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Ação civil pública para obrigar o Município a prestar serviço de iluminação pública

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Ação civil pública ajuizada em face do Município, para que aplique as verbas da contribuição específica para a prestação eficiente do serviço de iluminação pública, sob pena de suspensão da cobrança do respectivo tributo.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 2ª VARA CÍVEL E DOS FEITOS DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE ILHÉUS-BA:

"Entretanto, não basta ter propriedade predial e territorial urbana para ser sujeito passivo da Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública -CIP, há que ser o sujeito passivo um consumidor de energia elétrica beneficiado efetivamente com o aqui-e-agora do serviço de iluminação pública e não num futuro ainda que próximo" 1.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA, por intermédio da Promotora de Justiça que esta subscreve, lotada na 8ª Promotoria de Justiça de Ilhéus, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, legitimada pelos artigos 129, inciso III, da Constituição Federal, 25, inciso IV, letra a, da Lei nº 8.625/93, 5º, caput, da Lei 7.347/85 e 82, inciso I, da Lei nº 8.078/90, vem perante Vossa Excelência ajuizar a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA, Com pedido de tutela antecipada, EM DEFESA DOS CONSUMIDORES, pelo rito ordinário, contra MUNICÍPIO DE ILHÉUS, pessoa jurídica de direito público interno, CNPJ nº xxxxxx/xxxx, representada por seu Prefeito, Sua Excelência J.S.R., brasileiro, natural de Itabuna, nascido em xx-xx-xx, casado, filho de ELE e ELA, advogado, RG xxx-xx, CPF xxx.xxx.xx-xx, residente na Rua XXXX, s/nº, XX, Ilhéus, com domicílio legal na Prefeitura Municipal, sita na Praça J.J. Seabra, s/nº, Centro, Ilhéus, pelas razões fáticas e jurídicas que passa a expor, para adiante requerer:


1. DOS FATOS

Foram instaurados pela 8ª Promotoria de Justiça da Comarca de Ilhéus os procedimentos administrativos de números 032/01, 081/01 e 08/03, os quais seguem anexos.

Todos possuíam o escopo de apurar possível malferimento a direitos dos consumidores e cidadãos ilheenses, residentes nos bairros Salobrinho, São Miguel e Nossa Senhora da Vitória, os quais alegaram, em síntese, sofrerem com a insuficiência da prestação do serviço de iluminação pública pelo Município de Ilhéus, em que pese a cobrança da Taxa de Iluminação Pública (TIP), atualmente denominada Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP) na conta de energia elétrica.

No transcurso do procedimento, foram juntadas representações de associações de outros dois bairros da cidade, o Basílio (fl. 186) e o Jardim Pontal (fl. 198), onde foi afirmado, veementemente, sofrerem com o descaso do Município de Ilhéus em solucionar o problema da falta de iluminação nas vias públicas.

Além de sentirem-se lesados pelo poder público, que não oferece a contraprestação ao tributo pago, os moradores dos referidos bairros padecem de segurança em seus lares e ruas, haja vista o incremento, nessas áreas, da prática de ilícitos penais, facilitada pela precariedade da iluminação pública, conforme informações prestadas pelo Sr. Jonildo Barbosa Santos, presidente do Projeto Pequeno Bairro, com atuação no Bairro Basílio (fl. 186)

Cumpre salientar que os cidadãos ouvidos por esta Promotoria de Justiça foram uníssonos em afirmar a negligência do Poder Público, representado pelo Município de Ilhéus, em solucionar o grave problema da ineficiência de iluminação pública nos bairros supracitados.

O Sr. Luiz Antonio Barros Almeida asseverou, em termo de declarações à fl. 06, ter procurado, por diversas vezes, a Prefeitura Municipal de Ilhéus para noticiar os problemas com a iluminação pública que afligiam a comunidade do Salobrinho, bem como para solicitar a adoção das medidas pertinentes para solucioná-los.

Esta também foi a conduta da Srª. Luciene Regina Smirelli, a qual comprou, ela própria, conforme comprova a nota fiscal de fl. 144, lâmpada para substituição em poste da via pública, revelando que no Bairro São Miguel, em outubro de 2002, havia a falta de mais de setenta lâmpadas (fl. 139).

Por conduto da Associação dos Moradores do Bairro Nossa Senhora da Vitória, soube-se que os moradores também estão comprando lâmpadas para colocação nos postes de vias públicas. Nem mesmo o serviço de substituição é prestado pela Prefeitura Municipal de Ilhéus. Os próprios moradores trocam as lâmpadas queimadas, "com risco de eletrocussão e quedas, já que não dispõem de conhecimentos técnicos nem estrutura para tal iniciativa" (fl. 131).

Em síntese, embora tenha sido procurado pelos cidadãos, o Município de Ilhéus não adotou nenhuma providência para que os postes estivessem dotados de lâmpadas, de modo a iluminar devidamente os logradouros. Limitou-se a justificar a deficiência na iluminação pública dos bairros Nossa Senhora da Vitória, Salobrinho, São Miguel, Jardim Pontal e Basílio pela falta de lâmpadas para efetuar a reposição.

E em assim sendo, muitos moradores, cansados de esperar que o Município solucionasse o problema, compraram por conta própria lâmpadas para repor nos postes (fl. 139). Isto comprova que o Município de Ilhéus descumpre com sua função de manter suficientemente iluminados todos os logradouros, ensejando a situação acima descrita. Os cidadãos, já onerados com a elevada carga tributária, ainda custeiam a reposição de lâmpadas da rua onde residem, tarefa que é de competência do poder público local.

Tal conduta do réu é totalmente lesiva aos moradores dos bairros mencionados, pois são estes cobrados por um serviço do qual não usufruem. Possuem o status de cidadãos/consumidores no momento em que o tributo é computado compulsoriamente em suas respectivas contas de energia elétrica fornecidas pela COELBA, mas não são assim tratados pelo poder público quando reclamam a contraprestação.

A comprovação de que dos moradores é efetuada a cobrança da Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP), nova denominação legal da taxa de iluminação pública (TIP), encontra-se juntada às fls. 47/129 e 158/182.

Segundo a previsão legal municipal, o valor da Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP) tem o valor máximo de R$ 120,00 (cento e vinte reais), para pessoa física, e de R$ 1.200,00 (um mil, duzentos reais), para pessoa jurídica. Quando se tratar de imóvel sem ligação de energia elétrica, a cobrança é efetuada conforme a área do imóvel, sendo que o valor máximo anual é de R$ 500,00 (quinhentos reais) (fls. 195/196).

Cabe ressaltar que a cobrança da Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP) é efetuada pela COELBA, que repassa seu valor ao Município de Ilhéus, por força de convênio (fls. 188/194). Neste, há cláusula que assegura à concessionária a retenção de valores para quitação de débitos da Prefeitura Municipal de Ilhéus (fl. Cláusula quarta, item IV.2, fl. 190)

Não obstante, os valores da arrecadação são expressivos. Conforme tabela encaminhada pela COELBA, juntada à fl. 197, a arrecadação líquida da Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP), de janeiro de 2003 a março de 2004 foi a seguinte:

2003

Valor Líquido arrecadado R$

janeiro

120.665,61

Fevereiro

108.095,21

Março

113.916,93

Abril

124.961,15

Maio

120.749,94

Junho

122.349,21

Julho

152.057,91

Agosto

156.508,60

Setembro

175.609,61

Outubro

185.125,98

Novembro

169.382,92

Dezembro

195.712,23

2004

Valor Líquido arrecadado R$

Janeiro

228.226,55

Fevereiro

205.654,09

Março

238.799,87

Destarte, os valores arrecadados são mais que suficientes para que a manutenção de lâmpadas em postes situados em logradouros públicos seja efetuada com regularidade e presteza.

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Cabe salientar que as dificuldades encontradas pelos munícipes de atendimento pelo Município de Ilhéus também foram encontradas pelo Ministério Público. A Secretaria de Serviços Públicos, responsável pela iluminação Pública (fl. 07), sequer respondeu aos ofícios, tivessem eles o conteúdo de solicitação, caso dos ofícios nº 83-A/2002 (fl. 09), 131-A/2002 (fl. 19), 112/01 (fl. 30), 321/02 (fl. 34), 209/03 (fl. 36), 136/03 (fl. 146), 404/03 (fl. 148), tivessem eles o conteúdo de requisição, a exemplo dos ofícios nº 375/03 (fl. 38), 605/03 (fl. 40), 748/03 (fl. 42),606/03 (fl. 150), 606/03 (fl. 151), 840/03 (fl. 153). Isto forçou o encaminhamento das peças aos Promotores de Justiça Criminais, para fins do artigo 10 da Lei nº 7.347/85.

Diante do comportamento adotado pelo réu, infere-se a impossibilidade de solução extrajudicial, bem como fica demonstrado ser mister o aforamento da presente demanda, buscando, pela via judicial, garantir a devida iluminação elétrica das vias públicas deste Município.


2. DA LEGITIMIDADE DO MUNICÍPIO DE ILHÉUS

Embasado no artigo 149-A da Constituição Federal, o Município de Ilhéus vem cobrando da população em geral Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP), embutida na conta mensal enviada pela COELBA, como comprovam as cópias das contas pagas pelos munícipes, às fls. 15/18, 27 e 141/143.

O montante auferido, em vez de ser repassado ao ente público, pode ser retido pela concessionária, por força de convênio realizado entre esta e a Prefeitura de Ilhéus, como forma de quitação de dívidas.

Embora a COELBA arrecade a Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP), podendo até retê-la, o fato é que a receita é auferida em nome do poder público local. Não possui, destarte, a concessionária qualquer participação na relação material, cujo objeto é o tributo. Sendo assim, não detém legitimidade passiva ad causam, haja vista que relação tributária é estabelecida entre o Município e seus contribuintes.

Neste sentido, colaciona-se entendimento do Tribunal de Alçada de Minas Gerais:

"A CEMIG na verdade recebe os valores da taxa imposta pelo Município, e as transfere à Prefeitura ou as utiliza para amenizar débitos da Prefeitura, quando existentes, consoante assinala a apelada. Atividade esta, a evidência, insusceptível de legitimá-la para responder à ação" – Juiz-Relator Dr. Murilo Pereira – in Apelação Cível nº 3.195 de 17/10/86.

Por outro lado, cabe aos Municípios zelar pela devida prestação de serviço de iluminação pública. É este um serviço público de interesse local, da competência do ente federativo municipal, nos moldes do artigo 30 da Constituição da República. E, por conseguinte, é do Município a legitimidade para figurar no pólo passivo da presente demanda.


3. DO DIREITO

O artigo 149-A da Constituição Federal, com nova redação dada pela Emenda Constitucional nº 39/2002, reza o seguinte:

Art. 149-A. Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III.

Parágrafo único. É facultada a cobrança da contribuição a que se refere o caput, na fatura de consumo de energia elétrica."

Tal dispositivo foi resultado de pressões sofridas pelos Deputados Federais e Senadores, que atenderam aos clamores dos gestores municipais ante a perda da receita proveniente da combatida Taxa de Iluminação Pública, sobre a qual já havia diversas decisões judiciais reconhecendo a sua inconstitucionalidade.

Assim sendo, a Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP) substituiu a famigerada Taxa de Iluminação Pública e, por meio de emenda modificativa, angariou status de norma constitucional.

Por conta disto, várias ações civis públicas estão sendo aforadas nas mais diversas comarcas do país, visando a interrupção da cobrança deste tributo que para muitos, embora tenha sido alterada a nomenclatura, continua inconstitucional.

Em que pese terem algumas dessas ações logrado êxito na obtenção de liminares suspensivas da cobrança do tributo, tem-se que o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, estribado no argumento político da manutenção da segurança, ordem e economia públicas, direciona-se para a cassação destas. Assim, o Ministro Nilson Naves, em decisão prolatada nos autos do processo STA-60, tombado sob o nº 2003/0235842-2, deferiu o pedido de suspensão de tutela antecipada formulado pelo Município de São Paulo, pois, para ele, restou claro o potencial danoso da decisão que suspendeu a cobrança.

Em seu voto, o Ministro alegou ser a iluminação pública um serviço essencial indispensável à segurança e ao bem-estar da população e que este não poderia estar vulnerável à falta de receita, asseverando que "a manutenção da tutela antecipada concorrerá para o não cumprimento dos investimentos necessários em flagrante prejuízo ao interesse público".

Concessa vênia, se pôde o eminente Ministro do Superior Tribunal de Justiça lastrear a sua decisão no argumento da essencialidade do serviço de iluminação pública, maior razão assiste ao MM. Juiz para reconhecer a omissão e a responsabilidade do Município de Ilhéus face à inexistência ou indevida prestação do serviço de iluminação pública nos logradouros dos bairros Salobrinho, Nossa Senhora da Vitória, São Miguel, Basílio e Jardim Pontal, cujos moradores, por sua vez cumprem com suas respectivas obrigações tributárias.

Não tem a presente ação o fulcro de adentrar no âmago da inconstitucionalidade da Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP), tampouco o da inconstitucionalidade das Leis Municipais nº 3.002/2002 e 3.009/2003 que a instituíram.

O objetivo desta ação é que o Município de Ilhéus cumpra com sua função de desempenhar os serviços públicos de interesse local, proporcionando a devida iluminação nos logradouros, serviço este inexistente ou insuficiente nos bairros mencionados.

A realidade tem demonstrado que os gestores públicos não respeitam nem as normas constitucionais, nem as de caráter tributário. Corroborados pelo Poder Legiferante, acabam por reduzir o direito tributário a um instrumento, cuja finalidade seja de mera arrecadação para custear seus devaneios e irresponsabilidades administrativas. Olvidam, todavia, de que é o Direito Tributário um dos ramos do Direito Público mais informado pelas normas e princípios contidos na Constituição Federal.

Esta afirmação é veemente comprovada quando da avaliação da aplicação de receitas angariadas com os tributos no âmbito local. Embora seja a natureza da Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP) altamente controvertida, tem-se que, enquanto espécie tributária, possui destinação intrínseca e está vinculada à atuação do Estado.

Aceitar a alegação do Município, ora réu, de que não existem verbas para proceder à reposição de lâmpadas e manutenção dos postes é corroborar com a conduta lesiva daquele. E ainda, tal afirmação leva a um outro questionamento: -Afinal, para onde vai toda a receita angariada com a Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP)?"

Poder-se-ia dizer que fica retida pela COELBA, por força da cláusula quarta, IV.2 do convênio firmado entre a concessionária e o Município de Ilhéus (fl. 190). Contudo, a mesma cláusula vincula a retenção dos valores arrecadados à liquidação das obrigações do Município relativos ao fornecimento de energia elétrica para o serviço de iluminação pública. Se este serviço não está sendo prestado, não se justifica qualquer retenção.

Poder-se-ia dizer, ainda, que o valor afinal repassado ao Município é menor que o arrecadado, por força da taxa de prestação de serviço cobrada pela COELBA. No entanto, deduz-se da redação do item IV.3 da supracitada cláusula que o desconto para lançamento, arrecadação e controle da Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP) é de 3,38% sobre o produto bruto. Qual o destino, então, do percentual restante?

Tem-se, então, o quadro de descumprimento e desrespeito pelo Município de Ilhéus dos princípios regedores da Administração Pública, ditados pelo artigo 37 da Constituição Federal, in verbis:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

Fere-se, principalmente, o princípio da eficiência, tido como o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros2.

3.1 DA INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

A inteligência do artigo 175 da Constituição Federal chama a atenção para a prestação dos serviços públicos:

"Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.

Parágrafo único. A lei disporá sobre:

(...)

II - os direitos dos usuários;

III - política tarifária;

IV - obrigação de manter serviço adequado"

Serviço público, na abalizada lição de MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO é toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público. 3

Para a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANNEL), "Iluminação Pública é o serviço que tem por objetivo prover de luz ou claridade artificial, no período noturno ou nos escurecimentos diurnos ocasionais, os logradouros públicos".

Tem-se, portanto, que a iluminação pública é um serviço público de natureza essencial, prestado uti universi, que deveria ser objeto de imposto. Entretanto não foi essa a compreensão do Poder Legislativo que, inexplicavelmente, instituiu sua cobrança sob a forma de contribuição.

Assim, os moradores, contribuintes e usuários de energia elétrica, são compelidos a pagar o valor atinente à Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP) em suas contas mensais de energia.

Poder-se-ia questionar se é a remuneração específica pela prestação do serviço público a causa determinante de sua sujeição à disciplina legal das relações de consumo 4 e, com base neste entendimento, descartar a regulação pela norma consumerista. Isto porque, desta forma, a prestação de serviço de iluminação pública dos logradouros seria um serviço público de natureza geral, não possuindo os atributos da especificidade e da divisibilidade.

Entretanto, in casu, não restam dúvidas quanto à aplicação da Lei n.º 8.078/90, seja porque o próprio poder constituinte derivado, sem se utilizar da técnica jurídica, instituiu um verdadeiro imposto com a nomenclatura de contribuição, seja porque até mesmo esta espécie tributária presume vinculação à atuação estatal.

Neste diapasão, não assiste razão àqueles que procuram excluir do regime jurídico das relações de consumo a prestação de serviço de iluminação pública. A Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP) possui o mesmo fato gerador que a famigerada Taxa de Iluminação Pública.

Por conseguinte, o usuário deste serviço também deve ser considerado consumidor e gozar da proteção especial da lei consumerista. E em assim sendo, de acordo com o inciso X do artigo 6º da Lei nº 8.078/90, é direito básico do consumidor a devida prestação do serviço público, no caso dos autos, de iluminação pública.

3.2 DA RELAÇÃO ENTRE ILUMINAÇÃO PÚBLICA E SEGURANÇA

É cediço que, ao menos teoricamente, o tributo nominado de Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP) deveria prestar-se à viabilização da manutenção completa da rede de iluminação pública municipal. Entretanto, a prática comprova o contrário, visto que os moradores dos referidos bairros, bastante populosos, carecem do serviço de iluminação nas vias públicas.

Assim não é difícil intuir que a receita angariada na arrecadação do referido tributo esteja sendo utilizada em outras finalidades, a exemplo de saneamento de eventuais problemas de caixa nos cofres públicos do Município de Ilhéus, esquecendo-se este de sua responsabilidade na devida prestação do serviço público, cuja essencialidade é notória.

A prestação de serviço público de forma inadequada, insuficiente ou até mesmo, inexistente, acarreta a responsabilidade do poder público face aos prejuízos decorrentes de eventuais danos aos consumidores, pois agride direitos básicos destes.

Neste sentido, infere-se das informações coligidas no Procedimento Administrativo nº 081/01-Con, em anexo, que a falta de iluminação nos logradouros públicos dos referidos bairros vem ocasionando desconforto e perigo em potencial à vida e incolumidade física de seus respectivos moradores, haja vista a incidência de maior violência nos locais que não contam com a devida prestação do serviço.

Afinal, as ruas que não possuem iluminação, tornam-se locais ermos e são, cada vez mais, redutos de meliantes que, encobertos pela mortalha da escuridão, atuam, mormente em crimes contra o patrimônio e contra os costumes, causando sensação de insegurança nos munícipes.

A segurança pública é um direito do cidadão e um pressuposto para o exercício da cidadania. Embora não esteja inserida no rol constitucional de interesses locais, visto que é matéria de âmbito nacional, da competência da União e dos Estados, cabe ao Município, como poder público mais próximo dos cidadãos, complementar a atuação dos governos federal e estadual. Neste sentido, pertinentes as seguintes palavras:

"A Segurança Pública, em princípio, não se inscreve no rol dos "serviços públicos de interesse local". A defesa da Cidadania também não se limita, em principio, aos horizontes municipais. Entretanto, nem por isso, o Município está descomprometido com a luta pela Segurança Pública e pela Cidadania.A Segurança Pública e a Cidadania, numa primeira abordagem, são interesses sociais que transcendem o "interesse local". Mas se assim é, numa primeira abordagem, cabe um aprofundamento da questão. A Segurança Pública e a Cidadania, por envolverem o cotidiano das pessoas, acabam repercutindo no âmbito daquelas relações face a face, diretas, paroquiais que dão aos dois temas certas feições de "interesse local". Por esta razão, cabe ao Município suplementar a ação federal e estadual para garantir a população local "segurança pública" e "cidadania". 5

Ademais este não é um problema privativo da cidade de Ilhéus. Em muitos outros municípios o índice de criminalidade é mais elevado nos locais onde não se dispõe de eficiente iluminação pública.

Assim é que os jornais de todo país apontam a omissão do poder público em fornecer devidamente os serviços públicos de natureza essencial, como uma das causas determinantes do aumento da criminalidade. Veja-se trecho extirpado da Revista Eletrônica Tipiti:

"Entretanto, o que temos presenciado é um maior número de casos de violência, em especial contra crianças e adolescentes, o abandono total de vários bairros da grande São Luís, por exemplo, no Vassoural (onde morava o 20º menino assassinado) não há um único posto de polícia a quilômetros de distância. Para completar o descaso, falta iluminação pública, telefones públicos, transporte em quantidade suficiente para servir a população e o mais grave, o tráfico de drogas e armas impera nesses locais". 6

E ainda, basta frisar que, à época da crise energética vivenciada pelo Brasil no ano de 2001, a maior preocupação dos Secretários de Segurança Pública dos diversos Municípios era com a possibilidade de blecautes, visto que a criminalidade certamente aumentaria, como aduz trecho da reportagem eletrônica abaixo transcrita:

"Não é à toa que os secretários de Segurança Pública do país ficaram atônitos quando o governo anunciou a real possibilidade do blecaute, caso as metas de economia de energia não sejam atingidas. Além do possível aumento da criminalidade, haverá uma grande sensação de insegurança nas pessoas o que vai piorar ainda mais a imagem do governo perante a opinião pública". 7

A responsabilidade do Município de Ilhéus é evidenciada quando da análise do artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor:

"Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código".

Portanto, resta comprovado o liame de causalidade entre a falta de iluminação pública e aumento da criminalidade, fato que põe em risco à vida e integridade de um grande número de moradores doa bairros Salobrinho, Nossa Senhora da Vitória, São Miguel, Basílio e Jardim Pontal.

Reforce-se, mais uma vez, que os consumidores e usuários cumprem com sua obrigação tributária, mas não contam com a contraprestação do Município de Ilhéus, que permanece negligente e inerte aos perigos advindos a seus munícipes por conta de sua conduta omissiva.

Frise-se que essa conduta impinge aos cidadãos/usuários o sentimento de usurpação, por parte do poder público, de seus ganhos. A dívida para a cobertura da iluminação pública não é do consumidor e, sim, do Poder Público Municipal. O valor para o serviço de iluminação pública foi contratado entre o Município de Ilhéus e a COELBA.

Além de cobrar do consumidor dívida que não é, originariamente sua e a qual não se propôs a pagar, o réu e a concessionária omitem a quantia de energia consumida, não informam que o débito pertence ao Município e ainda efetuam, como sabido, a suspensão do fornecimento de energia elétrica se o débito indevidamente exigido não for pago, na forma, prazo e valor por eles estipulado.

A cobrança, da forma como é feita, está a evidenciar um verdadeiro ato de confisco em nome do município. A concessionária usa do poder de coerção que tem em suas mãos, qual seja, a ameaça da suspensão de serviço essencial, caso o pagamento do tributo não seja feito8.

E ainda, é vergonhoso constatar o fato de que alguns moradores, com o fito de solucionar o problema, passaram a arcar com o ônus de comprar as lâmpadas para os postes, mesmo efetuando o pagamento do tributo.

Neste sentido, não poderia o Município continuar a cobrar pela Contribuição se não oferece a devida fruição do serviço de iluminação pública aos moradores e consumidores dos referidos bairros.

Este é o entendimento do Ministério Público do Mato Grosso do Sul, que vem acionando muitos Municípios, requerendo a suspensão de cobrança "casada" de energia elétrica com a Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP).9

Em síntese, ante o dever inescusável do Município em promover direta ou, indiretamente, através de sua concessionária, a iluminação pública dos logradouros situados nos bairros mencionados, restou comprovada a omissão deste ente público, fazendo-se mister seja reconhecida sua responsabilidade pelos danos, inclusive morais, decorrentes de sua conduta, no mínimo, negligente.

Sobre as autoras
Karina Gomes Cherubini

Promotora de Justiça do Estado da Bahia. Especialista em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Especialista em Gestão Pública pela Faculdade de Ilhéus. Especialista em Direito Educacional pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Geana Cruz de Assis

Estagiária do Ministério Público

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHERUBINI, Karina Gomes; ASSIS, Geana Cruz. Ação civil pública para obrigar o Município a prestar serviço de iluminação pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1090, 26 jun. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16696. Acesso em: 22 nov. 2024.

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