O Desembargador Federal Luiz Paulo da S. Araújo negou, na tarde desta sexta-feira, dia 30 de junho, o pedido feito pela Companhia Aérea Pão de Açúcar para que fosse suspensa a liminar dada pelo Juiz de 1ª instância de paralisação das obras da Tirolesa na penedia do Monumento Tombado – o Pão de Açúcar.
Assim, as obras continuam paralisadas, como determinou a Justiça Federal, devendo as partes continuarem a apresentar as suas razões para futura decisão, agora no âmbito do Judiciário.
O Desembargador Federal considerou que a decisão do Juiz de 1ª instância foi “devidamente fundamentada” e que não vislumbrou qualquer “teratologia ou ilegalidade que justificasse a excepcional concessão do efeito suspensivo”(...) ”sendo certo que as obras, se reformada [futuramente] a decisão agravada pelo colegiado, poderão ser retomadas, ao passo que há periculum in mora inverso para toda a sociedade, tendo em vista que, como evidenciado pela própria agravante, o corte e perfuração de rocha nos Morros do Pão de Açucar e Urca não são passíveis de recomposição”. (grifos nossos)
O processo judicial seguirá ainda, no âmbito da Justiça Federal, que recebeu o pedido de intervenção no processo, como amicus curiae, ao lado do Ministério Público – autor da ação, do ICOMOS Brasil (Comitê Internacional de Sítios e Monumentos), órgão que atua junto à UNESCO como consultor dos Sítios Patrimônios Mundiais.
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Saiba mais sobre a liminar que suspendeu as obras de instalação da Tirolesa no Pão de Açúcar, bem como determinou a “suspensão dos efeitos do ato administrativo do IPHAN que autorizou a execução da obra".
Na tarde do dia 1º de junho, dois fatos excepcionalmente relevantes ocorreram em favor da preservação da integridade do Monumento Natural tombado do Pão de Açucar, no Rio de Janeiro: 1. o Juiz Federal Paulo André Espírito Santo Bonfadini, da 20ª Vara Federal, atendendo ao pedido feito pelo Ministério Público Federal, através do diligente Procurador Sérgio Suiama, concedeu liminar para suspender as obras de instalação da Tirolesa no Pão de Açúcar, bem como a “suspensão dos efeitos do ato administrativo do IPHAN que autorizou a execução da obra.” (Link) 2. O Icomos Brasil (Comitê Internacional de Sítios e Monumentos – Seção brasileira) enviou à Unesco um “Alerta Patrimonial”, com a denúncia de que a obra da Tirolesa deveria ser paralisada, para evitar “a inclusão do sítio [Paisagem Cultural do Rio de Janeiro] na Lista de Patrimônio Mundial em Perigo e até mesmo a exclusão da lista de Patrimônio Mundial.” (Link)
Sobre a Ação Judicial e a liminar:
A decisão judicial foi rápida, mas bastante substanciosa. A Ação Civil Pública do Procurador Federal Suiama foi protocolada na última quarta-feira, dia 31 de maio, após longo, cuidadoso e excelente estudo apresentado em sua petição inicial. O Procurador usou todas as informações técnicas que lhes foram entregues, por várias instituições, dentre as quais as de peritos técnicos, de geólogos, do ICOMOS Brasil, bem como aquelas resultantes de inspeção no local que teve o cuidado de pessoalmente fazer.
Destacamos aqui alguns importantes aspectos mencionados tanto na petição do Dr. Sérgio Suiama, quanto na decisão do Juiz Federal Paulo A. Espírito Santo:
1. A obra da Tirolesa implicou em cortes e perfurações na rocha do monumento tombado, referenciando-a como mutilação.
2. O processo de tramitação da autorização do projeto no IPHAN foi irregular, pois não atendeu sequer os seus próprios regulamentos internos. Além disto, não exigiu os estudos técnicos necessários para um projeto com desta envergadura.
3. A empresa que explora o bem tombado começou as obras antes mesmo de concluídas as devidas autorizações e licenças. Acentuou-se que sequer houve a qualquer estudo de impacto ambiental ou de vizinhança e, consequentemente, licença ambiental!
4. Que o impacto da obra pode não atender os pressupostos da preservação ambiental, e que estes, os interesses da preservação ambiental e do patrimônio cultural se impõem sobre eventuais interesses comerciais.
5. Que o tamanho e o impacto da intervenção da integridade do bem tombado, patrimônio mundial, poderá acarretar a perda do título de paisagem cultural mundial pela cidade, segundo o alerta dado pelo ICOMOS.
Sobre o Alerta Patrimonial à Unesco feito pelo ICOMOS Brasil:
Foi enviado à sede UNESCO o chamado “Alerta Patrimonial”, que é uma espécie de notificação feito pelo Comitê Brasileiro do ICOMOS, quando verificada situação crítica de perigo e ameaça à preservação de bem do patrimônio mundial. Segundo o ICOMOS Brasil “a aprovação desta intervenção compromete a autenticidade e integridade do bem em questão e abre precedentes perigosos para outras descaracterizações em bens tombados naturais em seu entorno.”
Destacamos ainda, no “Alerta Patrimonial” do ICOMOS Brasil:
1. Que a obra intervém “de forma danosa no Bem Tombado Nacional e sítio declarado Patrimônio Mundial, acrescentando um novo uso de esporte radical, concorrente e até contraditório, ao do bondinho com o qual o monumento é associado nacional e internacionalmente”.
2. Que “considera equivocado aprovar qualquer intervenção sem uma análise técnica que considere o Bem Tombado Nacional, à luz da metodologia introduzida e aplicada pelo IPHAN na Coordenadoria-Geral de Patrimônio Natural, de Paisagem Cultural e de Arqueologia do Departamento de Patrimônio Material, (…)”, indicando ainda que a obra seja paralisada para que se faça reexame da ocupação do local, não só à luz de um estudo global, como também “que seja elaborado um Heritage Impact Assessment – HIA, por organizações consideradas idôneas e isentas”.
3. Que a obra contrariou “as diretrizes da Unesco para os sítios reconhecidos como Patrimônio Mundial, [pois] não houve consulta à população sobre a referida obra, e, quando seus impactos começaram a ser percebidos, uma forte mobilização capitaneada pelas associações de moradores locais que levou à organização do movimento “Pão de Açúcar Sem Tirolesa” (@paodeacucarsemtirolesa), o qual já realizou diversas manifestações de protesto.” A denúncia do ICOMOS segue ainda nominando mais de quinze associações técnicas profissionais que manifestaram sua oposição à obra.
O IPHAN, desde março de 2023 tomou conhecimento dos amplos protestos da sociedade civil e de associações técnicas sobre as irregularidades da obra, mas não fez o seu embargo, apesar de ter sido explicitamente prometido pelo Diretor Nacional do Patrimônio Material e pelo Superintendente do IPHAN no Estado RJ. Esta promessa foi feita na primeira reunião do Comitê da Gestor (provisório) da Paisagem Cultural, em 24 de março de 2023, após mais de três anos de paralisação deste Comitê. Fosse tomada esta precaução, muito do vultoso dano a este patrimônio nacional teria sido evitado, bem como a ação judicial!