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Contestação à ação "ex empto"

Agenda 09/04/2014 às 12:56

Esta contestação visa demonstrar que a compra e venda fora "ad corpus" e não "ad mensuram".

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz __ Vara Cível da Comarca de W

Contestação

ante a Ação ex empto proposta por “A”, com arrimo nos fatos e fundamentos jurídicos a seguir:

I – Da natureza jurídica da venda – ad corpus – menção da área puramente enunciativa – repetição de transcrições registrais anteriores:

O réu adquiriu a área ora transacionada e não a medira. De igual modo, ao vendê-la para a autora, o pólo passivo o fez como um corpo certo, bastando-se observar no contrato, a inexistência de limites e confrontações, o que indica tratar-se de uma aquisição ad corpus e não ad mensuram.

Ninguém, muito menos a requerente, antes de entabular o negócio de compra e venda, havia procedido medição prévia, confiando na matrícula registral.

Derradeiramente, para reforçar a natureza ad corpus, o raciocínio expendido acima ganha fôlego, uma vez mais, com a análise do contrato, visto que nele se tem a seguinte nomenclatura: “INSTRUMENTO PARTICULAR DE COMPROMISSO DE VENDA E COMPRA DE UM SÍTIO, FEITO EM CARÁTER IRREVOGÁVEL E IRRETRATÁVEL” (grifou-se).

Nessa trilha, estão os julgados abaixo:

“No caso que se examina, os elementos probatórios demonstram, inequivocamente, que o autor comprou o que viu, coisa certa e determinada, pagando preço pelo que viu, sendo irrelevante as medidas do imóvel para a perfectibilização do negócio jurídico de compra e venda. Configurada a venda ad corpus.” (TJRS. Processo Apelação Cível Nº 70020377842. Vigésima Câmara Cível. Rel. Des. Glênio José Wasserstein Hekman. Data de julgamento: 09/04/2008).

 

“Nos termos do artigo 500, § 3º, do CC/2002 (artigo 1.136, do CC/1916), quando o imóvel é alienado como coisa certa e determinada, adquirindo, portanto, o imóvel pelo conjunto e não em atenção à área declarada, que assume caráter meramente enunciativo, tem-se a venda ad corpus.” (TJMS. Processo 2006.002689-9. 3ª Turma Cível. Rel. Des. Oswaldo Rodrigues de Melo. Data de julgamento: 10/04/2006).

 

II – Preliminarmente – ilegitimidade passiva – requerida não figura no contrato em debate – natureza pessoal da lide ex empto:

 

Enuncia a jurisprudência:

 

“PROCESSO CIVIL. ACAO EX EMPTO. COMPETENCIA TERRITORIAL. NATUREZA PESSOAL.” (TJRS. Processo Agravo de Instrumento Nº 596120808. Terceira Câmara Cível. Rel. Des. Moacir Adiers. Data de julgamento: 15/08/1996; marcou-se).

 

Ora, se a ação é de caráter pessoal (obrigacional) e, mais que isso, a ré não figura no contrato de compra e venda, não se há como vê-la atrelada à esta demanda, já que pelo princípio da força relativa da avença, somente se alcança os contraentes.

Assim sendo, é que a boa doutrina de Sílvio Rodrigues[1] vaticina que:

“O segundo princípio – o da relatividade das convenções – contém a idéia de que os efeitos do contrato só se manifestam entre as partes, não aproveitando nem prejudicando terceiros” (itálicos da fonte; sublinhou–se).

Logo, em sendo a requerida terceira quanto ao contrato em epígrafe, deve ser tida como parte passiva ilegítima, a teor do art. 267, VI, do CPC, havendo este Juízo de extirpá-la da lide, condenando a autora em honorários decorrentes dessa ilegitimidade.

Conclui-se com este julgado:

“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXTINÇÃO DO FEITO. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. ART. 267, INCISO IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CABIMENTO.

1. Julgado extinto o processo em relação a um dos réus, deve a Autora ser condenada a pagar honorários advocatícios à parte excluída, sendo, irrelevante, na hipótese, o fato de ambos os réus serem defendidos pelo mesmo Procurador. Precedentes.” (STJ. Processo

REsp 613770/RJ. QUINTA TURMA. Rel. Min. LAURITA VAZ. Data do julgamento: 03/10/2006).

III – Das impugnações especificadas às alegações da autora:

 

Em primeira mão, se não vingar a tese da ilegitimidade da ré, ela, por sua vez, ratificará os argumentos que serão lançados subsequentemente. As objeções serão feitas do modo mais linear possível, conjugando-se com as teses da demandante.

III.1 – Do preço ajustado – valor com percentagem em centavos – demonstração de venda ad corpus:

A autora alega ter comprado a área pelo preço TAL, porém, com todo o respeito, tal asserção é inverossímil. Veja-se:

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• Dividindo-se o preço global pelo número de hectares, chega-se a um montante determinado, menor do que fora afirmado na peça vestibular, manobra levada a cabo pela autora para induzir um preço (valor redondo como, por exemplo, R$ 10.000,00 e não R$ 10.013,87), compatível com venda ad mensuram!

No mesmo diapasão, o julgado seguinte:

“Entretanto, diante das circunstâncias dos autos a indicar que o preço fixado na compra e venda não teve como parâmetro mais relevante a metragem do imóvel, não há falar em venda ad mensuram. Referência às dimensões do imóvel meramente enunciativa.” (TJRS. Processo Apelação Cível Nº 70019300201. Décima Oitava Câmara Cível. Rel. Des. Mario Rocha Lopes Filho. Data de julgamento: 29/04/2008).

 

• A autora confessa na exordial que mediu a área após tê-la comprado e solvido o valor de TAL, tanto assim o é que o memorial descritivo é de DATA, conquanto o negócio jurídico se dera DATA (posterior).

A tanto, o aresto infra:

 

“Realiza-se venda ad corpus quando o imóvel é alienado como corpo certo e determinado, independentemente das medidas especificadas no instrumento, assim tidas apenas como enunciativas, não se admitindo reclamação quanto à falta de área.” (TJMS. Processo 2005.017874-8. Rel. Des. Hamilton Carli. Data de publicação: 06/03/2006).

 

III.2 – Da mora da autora – não comparecimento para lavratura da escritura – ausência de medidas prévias para retirada de guias do ITBI – ajuizamento da ex empto na data do vencimento da ultima prestação:

 

Novamente, data venia, merecem ser refutadas as teses da petição inicial, ao se observar que:

• O réu, com a boa-fé que lhe é peculiar, desconhecendo totalmente a falta da área – até mesmo porque alienara o “SÍTIO” para a autora –, envidou todos os esforços para que em DATA houvesse a escrituração do imóvel, já que fizera o depósito da documentação necessária para tanto perante o Cartório de Registro Imobiliário desta plaga;

• Precisamente na DATA, o requerido, HORÁRIO, encontrando-se no âmago do Cartório de Registro de Imóveis, enviou uma mensagem através de seu celular para o telefone móvel da peticionária (NÚMERO), indagando se ela não iria comparecer à dita serventia;

• É sabido que as atitudes, assim como as despesas da escrituração, correm por conta do comprador (art. 490, primeira parte, do Código Civil), ou seja, a autora, a bem da verdade, deveria ter comparecido ao CRI desta urbe antes da DATA para apanhar guias afetas ao pagamento do ITBI. Dessa forma, a escrituração só seria lavrada após pagos os tributos próprios da compra e venda, como dimana dos arts. 135, I, c/c 134, VI, ambos do Código Tributário Nacional. Daí porque o requerido-vendedor se adiantara, com seu extremo zelo, entregando os documentos necessários para lavratura da escritura, de sua responsabilidade, em DATA.

• Além dessas límpidas omissões, certamente propositais e com desejo de retardar o pagamento da obrigação, a demandante, coincidentemente, ajuizara a lide ex empto na data do vencimento da última prestação (DATA)!

• Se a requerente estivesse imbuída de boa-fé, no mínimo, teria se valido da consignação extrajudicial, para que na DATA estivesse em poder do réu, pelo menos, o numerário que a acionante achava devido (art. 890, § 1º, do Código de Processo Civil).

De efeito, percebe-se que:

a) Infelizmente, esse litígio comporta um espírito emulativo, isto é, criou-se um suposto conflito de interesses pretendendo alteração da venda de ad corpus para ad mensuram, com um único objetivo: dilatar no tempo o pagamento da obrigação, mormente porque o réu, em DATA, imitira na posse a compradora;

b) É tão solar o ideal de procrastinar o pagamento do sítio alienado que fora o requerido quem apanhara a guia judicial para o depósito, havendo ainda de, em DATA, gestar interpelação extrajudicial, tanto para a demandante quanto para seu causídico. Isso tudo porque a autora somente postulara o depósito judicial (conforme item 1 dos pedidos da exordial da ex empto), mas não se desincumbira de diligenciar a feitura da dita guia.

Quem, então, obrara com mora, o vendedor ou a compradora? A compradora! Salienta-se que, na data aprazada para saldar a última parcela, além de não comparecer ao Cartório Registral, sequer adimplira o montante estipulado no contrato e, muito menos, consignara, extrajudicialmente, a cifra que supunha exata.

Aplicável aqui, pois, este comando normativo do Código Civil:

“Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor.”

Põe-se fecho com este escólio pretoriano:

“CONFIGURAÇÃO DA MORA. Sendo flagrante o inadimplemento dos promitentes compradores, justificada está a cobrança dos encargos da mora contratados.” (TJRS. Processo Apelação Cível Nº 70017629270. Décima Sétima Câmara Cível. Rel. Des. Alzir Felippe Schmitz. Data de julgamento: 26/07/2007).

 

III.3 – Das partes contratantes – status social da compradora – alteração da verdade dos fatos:

 

Acerca desse temário, escande-se:

• O réu, como atestado de sua idoneidade, fizera o máximo quando da venda do sítio em apreço, já que, mesmo tendo parcelada a forma de sua aquisição, imitira a autora na posse, menos de um mês depois da venda. Há ato de maior confiabilidade que esse?

• A autora, por sua vez, não está dotada da ignorância e simplicidade que a peça vestibular pretende lhe imputar, dado que:

a) Trata-se de uma renomada artista plástica, convidada, inclusive, pela primeira-dama do estado para esculpir estátuas de vulto;

b) Possui curso de pós-graduação, em sua área de atuação, na Universidade de São Paulo;

c) É proprietária de uma significativa quantia de terra no estado X, como ela própria narra;

d) É a requerente esposa de FULANO, Engenheiro Agrônomo (afeito diuturnamente às lidas rurais), o que garante que, se sua mulher realmente tivesse comprado a área do requerido por metragem, aquele lhe teria cientificado que antes de pagar qualquer valor haveria de tê-la medido!

Onde então está a tão proclamada vulnerabilidade da compradora? “Em lugar algum” é a resposta. Fica evidentemente comprova que sua intenção foi – repita-se – protelar o pagamento do sítio por ela adquirido e com tentativa sagaz de engendrar um abatimento de seu preço!

III.4 – Dos comportamentos temerários da litigante:

A par do que já fora esboçado dantes, tem-se outros deslizes meridianos da compradora-requerente, a saber:

• Quando vindica a tutela antecipada, tem a coragem de dizer que, se deferida essa medida emergencial, depositaria nos autos da ex empto o quantitativo que ela entende como devido e o chama de “prestação vincenda”. Tal manobra chega a ser pueril: se a ação é intentada no final do expediente forense da DATA e se a última prestação, igualmente, vence na MESMA DATA, como a peticionária lograria depositá-la nestes autos antes do seu vencimento?

• Se a autora fosse tão diligente como ostenta, por que para efetuar o depósito nos autos da execução que lhe movera o réu, tivera este último que lhe endereçar interpelação extrajudicial?

• A venda, como realçado alhures, é ad corpus. Mesmo que a autora entendesse diferente, ajustou um contrato sem qualquer vício de vontade (art. 171, II, do CC), tanto que fora imitida na posse. Com isso, passou a usufruir das suas benesses e, ao não quitar a última parcela na data aprazada, obrara com mora, uma vez que o correto seria honrar a obrigação por inteiro e, depois – se assim o desejasse – discutir o abatimento que entendia fazer jus, mormente porque o réu é pessoa de todo solvável.

Corroborando o que vem sendo exarado, soa oportuno este judicioso posicionamento:

“Não se mostrando os aventados vícios no imóvel suficientes a invalidar o pacto celebrado entre as partes, posto que seu objeto constituiu-se em bem certo e discriminado, prevalecem intactas as condições da avença, que incluem a obrigatoriedade de pagamento das parcelas do financiamento do imóvel...” (TJDFT. Processo 19980110068009APC. 2ª Turma Cível. Rel. Des. ANGELO PASSARELI. Data de julgamento: 19/11/2008).

 

• A mora da autora, além de não ter desembolsado a última parcela na data aprazada, restou de todo configurada com o indeferimento da tutela antecipada, ou seja, passara in albis o último dia que possuíra para o solvimento (DATA). Sequer tomara o cuidado de ajuizar a ação com antecedência maior em relação ao dia fatal do vencimento da obrigação, ou ainda, em se desincumbir da via da consignação extrajudicial, também preteritamente ao termo final lançado no contrato.

IV – Da venda ad corpus – afinidade da autora com a beleza e praticidade do sítio – atividade de lazer:

Pode-se sintetizar que, por primeiro, o contrato dispõe acerca da área por mera enunciação; em segundo lugar, inexiste na telada avença qualquer menção a metragens, seja como limites ou confrontações; em terceiro passo, há nominação de compra de um sítio, como se percebe da nomenclatura que se dá ao próprio contato (ab initio); em quarto ângulo, a beleza do sítio alienado é ímpar; e, em quinta quadra, a dita gleba dista TANTOS km dessa cidade (UNS TANTOS km no asfalto e OUTROS TANTOS km em vicinal de ótima qualidade).

Ora, sendo a autora uma artista plástica que adora e inspira-se na natureza, nada mais evidente que não fora a extensão do sítio que a seduzira, mas, sim, o seu encanto, sua abundância de água (servida pelo Córrego TAL que corta o sítio alienado), a roda d’água e o tanque natural (que situam-se à beira da sede do sítio), e sem contar a boa alvenaria da casa, churrasqueira, fogão à lenha com forno e piscina. Isso dimana que o contrato celebrado o fora ad corpus, colhendo essa evidência até mesmo porque tal é o sentir da contraente, que vale mais do que eventual literalidade gráfica, como exsurge do art. 112, do CC.

A par de todas as comodidades que o sítio em questão oferta, tem-se ainda plantação de X hectares de eucalipto, contendo Y mil mudas, e outras tantas mudas de plantas ornamentais, como a palmeira real, o que torna o sítio um verdadeiro lugar de lazer, com todo o requinte das costumeiras pousadas. Assim ficou claro que a autora comprou com intenção muito diversa da situação que envolve as metragens.

V – Do requerimento:

Ante o exposto, requer-se digne Vossa Excelência em:

a) Declarar a ilegitimidade da ré, visto que esta não figura no contrato, condenando a autora em honorários advocatícios por conta da sua exclusão desta lide (art. 267, VI, do CPC);

b) Julgar improcedentes os pedidos formulados na petição inicial, porque:

b.1) Incabível ação ex empto em venda ad corpus, tal como se dá na espécie;

b.2) A consignação em pagamento – se assim se pode dizer – perdera o objeto, porquanto o montante exarado já fora depositado no feito executório de número 123, conforme informado pela própria demandante;

b.3) Por outro lado, ante à sucumbência, haja imposição à requerente quanto ao solvimento de honorários advocatícios, a ser arbitrado entre 10 e 20% (art. 20, § 3º, do CPC) sobre o valor dado à causa.

DATA


[1] Direito Civil – Dos Contratos e das Declarações Unilaterais da Vontade”, vol. 3, São Paulo: Saraiva, 2002, p. 17.

Sobre o autor
Emerson Odilon Sandim

Procurador Federal aposentado e Doutor em psicanalise

Informações sobre o texto

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