O Código de Processo Civil de 2015 prevê uma série de atos processuais a serem realizados de maneira conjunta ou simultânea.
É o caso do manejo simultâneo do Recurso Especial e do Recurso Extraordinário, em caso de a decisão atacada infringir, ao mesmo tempo, norma infraconstitucional e questão constitucional.
Pois bem. Antes da análise central, baseada em um julgado recente, interessante mencionar outras hipóteses de prática de atos processuais simultâneos a que a lei processual faz menção.
Há discussão antiga no que diz respeito a apresentação, no mesmo ato, da contestação e da reconvenção.
Sabe-se que é possível a existência de contestação sem reconvenção, bem como a de reconvenção sem a contestação.
Porém, é viável a apresentação de contestação e reconvenção em momentos distintos do lapso temporal do qual o réu dispõe para apresentar sua defesa?
Nesse caso, parece-me negativa a resposta. A doutrina e jurisprudência são uníssonas quanto à necessidade de a reconvenção ser apresentada no mesmo momento da contestação.
Mais do que isso, há a necessidade da reconvenção ser apresentada dentro da peça principal de defesa. 1
O contra-ataque do réu somente será proposto de forma isolada quando não houver o protocolo da contestação, ao passo que é possível reconvenção sem contestação, mas, na hipótese de irresignação do réu por meio da contestação, é dever que se apresente aquela junto a peça de defesa principal.
O dispositivo que regulamenta o procedimento da reconvenção é claro, quando diz expressamente que “na contestação, é licito ao réu propor reconvenção para manifestar pretensão própria, conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa”. 2
Além disso existem outros temas interessantes no que diz respeito a reconvenção, como a necessidade de conexão com a contestação, da natureza da decisão que indefere liminarmente a reconvenção, bem como a possibilidade e processamento da reconvenção nos procedimentos especiais, temas férteis para texto próprio.
Outra interessante hipótese acerca de atos processuais a serem realizados conjuntamente,diz respeito a interposição do recurso adesivo e contrarrazões ao principal.
No que diz respeito a esses atos processuais, entendo ser permitida a sua prática em momentos separados, dentro do prazo processual comum de quinze dias para resposta ao recurso principal.
De outra borda, há entendimento, inclusive, a permitir a prática desses dois atos em uma só peça processual, contrarrazões e recurso adesivo, contando que os limites argumentativos de cada um encontrem-se claramente delimitados. 3
Interessante questão, sobre a qual já tive oportunidade de escrever, diz respeito a renúncia ao recurso principal.
Tal conduta não tem o condão de fulminar o interesse no recurso adesivo, interesse esse que sequer veio a lume em momento pretérito. 4
A parte que renuncia ao recurso principal não deve ter por fulminada a interposição do recurso aderente, ao passo que o próprio interesse recursal nasce em momento posterior.
A grande diferença acerca da interposição conjunta da contestação/reconvenção e recurso adesivo/contrarrazões repousa nos dizeres da lei processual.
Enquanto o artigo 343 diz que a reconvenção deverá ser oferecida com a contestação, o artigo 997 do mesmo Código de Processo Civil aduz que o recurso aderente deverá ser interposto perante o órgão responsável por conhecer do principal, no prazo em que a parte dispõe para as contrarrazões.
Observe que são situações distintas para a prática de atos a serem realizados em momentos processuais próximos ou idênticos.
Porém, o ponto central do presente ensaio diz respeito a mais uma hipótese de atos processuais a serem consumados conjuntamente.
A dúvida reside na medida temporal que devem ser realizados, se no mesmo instante processual ou no prazo comum de quinze dias para interposição recursal.
Na hipótese de acórdão proferido por tribunal estadual ou tribunal regional federal ferir, simultaneamente, norma infraconstitucional e questão constitucional, deve-se interpor ao mesmo tempo recurso especial e recurso extraordinário, não importando a ordem de interposição.
Porém, em qualquer hipótese, os autos serão remetidos primeiramente ao Superior Tribunal de Justiça, posto que o julgamento favorável do recurso especial poderá prejudicar o recurso extraordinário.
Diante do afirmado, nasce a presente indagação: deverão os recursos excepcionais serem interpostos no mesmo ato processual ou dentro do mesmo prazo comum para recorrer?
Em recente julgado, a Primeira Vice-Presidência do Tribunal de Justiça de Santa Catarina inadmitiu recurso extraordinário interposto, aproximadamente, quarenta e oito minutos após o recurso especial referente a mesma decisão. 5
Em sua fundamentação, o desembargador utilizou dois precedentes do Supremo Tribunal Federal, que dizem ser necessária a interposição simultânea dos aludidos recursos, sob pena de preclusão e inadmissão da remessa de ambos ao Superior Tribunal de Justiça, que é o primeiro tribunal superior a recebê-los por força legal. 6
Mas, qual a exata profundidade dos termos “simultaneamente” ou “interposição conjunta”, utilizados em tantos precedentes e atrelados a letra da lei?
Não é só o Tribunal de Justiça de Santa Catarina que vem entendendo da maneira acima narrada.
O Tribunal de Justiça de Goiás, em acórdão igualmente proferido pela Vice-Presidência, entendeu pela preclusão de recurso extraordinário interposto em dia distinto, porém dentro do prazo comum, do recurso especial. 7
O entendimento causa certa estranheza, ao passo que sequer os dizeres da lei exigem que a interposição seja realizada no mesmo ato/momento processual, apenas se referindo a interposição conjunta, mas não simultânea.
Isso significa que não há a necessidade da interposição pelo patrono do recorrente dos dois recursos excepcionais na mesma sentada, um seguido do outro, em um idêntico momento processual.
A posição dos tribunais de segundo grau mencionados vem causando severa apreensão nos advogados militantes em todo o país.
Não é tarefa que se revela das mais fáceis explicar a um cliente que seu recurso especial ou extraordinário não foi admitido na origem pelas razões, preocupantes, ora expostas.
Uma tranquilizadora notícia. O Superior Tribunal de Justiça tem reformado essas decisões, ainda que em sede de agravo em recurso especial e em decisões que não possuem vinculatividade obrigatória, posicionando-se no sentido de se permitir a interposição separada dos recursos, mas dentro do prazo comum de quinze dias. 8
Vem sendo sedimentado o entendimento de que a parte dispõe do prazo comum de quinze dias, não sendo necessária a interposição simultânea, transmitindo a ideia e interpretando a expressão “interposição conjunta” do artigo 1.031, do Código de Processo Civil, no sentido de que conjunta é a apresentação recursal que se dá no mesmo lapso temporal (comum), que dispõe o recorrente, qual seja quinze dias úteis da publicação do acórdão recorrido.
Isso significa que é possível, a título de ilustração, em face de decisão que ofende preceito federal infraconstitucional e constitucional, a interposição de recurso especial no terceiro dia do prazo comum, e do recurso extraordinário no décimo dia.
Tal fato não configura preclusão, ao passo que sequer há impeditivo legal para tanto.
A problemática só terá um fim e uma segurança quando o Superior Tribunal de Justiça se manifestar de forma definitiva, posicionando-se, creio, pela não preclusão no caso.
De outra borda, se o padrão decisório dos tribunais de segundo grau, no intuito de diminuir a carga recursal se manifestar no sentido das decisões aqui expostas, quem arcará com a irrazoabilidade será o jurisdicionado. Aguardemos.
Notas
CASSIO SCARPINELLA BUENO, Novo Código de Processo Civil Anotado, Saraiva, 2015, p. 258
Art. 343, do Código de Processo Civil.
DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES, Novo Código de Processo Civil Comentado, Editora JusPodivm, 2ª ed., 2017, p. 1641
<https://www.conjur.com.br/2023-abr-11/moraes-oliveira-recurso-adesivo-renuncia-direto-principal>
Recurso 0000918-66.2021.8.16.0092/3 TJSC
RE 915324, 1288529
Recurso 5629994-31.2019.8.09.0006 TJGO
AREsp: 2126023 GO