10. Causa de Aumento de Pena
Por outro lado, a Lei Antidrogas criou uma majorante de um sexto a dois terços, (art. 40 e seus incisos), que deve incidir, no momento da sentença condenatória, sobre as "penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei". Ou seja, sobre as penas cominadas aos crimes descritos nos referidos dispositivos legais, aí incluído o crime de petrechos para o tráfico.
São sete as circunstâncias majorantes, previstas nos incisos do referido art. 40, que devem incidir sobre a pena a ser aplicada, se:
I – a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do delito;
II – o agente praticar o crime prevalecendo-se de função pública ou no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância;
III – a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimento prisionais, de ensino ou hospitalares, de sede de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas ou beneficientes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou em transportes públicos;
IV – o crime tiver sido praticado com violência, grave ameaça, emprego de arma de fogo, ou qualquer processo de intimidação difusa ou coletiva;
V – caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal;
VI – sua prática envolver ou visar a atingir criança ou adolescente ou quem tenha, por qualquer motivo, diminuída ou suprimida a capacidade de entendimento e determinação;
VII – o agente financiar ou custear a prática do crime.
Literalmente interpretado o comando contido no caput do artigo 40, parece que o aumento deve ser obrigatoriamente aplicado sempre que verificada a presença de uma das circunstâncias acima descritas.
No entanto, cremos que a melhor interpretação é a de que nem todas as circunstâncias majorantes são compatíveis com o tipo penal descrito no art. 34, da Lei Antidrogas. Mesmo no caso do crime mais grave, que é o de tráfico ilícito, não nos parece razoável admitir que o simples fato de ser praticado nas proximidades de uma entidade ou associação cultural, recreativa, esportiva ou beneficiente, mas sem qualquer relação com a entidade e com os seus associados – apenas para ficar num exemplo isolado – apresente relevância político-jurídica para o aumento obrigatório da pena.
No caso do crime de petrechos, torna-se ainda mais evidente a impropriedade de se proceder a uma efetiva aplicação desta circunstância majorante, pois não seria razoável um aumento de pena somente porque a posse ou a guarda dos equipamentos ou aparelhos ocorra na proximidade de um locais assinalados no referido dispositivo. Além disso, verifica-se que as circunstâncias descritas nos incisos I e IV, são próprias do crime de tráfico ilícito e dificilmente poderão estar presentes na ação realizadora do crime de petrechos para o tráfico.
A nosso ver, esta causa de aumento deveria ter sido evitada pelo legislador – seja pelo excesso de preciosismo repressivo, seja por estar assentada na crença inútil de que o repique punitivo é um instrumento eficaz de combate à delinqüência. Esqueceu-se o legislador que, no caso do crime de petrechos para o tráfico, os marcos da sanção reclusiva conservam uma enorme distância entre o mínimo e o máximo. Isto permite ao magistrado, na apreciação das circunstâncias judiciais, fixar a pena-base com amplo espaço de manobra. Desta forma, as referidas circunstâncias poderiam ficar para ser objeto de consideração pelo juiz, na sua tarefa de aplicação da pena-base.
11. Regime Prisional Inicial e Progressão de Regime
A atual Lei Antidrogas trouxe, em seu texto, uma série de proibições e restrições para aplicação específica aos crimes ali tipificados. Cremos que o legislador optou por criar um subsistema punitivo próprio e autônomo, seja em termos penais ou processuais penais. Apesar das inúmeras normas de proibição expressa, a Lei Antidrogas é omissa quanto à progressão de regime prisional. No entanto, tratando-se de tipo penal classificado como hediondo, aplica-se ao crime de petrechos para o tráfico a regra contida no art. 2º, inciso 1º, da LCH, que agora determina o cumprimento da pena inicialmente em regime fechado.
Assim sendo, o condenado por crime de petrechos para o tráfico ilícito de drogas deve iniciar o cumprimento de pena em regime fechado, mas pode progredir de regime prisional, desde que tenha cumprido dois ou três quintos da pena (conforme seja primário ou reincidente) e comprovado o necessário mérito prisional.
12. Considerações Finais
1. Em termos de linguagem jurídico-penal, a expressão petrechos para o tráfico ilícito de drogas pode ser considerada como a mais adequada para denominar o crime previsto no art. 34 da Lei Antidrogas.
O crime de petrechos pode ser considerado como um tipo penal equiparado ao crime de tráfico ilícito de drogas. Portanto, deve ser considerado, também, como uma espécie de crime hediondo.
2. A norma agora vigente manteve a incriminação desta conduta meramente preparatória e, comparativamente ao texto da lei anterior, deu-lhe uma maior amplitude, em termos de descrição típica.
3. O crime de petrechos deve ser considerado como tipo penal subsidiário do crime mais grave, que é o tráfico ilícito de drogas. Trata-se, portanto, de tipo penal com função de controle penal essencialmente acautelatória. Considerando-se que se trata de crime subsidiário, a pena privativa de liberdade cominada – três a dez anos de reclusão – revela-se relativamente elevada.
4. O legislador manteve, também, a opção por uma descrição abrangente e multifacetada do comportamento incriminado. Em conseqüência, a norma incriminadora utiliza-se de onze verbos para indicar o rol das condutas proibidas capazes, cada uma delas, isolada ou conjuntamente, de realizar este tipo penal de múltipla ação.
Apesar de se referir apenas aos crimes previstos no art. 33, a causa de redução estabelecida no art. 33, § 4º, da Lei Antidrogas, pode ser aplicada, também, ao crime menor de petrechos para o tráfico.
5. Para a configuração do crime, os petrechos não precisam, obrigatoriamente, ter destinação própria ou exclusiva à produção ou ao preparo de drogas, mas é preciso ficar demonstrada a destinação dos petrechos idôneos voltada, propositadamente, para a produção ou o preparo de drogas (elemento subjetivo do crime).
6. A pena pecuniária teve seus valores mínimo e máximo significativamente aumentados em relação aos valores cominados na lei anterior. Esta é uma marca caraterística da nova Lei Antidrogas.
7. Conforme entendimento majoritário da doutrina, por se tratar de tipo penal equiparado ao crime de tráfico ilícito de drogas, o condenado pelo crime de petrechos para o tráfico, deve iniciar o cumprimento de pena em regime fechado. Poderá progredir de regime prisional, desde que tenha cumprido dois ou três quintos da pena (conforme seja primário ou reincidente) e comprovado o necessário mérito prisional.
13. Notas Bibliográficas
(1) FRANCO, Alberto Silva. Crimes Hediondos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 146.
(2) GOMES, Luiz Flávio e outros. Nova Lei de Drogas Comentada – Lei 11.343, de 23.08.2006. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 67..
(3) Segundo consta do Novo DicionárioAurélio da Língua Portuguesa, além do sentido próprio à linguagem militar – munições e instrumentos de guerra – o vocábulo petrechos, como substantivo masculino e plural significa, também, "quaisquer objetos necessários à execução de algo". Rio de janeiro: Nova Fronteira, 1986.
(4) Ver, sobre o assunto: HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, 1959, v. IX, p. 230. FARIA, Bento de. Código Penal Brasileiro Comentado. Rio de Janeiro: Record Editora, 1961, v. VII, p. 29. NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, v. 4, p. 119.
(5) GRECO FILHO, Vicente. Tóxicos – Prevenção – Repressão. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 101.
(6) MONTEIRO, Antônio Lopes. Crimes Hediondos. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 86.
(7) MENDONÇA, Andrey Borges de e CARVALHO, Paulo Roberto Galvão de. Lei de Drogas. Comentada Artigo por Artigo. São Paulo: Método, 2007, p. 34-5.
(8) Ver, a esse respeito: GUIMARÃES. Isaac Sabbá. Tóxicos. Comentários, Jurisprudência e Prática. Curitiba: Juruá, 2003, p. 63; GOMES, Luiz Flávio (Coord.) e outros. Nova Lei de Drogas Comentada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 166.
(9) TJRJ: Ap. Crim., 12.966, DJ 16.09.1985.
(10) Ob. cit, p. No mesmo sentido: MENDONÇA, Andrey Borges de e CARVALHO, Paulo Roberto Galvão de. Lei de Drogas. Comentada Artigo por Artigo, p. 103-4.
(11) GRECO FILHO, Vicente. Ob. cit., p. 102.
(12) GUIMARÃES. Isaac Sabbá. Tóxicos. Comentários, Jurisprudência e Prática, cit., p. 63; GRECO FILHO, Vicente. Tóxicos – Prevenção – Repressão, cit., p. 103; GOMES, Luiz Flávio (Coord.) e outros. Nova Lei de Drogas, cit., p. 167; MONTEIRO, Antônio Lopes. Crimes Hediondos, ob. cit., p. 86-7.
(13) Ob. cit., p. 102.
(14) DELMANTO, Celso. Tóxicos. São Paulo: Saraiva, 1982, p. 26.
(15) BARBOSA JÚNIOR, Salvador José e outros. A Desproporcionalidade da Cominação da Pena de Multa na Lei de Drogas. Boletim IBCCrim, Ano 14 – Nº 169 - Dezembro 2006, p. 6.
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