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O sistema de call center (teleatendimento).

Sua insuficiência e a obrigação das operadoras de telefonia móvel de disponibilizar postos de atendimento aos usuários

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20/07/2007 às 00:00
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Os órgãos de defesa do consumidor argumentam que o serviço de atendimento telefônico é inadequado e insuficiente, e pretendem que as prestadoras de serviços de telefonia móvel sejam obrigadas a disponibilizar postos de atendimento pessoal.

Sumário: 1. Introdução. 2. A inexistência de lei em sentido formal que obrigue as prestadoras de telefonia móvel a disponibilizar atendimento pessoal a todas as categorias de usuários. 3. A abertura de postos de atendimento como obrigação decorrente de normas regulamentares da ANATEL. 4. A posição da Jurisprudência. 5. A obrigação de tratamento diferenciado para os consumidores hipossuficientes. 6. A inadequação do call center para atendimento imediato aos usuários. 7. A previsão do CDC contra práticas comerciais abusivas e o poder interventivo do Juiz nas relações entre fornecedores e consumidores. 8. A caracterização das "células de retenção" ou métodos de fidelização no teleatendimento como prática comercial abusiva. 9. Conclusões.


1. Introdução

Uma intensa discussão está ocorrendo nos meios forenses sobre a obrigatoriedade (ou não) das operadoras de telefonia móvel de instalar postos de atendimento para o recebimento de queixas, reclamações e pedidos de rescisão dos usuários. Atualmente, somente é oferecido o sistema de teleatendimento (call center), forma única de comunicação entre o consumidor e a empresa prestadora quando se trata desses assuntos. Os pontos de venda de serviços e produtos das operadoras de telefonia móvel não recebem ou não dispõem de unidade para o atendimento a queixas e reclamações apresentadas pessoalmente pelos consumidores.

Os órgãos de defesa do consumidor argumentam que o serviço de call center (atendimento telefônico) é inadequado e insuficiente para atender a essa demanda, e pretendem que as prestadoras de serviços de telefonia móvel sejam obrigadas a disponibilizar outras e específicas formas de atendimento aos consumidores, notadamente postos de atendimento pessoal. As operadoras alegam que não há previsão legal desse tipo de obrigação e que exploram o serviço de telefonia móvel sob o regime jurídico de direito privado, não podendo sofrer ingerência na esfera de assuntos administrativos internos.

É sobre os aspectos jurídicos desse problema que nos propomos a oferecer algumas conclusões, no presente trabalho.


2. A inexistência de lei em sentido formal que obrigue as prestadoras de telefonia móvel a disponibilizar atendimento pessoal a todas as categorias de usuários

O princípio da legalidade, traduzido na expressão constitucional de que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei", garante o particular contra atividade do Judiciário que não se subsuma à atuação da vontade da lei. Em perfeita conexão com o princípio da separação dos poderes, pode ser reputado como o natural desdobramento de direitos políticos e garantias individuais da estruturação dos poderes, na medida em que assegura que somente o Legislativo pode obrigar os particulares. O princípio da legalidade visa garantir às pessoas que suas liberdades e patrimônio não serão perturbados senão em decorrência de mandamento advindo do Legislativo, Poder representativo dos cidadãos. Em razão dessa mecânica estabelecida entre os Poderes do Estado, o Judiciário só pode compelir o particular na medida em que promova a atuação da vontade da lei.

Portanto, sem que exista lei ou ato normativo do Executivo (decorrente de sua competência regulatória da atividade econômica), não se pode impingir a um determinado agente econômico, que exerça sua atividade sob o regime jurídico privado, uma obrigação específica. No caso, realmente, não existe lei que imponha às operadoras de telefonia móvel a obrigação de instalar postos de atendimento pessoal ao consumidor (ou mesmo que atribua a obrigação de disponibilizar certos meios específicos para o cancelamento de linha e serviços). Sobre a inexistência de obrigação legal, já se manifestou a 1ª. Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª. Região, por ocasião do julgamento do Ag. de Inst. n. 57525/CE, assim ementado:

"AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OPERADORA DE TELEFONIA MÓVEL. INSTALAÇÃO DE PONTOS DE ATENDIMENTO PESSOAL COM FINS EXCLUSIVOS DE RESCISÃO CONTRATUAL. INEXISTÊNCIA DE COMANDO NORMATIVO QUE IMPONHA ESSA OBRIGAÇÃO.

1. Agravo de Instrumento intentado com vistas a reformar decisão proferida em sede de ação civil pública no bojo da qual restou deferida medida liminar para determinar que a operadora de telefonia móvel recorrente procedesse à imediata instalação de pontos de atendimento pessoal com fins exclusivos de rescisão contratual.

(...)

3. Entrementes, não se afigura razoável que se utilize de provimento liminar – que, pela sua natureza, é dotado de precariedade – para se compelir prestadora de serviço de telefonia móvel a desenvolver atividades que não lhe são expressamente impostas por comando legal.

4. Ademais, não se pode perder de vista que o cancelamento das linhas telefônicas, bem ou mal, pode ser realizado tanto pelo sistema do "call center" como por atendimento pessoal através de requerimento padronizado".

No seu voto condutor, o relator do processo, Des. Francisco Wildo, assentou não somente que não existe lei que imponha à operadora de telefonia móvel a obrigação de instalar pontos de atendimento pessoal, como também que tal imposição não pode ser extraída das regras e princípios genéricos da legislação consumerista. Disse o relator a esse respeito:

"É certo que o insigne julgador singular proferiu a decisão agravada valendo-se de normas previstas no Código de Defesa do Consumidor e nas Leis n. 8.078/95 e 9.472/97 para argumentar, genericamente, que os usuários da telefonia móvel têm direito à prestação de serviços de telecomunicações com qualidade e regularidade. Contudo, além de entender que as normas em questão não têm o condão de fazer surgir de per si a obrigação imputada no ato objurgado, verifico que os interesses dos usuários não estão sendo desatendidos, eis que os documentos coligidos aos autos (cf. fls. 195 e ss) comprovam que a rescisão contratual pode ser feita tanto pelo sistema de "call center" como pelo intermédio de atendimento pessoal.

Do mesmo modo, penso que a dificuldade de acesso aos sistemas do 0800 ou 0800363636, como o congestionamento das linhas telefônicas, não seria motivo suficiente à instalação dos postos de atendimento em referência, eis que, a meu ver, caberia à ANATEL, neste caso, na qualidade de órgão responsável pela fiscalização das telecomunicações no país, imputar penalidade à operadora por infração às disposições normativas já existentes e não ao Judiciário ordenar o desenvolvimento de atividades que sequer são expressamente impostas por lei".

Realmente, o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) somente contém princípios e regras prevendo o direito do consumidor à prestação adequada e eficiente dos serviços públicos em geral (art. 6º., X). Por sua vez, a Lei de Concessões (Lei n. 8.987/95) também se limita a prescrever que os usuários dos serviços públicos concedidos têm direito a receber serviço adequado (art. 7º., I). Já a Lei Geral das Telecomunicações (Lei n. 9.472/97) assegura ao usuário dos serviços de telecomunicações apenas o direito de resposta às suas reclamações (art. 3º., X).

Não há, portanto, qualquer norma legal que exija especificamente que o atendimento ao usuário do serviço de telefonia móvel seja feito de forma pessoal, isto é, mediante o contato pessoal com um funcionário da prestadora. As disposições genéricas da legislação acima mencionada não seriam, por si sós, suficientes para sustentar pedidos específicos de implantação de diversas formas de atendimento aos usuários. Nesse ponto, concordamos com as conclusões do julgado acima transcrito.


3. A abertura de postos de atendimento como obrigação decorrente de normas regulamentares da ANATEL

Acontece que já existe um regramento que fundamenta a imposição de tal obrigação de fazer, regramento esse de natureza infra-legal, mas nem por isso menos obrigatório para as prestadoras de serviços de telecomunicações.

Ao Poder Executivo, como se sabe, remanesce uma parcela da atividade normativa estatal, pois detém a competência regulamentar das leis, tal como previsto no art. 84, IV, da Constituição Federal, que confere ao Chefe do Poder Executivo a função de expedir decretos e regulamentos para fiel execução das leis que tiver sancionado. O Executivo ainda exerce função normativa em razão do papel regulador da atividade econômica do Estado. A normatização do comportamento dos agentes econômicos possui expressa previsão no art. 174 da CF e significa a edição de normas jurídicas tendentes ao regramento da conduta dos participantes de um setor da economia que esteja regulado. No plano legal, um exemplo do deferimento de competência normativa pode ser percebido nos artigos 3º., I, da Lei n. 9.427/96 e 19, X, da Lei n. 9.472/97. Essa função normativa, como nota caracterizadora da função reguladora da atividade econômica, é exercida por meio das agências reguladoras.

Na área das telecomunicações, o órgão do Poder Executivo que tem competência normativa da atividade dos agentes econômicos (operadoras dos serviços de telecomunicações) é a ANATEL – Agência Nacional de Telecomunicações, entidade integrante da Administração Federal indireta, submetida a regime autárquico especial e vinculada ao Ministério das Comunicações, com sede no Distrito Federal [01]. Tudo o que estiver relacionado à organização e exploração dos serviços de telecomunicações, nos termos das leis brasileiras, fica a cargo dessa agência. É essa autarquia que tem a função de órgão regulador das telecomunicações no Brasil, podendo, nos termos das políticas estabelecidas pelos Poderes Executivo e Legislativo (art. 1o.), definir o disciplinamento e a fiscalização da execução, comercialização e uso dos serviços e da implantação e funcionamento de redes de telecomunicações. Como órgão regulador das telecomunicações, à Anatel compete adotar as medidas necessárias para o desenvolvimento das telecomunicações brasileiras, especialmente expedindo normas sobre a prestação desses serviços, quer quando prestados no regime público (art. 19, IV, da Lei 9.472/97) ou no regime privado (art. 19, X, da mesma Lei).

É no campo da normatização produzida por essa agência reguladora das telecomunicações que encontramos regras que especificam as formas de atendimento que as operadoras de telefonia móvel devem disponibilizar aos consumidores. De fato, o Regulamento do Serviço Móvel Pessoal – SMP (anexo à Resolução da Anatel n. 316, de 27.09.02), contém um certo número de dispositivos que indicam perfeitamente a intenção do órgão regulador de estabelecer variadas formas de atendimento aos usuários. Observe-se, por exemplo, a redação do parágrafo terceiro do art. 13 desse Regulamento:

"Art. 13. A prestadora deve receber e solucionar as queixas e reclamações dos Usuários nos prazos fixados no PGMQ-SMP.

§3º Todas as queixas apresentadas pelo Usuário devem ser processadas pela prestadora e receber um número de ordem a ser informado ao interessado para possibilitar o acompanhamento de sua solução, inclusive por intermédio da central de informação e atendimento do Usuário. (grifo nosso)".

Ao utilizar-se da expressão inclusive, para determinar que as queixas devem ser registradas e apresentar um número de ordem mesmo quando forem veiculadas por meio da central de informação e atendimento do usuário, o órgão regulador aponta claramente no sentido de que as prestadoras do SMP devem disponibilizar outro meio de atendimento.

Também no parágrafo 1º. do art. 60 do mesmo Regulamento (inserto no capítulo que trata "Da Contestação de Débitos"), o órgão regulador indica a necessidade da existência de postos de atendimento, para que o consumidor possa apresentar suas reclamações e queixas pessoalmente:

"Art. 60. O Usuário pode questionar os débitos contra ele lançados mediante contestação dirigida à prestadora.

§1º A contestação de débitos pode ser apresentada pessoalmente pelo Usuário, ou por seu representante legal, na forma escrita ou verbal, podendo valer-se de qualquer meio de comunicação à distância" (grifo nosso).

Por fim, o art. 82 (inserto no Capítulo IV do Regulamento, que trata "Do Atendimento aos Usuários") é o mais claro de todos, ao estabelecer que a operadora deve dar publicidade do endereço dos postos de atendimento:

"Art. 82. A prestadora deve tornar disponível o acesso telefônico gratuito a setor de informação e de atendimento ao Usuário bem como divulgar os endereços dos postos de atendimento públicos".

Se não há lei em sentido formal que imponha o dever da prestadora do Serviço Móvel Pessoal de oferecer postos de atendimento públicos, essa obrigação deriva de édito de conteúdo normativo emitido pela agência reguladora. Em várias passagens da norma regulamentar, como se viu, fica explicitado que o atendimento ao público de usuários deve ser feito de forma pessoal, daí porque decisão judicial que reconheça essa obrigação não pode ser acoimada de interferir de forma desarrazoada na administração interna da operadora de telefonia móvel. Existe, ao contrário, fundamento jurídico extremamente convincente, uma vez que, como se demonstrou, a operadora está obrigada a observar os condicionamentos impostos em regulamentação específica para a área de telecomunicações (especificamente para a exploração do serviço pessoal móvel de comunicação).

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O canal de comunicação telefônica (teleatendimento) pode ser até muito mais conveniente para o próprio usuário, em determinadas situações, já que fornece a comodidade de não precisar se deslocar até o local do posto de atendimento. Mas também devem existir alternativas de atendimento, outras formas de comunicação entre o consumidor e a empresa prestadora, para os casos em que o usuário não possa, não queira ou não consiga se comunicar através de telefone. Portanto, não se está reconhecendo a imprestabilidade do serviço de call center (teleatendimento), até porque não seria razoável deixar de utilizar as tecnologias de comunicação para a implantação de um serviço de atendimento, que pode ser muito mais conveniente para o próprio usuário, desde que devidamente estruturado. O que se está a reconhecer é que existe todo um contexto normativo pertinente aos serviços de telecomunicações e especificamente em relação ao serviço de telefonia móvel que permite concluir, de forma inequívoca, que as prestadoras desses serviços estão obrigadas à manutenção de postos de serviços para o atendimento direto e pessoal ao usuário. O usuário da telefonia móvel tem direito ao atendimento pessoal em postos da prestadora, onde possa apresentar: a) contestação de débitos; b) solicitação de reparos; c) emissão de segunda via de conta telefônica; d) restabelecimento de acesso; e) correção de endereços e outros dados; e f) solicitação de cancelamento de linha e rescisão contratual. O atendimento pode ser realizado por meios telefônicos e virtuais, mas, em razão de determinações regulamentares, tem que ser fornecido também de forma pessoal ao usuário. O atendimento ao usuário via telefone, o chamado call center, ou ainda qualquer tipo de auto-atendimento por meio da Internet, não pode ser a ferramenta exclusiva de interação do usuário com a prestadora, quando se trate de oferecer reclamação ou solicitar cancelamento da linha. Em razão das determinações regulamentares, a prestadora de serviços de telefonia móvel não pode substituir o atendimento pessoal por outros meios telefônicos ou via Internet.

Em sendo assim, não prospera a argumentação das operadoras de telefonia móvel de que, por explorarem o Serviço Móvel Pessoal (SMP) sob o regime jurídico privado [02], não estão obrigadas a instalar postos de atendimento pessoal aos usuários. É certo que existem diferenças entre os regimes público e privado na prestação dos serviços de telecomunicações, como por exemplo as obrigação de universalidade e continuidade, somente atinentes às operadoras que exploram esses serviços na primeira modalidade. As operadoras de serviços de telecomunicações prestados em regime público, justamente porque os serviços escolhidos para serem executados sob esse regime são considerados de "interesse econômico geral", têm obrigações mais severas, caracterizadas por um controle de tarifas mais estrito e imputação de obrigações de natureza social (as obrigações de universalização dos serviços e ônus de continuidade) [03]. Mas isso não significa que as operadoras que atuam sob o regime jurídico privado também não sofram condicionamentos administrativos e que os serviços que prestam não sejam regulados [04]. Como órgão regulador das telecomunicações, à Anatel compete expedir normas sobre a prestação dos serviços de telecomunicações, tanto os que são prestados no regime público (art. 19, IV, da Lei n. 9.472/97) como os que são executados no regime privado (art. 19, X, da mesma Lei). É certo que a agência deve observar a exigência de intervenção mínima na vida privada [05], mas está autorizada a impor os limites e encargos que considerar necessários, tendo em vista as necessidades do serviço e desde que não extrapolem os limites das leis e da Constituição. O Serviço Móvel Pessoal (SMP) é serviço de interesse coletivo [06] e, portanto, submetido às disposições constantes da regulamentação [07].

Uma vez que a Anatel expediu a regulamentação do SMP (Anexo à Resolução n. 316, de 27.09.02) prevendo a obrigatoriedade de as prestadoras da telefonia móvel disponibilizarem variadas formas de atendimento aos seus usuários (arts. 13, § 3º.; 60, § 1º.; e 82), agiu dentro do seu poder normativo que lhe é conferido pela Constituição (art. 174) e pela Lei (art. 19, X, da Lei 9.472/97). A prestadora possuiria liberdade para decidir qual a melhor forma de estruturar seu serviço de atendimento se não houvesse previsão regulamentar; todavia, tendo a agência reguladora explicitado a obrigação de instalação de postos de atendimento ao público, desapareceu essa liberdade, estando obrigada a atuar em consonância com esses condicionamentos administrativos. Havendo clara resistência da operadora em sujeitar-se às normas regulamentares da agência de telecomunicações, o Judiciário pode ser solicitado para interferir a fim de compeli-la a observar os condicionamentos próprios da sua atividade econômica.


4. A posição da Jurisprudência

Já podem ser registrados alguns posicionamentos jurisprudenciais no sentido de que as prestadoras de serviços de telefonia estão obrigadas a instalar postos de atendimento aos usuários. Expressivo desse entendimento é acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, assim ementado:

"AÇÃO CIVIL PÚBLICA – TELEFONIA – REABERTURA DE POSTOS DE ATENDIMENTO E LOJAS DE SERVIÇO – JUÍZO COMPETENTE – CITAÇÃO.

I- As pessoas jurídicas de direito privado, concessionárias de serviço público, prestadoras de serviço de telefonia, sujeitam-se às regras de relações de consumo. Os conflitos gerados entre elas e os consumidores, devem ser resolvidos pela Justiça Comum, por ausência de interesse da agência reguladora.

(...)

V- Nada obsta que sejam reabertos os postos de atendimento e lojas de serviços, visando maior facilidade para os consumidores, sem prejuízo de disponibilizar os mesmos serviços através de linhas telefônicas e da rede mundial de computadores" (TJDF – 5ª. Turma Cível, APC n. 2002011090881-2, rel. Desa. Haydevalda Sampaio, ac. un., j. 14.06.04)

Do STJ podemos citar o seguinte aresto:

"ADMINISTRATIVO. EMPRESA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇOS DE TELEFONIA. POSTOS DE ATENDIMENTO. REABERTURA. SISTEMA DE TELEATENDIMENTO OU VIA INTERNET. (...). APLICABILIDADE AO CASO DOS ARTIGOS 6º., § 1º., DA LEI 8.987/95, 2º. DA LEI 10.048/2000 E 32 DA RESOLUÇÃO N. 30/98 DA ANATEL. (...). RECURSO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.

(...)

5. Sendo a recorrente concessionária de serviço de telefonia pública, tem o dever de prestar um serviço para plena satisfação os usuários, que são, no dizer de Hely Lopes Meirelles, "seus legítimos destinatários". A utilização exclusiva do sistema de teleatendimento, internet ou de casas lotéricas implica a prestação de serviço inadequado, por implicar em várias conseqüências prejudiciais ao usuário que se vê completamente lesado no seu direito a um bom e eficiente serviço, pelo qual paga caro, e impotente no sentido de não ter como buscar a reparação do dano sofrido pela má prestação desse serviço.

6. Desarrazoada e sem respaldo legal, a argumentação aduzida pela recorrente de não estar obrigada à prestação de serviço por meio de postos de atendimento e que o recebimento da apelação apenas no efeito devolutivo acarretou-lhe sérios prejuízos, tendo ocorrido por isso, violação dos artigos 420 do CPC e 14 da Lei 7.347/85. Maior prejuízo certamente advirá aos usuários que dependem dos serviços da concessionária. Aplicação, ao caso, dos preceitos legais insertos nos artigos 6º., §1º. da Lei 8.987/95, 2º. da Lei 10.048/2000 e 32 da resolução n. 30/98 da ANATEL" (STJ, REsp 513.850-SC, rel. Min. José Delgado).

Os precedentes acima transcritos foram construídos em face dos serviços de telefonia fixa (STFC) [08], enquanto que o caso presente se estabelece diante das prestadoras de serviço de telefonia móvel, mas não haveria dificuldade em se estender a conclusão desses julgados também para o SMP, tendo em vista que o fundamento jurídico neles encontrado (para imposição da obrigação de instalação de pontos de atendimento ao público) foram regras do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) e da Lei das Concessões (Lei 8.987/95) - apenas o último dos julgados, do STJ, faz referência também, como fundamento de decidir, a resolução da Anatel (Res. n. 30/98).

O fundamento jurídico essencial desses julgados foi o dever das prestadoras de oferecer serviços adequados e satisfatórios, disposto na legislação de regência dos serviços públicos delegados (Lei 8.987/95) e na legislação consumerista (Lei 8.078/90) - o que, na nossa ótica de examinar o problema, não seria suficiente para impor a obrigação específica de abertura de postos de atendimento [09] -, mas em todo o caso a noção que deles sobressai é que a exigência de atendimento pessoal (sobretudo quando se refere a categoria de consumidores hipossuficientes) é imanente ao dever de prestação de serviços adequados e eficientes. Em assim sendo, seria perfeitamente viável a extensão dessa obrigação aos prestadores dos serviços de telefonia móvel (celular), pela simples razão de que também são considerados fornecedores de serviços no mercado de consumo, subordinados às regras do CDC, bem como submetidos às disposições da Lei de Concessões. Todo ente privado prestador delegatário de serviços públicos (de utilidade pública ou de interesse público) tem a obrigação de prestá-los de forma adequada, eficiente e satisfatória.

Não haveria, realmente, uma razão lógica para excluir as operadoras de telefonia móvel dessa obrigação, haja vista ser vinculada a praticamente todo serviço de utilidade pública cuja execução é delegada. Em regra, quase todos os delegatários, responsáveis pela prestação de serviços públicos massificados, assim entendidos aqueles que são prestados a um grande número de consumidores, têm a obrigação de instalar postos de atendimento públicos. Veja-se, por exemplo, o caso das concessionárias de serviço de fornecimento de energia elétrica, a respeito das quais o STJ já reconheceu essa obrigação como resultante do dever de prestar serviço eficiente e adequado (previsto no art. 6º. da Lei 8.987/95), conforme se depreende da ementa abaixo transcrita:

"AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ENERGIA ELÉTRICA. DISTRIBUIDORA DE ENERGIA ELÉTRICA. POSTOS DE ATENDIMENTO. REABERTURA. SISTEMA DE TELEATENDIMENTO. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 6º., § 1º. DA LEI 8.987/95 CARACTERIZADA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DO ARTIGO 2º. DA LEI 10.048/2000. (...)

(...)

4. Deve ser provido recurso especial, para se estender a todos os municípios elencados na ação civil pública os efeitos de liminar que determina a reabertura de postos de atendimento de distribuidora de energia elétrica, evitando que os usuários residentes em locais distantes e portadores de deficiência física, idosos e pessoas de pouca instrução tenham seus direitos prejudicados, em face da má prestação para não dizer inutilidade do serviço exclusivo de teleatendimento. Sabendo-se, aliás, que este é um desserviço ao consumidor atendendo tão somente aos objetivos de economia e maior lucratividade da empresa concessionária em detrimento e prejuízo dos usuários" (STJ-1ª. Turma, REsp 644845/RS, rel. Min. José Delgado, j. 17.02.05, DJ 04.04.05).

A similitude que as prestadoras (autorizatárias) do serviço de telefonia móvel guardam nesse aspecto, com outros delegatários de serviço público (cuja execução foi atribuída ao particular através de concessão ou permissão) destinado a grande número de consumidores, justifica que tenham as mesmas obrigações quanto ao atendimento às suas queixas e reclamações. Os meios considerados eficazes para o atendimento de modo eficiente aos consumidores devem guardar simetria, quando exigidos em relação a qualquer ente privado delegatário de serviço público (de utilidade ou interesse público) prestado de forma massificada a uma grande gama de consumidores, independentemente da modalidade de delegação do serviço (seja por meio de concessão, permissão ou autorização). A generalização do acesso ao serviço de telefonia móvel impõe que os condicionamentos quanto ao atendimento aos consumidores tenham uma correspondência sistêmica com outros serviços públicos de massa, notadamente em relação aos serviços de telecomunicações de massa (a exemplo do STFC) [10].

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Sobre o autor
Demócrito Reinaldo Filho

Juiz de Direito. Doutor em Direito. Ex-Presidente do IBDI - Instituto Brasileiro de Direito da Informática.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REINALDO FILHO, Demócrito. O sistema de call center (teleatendimento).: Sua insuficiência e a obrigação das operadoras de telefonia móvel de disponibilizar postos de atendimento aos usuários. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1479, 20 jul. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10175. Acesso em: 22 dez. 2024.

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