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Um estudo sobre o art. 16 da Lei de Tóxicos

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01/11/2000 às 00:00
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CONCLUSÃO PESSOAL

Após este detalhado estudo acerca do discutível art. 16 da Lei antitóxicos, minha conclusão pessoal é a seguinte :

O legislador ao elaborar a referida lei, buscou ser o mais amplo e rígido possível procurando reprimir qualquer ação que envolvesse substâncias entorpecentes.

Centrando o foco neste artigo, a intenção da norma foi coibir a divulgação dos entorpecentes em virtude do perigo social que representa à sociedade.

Entretanto, este tipo de perigo social é de tão grande monta, que não se coíbe com penas comuns como de outros criminosos, pois há o risco iminente de tranformarmos meros consumidores ou usuários em marginais. Tampouco, não me parece justo punir um simples usuário por culpa do fracasso do Estado no controle, repressão e o mais importante, na recuperação do viciado ou consumidor.

Não precisamos de mais leis, o que precisamos é que o legislador acorde para o problema, ou melhor, dê prioridades na implantação de programas preventivos com profissionais treinados e instituições aptas a receberem este tipo de pessoa, que muitas vezes, a simples prevenção e instrução da sociedade, levaria as pessoas a terem uma consciência maior dos malefícios que as drogas podem causar.

O ensino no Brasil, a cada ano reformula os currículos escolares, seria tão difícil que em uma dessas reformulações acrescentasse uma disciplina que instruísse e conscientizasse a população desde cedo. É necessário sim, primeiramente, uma mudança cultural, para evitarmos que no futuro as crianças de hoje, influenciadas pelos colegas e pela curiosidade venham a ser potenciais usuários, dependentes e por que não dizer traficantes. Se em muitas famílias as crianças e adolescentes não encontram a sustentação devida, deve este legislador que temos, olhar um pouco para isso, pois esta é a sua função primordial, o bem-estar social.

Por isso afirmo com convicção, de que adianta o Estado punir o viciado ou a divulgação dos tóxicos. Primeiro, punir o viciado de nada resolve, pelo contrário, com o nosso sistema prisional e de recuperação, com certeza servirá somente de estágio para outros crimes maiores, pois estará convivendo com mestres dos delitos. Segundo, punir só a divulgação, até acho ser um atrativo para o viciado, pois quanto mais arriscado o feito, mais emoção ele trará, que certamente será comemorado em alguma "rodinha" de consumo de drogas. Por analogia, é a mesma coisa que querer punir um alcóolatra. Fica uma questão, quantas pessoas vão conseguir vencer o vício com punição e quantas vão conseguir vencê-lo com tratamento, reabilitação e um pouco de atenção, que a maioria destas pessoas nem sabe o que é isso.

Neste estudo verifiquei que inúmeros julgados e até decisão do STF prendem-se à letra da lei. Ora, devemos ter uma mente mais aberta e adequar a nossa realidade à letra da lei e não somente interpretá-la literalmente. Neste sentido, se o legislador quer evitar o perigo social à saúde, que não consegue fazer de forma alguma, não é justo estragar a vida de um jovem ou quem quer que seja por ser um simples experimentador, curioso ou até ingênuo Ser Humano que para não parecer ridículo com os seus colegas, aceita experimentar. Será que aquele "bando" de indigentes bêbados não traz perigo algum a sociedade ? A divulgação da indigência e do alcoolismo não está previsto em lei alguma qualquer punição.

Na minha singela opinião, de nada adianta termos leis que se originaram das elucubrações do nosso legislador, tentando prever todas as hipóteses de que o próprio Estado não tem condições de garantir. Ora, se já temos em nossa bagagem a experiência que este caminho praticado até hoje não surtiu os efeitos esperados, vamos tentar pelo mais simples, que é a educação das pessoas para que estas não venham a se surpreender lá na frente e para aqueles que já se encontram nesta lamentável situação, cabe ao legislador ter um pouco de boa vontade e investir um "quinhão" na recuperação destes famigerados, que, com certeza, a grande maioria vai receber este auxílio e incentivo de braços abertos e agradecer por alguém ter dado uma oportunidade de reabilitá-los.


NOTAS

1. Apelação n.º 58.511 de São Paulo, Acórdão de 12/12/1972, Rel. Camargo Sampaio.

"... Segundo ensina o Prof. Vicente Greco Filho – em sua recente e acatada obra Tóxicos – Saraiva, 1972 – ‘a lei não pune o vício em si mesmo, porque não tipificada a conduta ‘usar’, mas pune o perigo social que representa a detenção ilegal do tóxico, qualquer que seja o fim a que se destina’."

Na verdade, ‘crime é trazer consigo’, conduta que gera um perigo que a norma legal procura evitar, mas não se apena a conduta de ‘usar’.

Realmente, quase sempre, para usar, o agente necessariamente deve ter trazido consigo. ..."

2. Ap. 179.903 - Sorocaba, ac. 4ª Câm. TACrim, em 10/4/1978, Rel. Juiz Gonçalves Sobrinho, JTACrimSP, 51:318.

3. Ap. 173.005-Jundiaí, ac. Um. 3ª Câm. TACrim, em 01/12/1977, Rel. Lauro Alves, JTACrimSP, 51

4. Tóxicos-Prevenção-Repressão, Vicente Greco Filho, Ed. Saraiva, 16ª ed., 1996, pg. 114

5. RT 552/305

6. (Extraído da internet, texto de Otaviano Moraes, Consumo de Drogas e o Princípio da Lesividade)

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7. TACRIM/SP, Apelação criminal n.º 210.983, Rel. Juiz Albano Nogueira; RT 560/312; 574/460; 583/350; 599/326.

8. RT 464/346; 536/339; 574/398; 587/364; RJTJSP 104/461. Em sentido contrário, entendendo a existência de fato típico : RTJ 88/104.

9. RT 619/405; RJTJSP 108/488.

10. JTACrimSP, 58:322

11. Neste sentido, TJSP, Acrim 72.018, RT, 651:263

12. Lei Antitóxicos anotada, Damásio E. de Jesus, Ed. Saraiva, 3ª ed., 1997, pg. 89 e 90.

13. RT 576:364, 536:339, 624:289, 562:326, 673:352, 587:364 e 574:398, JTACrimSP 55:193, 54:175, 51:328, 50:300 e 49:384

14. RT 88:104

15. Leis penais especiais e sua interpretação jurisprudencial. Coord.: Alberto Silva Franco e Rui Stoco. Ed. RT, 6ª ed., vol. 2.

16. Tóxicos - Tráfico de entorpecentes – Teoria/Jurisprudência/Prática e legislação – Brayan Akhnaton – Ed. Fulex

17. TJ – Ap. 102398-3/0 – 6ª câmara – Rel. Des. Márcio Bartoli – RT 180/109.

18. Comentários à Lei de Entorpecentes – 2ª edição revisada RJ – Editora Forense - 1997

19. Vicente Amêndola Neto – Tráfico de Entorpecentes – Jurisprudências Específicas e a Lei n.º 6.368/76 – 1ª edição/2000 – M.E. Editora Ltda

20. TJRS – AC 69.103.051-4 – Rel. Nério Letti – RJTJRS 155/69-76

21. Magistrado da 2ª Vara-Crime do Foro Regional de Tristeza

22. Op. Cit.


BIBLIOGRAFIA

1.Vicente Greco Filho, Tóxicos-Prevenção-Repressão, Ed. Saraiva, 16ª ed., 1996

2.Otaviano Moraes, Consumo de Drogas e o Princípio da Lesividade, texto extraído da Internet.

3.Damásio E. de Jesus, Lei Antitóxicos anotada, Ed. Saraiva, 3ª ed., 1997

4.Alberto Silva Franco e Rui Stoco, Leis penais especiais e sua interpretação jurisprudencial. Ed. RT, 6ª ed., vol. 2.

5.Brayan Akhnaton – Tóxicos - Tráfico de entorpecentes – Teoria/Jurisprudência/Prática e legislação – Ed. Fulex

6.Vicente Amêndola Neto – Tráfico de Entorpecentes – Jurisprudências Específicas e a Lei n.º 6.368/76 – 1ª edição/2000 – M.E. Editora Ltda

7.Valdir Sznick Comentários à Lei de Entorpecentes – 2ª edição revisada RJ – Editora Forense - 1997

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Sobre o autor
Luis Fernando Diedrich

economista e acadêmico de Direito na FMU

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DIEDRICH, Luis Fernando. Um estudo sobre o art. 16 da Lei de Tóxicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 47, 1 nov. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1020. Acesso em: 19 abr. 2024.

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