Reza, o art. 5º., II, in fine do Codex Processual Penal, ser o requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo uma das maneiras de eclosão da persecutio criminis em caso de ação penal pública.
Frisa-se "uma das maneiras", já que outras podem figurar, tais quais a requisição da autoridade judiciária ou do Parquet, bem como ex-officio.
A propósito, e sem adentrar ao meritum causae, convém salientar que as requisições ministeriais além das provenientes da magistratura, ao revés do que muitos autores tendem a preconizar, só devem ser cumpridas quando não forem manifestamente eivadas de ilegalidade. Sabe-se que requisitar significa exigir, e como tal, não cabe à autoridade policial o desatendimento. Entretanto, ao atentarmos para o fato de que inúmeras vezes alguns direitos e garantias individuais findam feridos, vislumbraremos que as requisições podem ser consagradas ao arrepio da lei, sem o devido amparo legal.
Senão, vejamos o que aduz a Lex Suprema in verbis:
"Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
....................................
VIII requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais".
A respeito do susocitado afirma Massili: "...tal norma quer na verdade significar que o Ministério Público, além dos poderes de requisição, tem o dever de indicar os fundamentos jurídicos de suas pretensões processuais".
Em assim sendo, quis, pois, sabiamente, o legislador com tal condição limitar o poder do Ministério Público, impedindo-o de apresentar requisições vãs, infundadas; que nessas condições são manifestamente ilegais.
Mas quanto ao indeferimento, quando este se evidenciará? A lei adjetiva penal não nos ensina em qual hipótese deveremos jugular pelo desacolhimento da pretensão do ofendido ou quem legalmente o represente em ver seu algoz indiciado (rectius. quasi imputatus).
Portanto, como criação doutrinária eis que emergem 04 (quatro) situações, consagradas pioneiramente pelo emérito jurista Hélio Bastos Tornaghi em sua célebre e festejada obra Instituições de Processo Penal: "1º. Quando o fato narrado não for típico; 2º. Quando, manifestamente, já estiver extinta a punibilidade; 3º. Quando a autoridade não for competente; e 4º. Quando a petição não ministrar nenhum elemento" (v.2., 2ª. ed. São Paulo, Saraiva, 1977, p. 261).
Não cabe à autoridade policial aferir a licitude do fato ou da culpabilidade do agente. Se o fizesse estaria julgando, vale dizer, usurpando atribuições do juiz. Assim, não lhe compete, v.g., deixar de abrir inquérito por entender que, tendo sido o fato cometido em qualquer das circunstâncias do art. 23 do Estatuto Repressivo Pátrio, não constitui crime. Deve-se ater exclusivamente à configuração, à adequação, do fato à descrição legal.
Do indeferimento do requerimento de abertura do inquérito policial cabe recurso ao Chefe de Polícia, que ao contrário do fluentemente aduzido, não é o Secretário de Estado da Segurança Pública e sim a autoridade maior na pirâmide hierárquica da Polícia dos Estados (Superintendente ou Chefe de Polícia, na Polícia Civil) ou União (Superintendente, na Polícia Federal). È o mandamento constante do art. 5º., §2º. do referido diploma legal.
Por intermédio de criação jurídico-administrativa e diante da inexistência de uma regulamentação do Inquérito Policial no Código de Processo Penal ou em lei esparsa, pode ser impetrado novamente, diante da confirmação pelo Chefe de Polícia da desnecessidade da abertura do inquérito, desde que surjam novos fatos que fundamentem o pleito.
Nunca é demais salientar que, caso o ofendido ou seu representante legal estejam insatisfeitos com o desfecho de sua pretensão, ao mesmo tempo que persistam convictos da autoria e materialidade do fato, podem pura e simplesmente encaminhar toda a documentação ao representante do Ministério Público, que verificada a procedência e, se utilizando de prerrogativa disposta ao longo dos arts. 39, §5º. do Codex Processual Penal, ofertará denúncia.
Ademais:
"Art. 12. O inquérito policial acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou a outra";
"Art. 27. Qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção"; e
"Art. 46..................
§1º. Quando o Ministério Público dispensar o inquérito policial, o prazo para o oferecimento da denúncia contar-se-á da data em que tiver recebido as peças de informação ou representação".
Ex positis, conclui-se que o inquérito policial é dispensável, e qualquer investida do Ministério Público no sentido de propagar a persecutio criminis in judicio sem a peça policial é perfeitamente lícita, pois o que não se compreende na sistemática processual penal brasileira, é a propositura de ação penal sem o indispensável suporte fático.