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Razoabilidade e proporcionalidade no direito processual administrativo brasileiro

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4. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE NA LEI DE PROCESSO ADMINISTRATIVO FEDERAL (LEI Nº 9.784/99)

É humanamente impossível tratar de todas as repercussões, na LPA, dos dois princípios sob exame, ainda em apenas um artigo. Por isso, restringiremos nossa análise aos aspectos mais relevantes para uma interpretação sistemática do referido diploma.

É de se ressaltar que, embora seja uma lei que regula o processo administrativo, a LPA também se presta a regular a produção de atos administrativos não-processuais [14]. Por isso, as observações aqui expendidas também se aplicam aos atos simples, compostos e complexos, ainda que não relativos a um processo administrativo propriamente dito.

4.1. Princípio da informalidade do processo administrativo.

De acordo com o art. 2º, parágrafo único, da LPA, devem ser adotados dois critérios que se complementam para formar o que a doutrina chama de princípio da informalidade do processo administrativo: a "observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados" (VIII) e a "adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados".

Isso indica que: a) o processo administrativo, ao contrário dos processos judicial e legislativo, não precisa obedecer a formalidades rigorosas; e b) assim, são obrigatórias apenas as formalidades essenciais à proteção dos direitos dos administrados.

A utilização da razoabilidade e da proporcionalidade é necessária exatamente para definir quais as formalidades essenciais, aquelas das quais não se pode prescindir [15]. Obviamente, quando a lei estipula explicitamente a forma a ser adotada, não há motivo para maiores questionamentos. É o exemplo da obrigatoriedade da numeração de todas as folhas dos autos do processo (art. 22, §4º); não há que se analisar se essa formalidade é essencial: se a lei a determina, é porque já a considera essencial.

Outra situação ocorre quando a lei não estipula a forma do ato. Uma interpretação literal do art. 22, caput, [16] levaria a crer que a Administração está, aí, livre para atuar. Porém, é preciso sempre utilizar, na definição da forma, a razoabilidade e a proporcionalidade da medida. Afinal, não se pode despojar o processo de uma forma que proteja os interesses do administrado e a certeza dos fatos só porque ela não está expressamente prevista em lei; por outro lado, é desarrazoado e desproporcional obrigar a Administração a dotar determinada forma sequer prevista em lei, se não para resguardar interesses importantíssimos que estejam eventualmente em questão [17].

Deve-se, então, na definição da forma a ser adotada, ir além da leitura do texto da norma, para analisar se a forma que se pretende utilizar é adequada à defesa da certeza e da segurança do processo (adequação); se é a que menor gravame impõe ao administrado e, também, à Administração (necessidade); e, finalmente, se o grau de formalidade a ser imprimido é proporcional ao grau de risco de violação dos referidos valores (proporcionalidade) [18][19].

4.2. Princípio da motivação.

Ao contrário do motivo, a motivação não é um requisito dos atos administrativos. Todo ato tem um motivo, mas a explicitação desses fundamentos de fato e de direito só é imprescindível em determinados casos. É nesse sentido que se deve ler a disposição do art. 2º, parágrafo único, VII, da LPA, segundo é necessária a "indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão".

Essa determinação, à primeira vista peremptória, deve ser compatibilizada com o que dispõe o art. 50, quando estipula quais os atos que deverão ser obrigatoriamente motivados. Ora, se a lei faz essa ressalva, é porque a motivação, embora seja um dos critérios do processo administrativo, nem sempre é imprescindível. Será dessa maneira sempre que se tiver em conta uma das hipóteses arroladas nos incisos do art. 50.

Mas não só nesses casos. Com base na mesma interpretação utilizada no tópico anterior, pode-se afirmar com segurança que, sempre que se tornar necessária para valorizar a segurança jurídica e a certeza do processo, a motivação será obrigatória, mesmo que não prevista como tal.

Aliás, é importante lembrar que é justamente por meio da motivação que será possível sindicar a razoabilidade e a proporcionalidade de um ato. É na exposição de motivos que se deverá demonstrar, de maneira clara e racional, por que o ato é razoável (adequado e necessário) e proporcional, notadamente quando a providência negar, limitar ou afetar direitos ou interesses (art. 50, I) ou impuser ou agravar deveres, encargos ou sanções (inciso II) [20].

A motivação será importantíssima, ademais, quando se tratar de atos discricionários. Essa é uma que, apesar de não incluída no rol (exemplificativo) do art. 50, obriga a Administração a motivar a providência adotada. Como ensina Celso Antônio Bandeira de Mello, a discricionariedade deixa ao Administrador um espaço de análise sobre o mérito (oportunidade e conveniência) do ato, e é justamente por isso que se faz necessário saber por que se optou por praticar o ato agora (oportunidade), ou desta maneira (conveniência), ou por que se escolheu essa solução e não aquela [21].

É aqui que o administrador deverá expor cuidadosamente o raciocínio de adequação, necessidade e proporcionalidade do ato, mesmo porque o STJ já decidiu que o Judiciário pode analisar o mérito do ato administrativo, no que se refere à razoabilidade: "O Poder Judiciário não mais se limita a examinar os aspectos extrínsecos da administração, pois pode analisar, ainda, as razões de conveniência e oportunidade, uma vez que essas razões devem observar critérios de moralidade e razoabilidade" [22].

4.3. Princípio da interpretação da norma administrativa conforme o interesse público.

Um mesmo texto pode fundamentar interpretações diversas. De acordo com os cânones da Nova Hermenêutica Constitucional, cabe ao intérprete construir a norma a partir do texto da norma (dado) – e todos os que participam da vivência constitucional são intérpretes da Constituição [23]. Porém, o sistema possui uma série de intérpretes autorizados ou qualificados, cuja interpretação é vinculativa ou, pelo menos, tem força normativa. É o caso da autoridade administrativa, que recebe da lei a competência explícita para aplicar o Direito e a atribuição implícita de previamente interpretá-lo.

É nesse momento que a razoabilidade e a proporcionalidade se mostram fundamentais. No momento de definir o significado a ser seguido, o administrador deve seguir uma seqüência racional: a) verificar quais as possíveis interpretações para aquele texto (interpretação gramatical); b) excluir os significados absurdos [24]; c) eliminar os significados que, embora racionais, sejam incompatíveis com o sistema (interpretação sistemática); e d) em ainda havendo mais de uma interpretação possível, analisar-lhes a razoabilidade (adequação e necessidade) e a proporcionalidade, tanto da própria interpretação quanto das conseqüências que pode gerar (interpretação teleológica).

Evidentemente, esse esquema a priori não pode (nem se propõe a) resolver todos os problemas de interpretação das normas pelo administrador, mas fornece um caminho racional, que poderá, depois, ser facilmente analisado em qualquer outra sede, inclusive judicial, facilitando a identificação da legitimidade (ou não) do ato.

A razoabilidade e a proporcionalidade servem, no caso (mais acentuadamente a primeira), para permitir uma maior vinculação entre a interpretação e a consecução do interesse público, fim último de qualquer providência administrativa. É o que se depreende, também, do inciso XIII do art. 2º, parágrafo único, da LPA, que considera critério a ser observado nos processos administrativos a "interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige".

Veja-se: da forma que melhor garanta o interesse público. A própria lei admite a pluralidade de interpretações e recomenda seja escolhida a que melhor atenda ao interesse público. Ora, essa análise de qual a melhor interpretação para alcançar determinado fim é puramente a análise da razoabilidade da medida.

4.4. Delegação e avocação de competências.

É intrínseca ao poder hierárquico a prerrogativa de delegar competências a autoridades (subordinadas ou não) ou de avocar atribuições legalmente conferidas aos subordinados [25]. A LPA inovou mais uma vez o ordenamento jurídico-administrativo brasileiro ao regular esses dois institutos, nos arts. 11 a 17.

A razoabilidade e a proporcionalidade permeiam a legalidade desses dois fenômenos de transferência de atribuições, pois tanto a delegação quanto a avocação representam uma subversão da competência legalmente estabelecida: o natural é que pratique o ato o administrador público autorizado por lei; a delegação a outra autoridade ou a avocação das atribuições dos subordinados representam formas excepcionais de prática dos atos administrativos. Por isso mesmo, devem ser utilizadas com parcimônia, com atenção redobrada à razoabilidade (adequação e necessidade) e à proporcionalidade [26].

Com efeito, o art. 12 trata da delegação de competências e estabelece, no caput, que: "Um órgão administrativo e seu titular poderão, se não houver impedimento legal, delegar parte da sua competência a outros órgãos ou titulares, ainda que estes não lhe sejam hierarquicamente subordinados, quando for conveniente, em razão de circunstâncias de índole técnica, social, econômica, jurídica ou territorial."

A última oração do período estabelece os requisitos para a validade do ato de delegação, quais sejam: a) requisito explícito – a conveniência (aspecto de mérito do ato), em razão de circunstâncias determinadas; e b) requisitos implícitos – b.1) motivação (inerente aos atos discricionários) e b.2.) razoabilidade e proporcionalidade, uma vez que se trata de ato excepcional e cujas circunstâncias autorizadoras se encontram previamente definidas, cabendo a análise sobre os meios para alcançar esses fins [27].

Por outro lado, o art. 15, ao tratar da avocação, releva o caráter de excepcionalidade da providência: "Será permitida, em caráter excepcional e por motivos relevantes devidamente justificados, a avocação temporária de competência atribuída a órgão hierarquicamente inferior". Aqui a motivação é explicitamente exigida, o que não muda nada, já que, ao estabelecer os requisitos que justificam a delegação, a lei também passa a exigir a exposição dos motivos. E é justamente nela que, tanto na avocação quanto na delegação, a autoridade terá que demonstrar a razoabilidade e proporcionalidade do ato.

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4.5. Princípio da impulsão de ofício ou da oficialidade.

Ao contrário do que acontece com o processo judicial, em que vigora o princípio dispositivo ou da demanda (nemo judex sine actorem, não há demanda sem autor), no processo administrativo se reconhece à Administração o poder de agir de ofício. Justamente por isso o art. 2º, parágrafo único, preconiza a "impulsão, de ofício, do processo administrativo, sem prejuízo da atuação dos interessados" (inciso XII).

Esse poder da Administração de impulsionar o processo se desdobra em duas modalidades: primeiramente, a possibilidade de iniciar o processo (art. 5º) [28]; em segundo lugar, a possibilidade de dar-lhe seguimento, mesmo tendo sido iniciado pelo interessado e havendo desistência ou renúncia por parte deste, sempre que houver interesse público (art. 51, §2º) [29]; e, finalmente, a ampla iniciativa probatória conferida por lei à Administração (art. 29, caput) [30].

Ocorre que, como todos os atos administrativos, os atos de impulsão de ofício também devem guardar razoabilidade e proporcionalidade, principalmente quando se referirem ao início ou continuação do processo. Afinal, não se concebe que a Administração instaure um processo por qualquer bobagem.

Mesmo com o princípio da informalidade, o processo administrativo ainda exige diversas formalidades, que tomam tempo e paciência dos órgãos pelos quais tramitará. Os documentos deverão ser autuados e cadastrados no banco de dados, todas as páginas serão numeradas e rubricadas, o protocolo deverá acompanhar-lhe a tramitação, enfim, será adotada uma série de providências que, quando desnecessárias, comprometem a eficiência da administração (CF, art. 37, caput).

Por isso, deve-se evitar a instauração de processos desnecessários (o que, infelizmente, se vê bastante na prática), como a autuação de bilhetes, convites, ofícios de mero expediente, etc. Em outras palavras: deve-se verificar se a instauração do processo é meio adequado para a consecução dos objetivos (adequação), se é a única forma possível de se realizarem esses fins (necessidade) e se é um instrumento proporcional à finalidade colimada (proporcionalidade). Apenas com a resposta afirmativa a esses requisitos de razoabilidade e proporcionalidade é que se deve dar início ao processo.

4.6. Anulação, revogação e convalidação.

Essas três figuras se referem à extinção dos atos administrativos. Duas delas extinguem o ato (anulação e revogação), a outra impede a extinção (convalidação).

De acordo com a Súmula 473 do STF, "A administração pode anular seus atos, quando eivados de ilegalidade, porque deles não se originam efeitos, ou revogá-los.. .". Essa construção da doutrina e da jurisprudência também foi positivada pela LPA, quando dispôs que "A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos".

A partir do exposto, infere-se que a anulação é o ato vinculado (a Administração é obrigada a anular os atos ilegais) por meio do qual a Administração retira a validade de outro ato, com efeitos retroativos (ex tunc). Já a revogação – que opera efeitos ex nunc – é o ato discricionário por meio do qual a Administração retira um ato que já não é mais conveniente ou oportuno. Disso se deduz que na anulação – ato vinculado – a análise de razoabilidade e proporcionalidade é mais restrita que na hipótese de revogação (que, por ser ato discricionário, deve mais à razoabilidade e à proporcionalidade).

Tal conclusão, porém, não é de todo verdadeira. Mesmo em se tratando de vício de legalidade, a anulação não é, a rigor, obrigatória. Se o defeito for sanável, há uma certa margem de opção para o administrador, que poderá não anular o ato, mas suprir a falta ou imperfeição do ato, convalidando-o. É o que dispõe o art. 55 da LPA: "Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria Administração".

É aqui que se revela fundamental a análise sobre a razoabilidade e proporcionalidade da anulação. Claro que é objetivo da administração retirar do ordenamento os atos ilegais (dever de legalidade: CF, art. 37, caput). Mas, de outra parte, também se devem ter em mente os princípios da eficiência (CF, 37, caput) e do interesse público (LPA, art. 2º, caput). Logo, a autoridade administrativa deve analisar a situação fática para – levando-se em conta que a anulação é uma providência radical para fulminar um ato com efeitos retroativos, inclusive com efeitos retroativos – verificar a adequação e principalmente a necessidade e a proporcionalidade do ato anulador.

Com isso se revela que o princípio é o da manutenção dos atos administrativos, até mesmo em homenagem ao atributo da presunção de legalidade e legitimidade. A regra – em se tratando de defeito sanável – é a convalidação do ato [31]. A anulação, notadamente quando se trate de providência que beneficie os administrados e para cuja ilegalidade não concorreram, é excepcional e radical, devendo-se tomar cuidado na análise da razoabilidade e da proporcionalidade da medida. [32][33]

4.7. Efeitos dos recursos administrativos.

De acordo com o art. 61, caput, da Lei de Processo Administrativo, os recursos administrativos têm, ordinariamente, apenas o efeito devolutivo [34]. Isso porque, como o Brasil adota a ampla revisão judicial dos atos administrativos (CF, art. 5º, XXXV), pode-se sempre recorrer ao Judiciário, inclusive por meio de medidas cautelares.

Entretanto, o parágrafo único do mesmo artigo abre a possibilidade para que a autoridade recorrida ou o órgão ad quem confiram ao recurso também o efeito suspensivo, quando determina que "Havendo justo receio de prejuízo de difícil ou incerta reparação decorrente da execução, a autoridade recorrida ou a imediatamente superior poderá, de ofício ou a pedido, dar efeito suspensivo ao recurso".

Essa é uma das hipóteses mais claras de utilização da razoabilidade e da proporcionalidade para justificar uma medida. Na análise acerca do "prejuízo de difícil ou incerta reparação", a autoridade não poderá deixar de levar em conta quais os eventuais prejuízos (ao particular e à Administração) que a concessão do efeito suspensivo poderá causar. Deverão ser sopesados, balanceados, os princípios da auto-executoriedade dos atos administrativos e o do respeito aos direitos fundamentais dos interessados [35].

Nesse ponto, nada melhor que uma análise pormenorizada sobre os elementos de adequação, necessidade e proporcionalidade do ato de concessão do efeito suspensivo. Embora a lei não exija a motivação especificamente sobre os efeitos dos recursos, é de bom tom que, em questões intrincadas, a autoridade com poder de decisão motive o ato que concede ou não o efeito suspensivo, justamente para facilitar a verificação da razoabilidade e proporcionalidade da medida [36].

4.8. Prazos.

Boa parte das normas processuais estabelece prazos para a prática dos atos, sob pena de preclusão ou responsabilidade (prazos próprios) ou como indicativo do tempo para a tramitação do processo (prazo impróprio) – embora não se possa admitir, no moderno Direito Processual, prazos cujo desrespeito não implique sanção alguma.

Posto que muitos dos prazos estabelecidos na LPA sejam impróprios [37], a maioria dos prazos assinalados aos interessados podem, se desrespeitados, gerar preclusão [38]. Há, por isso, que se atentar para a razoabilidade e a proporcionalidade, tanto no momento de estabelecer prazos quanto na hora de verificar-lhes o cumprimento.

No primeiro caso, é necessário que se estabeleçam prazos razoáveis e proporcionais à urgência na tramitação do processo. Além disso, deve-se levar em conta a possibilidade de cumprimento dos prazos estabelecidos. Como exemplo, fere qualquer princípio de razoabilidade e proporcionalidade a decisão que confere o prazo de um dia para o exame dos autos e apresentação de alegações escritas, em caso de consulta pública, por quem sequer conhecia o processo (art. 31, §1º). Por outro lado, é de se lembrar que os atos de instrução deverão ser realizados da maneira menos onerosa para os interessados (elemento da necessidade): art. 29, §2º.

Já com relação ao cumprimento dos prazos, deve-se atuar, também, de forma razoável e proporcional. É preciso sopesar pelo menos três princípios: instrumentalidade das formas, isonomia e impulsão de ofício.

O processo é um instrumento de realização prática do direito objetivo (DINAMARCO); por isso, as formalidades não podem ser encaradas como fins em si mesmas, mas como instrumento de efetivação prática dos objetivos do processo. Assim, o não atendimento de um prazo, quando decorrer de caso fortuito/força maior, ou quando o atraso for ínfimo, deve ser relevado [39].

Porém, os prazos também têm uma função isonômica, na medida em que realizam o princípio da impessoalidade (CF, art. 37, caput): são igualmente aplicáveis a todos os interessados. Essa funções tem de ser levada em conta, antes de se relevar qualquer prazo. Se a medida prejudicar os interessados que atuaram no tempo devido, será inválida. Além disso, há casos em que a própria lei veda, peremptoriamente, a desconsideração dos prazos (art. 63, I) – o que, de resto, deve ser a regra.

Por fim, deve ser lavado em conta o princípio da impulsão de ofício do processo administrativo. Afinal, não é porque foi descumprido um prazo que a Administração não poderá dar seguimento ao processo (art. 51, §2º).

4.9. Aplicação de penalidades e sanções.

Normalmente esse é um tema tratado em leis específicas, motivo por que a LPA só se aplica no vazio normativo (princípio da subsidiariedade: art. 69). Ainda assim, a observância da razoabilidade e da proporcionalidade se faz obrigatória.

Dessa forma, a sanção aplicada deve guardar relação de conseqüência com a falta praticada (razoabilidade), além de ser proporcional à gravidade do ilícito e dos prejuízos (materiais ou não) causados pelo ato.

Nesse sentido, e estabelecendo também outros critérios, a lei nº 8.112/90 determina que "Na aplicação das penalidades serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais" (art. 128, caput). Perceba-se: natureza (critério qualitativo – princípio da razoabilidade) e gravidade da sanção (critério quantitativo – princípio da proporcionalidade).

Ademais, é necessário verificar se: a) a sanção é meio idôneo a realizar o fim juridicamente protegido (adequação); b) além de idônea, se ela é o único meio adequado ou, dentre os vários, o menos gravoso ao sancionado e à Administração (necessidade) [40]; c) além de adequada e necessária, se é proporcional à gravidade do ilícito praticado (proporcionalidade) [41][42].

Como o ato que imponha sanção deve ser obrigatoriamente motivado (LPA: art. 50, II; na legislação específica: Lei nº 8.112/90, art. 128, parágrafo único), é aí que se poderá analisar a razoabilidade e proporcionalidade da medida adotada.

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Sobre o autor
João Trindade Cavalcante Filho

Professor de Direito Administrativo e Constitucional do OBCURSOS/Brasília. Técnico Administrativo da Procuradoria Geral da República, lotado no gabinete do Subprocurador-Geral da República Eitel Santiago (área criminal/STJ). Coordenador e Professor de Direito Constitucional e Administrativo do Curso Preparatório para Concursos e de Capacitação para Servidores, Estagiários e Terceirizados da Procuradoria Geral da República. Ex-professor de Direito Penal e Legislação Aplicada ao MPU do Curso Preparatório para Concursos da Escola Superior do Ministério Público da União. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional (IBDC).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Razoabilidade e proporcionalidade no direito processual administrativo brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1550, 29 set. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10471. Acesso em: 25 abr. 2024.

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