Resumo: O presente artigo científico tem o objetivo de mostrar a utilidade de uma Ata Notarial que, até pouco tempo atrás era ainda pouco conhecida e utilizada, principalmente como prova legal de fatos e publicações nos chamados “crimes virtuais” e “fake news” propagados pelo uso crescente da Internet. Estes crimes vão desde golpes monetários aplicados por estelionatários que usam da boa fé das pessoas, até casos de injúria; difamação; ameaças de exposição de cenas de nudez ou de sexo obtidas de modo fraudulento; divulgação de cenas de estupro; casos de pornografia infantil; “bullying”; perseguição digital (“stalking”); importunação; assédio sexual entre outros. Além destas situações, a Ata Notarial passou a ter uma importância enorme nas ações de Usucapião Extrajudicial, pois se trata de um elemento obrigatório para o seu reconhecimento diretamente no Cartório do Registro de Imóveis. Temos também as Atas Notariais de diálogo telefônico, de abertura de cofre bancário, de entrega de chaves de aluguel ou de um bem móvel. Atas em que se solicita ao Tabelião para que participe de uma reunião de condomínio ou em uma reunião societária (atas empresariais) onde ele vai narrar de forma objetiva e detalhada os fatos jurídicos verificados pessoalmente. A Ata Notarial é um documento com presunção de veracidade porque sua lavratura é exclusiva do Tabelião de Notas, que tem fé pública. Por isto é considerada uma prova pré-constituída que, posteriormente, poderá ser usada numa eventual ação judicial na busca de reparações por dano moral e a exclusão de conteúdos veiculados de forma indevida.
Palavras-chave: Ata Notarial. Usucapião Extrajudicial. Tabelião de Notas. Internet.
1. INTRODUÇÃO
A Ata Notarial é muito útil no caso de obtenção de provas e pode ser usada antes do início de um procedimento judicial e, em alguns casos, evitando tal procedimento com um acordo extrajudicial.
O seu uso está sendo muito disseminado para a comprovação de crimes digitais, fazendo prova de fatos e de publicações de crimes praticados na Internet.
Estes crimes vão desde golpes monetários aplicados por estelionatários que usam da boa fé das pessoas até casos de injúria, ameaças de exposição de cenas de nudez ou de sexo obtidas de modo fraudulento, divulgação de cenas de estupro, casos de pornografia infantil, “bullying”, perseguição digital (“stalking”), importunação e assédio sexual entre outros. Estes casos demonstram a vulnerabilidade dos internautas diante dos perigos a que estão expostos no mundo digital.
Quando não temos como provar uma situação potencialmente perigosa ou danosa, podemos procurar o Tabelião de Notas que, em tese, funcionaria como uma testemunha cujo ato vai ter fé pública e fazer prova plena perante qualquer juiz ou Tribunal.
Temos vários tipos de Atas Notariais como as Atas empresariais, Atas usadas no Direito de Família, Atas de acompanhamento em reuniões de condomínio e a Ata Notarial como elemento obrigatório para instruir o reconhecimento extrajudicial de Usucapião lavrada pelo Tabelião de Notas atestando o tempo de posse do requerente e de seus antecessores.
2. CONCEITO DE ATA NOTARIAL
A Ata Notarial é o instrumento público através do qual o Tabelião de Notas descreve uma determinada situação ou um determinado fato que lhe é apresentado pelo interessado, e o translada para seus livros de notas ou para outro documento.
Em outros casos, o Tabelião de Notas, a pedido do interessado, vai fazer a narrativa de fatos ou de algo que presencia ou presenciou, na exata medida em que os fatos se sucederam, descrevendo fielmente tudo o que viu e ouviu com os seus próprios sentidos e lavrando um documento qualificado com a mesma força probante da Escritura Pública e a fé pública que é inerente ao Tabelião de Notas.
“Ata Notarial é o instrumento público pelo qual o tabelião, ou preposto autorizado, a pedido de pessoa interessada, constata fielmente os fatos, as coisas, pessoas ou situações para comprovar a existência ou o seu estado”, conforme o conceito de Paulo Roberto Gaiger Ferreira e Felipe Leonardo Rodrigues (2).
O Código de Normas de São Paulo, no Capítulo 16, dedicado ao Tabelionato de Notas e repetido, de maneira semelhante, em quase todos os Códigos de Normas do Brasil, traz os requisitos que a Ata Notarial deverá conter:
a) local, data, hora de sua lavratura e, se diversa, a hora em que os fatos foram presenciados ou verificados pelo Tabelião de Notas; - Aqui, o tempo deve ser preciso, às vezes, até quanto aos segundos. O que não ocorre na Escritura Pública onde basta apenas o dia. A hora não é utilizada.
b) nome e qualificação do solicitante;
c) narração circunstanciada dos fatos;
d) assinatura e sinal público do Tabelião de Notas.
A Ata Notarial, ainda, poderá conter:
a) conter a assinatura do solicitante e de eventuais testemunhas;
b) ser redigida em locais, datas e horas diferentes, na medida em que os fatos se sucedam com descrição fiel do presenciado e verificado, e respeito à ordem cronológica dos acontecimentos e à circunscrição territorial do Tabelião de Notas;
c) conter relatórios ou laudos técnicos de profissionais ou peritos, que serão qualificados e, quando presentes, assinarão o ato;
d) conter imagens e documentos em cores, podendo ser impressos ou arquivados em classificador próprio.
A assinatura do solicitante é um elemento facultativo na Ata Notarial. Mas, para segurança jurídica de quem redige a Ata Notarial é recomendável que contenha a assinatura do solicitante que, hoje em dia pode ser feita de forma remota com a assinatura digital das partes, de acordo com o Provimento nº 100 do Conselho Nacional de Justiça:
Art. 20: Ao Tabelião de Notas da circunscrição do fato constatado ou, quando inaplicável este critério, ao tabelião do domicílio do requerente compete lavrar as atas notariais eletrônicas, de forma remota e com exclusividade por meio do e-Notariado, com a realização de videoconferência e assinaturas digitais das partes.
3. EXCLUSIVIDADE DOS TABELIÃES DE NOTAS
3.1. Lei nº 5.869/1973 (Código de Processo Civil) e a Lei nº 13.105/2015 (Novo Código de Processo Civil)
Na época da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), que lhe faz referência expressa no art. 384, a Ata Notarial foi anunciada como se fosse uma novidade trazida pelo NCPC.
Art. 384, NCPC 2015: “ A existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião.
Parágrafo único: Dados representados por imagem ou som gravados, em arquivos eletrônicos poderão constar da ata notarial.”
Porém, não se trata de uma criação nova, porque o CPC de 1973 já fazia referência, embora não explicitamente, conforme o artigo 364 transcrito abaixo.
“ Art. 364 do CPC/1973: O documento publico faz prova não só da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão, o tabelião, ou o funcionário declarar que ocorreram em sua presença.”
Portanto, se formos considerar o Código de Processo Civil de 1973, a Ata Notarial já existe no Brasil há mais de 35 anos, embora tenha ganhado maior destaque com os crimes virtuais e as “fake news” praticados com o uso crescente da Internet.
3.2. Lei nº 8.935/1994 – Lei dos Cartórios
De acordo com a Lei Federal nº 8.935, de 14 de novembro de 1994, que regulamento o art. 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e registrais – Lei dos Cartórios, em seu artigo 6º dispõe:
“Aos notários compete: I – formalizar juridicamente a vontade das partes; ... III – autenticar FATOS.”
E o art. 7º da referida Lei diz:
“Aos tabeliães de notas compete com EXCLUSIVIDADE:
I – lavrar escrituras e procurações públicas;
II – lavrar testamentos públicos e aprovar os cerrados;
III – LAVRAR ATAS NOTARIAIS;
IV – reconhecer firmas;
V – autenticar cópias.
Portanto, a fundamentação legal da lavratura das Atas Notariais decorre do disposto nos incisos III, dos artigos 6º e 7º da Lei nº 8.935/94.
Não é necessário fundamentar ou exigir da parte comprovação de seus direitos antes, depois ou no transcorrer dos fatos. A avaliação notarial quanto à legalidade é mitigada.
O Tabelião de Notas não tem competência legal para dizer se algo é lícito ou não. O Juiz de Direito, eventual destinatário da Ata Notarial, é que tem a competência legal e a jurisdição para declarar se o fato narrado é ou não um ilícito.
O Tabelião não faz juízo de valor, sendo assim, algo potencialmente ilícito pode ser registrado na Ata Notarial. Não existe a limitação de serem registradas somente coisas lícitas. Quando alguém solicita que se faça uma Ata Notarial é provável que houve ou haverá alguma confusão ou problema que precisa ser provado, ou algum fato ofensivo que ocorreu e precisa ser registrado.
Ainda, de acordo com o artigo 8º e 9º, da Lei nº 8.935/94, é livre a escolha do Tabelião de Notas, qualquer que seja o domicílio das partes ou o lugar de situação dos bens objeto do ato ou negócio, mas o Tabelião não poderá praticar atos de seu ofício fora do Município para o qual recebeu a delegação.
3.3. Usucapião Extrajudicial – Art. 216-A, da Lei nº 6.015/1973
O atual Código de Processo Civil (2015) inseriu o artigo 216-A na Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 – Lei de Registros Públicos e com isto a Ata Notarial passa a ter enorme importância, uma vez que é um elemento obrigatório no caso da ação de Usucapião Extrajudicial.
Portanto, é fato que o Código de Processo Civil atual (2015) não criou a Ata Notarial, mas deu uma grande importância a este meio de prova porque previu expressamente a terminologia no “caput” do artigo 384 e tornou a Ata Notarial um requisito obrigatório da ação de Usucapião Extrajudicial.
4. DIFERENÇAS ENTRE ATA NOTARIAL E ESCRITURA PÚBLICA
Os Atos Notariais são classificados em dois grupos:
4.1. Atas Notariais, que é todo e qualquer ato do Tabelião cuja finalidade seja simplesmente autenticar certo fato, pré-constituindo prova. (art. 6º, inciso III, da Lei nº 8.935/94). Dividem-se em: a) Autenticações; b) Atas Notariais (stricto sensu).
As Atas Notariais (stricto sensu), objeto de nosso estudo, são os instrumentos que verificam e descrevem a ocorrência de certo fato, pormenorizando-o com a finalidade pré-constituir prova jurídica. Sendo de muita utilidade nos dias atuais.
4.2. Escrituras Públicas: Formalizam juridicamente a vontade das partes. O notário intervém nos atos e negócios jurídicos a que as partes devam ou queiram dar forma legal e autenticidade, redigindo o instrumento adequado para propiciar a plena eficácia (art. 6º, incisos I e II, da Lei nº 8.935/94). Dividem-se em:
a) Procurações: Formalizam o mandato, propiciando a representação para atos ou negócios; b) Negociais: Formalizam negócios, via de regra imobiliários, como as Escrituras Públicas de Compra e Venda e as Doações; c) Testamento: Ato da disposição da totalidade de bens, ou de parte deles, ou de declarações de caráter não patrimonial, para produzir efeitos depois da morte da pessoa.
Tanto a Ata Notarial como a Escritura Pública são Atos Notariais que vão necessitar da assessoria do Tabelião de Notas, que em ambas deverá ser imparcial.
Na Ata Notarial o Tabelião só vai agir quando for solicitado e vai constatar tudo sempre a pedido do interessado. A atuação do Tabelião apresenta um caráter passivo. Não deve manifestar “juízo de valor” ou opinião sobre os fatos., mas deve ter uma cautela legal. Sendo assim, algo potencialmente ilícito pode ser registrado na Ata Notarial. Quem tem competência legal para dizer se o fato é lícito ou não é o Juiz de Direito, eventual destinatário da Ata Notarial, sendo que, quase sempre o seu objeto é a constatação de fatos potencialmente ilícitos.
Na Escritura Pública o Tabelião vai emitir um juízo de valor sobre a legalidade do ato. Aqui ele pode se negar a redigir algo que seja ilícito ou ilegal. Por exemplo, a compra de um ser humano. Às vezes, vai contra a moral e os bons costumes. Outro exemplo, no Testamento, o testador quer deixar todos os seus bens para uma terceira pessoa e, sabe-se que tem filhos. O Tabelião tem que esclarecer que o testador precisa “reservar a legítima” para os filhos. A sua atuação é muito mais ativa.
A Ata Notarial tem natureza jurídica autenticatória. Não constitui direito ou obrigações. Seu objeto é constituir prova descrevendo o fato jurídico no instrumento, para o futuro com autenticidade notarial. O tabelião vai registrar fatos para a produção de direitos.
Na Escritura Pública a natureza jurídica e constitutiva obrigacional. Seu objeto é declarar os atos e negócios jurídicos, que vão constituir direitos e obrigações para a parte ou partes. O tabelião vai relata uma relação jurídica.
Na Ata Notarial se houver a desistência da assinatura da parte, o ato pode ser completado, a critério do tabelião, que pode finalizar o ato, tornando-o válido e eficaz.
Na Escritura Pública é indispensável a assinatura das partes para ser válido e eficaz. Se houver a desistência da assinatura de uma das partes o ato fica incompleto e o tabelião não pode completá-lo.
5. CONCLUSÃO
A Ata Notarial é um ato notarial feita, com exclusividade, em um Tabelionato de Notas, sendo muito útil para vários tipos de profissionais que podem fazer uso deste documento, principalmente, provando fatos e publicações nos chamados “crimes virtuais” e “fake news” propagados pelo uso crescente da Internet.
Por exemplo, quem trabalha em Cartórios tem na ata notarial uma ferramenta cada vez mais solicitada.
O advogado que saiba utilizar a Ata Notarial como “meio de prova”, terá condições de desempenhar a sua advocacia de uma maneira muito mais marcante.
No caso da ação de Usucapião Extrajudicial tem um valor enorme, porque a Ata Notarial lavrada pelo Tabelião de Notas é um elemento obrigatório para o seu reconhecimento, que será processado diretamente no Cartório do Registro de Imóveis.
Portanto, atualmente e a cada dia mais, a Ata Notarial como “meio de prova” é um dos grandes instrumentos do Direito Registral e Notarial.
Notas
1 FERREIRA, Paulo Roberto Gaiger. RODRIGUES, Felipe Leonardo. Ata Notarial – Doutrina, Prática e Meio de Prova. 3ª. ed. Editora Juspodivm. 2021.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição Federal. Disponível em http://www planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 15.07.2021.
BRASIL. Lei nr. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Código de Processo Civil. Disponível em http://www.planalto.gov.br › ccivil_03 › leis. Acesso em 15.07.2021.
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em http://www.planalto.gov.br › _ato2015-2018 › 2015 › leis. Acesso em 15.07.2021.
BRASIL. Lei nr. 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Lei de Registros Públicos. Disponível em http://www.planalto.gov.br › ccivil_03 › leis. Acesso em 15.07.2021.
BRASIL. Lei nr. 8.935, de 18 de novembro de 1994. Lei dos Cartórios. Disponível em http://www.planalto.gov.br › ccivil_03 › leis › l8935. Acesso em 15.07.2021.