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Ressarcimento dos Estados pela perda de arrecadação do ICMS-Combustíveis

27/07/2023 às 17:17
Leia nesta página:

A compensação das dívidas dos Estados junto à União por perdas arrecadatórias do ICMS incidentes sobre combustíveis como gênero não tem amparo legal e constitucional.

Mais de 20 Estados da Federação ingressaram com ação direta de inconstitucionalidade contra a Lei Complementar nº 194/2022, que proibiu a tributação dos combustíveis pelo ICMS, em percentual superior àquele incidente sobre as mercadorias em geral, ou seja, 18% ou 17%, conforme o Estado (ADI nº 7191 e ADPF nº 984).

O Relator dos processos, Ministro Gilmar Mendes, constituiu uma Comissão Especial composta por representantes dos Estados e da União para solucionar o impasse.

Dessa Comissão Especial surgiu a proposta de acordo para: a) definir os produtos essenciais (diesel, gás natural e gás de cozinha); b) encaminhamento pela União ao Congresso Nacional da proposta de aperfeiçoamento legislativo da Lei Complementar nº 194/22 e da Lei Complementar nº 192/2022; c) celebrar no prazo de 30 dias convênio através do Confaz para uniformizar o imposto incidente sobre os combustíveis, com exceção da gasolina; d) renúncia expressa dos Estados e do DF quanto à possibilidade de cobrar diferenças não pagas pelos contribuintes, pela desconformidade artificialmente criada dos últimos 60 dias,  da mesma forma que não poderão ser levados a restituir eventuais valores cobrados a maior, desde o início dos efeitos da medida legal até 31 de dezembro de 2022.

O acordo foi homologado pelo STF e encaminhado ao TCU e aos presidentes da Câmara e do Senado Federal para os trâmites devidos acerca do aperfeiçoamento legislativo.

Em outra ação impetrada pelo Estado de Pernambuco o Ministro Relator, Roberto Barroso, determinou a compensação mensal de sua dívida perante a União pela perda arrecadatória do ICMS daquele Estado, motivada pela redução da alíquota incidente sobre combustíveis, gás natural, energia elétrica, comunicações e transportes (ACO nº 3601).

Primeiramente, não é adequado falar em redução de alíquota, que não houve mesmo porque a fixação de alíquotas é de competência privativa do ente político regional.

O que houve foi  a proibição de o Estado membro tributar os combustíveis em patamar superior à tributação das mercadorias em geral, o que situa o diploma legal (LC nº 194/22) no âmbito das normas gerais para assegurar a aplicação uniforme em todos os Estados da Federação (art. 146, III da CF).

Em segundo lugar, a União limitou-se a regulamentar o disposto no inciso III, do § 2º, do art. 155 da CF que faculta aos Estados  a tributação seletiva em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços.

Nos termos da dicção constitucional, tratando-se de mera faculdade, nenhum Estado está obrigado a promover a tributação seletiva.

Mas, em fazendo o uso da faculdade conferida pelo Texto Magno não poderá implementar a seletividade ao inverso, isto é, tributar mais as mercadorias e serviços considerados essenciais.

Em terceiro lugar, a Lei Complementar nº 194/2022 guarda harmonia com o decidido pela Corte Suprema que decretou a inconstitucionalidade da tributação de energia elétrica e serviços de telecomunicação pelo  Estado de Santa Catarina em percentual superior a 17% aplicável às mercadorias em geral (RE nº 714.139/SC julgado sob sistemática de repercussão geral).

É obvio que o exemplo da tributação de energia elétrica e da telecomunicação serve para os demais casos de tributação de bens essenciais como combustíveis.

Colocada a questão nesses termos fica bem difícil entender a condenação da União que limitou-se a exercer a sua competência legislativa para regular o dispositivo constitucional de forma a harmonizar-se com a jurisprudência do STF firmada sob a sistemática de repercussão geral, portanto, de aplicação erga omines e de efeito vinculante.

Não socorre o argumento de que uma parte do combustível representada pela gasolina não se submete à alíquota seletiva por não ser produto essencial.

Ora, a Lei Complementar nº 194/2022 incluiu a gasolina no rol de produtos essenciais e não houve declaração de inconstitucionalidade dessa Lei pelo STF.

Quando o aperfeiçoamento legislativo dessa Lei Complementar nº 194/2022, que consta do acordo homologado pelo STF, vier a excluir a gasolina do rol de produtos essenciais, aí sim que a gasolina deixará de ser produto essencial por opção legislativa, não antes.

De qualquer forma, a nova Lei evidentemente não poderá vir com efeito retroativo de maneira que, a nosso ver, a compensação das dívidas dos Estados junto à União por perdas arrecadatórias do ICMS incidentes sobre combustíveis como gênero não tem amparo legal e constitucional. 

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Sobre o autor
Kiyoshi Harada

Jurista, com 26 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HARADA, Kiyoshi. Ressarcimento dos Estados pela perda de arrecadação do ICMS-Combustíveis. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7330, 27 jul. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/103358. Acesso em: 22 dez. 2024.

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