde), na qual o Dr. Aldo de Albuquerque Mello[3], seguindo a corrente adotada pelo TSE nas decisões supracitadas, reconheceu abuso do poder econômico por parte do prefeito reeleito com 67% dos votos válidos ("alcançando uma diferença de 4.000 votos em um universo de 11.000 votos válidos"), cassando o registro do mesmo e declarando sua inelegibilidade.

Com efeito, nesta corajosa e brilhante decisão, prevaleceu o bom senso.

Pensamento diverso, data vênia, representa estímulo ao infrator, na medida em que prevalece a seguinte máxima:

"É melhor abusar bastante do poder, aliciar inúmeros eleitores, pois assim, maior será o resultado eleitoral em favor do infrator e inviável tornar-se-á a ação da Justiça Eleitoral, diante da impossibilidade de demonstrar a influência da conduta abusiva no resultado concreto das eleições".

Parece-nos claro, como o sol do meio dia, que a Justiça Eleitoral não pode permitir referida situação.

Os comportamentos comprovados nestes autos, revelaram a maneira de atuar do então candidato (representado) em sua "campanha", merecendo severa censura por parte do Estado, não apenas para que fatos semelhantes não se repitam, mas sobretudo, para que seja assegurada a liberdade do voto e o Estado Democrático de Direito.


Ex positis, requeremos a cassação do diploma, bem como, do mandato eletivo do representado, com espeque no art. 41-A e § 5.º, do art. 73, ambos da Lei n.º 9.504/97 e do art. 14 §§ 10 e 11 da CF; acolhendo-se a representação em todos os seus termos.

P. deferimento.

Gararu, 10 de abril de 2001

Félix Carballal Silva

1.TER/Piauí (Ac. Public. no DJE 25/03/92).

2.Celso Delmanto, in Código Penal Comentado, Renovar, 4.ª edição, 1998, p. 18

3.Sentença prolatada em 15 de dezembro de 2.000 pelo Juízo de Direito da 33.ª Zona Eleitoral - Sergipe.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

. Ação de impugnação de mandato eletivo por compra de votos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16424. Acesso em: 22 nov. 2024.

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