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Coisa julgada inconstitucional e ação rescisória em matéria tributária.

Restabelecimento do crédito tributário

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Agenda 17/10/2007 às 00:00

III. O OBSTÁCULO PROCESSUAL AO CONHECIMENTO DO RECURSO DE AGRAVO REGIMENTAL

20. Com efeito, há um obstáculo intransponível ao conhecimento do Agravo sob exame: a matéria constitucional nasceu nos julgamentos do Egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Não foi no STJ, no julgamento do REsp n. 333.258, que as questões constitucionais que ora se pretendem submeter ao crivo do STF foram debatidas. Foi, repita-se no TRF 1.

21. Por essa razão, que a Empresa interpôs, perante o TRF 1, a petição de recurso extraordinário que veio a ter o seu seguimento negado na instância originária, em despacho do Vice-Presidente daquela Corte regional. Nada obstante, foi interposto Agravo de Instrumento em Recurso Extraordinário n. 2001.01.00.028805-0, que, em vez de ascender ao Pretório Excelso, ficou retido nas instâncias ordinárias, em face das normas procedimentais. Competia a Empresa, para evitar a preclusão, peticionar ao TRF 1 requerendo o "destravamento" do mencionado agravo e o seu encaminhamento para o STF.

22. Em vez de ter tomado essa correta providência processual, a Empresa interpôs, contra o acórdão do referido REsp n. 333.258, recurso extraordinário em face de questões constitucionais ventiladas nos julgamentos do TRF 1, e apenas confirmadas no julgamento do STJ, sem o ineditismo processual indispensável para o cabimento de recurso extraordinário em face de recurso especial.

23. A jurisprudência do STF é pacífica em relação a essa situação processual, com bem recordado no despacho de inadmissão proferido pelo Ministro Vice-Presidente do STJ, no douto Parecer do Ministério Público Federal. Eis os precedentes consignados: RREE ns. 115.949 e 452.027 e AI n. 483.230.


IV. A AÇÃO RESCISÓRIA EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA

24. Ainda que superada essa aludida barreira do conhecimento processual, no mérito melhor sorte não assiste à Empresa.

25. O pleito constitucional submetido à elevada apreciação do Supremo Tribunal Federal, a despeito do bom nome dos causídicos patrocinadores (André Martins de Andrade, Marco André Dunley Gomes e Rodrigo Leporace Farret), de reconhecida seriedade e competência profissional, e da alta qualificação dos ilustres pareceristas contratados (Humberto Theodoro Jr., Sacha Calmon Navarro Coêlho, Misabel de Abreu Machado Derzi e Egas Moniz Aragão), todos doutrinadores que honram as letras jurídicas nacionais, raia à irrisão, permissa venia.

26. Seria flagrante panurgismo acompanhar as teses desenvolvidas pela Empresa. Mas, diferentemente dos "carneiros de Panurgo", tomaremos outro rumo.

27. A tese central defendida pela Empresa é a impossibilidade de ação rescisória rescindir decisão judicial transitada em julgado que declarou a inconstitucionalidade de norma tributária e, por conseqüência, restabeleceu o crédito tributário julgado extinto pela decisão rescindida. Com essa tese, pretende-se fazer da ação rescisória em matéria tributária instituto processual emasculado, data venia.

28. Alega a Empresa: "O Código Tributário Nacional, lei complementar à Carta da República, que disciplina as limitações ao poder de tributar (art. 146, I e II, b) dentre as quais se insere a coisa julgada, determina que as decisões favoráveis ao contribuinte, transitadas em julgado, extinguem o crédito tributário. De outra parte, a lei tributária não prevê, em qualquer hipótese, o ressurgimento do crédito tributário extinto por força de decisão judicial passada em julgado, como entendeu o Superior Tribunal de Justiça".

29. Diz mais a Empresa: "Assim, ao confirmar o provimento da ação rescisória, na espécie dos autos, tendo em vista que, com o trânsito em julgado da sentença rescindenda, extingue-se a obrigação e o crédito tributário, o E. Superior Tribunal de Justiça acaba por conferir ao decisum rescisório efeito de lei, caráter normativo capaz de reinventar a obrigação e o crédito, substituindo a lei e o legislador, fulminando os princípios constitucionais da legalidade (art. 5º, II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei), da estrita legalidade em matéria tributária (art. 150... é vedado à União... I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça...), e o da separação de poderes, vez que atua como legislador positivo, ao arrepio da jurisprudência sedimentada nesta Excelsa Corte (Cf. RE n. 188.951, DJ de 15.9.95 e RE n. 196.590, DJ de 14.11.96)."

30. Para dar um mínimo de consistência teórica a essas teses, a Empresa louvou-se em pareceres contratados junto a eminentes doutrinadores que, nada obstante a excelência de seus articulados e o quilate acadêmico emprestado, não conseguem derrubar – nem arranhar – os alicerces que fundaram as teses da Fazenda Nacional e todas as decisões judiciais proferidas a partir do julgamento da presente Ação Rescisória n. 94.01.29225-6.

31. É preciso deixar claro que no julgamento da referida AR n. 94.01.29225-6 o tema do alcance da decisão que rescinde decisão passada em julgado em matéria tributária foi surpreendido. Recordem-se os votos dos Juízes Tourinho Neto e Osmar Tognolo:

"Diz, então, a ora ré que o crédito tributário, de acordo com o art. 156, inciso X, do Código Tributário Nacional, extingue-se com a decisão judicial transitada em julgado. Logo, raciocina: transitada que foi a decisão, extinto foi o crédito tributário. E assim, mesmo que venha a ser rescindida a sentença, o crédito tributário não pode ressurgir, porque já foi extinto por decisão judicial transitada em julgado, e essa extinção seria ex lege. Data venia, assim não entendo. Se a sentença é rescindida, evidentemente o crédito tributário está intacto; volta-se ao status quo ante. Não há por que dizer que não. O que impede que este crédito esteja inteiro, vigendo? Por que foi imposto por lei? Não. A lei diz o seguinte: a decisão judicial transitada em julgado extingue o crédito tributário. Só. E se essa decisão cair? Claro e evidente que o crédito estará perfeito, intacto para ser cobrado".

32. Juiz Osmar Tognolo:

"O mandado de segurança, no caso, é preventivo, por uma razão muito simples: quanto à contribuição social, o lançamento é por homologação, não há ato da autoridade administrativa. O que se pretende é evitar qualquer tipo de coação, de fiscalização, incidindo sobre o não-recolhimento, que é de responsabilidade exclusiva do contribuinte. Não há nada extinto, porque nada foi pago; nada foi antecipado; não existe crédito para ser considerado extinto."

34. No STJ, nos votos dos Ministros Garcia Vieira, José Delgado e Luiz Fux palmilharam a trilha percorrida no TRF 1. Ministro Garcia Vieira:

"O egrégio Tribunal a quo decidiu a questão em bases constitucionais, conforme se depreende da própria ementa do acórdão e do contexto do voto condutor de fls. 125⁄127 e dos seguintes; e, depois, porque a egrégia Corte Especial já pacificou o entendimento no sentido de que é admissível a ação rescisória mesmo que à época da decisão rescindenda fosse controvertida a interpretação de texto constitucional, afastada a aplicação da Súmula n° 343 do STF

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(Resp n° 184.175⁄SE, Relator Min. Peçanha Martins, DJ 19.02.2001). Neste mesmo sentido, Resp 157.051-PE, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 14.12.98, Resp 259.254⁄PE, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 16.08.2000 e Resp 346.359⁄DF, da minha relatoria, decisão monocrática de 05.11.2001.

Sob este aspecto, portanto, não conheço do recurso.

Do mesmo modo, afigura-se-me inadmissível a irresignação recursal, em relação ao alegado maltrato ao artigo 468 do CPC, não versado no acórdão hostilizado e, por isso mesmo, ausente o necessário prequestionamento viabilizador do acesso à via excepcional, bem como no que se relaciona com o pretenso dissídio jurisprudencial, eis que os julgados indicados como paradigmas cuidam da matéria de mérito, cujo exame, nesta via recursal, está superado pelos motivos invocados.

Resta, contudo, apreciar a quaestio iuris quanto à preliminar rejeitada, por unanimidade, relativa à falta de interesse processual e de impossibilidade jurídica do pedido, por isso que a matéria foi apreciada à luz da legislação infraconstitucional tida como desafeiçoada, conforme se verifica no fundamento, assim resumido, preliminarmente:

"Dispõe o art. 156, inc. X, do CTN, que a decisão judicial transitada em julgado extingue o crédito tributário. Ora, se a sentença é rescindida, o crédito permanece intacto. Volta-se ao statu quo ante. Deste modo, rejeito a preliminar de falta de interesse e de impossibilidade jurídica do pedido, argüida na sustentação oral. " (fl. 125)

Para justificar o seu voto, melhor explicita o digno Relator, no seguinte excerto:

"Diz, então, a ora ré que o crédito tributário, de acordo com o art. 156, inciso X, do Código Tributário Nacional, extingue-se com a decisão judicial transitada em julgado. Logo, raciocina: transitada que foi a decisão, extinto foi o crédito tributário e assim mesmo que venha a ser rescindida a sentença, o crédito tributário não pode ressurgir, porque já foi extinto por decisão judicial transitada em julgado, e essa extinção seria ´ex lege´. ´Data venia´, assim não entendo. Se a sentença é rescindida, evidentemente o crédito tributário está intacto; volta-se ao ´statu quo ante´. Não há por que dizer que não. O que impede que este crédito esteja inteiro, vigindo? Por que foi imposto por lei? Não. A lei diz o seguinte: a decisão judicial transitada em julgado extingue o crédito tributário. Só. E se essa decisão cair? Claro e evidente que o crédito estará perfeito, intacto para ser cobrado. " (fl. 171)

Conheço do recurso quanto ao tema infraconstitucional devidamente prequestionado.

Entendo assistir razão ao v. aresto hostilizado. É verdade que a decisão judicial transitada em julgado extingue o crédito tributário (art. 156, X, do CTN). Mas, se a rescisória foi admitida e julgada procedente, como no caso em exame volta-se ao statu quo ante e o crédito resurge e pode ser cobrado do contribuinte integralmente.

Com a procedência da ação rescisória, desaparece a decisão judicial passada em julgado, ficando sem efeito a extinção, porque deixou de existir a coisa julgada.

Assim sendo, rejeito a preliminar de falta de interesse e de impossibilidade jurídica do pedido.

Como se vê, nenhuma censura merece o v. acórdão recorrido que fica inteiramente mantido.

35. Ministro José Delgado:

"(...)

No caso, o contribuinte defende o que aqui está posto. Veja V. Exa. que as opiniões doutrinárias, por mais sólidas que sejam, geram insegurança na confiabilidade da tese defendida. Aprofundei-me muito no estudo dessa situação e não tenho desprestigiado os efeitos da segurança jurídica, mas não posso valorizá-la em matéria tributária quando tenho uma Constituição Federal a cumprir. Não posso conceber que uma decisão - mesmo de trânsito em julgado -, que recebeu os efeitos de uma ação rescisória desconstituindo-a em razão de o Supremo Tribunal Federal, órgão maior, ter declarado a constitucionalidade de uma lei tributária, permita que um contribuinte se beneficie, por prazo certo ou incerto, dessa decisão.

Seria olhar de modo muito estreito ao que diz o art. 156, inciso X. do CTN. Sabemos, hoje, que essa decisão literal de qualquer dispositivo legal tem uma interpretação completamente afastada do nosso ordenamento jurídico. Se ler o art. 156. inciso X, do CTN como está posto, e limitar-me tão-somente ao mesmo, tenho que dar razão ao contribuinte. Mas não posso fazê-lo, porque sei que essa interpretação não me leva a um convencimento de acordo com as regras postas na Constituição Federal. Prefiro ficar com a interpretação sistêmica, finalística, aplicada a todos os ramos do Direito, especialmente ao do Direito Tributário. Não devemos nos esquecer que estamos no ramo do Direito Tributário em que não se admitem privilégios, e o princípio da igualdade tem que ser considerado. Uma lei declarada constitucional tem que abranger todos os contribuintes. Uma sentença não pode ir de encontro ao que está posto no art. 150. da Constituição Federal, que expõe como princípio fundamental das relações tributárias o da igualdade tributária, nem à situação aqui posta no voto do eminente Ministro Relator, nem à situação contrária, quando a lei é declarada inconstitucional e o tribunal a quo declarou a sua constitucionalidade. Se a lei foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, mesmo em situações de trânsito em julgado que tenha que manifestar a constitucionalidade. O fisco também não pode cobrar o tributo.

Tem sido essa a posição uniforme desta Turma, sem nenhum equívoco, tanto em benefício do contribuinte, quanto do órgão tributário.

Sr. Presidente, não obstante as minhas homenagens às razões aqui postas, não posso me convencer da tese aqui desenvolvida, porque, a meu ver, fere a elementar regra de interpretação, e não podemos interpretar estritamente, literalmente o art. 156, inciso X, do CTN. A coisa julgada tributária há de produzir efeitos de acordo com a Constituição Federal. Sabemos que há vários trabalhos nos cursos de mestrado desenvolvendo a chamada coisa julgada inconstitucional, demonstrando que a sentença não pode chegar a tanto, interferir no que está na Constituição. O julgador brasileiro não é um poder constituinte, nem originário, nem derivado, mas transformar-se-ia no primeiro.

Com essas considerações, fazendo meus os louvores que S. Exa. fez à sustentação oral do eminente advogado, acompanho o eminente Relator.

36. O Ministro Luiz Fux:

Sr. Presidente, Egrégia Turma, também gostaria de me solidarizar com o eminente Ministro José Delgado quanto aos elogios lançados ao eminente advogado da tribuna, que fez realmente uma sustentação oral singular, assim como também é singular essa causa. Considero, pelo pouco tempo que aqui tenho, uma das causas mais bonitas em termos doutrinários que passou pela Turma, principalmente essa questão central sobre a ressuscitação do crédito tributário em razão do acolhimento da ação rescisória, desconstituindo uma sentença que considerou indevido o tributo por inconstitucionalidade.

A nossa Turma tem firmado dois princípios básicos: o primeiro deles é que a segurança jurídica há de obedecer os limites impostos pela Constituição Federal; em segundo lugar, como muito bem destacou o Sr. Ministro José Delgado, o contribuinte não pode ser obrigado a pagar um tributo por força da coisa julgada se posteriormente essa lei veio a ser considerada inconstitucional. Claro, se empreendermos esse raciocínio com relação ao contribuinte a fortiori, temos que empreender esse raciocínio também em favor da Fazenda Pública, até pelo princípio da igualdade.

Para auxiliar na formação da nossa opinião, e coadjuvar os brilhantes votos dos Srs. Ministros José Delgado e Garcia Vieira, trago à colação o art. 156 que dispõe: "Extingue o crédito tributário, dentre outros, a decisão judicial passada em julgado." Se nos detivermos no art. 156 do Código Tributário Nacional, vamos verificar que todos os incisos que antecedem a esse, que é objeto da discussão, tratam de fatos jurídicos que tornam o crédito tributário automaticamente inexistente do ordenamento jurídico. Assim, por exemplo, o pagamento que extingue o crédito tributário, bem como a remissão que também opera esse efeito.

Pergunto, a decisão transitada em julgado, neste momento, extingue o crédito tributário? Não. Só a decisão soberanamente julgada, que é aquela decisão que não comporta mais a ação rescisória, porque em tema de Direito Tributário, o art. 111 do Código Tributário Nacional, no seu inciso I é claríssimo ao nos impor, aplicadores da lei, uma interpretação absolutamente restritiva a todas as regras e a todas as decisões judiciais que visem a excluir o crédito tributário, que é o que se pretende na hipótese vertente.

Gostaria de adjuntar esses elementos aos brilhantes votos que me antecederam para acompanhar integralmente o Sr. Ministro-Relator, com os aditamentos ilustres e brilhantes do Ministro José Delgado.

37. Após a leitura desses contundentes votos, torna-se cristalina indevida insurgência da Empresa.

38. Com efeito, dispõe o artigo 156, X, CTN, que a decisão judicial passada em julgado extingue o crédito tributário. Também está disposto no art. 485, V, CPC, que a sentença de mérito transitada em julgado pode ser rescindida quando violar literal disposição de lei. Na Constituição da República, art. 108, I, "b", está prescrito que compete aos Tribunais Regionais Federais processar e julgar, originariamente, as ações rescisórias de seus julgados.

39. Ainda em sede constitucional, está timbrado que a lei não excluirá da apreciação do Judiciário lesão ou ameaça a direito, nem prejudicará o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada (art. 5º, XXXV e XXXVI, CR).

40. É fora de toda dúvida a indispensável interpretação sistemática de todos esses enunciados prescritivos. A coisa julgada pode ser rescindida por decisão judicial competente, em ação rescisória, se essa coisa julgada não estiver perfeita, em adequada harmonia com a ordem jurídica. É o caso presente.

41. Nessa linha, é evidente que é soberana a coisa julgada que não possa sofrer os efeitos de uma ação rescisória. Se ainda for possível o ajuizamento de ação rescisória, a coisa julgada ainda não é perfeita, soberana, indiscutível e insuscetível de nova apreciação judicial, mormente, como no presente caso, quando se viola literal disposição constitucional e se contraria flagrantemente decisão constitucional do Supremo Tribunal Federal.

42. A unidade sistemática do ordenamento jurídico brasileiro não suporta a idéia da convivência de decisões judiciais antagônicas, sobretudo se houver antagonismo com decisão constitucional do Supremo Tribunal Federal.

43. Há um importante julgado do Ministro Gilmar Mendes que ilumina a compreensão desse tema: o respeito à supremacia das decisões constitucionais do STF. Cuida-se do Agravo Regimental no RE 395.662 (Redator para o acórdão Ministro Gilmar Mendes, J. 16.03.2004; DJ. 23.04.2004). Eis a ementa do acórdão:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL.

2. Ação rescisória. Extinção do feito, sem julgamento do mérito, por impossibilidade jurídica do pedido. 3. Entendimento no sentido de que o autor pretendia rescindir a sentença, em vez de buscar a desconstituição do acórdão que a substituiu. 3. Formalismo excessivo que afeta a prestação jurisdicional efetiva. Erro no pedido que não gera nulidade, nem causa para o não-provimento.

4. Força normativa da Constituição. Jurisprudência do STF quanto à matéria que constitui objeto da ação rescisória.

5. Recurso extraordinário provido. Remessa ao TRT da 4ª Região, a fim de que aprecie a ação rescisória, como entender de direito.

43. No tocante à supremacia das decisões constitucionais da Corte, o Ministro Gilmar Mendes pontificou:

"Ressalte-se, ainda, que o Supremo Tribunal Federal já se manifestou quanto à matéria que constitui o mérito da ação rescisória.

Ora, se ao Supremo Tribunal Federal compete, precipuamente, a guarda da Constituição Federal, é certo que a sua interpretação do texto constitucional deve ser acompanhada pelos demais Tribunais, em decorrência do efeito definitivo absoluto outorgado à sua decisão. Não se pode diminuir a eficácia das decisões do Supremo Tribunal Federal com a manutenção de decisões divergentes.

Assim, se somente por meio do controle difuso de constitucionalidade, portanto, anos após as questões terem sido decidas pelos Tribunais ordinários, é que o Supremo Tribunal Federal veio a apreciá-las, é a ação rescisória, com fundamento em violação de literal disposição de lei, instrumento adequado para a superação de decisão divergente.

Contrariamente, a manutenção de soluções divergentes, em instâncias inferiores, sobre o mesmo tema, provocaria, além da desconsideração do próprio conteúdo da decisão desta Corte, última intérprete do texto constitucional, a fragilização da força normativa da Constituição."

44. Se isso por si só não fosse suficiente para espancar as pretensões da Empresa, em homenagem ao esforço argumentativo deduzido, a alegação de que a decisão judicial que, em ação rescisória, rescinde decisão judicial transitada em julgado e restabelece o crédito tributário extinto, viola o princípio constitucional da legalidade tributária (arts. 5º, II; 150, I, CR), não encontra guarida no sistema constitucional nem na jurisprudência da Suprema Corte.

45. Só a lei pode instituir tributo. Somente a lei pode elencar as hipóteses de extinção do crédito tributário. Coisa julgada, que vem a ser efeito de decisão judicial perfeita, em harmonia com o ordenamento jurídico e não sujeita à rescindibilidade, extingue plenamente o crédito tributário. Todavia, se a coisa julgada não é perfeita e pode ser atacada via ação rescisória, é de toda evidência que o crédito tributário não foi extinto plenamente. E, ainda que tenha sido, faz parte dos efeitos da decisão em ação rescisória restabelecer a situação jurídica anterior. A segurança jurídica pressupõe a conformidade com o ordenamento jurídico-constitucional. Se assim não fosse, emasculada estaria o instituto da ação rescisória.

46. Em relação ao princípio constitucional da separação dos Poderes não há qualquer violação perpetrada pela decisão judicial ora combatida. Com efeito, a própria Constituição da República estabelece que compete ao Poder Judiciário analisar a juridicidade de todas as condutas e comportamentos das pessoas e instituições. Compete ao Judiciário dizer se uma norma jurídica é válida ou inválida. Isso não é intrusão na atividade legislativa, mas atribuição que a própria Constituição lhe destinou. Não há que se falar em atividade legislativa positiva. Não houve criação de tributo nem inovação do ordenamento jurídico, mas tão somente a aplicação do direito e da justiça. É cediço que a guarda da Constituição, do Direito e da Justiça compete, precipuamente ao Poder Judiciário e, em última e definitiva instância, ao Supremo Tribunal Federal (Capítulo III – Do Poder Judiciário, arts. 92 a 135, CR).

47. O pleito da Empresa, no ponto que interessa, ou seja, não sofrer as conseqüências de não pagar tributo por meio de decisão judicial, posteriormente revista ou anulada ou rescindida, foi recentemente rechaçado (RREE 353.657 e 370.682) no julgamento da modulação dos efeitos constitucionais do creditamento de IPI nas hipóteses de alíquota-zero ou não-tributados, forte o STF no argumento de que contra decisão que declara constitucional a norma tributária não se pode invocar a segurança jurídica, pois o contribuinte correu os riscos sabendo das possíveis conseqüências, como no presente caso.

48. Com o costumeiro brilhantismo, um dos patronos da Empresa sustentou que vivemos em um Estado de Direito, e não em um Estado Liberal ou Estado Social. Com razão o ilustre advogado da Contribuinte.

49. Se estivéssemos sob a égide do paradigma constitucional do Estado Liberal, no qual o tributo é uma violência ao patrimônio do contribuinte e o Estado um eterno inimigo do indivíduo, a solução dessa controvérsia não demandaria maiores dificuldades: a Contribuinte teria o seu pleito atendido.

50. Se estivéssemos sob a égide do paradigma constitucional do Estado Social, no qual o Estado assume todas as funções públicas, sufoca o indivíduo e o contribuinte, toma tributos sem respeito ao ordenamento jurídico e sem um mínimo de ética e moralidade públicas, a solução também não seria problemática: a Contribuinte não teria direito algum.

51. Felizmente, a partir de 05.10.1988 passamos a viver na quadra do paradigma constitucional do Estado Democrático de Direito, síntese e superação dos outros dois paradigmas recordados. Qual a melhor solução? Qual o sentido do tributo? Qual o sentido das contribuições sociais da seguridade social? Qual o significado da idéia democrática no Estado de Direito? Qual o valor da igualdade? E da justiça?

52. Parece-nos que no atual modelo constitucional, não há espaço para uma leitura monstruosa do papel do Estado, das leis e da jurisprudência, como pretende a Empresa. No Estado Democrático de Direito, em princípio, todos os tributos instituídos por lei aprovada pelos legítimos representantes do povo, em conformidade com as normas constitucionais, são válidas, gozam da presunção de validade constitucional, até que decisão definitiva do STF diga o contrário. A palavra definitiva acerca da validade constitucional de uma norma tributária compete ao Supremo Tribunal.

53. A Contribuinte ao optar por não pagar o tributo, ainda que escorada por decisão judicial transitada em julgado, mas sem o crivo definitivo do STF agiu por conta e risco próprios. Recorde-se que a decisão do TRF 1 que manteve a sentença concessiva da exoneração tributária data de 31.08.1992. A decisão do STF que julgou válida a norma tributária obrigatória do recolhimento da exação data de 01.07.1992. Ou seja, mesmo após o julgamento da Suprema Corte, pretendeu a Empresa beneficiar-se de decisão judicial contrária ao entendimento desse Colendo Tribunal. Eis a justiça das decisões combatidas.

54. E a igualdade e a justiça no dever de todos contribuírem com a seguridade social na medida de suas potencialidades econômicas será preservada com o indeferimento do pleito da Empresa. Isso porque, a contribuição em jogo incide sobre o lucro. Tributar o lucro é uma das conseqüências de uma política fiscal em conformidade com o modelo democrático de nossa sociedade, pois todos devem participar na medida de suas disponibilidades para que todos possam usufruir na medida de suas necessidades. Nada mais justo, mais eqüitativo, mais democrático.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

. Coisa julgada inconstitucional e ação rescisória em matéria tributária.: Restabelecimento do crédito tributário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1568, 17 out. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16807. Acesso em: 25 nov. 2024.

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