VII – DOS DANOS MORAIS COLETIVOS
Ante o descumprimento das obrigações contratuais, legais e constitucionais conferidas às demandadas, tem-se caracterizada a conduta ilícita a partir do não oferecimento de um serviço público à população que transita em uma das maiores rodovias do país, ligando as duas maiores cidades da Bahia, com grande intensidade de tráfego.
Configurada a conduta antijurídica, traduzindo-se como um dos elementos necessários ao dever de reparar o dano, não se pode ignorar o surgimento, por conta da inexecução contratual, da situação de ofensa aos direitos dos consumidores do serviço, com o condão de gerar sensação de insegurança e intranquilidade, incidindo evidente ameaça às suas vidas e integridade física. Claramente perceptível, pois, o preenchimento de todos os critérios necessários para a exigibilidade do dever de reparar o dano: conduta ilícita, nexo de causalidade e dano.
Assim, o instituto do dano moral coletivo, pertinente à presente situação, encontra-se previsto no art. 1º da Lei nº. 7.347/85:
Art. 1º - Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: (...)
II - ao consumidor; (…)
IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.
Importante salientar, mais uma vez, que, para o surgimento e perpetuação do cenário ora relatado, foram determinantes a ineficácia da fiscalização da ANTT e a ausência de diálogo efetivo entre a VIABAHIA e a Polícia Rodoviária Federal, que até o momento não conseguiram implantar soluções para a questão dos furtos dos cabos e restaurar o fornecimento de energia.
Por todo o exposto, e considerando o longo período em que a população não pôde desfrutar adequadamente do serviço que lhes é devido, frise-se, desde 04 de abril de 2016, requer este órgão ministerial a condenação das demandadas ao pagamento de indenização em montante não inferior a R$300.000,00 (trezentos mil reais). Cumpre rememorar a expressa obrigação da VIABAHIA e da ANTT a destinar verba anual não inferior a R$ 623.820,00 (seiscentos e vinte e três mil, oitocentos e vinte reais), para exclusivo fim de segurança dos usuários.
Na temática sobre arbitramento dos danos morais (incluindo os “difusos”), o STJ já assentou entendimento no sentido da possibilidade de arbitramento pelo juiz, senão vejamos:
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. REQUERIMENTO DE ARBITRAMENTO PELO JUIZ DA CAUSA. SUGESTÃO DE VALOR. LIMITAÇÃO. JULGAMENTO ULTRA PETITA. 1.- Na formação dos precedentes desta Corte, já se firmou que na ação de indenização por danos morais não se exige que o autor formule pedido certo e determinado quanto ao valor da condenação pretendida, a ser fixada, diante da dificuldade de mensuração, segundo o prudente arbítrio do juiz. À medida que a jurisdição foi tratando do tema, contudo, certos parâmetros foram se estabelecendo para a fixação, de modo que se pode iniciar o caminho em prol da exigência de formulação de pleito preciso, inclusive quanto a valores e elementos a serem ponderados na sua fixação, prestigiando-se o contraditório, que baliza o debate jurisdicional e acarreta maior precisão em valores. 2.- No caso, o autor, além de pedir o arbitramento da indenização pelo Juízo, também indicou, ele próprio, um valor para a indenização, de modo que é de se entender que o julgador não podia ultrapassá-lo para fixar valor maior, em evidente julgamento "extra-petita", não fazendo sentido a exigência, pelo ofendido, de valor maior do que o que ele próprio sugeriu. 3.- Recurso Especial provido, reduzindo-se o valor da condenação ao valor pleiteado pelo autor (STJ, 3ª turma, Resp-1313643, Rel. Sidnei Beneti, Dje 13/06/2012). (grifei)
VIII – DO PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA
Conforme disposição do art. 300 do Código de Processo Civil de 2015, a tutela de urgência será concedida com o preenchimento de dois requisitos: a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.
Em verdade, inexiste vedação à concessão desse tipo de tutela em ações civis públicas. Pelo contrário, trata-se de prática reconhecida na legislação pátria, a exemplo das previsões dos arts. 4º e 12 da Lei nº. 7.347/85:
Art. 4º. O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.
Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo.
Partindo dessa premissa, deve ser avaliada, então, a presença dos dois requisitos para a concessão da tutela no caso sob análise.
A probabilidade do direito está mais do que comprovada nesta peça exordial e nos documentos que a ela foram acostados. A partir da análise de dispositivos constitucionais, da legislação relativa às concessões de serviços públicos e do Código de Defesa do Consumidor, restou configurada a posição de fornecedora assumida pela concessionária VIABAHIA e foram reconhecidas suas obrigações em oferecer um serviço adequado à população consumidora.
Por seu turno, o perigo de dano traduz-se na ausência de oferta do serviço de iluminação pública na Rodovia Engenheiro Vasco Filho, situação que perdura desde 04 de abril de 2016, em claro desrespeito aos direitos dos usuários, até porque põe em risco a vida de todos os transeuntes da via.
Assim sendo, e tendo em vista a urgência que envolve a celeuma instalada em razão do insustentável período pelo qual se estende, sem qualquer solução, requer a concessão de tutela provisória de urgência para fins de que a VIABAHIA e a ANTT sejam compelidas, solidariamente, sob pena de multa diária de R$ 100.000,00 (cem mil reais), a restabelecer o fornecimento de energia na localidade, com a instalação dos equipamentos necessários para o serviço de iluminação e monitoramento, no prazo de 90 (noventa) dias, indicando, ainda, um novo plano de ação para fiscalização dos equipamentos instalados, sobretudo as medidas indicadas no documento às fls. 152/156 (modernização do atual sistema de iluminação para o sistema em LED).
Ademais, requer a tutela de urgência para que a União, por intermédio da PRF, realize o patrulhamento ostensivo, executando operações relacionadas com a segurança pública, com o objetivo de preservar a ordem, incolumidade das pessoas, o patrimônio da União e o de terceiros, elaborando plano eficaz administrativo, no prazo máximo de 90 (noventa) dias, sob pena de multa diária no valor de 100.000,00 (cem mil reais).
IX – DOS PEDIDOS
Resta patente a precariedade da prestação do serviço de iluminação pública, que é essencial, eis que se relaciona com a segurança pública. Frise-se que a jurisprudência entende que não se pode invocar a reserva do possível para justificar o inadimplemento de direito fundamental. Por todo o exposto, e do que se acha devidamente comprovado pela documentação anexa, requer:
a) a citação dos requeridos, na pessoa de seus respectivos representantes legais, para, se desejarem, contestarem a presente ação, no prazo legal, sob pena de caracterização da revelia e seus efeitos legais, bem como comparecerem à audiência prevista no artigo 334 do NCPC;
b) a intimação o Município de Salvador para, querendo, integrar o polo ativo da lide;
c) a inversão do ônus da prova, impondo-se aos requeridos o dever processual de comprovar, nos autos da presente ação civil pública, a plena regularidade e legalidades das condutas questionadas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, bem como a não ocorrência dos danos morais coletivos apontados nesta exordial;
d) a concessão da tutela de urgência determinativa de obrigação de fazer para o pronto restabelecimento e manutenção da prestação adequada do serviço de iluminação pública no trecho da Rodovia Engenheiro Vasco Filho, que se estende do Shopping Bela Vista até a Estação Pirajá, pela VIABAHIA e pela ANTT, em até 90 (noventa) dias, sob pena de multa diária de R$ 100.000,00 (cem mil reais), com fundamento no artigo 497, combinado com o artigo 139, inciso IV, ambos do Código de Processo Civil (Lei nº. 13.105/2015);
e) Condenação da União, a fim de que a Polícia Rodoviária Federal efetive o patrulhamento ostensivo de forma eficiente, executando operações relacionadas com a segurança pública do local, atualmente, desprovido de iluminação e no qual incide altos índices de delitos, visando preservar a ordem, a incolumidade das pessoas, o patrimônio da União e o de terceiros, sob pena de multa diária no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais);
f) Seja a presente demanda julgada totalmente procedente, com a condenação solidária dos réus ao restabelecimento e manutenção da prestação adequada do serviço de iluminação pública no trecho da Rodovia Engenheiro Vasco Filho, que se estende do Shopping Bela Vista até a Estação Pirajá, além do pagamento de indenização, em valor não inferior, a R$300.000,00 (trezentos mil reais), a ser revertido para o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, estabelecido no art. 13 da Lei nº. 7.347/85;
g) ad argumentandum tantum, na hipótese remota de se concluir que a obrigação aqui pleiteada não seja cabível a qualquer um dos réus, sejam os demais condenados, nos termos do pedido anterior;
Em que pese já tenha apresentado prova pré-constituída do alegado, o MPF requer que lhe seja facultada a produção de todos os meios de prova em direito admitidos, especialmente prova documental, testemunhal e pericial, na medida necessária ao pleno conhecimento dos fatos, manifestando, de logo, seu interesse na designação de audiência de conciliação.
Dá à causa o valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais).
Salvador/BA, 18 de julho de 2018.
Leandro Bastos Nunes
Procurador da República
Notas
1Constituição, art. 31, XII, b e e.
2Cláusula 19.1.5, Edital 001/2008.
3Art. 29, Lei n. 8.987/95.