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Reconhecimento de vínculo de emprego e as multas dos arts. 467 e 477, § 8º, da CLT

29/10/2007 às 00:00

Resumo:


  • O reconhecimento de vínculo empregatício muitas vezes ocorre judicialmente, acarretando o pagamento de direitos trabalhistas e previdenciários sonegados, além de contribuir para a economia ao permitir que o trabalhador atue como consumidor.

  • A legislação trabalhista prevê multas para o empregador que não realiza o pagamento correto das verbas rescisórias, incentivando o cumprimento das obrigações e penalizando atrasos ou sonegação.

  • Decisões judiciais que declaram a existência do vínculo empregatício têm natureza declaratória e não constitutiva, devendo ser aplicadas multas previstas nos artigos 467 e 477 da CLT em caso de não cumprimento, para desencorajar a prática de sonegação trabalhista.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

1) introdução

Nem sempre o vínculo empregatício é reconhecido pelo empregador, com a correspondente anotação da Carteira de Trabalho e Previdência Social. Muitas vezes, é necessário que o empregado ajuíze ação trabalhista para buscar o reconhecimento judicial da natureza do serviço prestado, com as conseqüências correspondentes, dentre elas o pagamento dos direitos decorrentes da extinção do contrato.

Se, por um lado, há zonas nebulosas nas quais a natureza do vínculo nem sempre transparece à primeira vista (por exemplo, no ramo de vendas externas), há outros casos em que o próprio empregador, mesmo ciente de suas obrigações legais, preferiu mascarar o liame, afirmando trabalho autônomo, estágio etc.

É evidente que o empregador que deixa de reconhecer o vínculo empregatício tem em mente a redução de custos, com a sonegação de verbas trabalhistas (horas extras, natalinas, FGTS etc.), previdenciárias e fiscais (verbas pagas de forma oficial, com os recolhimentos e recibos, não permitem lançamento no "caixa 2"). Esta redução de custos lhe permite uma concorrência desleal com outras empresas do ramo que cumpram, regularmente, com suas obrigações e precisam repassar os valores para seus preços.

Há um outro lado nefasto na sonegação de verbas trabalhistas. O empregado mal remunerado é também um mau consumidor. Enquanto os valores sonegados pelo empregador e transformados em moeda estrangeira ou poucos bens de luxo produzem muito pouco na economia, os valores repassados ao empregado, uma vez gastos em gêneros de primeira necessidade (alimentação, vestuário, habitação, medicamentos, educação), têm um efeito multiplicador. O real pago no mercadinho é repassado ao distribuidor, repassado ao agricultor, repassado à farmácia e assim sucessivamente.

A fiscalização, por deficiente de meios pessoais e materiais, não logra impedir a fraude, quiçá reduzi-la significativamente. Para piorar o quadro, ao se criar a Super-Receita, estabeleceu-se um mecanismo que veda a autuação administrativa no caso de discussão acerca do vínculo empregatício, salvo após reconhecimento judicial do liame [01].

O caminho deveria ser, a nosso ver, exatamente o contrário. Se a aparência é de vínculo empregatício e não de relação civil ou comercial, a empresa deveria ser autuada, sem prejuízo de vir a discutir esta atuação, administrativa ou judicialmente.

Em regra, no curso do contrato, o empregado não reclama, para não perder o posto de trabalho; por isso, o mau empregador conta com a vantagem de que apenas parte dos trabalhadores reclamará e, ainda, dos que reclamarem, a prescrição atingirá parte do liame.

A prova do vínculo não é tão fácil. O empregador conta com toda uma estrutura documental visando dar aparência legal à fraude: contrato de prestação de serviços, recibos de pagamento de autônomo e, nos casos mais graves, impõe ao empregado, inclusive, firmar os documentos de abertura de uma pessoa jurídica.

Trava-se, assim, intensa luta judicial, com oitiva de testemunhas e juntada de documentos, uma instrução probatória na maioria das vezes tormentosa e difícil, de parte a parte, mas principalmente para o empregado.

O número de empregos informais (leiam-se empregos em que as formalidades legais não são cumpridas) é ainda enorme no país, sendo que neles, por evidente, não há anotação de carteira de trabalho. Reconhece-se que os excessos de encargos impostos, principalmente, à pequena empresa, têm grande parcela de culpa, por, em alguns casos, tornarem a sonegação causa de sobrevivência.

Entretanto, é preciso adequar o sistema, não havendo pressão social suficiente sobre o Legislativo, exatamente em razão da forma indireta (sonegação generalizada).

As conseqüências são funestas, ultrapassando o campo individual. Uma grande massa está à margem de contribuir para a Previdência Social e, ao final, acabam pesando para ela, que não pode desampará-los, no fim da vida [02]; a massa de contribuintes, porque desproporcional à dos beneficiários, é onerada com contribuições altas, que tornam vantajosa a sonegação, criando-se um círculo vicioso.

Não se pode olvidar ainda que a lei trabalhista é ainda, quiçá, a única forma de distribuição de renda no Brasil, onde imperam grandes abismos entre os mais ricos e os mais pobres.

A lei trabalhista é, assim, importante meio de atuação do Estado, não só do ponto de vista econômico e tributário, mas também social e assistencial.

Daí a importância de se interpretar a legislação trabalhista sempre de forma a incentivar o seu cumprimento e onerar o seu descumprimento.

O desafio do Direito (e da Justiça) no Brasil é incentivar o cumprimento voluntário das obrigações, diante de uma mentalidade crescente de desrespeito à lei e à moral que chega ao cúmulo do ufanar-se do desrespeito. O Brasil vive uma crise de paradigmas, onde muito se fala em ética, mas pouco se pratica, como se ela fosse assunto para os outros.

Faz sentido, assim, a afirmação do filósofo australiano Peter Singer, em entrevista à Revista Veja, sobre o tema "A ética do dia-a-dia":

"A ética é um exercício diário, precisa ser praticada no cotidiano. Só assim ela pode se afirmar em sua plenitude numa sociedade. Se uma pessoa não respeita o próximo, não cumpre as leis da convivência, não paga seus impostos ou não obedece às leis de trânsito, ela não é ética. Num         primeiro momento, pequenas infrações isoladas parecem não ter importância. Mas, ao longo do tempo, a moral da comunidade é afetada em todas as suas esferas. Chamo a isso de um círculo ético. Uma ação interfere na outra, e os valores morais perdem força, vão se diluindo. Para uma sociedade ser justa, o círculo ético é essencial." [03]

É preciso se criar um círculo virtuoso e, para tanto, como dito, onerar o descumprimento das leis, inclusive da trabalhista e incentivar o cumprimento voluntário das obrigações.

Feitos estes prolegômenos, podemos falar, em específico das multas dos artigos 467 e 477, § 8º, da CLT.


2) Da multa do art. 467 da CLT

Dispõe o artigo 467, da Consolidação das Leis do Trabalho:

Art. 467 - Em caso de rescisão do contrato de trabalho, motivada pelo empregador ou pelo empregado, e havendo controvérsia sobre parte da importância dos salários, o primeiro é obrigado a pagar a este, à data do seu comparecimento ao tribunal de trabalho, a parte incontroversa dos mesmos salários, sob pena de ser, quanto a essa parte, condenado a pagá-la em dobro.

Art. 467 - Em caso de rescisão de contrato de trabalho, havendo controvérsia sobre o montante das verbas rescisórias, o empregador é obrigado a pagar ao trabalhador, à data do comparecimento à Justiça do Trabalho, a parte incontroversa dessas verbas, sob pena de pagá-las acrescidas de cinqüenta por cento. (Alterado pela Lei n.º 10.272, de 05-09-01, DOU 06-09-01) Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica à União, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e as suas autarquias e fundações públicas. (Acrescentado pela MP n.º 2.180-35, de 24-08- 01, DOU 27-08-01)

A finalidade deste dispositivo é impor o imediato pagamento da parcela incontroversa das verbas rescisórias, não permitindo ao empregador, sob pena de multa, inseri-las dentre as parcelas discutidas, com o fito de postergar o pagamento e punir indiretamente o empregado ou levá-lo ao desespero e, com ele, à aceitação de um acordo desvantajoso.

Uma análise gramatical do artigo em comento impediria a aplicação da multa em todo e qualquer caso em que o empregador controvertesse o pagamento de quaisquer verbas rescisórias.

Bastaria o empregador alegar, por exemplo, que pagou, sem exibir o recibo; que a dispensa teria se dado por justa causa e que nenhum valor seria devido etc.

Entretanto, a doutrina e a jurisprudência passaram a entender que a controvérsia há de ser séria.

A alegação de que nenhuma rescisória é devida deve estar comprovada por documentos (recibo de pagamento escrito, por força do artigo 464 da CLT [04]) ou termo de rescisão que comprove com os créditos e débitos, a inexistência de saldo favorável ao empregado. A mera alegação desserve a esta finalidade.

Não pode haver controvérsia válida ainda, quando contra todas as evidências e contra todas as disposições legais, o empregador busca locupletar-se da própria torpeza.

O juiz deve atentar para o fito meramente procrastinatório e sempre que reconhecê-lo aplicar a multa, mesmo que o empregado não tenha formulado pedido neste sentido (a atuação, neste caso, por expressa autorização legal, pode se dar ex officio).

Se a empresa é contumaz nesta prática (de sonegar parcelas rescisórias) devem ser oficiados o Ministério Público do Trabalho e a Delegacia Regional do Trabalho para que tomem as providências cabíveis à punição dos ilícitos e à prevenção de novas ocorrências.


3) Da multa do art. 477, § 8º, da CLT

Dispõe, por seu turno, o artigo 477, §§ 6º e 8º, da CLT:

Art. 477 - É assegurado a todo empregado, não existindo prazo estipulado para a terminação do respectivo contrato, e quando não haja ele dado motivo para cessação das relações de trabalho, o direito de haver do empregador uma indenização, paga na base da maior remuneração que tenha percebido na mesma empresa.

(...)

§ 6º - O pagamento das parcelas constantes do instrumento de rescisão ou recibo de quitação deverá ser efetuado nos seguintes prazos:

a) até o primeiro dia útil imediato ao término do contrato; ou

b) até o décimo dia, contado da data da notificação da demissão, quando da ausência do aviso prévio, indenização do mesmo ou dispensa de seu cumprimento.

(...)

§ 8º - A inobservância do disposto no § 6º deste artigo sujeitará o infrator à multa de 160 BTN, por trabalhador, bem assim ao pagamento da multa a favor do empregado, em valor equivalente ao seu salário, devidamente corrigido pelo índice de variação do BTN, salvo quando, comprovadamente, o trabalhador der causa à mora.

Assim, a lei trabalhista prevê multa em favor do empregado, em razão do pagamento intempestivo das verbas rescisórias.

A razão é simples.

O empregado já perdeu seu emprego e enfrentará dificuldades para sua sobrevivência. É preciso garantir-lhe, no mínimo, o pagamento das parcelas rescisórias, para que possa enfrentar os tempos difíceis até encontrar um novo emprego e receber a remuneração.

Não se diga que o seguro-desemprego cuidará disto, porque um dos aspectos mais nefastos da negativa de vínculo ou da sonegação trabalhista é que, sem a homologação da rescisão, sem recolhimento de FGTS, sem anotação da CTPS, o trabalhador não conseguirá receber a benesse.

Acresça-se a isto as hipóteses em que o empregador imputa ao empregado uma justa causa [05]. O trabalhador não terá referências para conseguir um novo emprego, não terá liberado o FGTS, não receberá a indenização compensatória de 40% e ainda por cima não fará jus ao seguro-desemprego, ou seja, receberá também uma punição do Estado, ao negar-lhe um benefício social cujo intuito é garantir a sobrevivência.

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O c. TST reconhece, em sua jurisprudência sumulada, inclusive a possibilidade de que norma coletiva que vise cominar o pagamento intempestivo das rescisórias seja cumulada com a multa legal em comento [06].

Com relação à multa do artigo 477, § 8º, da CLT, contudo, parte considerável da jurisprudência deixa de aplicá-la sempre que o vínculo é reconhecido em juízo. Afirmam a existência de controvérsia quanto ao vínculo, a impedir a aplicação da cominação. Do mesmo modo, não a aplicam quando é discutida a forma de rescisão.

Entretanto, assim, não é.

A sentença que reconhece e declara a existência de vínculo empregatício não o constitui.

Efetivamente, se o vínculo apenas fosse constituído pela sentença, poder-se-ia afirmar não ter havido pagamento a destempo de rescisórias, que só se tornaram devidas com o trânsito em julgado da decisão judicial.

Entretanto, a sentença é meramente declaratória [07], na parte em que reconhece o vínculo empregatício, produzindo efeitos ex tunc.

Do mesmo modo, o empregador que imputa uma justa causa, de forma leviana, não pode obter qualquer vantagem de sua aventura jurídica, altamente prejudicial ao empregado. O Código Laboral do Paraguai, neste ponto, é mais avançado que a lei nacional, ao prever, de plano, a possibilidade de fixação de indenização ex officio no caso de justa causa improvada em juízo.

Por outro lado, a decisão judicial, na medida do possível, deve restituir as partes "status quo ante" da resistência à pretensão. Só teria cabimento excluí-la se a decisão constituísse o vínculo ao invés de meramente declará-lo.

Doutra parte, constitui princípio de direito que a ninguém é dado beneficiar-se da própria torpeza.

Ora, se o empregador nega o vínculo, impõe ao empregado que firme documentos visando dar ao contrato de trabalho aparência formal diversa e menos favorável ao hipossuficiente, ou então se limita a negar a própria prestação de serviços carreando ao trabalhador enorme ônus probatório [08] e, ao final, fosse excluída a multa, haveria benefício considerável no descumprimento da lei, rectius, incentivo à sua ocorrência.

O juiz deve se preocupar com a justiça das decisões, o que lhe impõe, muitas vezes, aplicar o princípio da proporcionalidade ou o princípio da razoabilidade.

Especificamente no que se refere à justiça nas Decisões, ao decidir com justiça, Marinoni adverte sobre a necessidade de o juiz pautar-se por critérios de justiça, seja ao apreciar ao prova, seja ao enquadrar os fatos em normas e categorias jurídicas, seja ao interpretar os textos do Direito Positivo, considerando, em relação à prova, que muitas vezes a certeza não é possível e que deve contentar-se com a probabilidade (princípio da probabilidade) [09] e que, muitas vezes, direitos podem colidir, devendo serem sopesados, no caso concreto, qual o bem juridicamente superior a prevalecer sobre o inferior, em face do Princípio da Proporcionalidade. Este princípio pressupõe um juiz aberto à realidade social de sua época, servindo como canal de comunicação entre a carga axiológica da Sociedade em que vive e os textos legais [10].

A Razoabilidade e a Proporcionalidade não são sinônimas, havendo quem considere a última espécie da primeira, embora haja quem entenda tratarem-se do mesmo princípio, ao qual a doutrina norte-americana denominaria Razoabilidade e a tedesca Proporcionalidade. A Razoabilidade teria os seguintes elementos: adequação (capacidade ou aptidão da medida para atingir os objetivos pretendidos), necessidade (utilidade ou proveito da medida) e proporcionalidade (ponderação da relação existente entre os meios e os fins, ou entre os ônus e os bônus). A Proporcionalidade visa estabelecer uma relação entre meio e fim, para que se torne possível o controle dos excessos. [11]. O Supremo Tribunal Federal vem afirmando, em seus julgados mais recentes, que o princípio da Proporcionalidade tem sua sede material no Princípio do Devido Processo Legal, que, em um regime democrático, não se limita a assegurar a observância do Processo na forma descrita na lei, mas alcança também aquelas situações em que falta Razoabilidade à lei. [12]

GOLDSCHMIDT ressalta o papel harmonizador do Princípio da Proporcionalidade:

"... o intérprete e o aplicador do direito irão valer-se do princípio da proporcionalidade e da interpretação conforme a Constituição para buscar harmonizar os valores e os princípios em tese aplicáveis ao caso controvertido, de tal forma que a solução eleita para solver o litígio tenha o condão de trazer o menor prejuízo (ou sacrifício) às partes envolvidas e à sociedade, mantendo a ordem e a unidade do sistema e, os valores insculpidos na Constituição." [13]

Ora, traduziria um sacrifício desproporcional ao empregado retirar-lhe o direito à multa, em razão da má-fé do empregador. A própria ordem e unidade do sistema estariam prejudicadas, neste caso, na medida em que se criaria um incentivo econômico ao descumprimento da lei.

Ainda, o princípio da proporcionalidade não permite que se trate com rigor quem cumpriu a lei trabalhista, em todo seu elenco, ou a maior parte dele, apenas porque atrasou a rescisão e, ao mesmo tempo, trate com complacência que a desrespeitou, totalmente. Exemplifico: uma empresa "X" registra a CTPS, recolhe contribuições previdenciárias, paga horas extras, adicional de insalubridade etc.; por desventura, no dia da rescisão, por um problema bancário ou mesmo por falta de capital, paga as rescisórias um dia após o vencimento do prazo legal: será condenada no pagamento da multa. A empresa "Y" contrata trabalhador para mesma função; afirma que ele é autônomo ou estagiário, embora o submeta às mesmas condições (horário, subordinação etc), além de fazê-lo firmar uma série de documentos para dar respaldo à fraude: ad absurdam considerada a tese contrária, deverá ser isentada da multa, como prêmio por sua "astúcia".

Nessa ótica, a aplicação da multa, assim como, da lei trabalhista e previdenciária em sua plenitude, tornam inócuas ou mesmo desvantajosas a prática.

As decisões judiciais possuem ainda um caráter extraprocessual, projetando efeitos fora dos processos em que são proferidas e também com relação a terceiros. Têm, assim, uma função política que não pode ser desprezada. De fato, toda decisão judicial serve às partes in genero, ou seja, no sentido de litigantes em geral, mormente os litigantes habituais, para que promovam a adequação de seu agir, fruto da confiança nas instituições e na efetividade e rapidez de sua resposta, sendo um instrumento de política judiciária.

Assim, esta função extraprocessual indica para os litigantes, mas também para os terceiros, como devem agir, para garantir que não haverá reprovação social e judiciária: desonerar a empresa da multa, nessas águas, lhe incentivaria, assim como a terceiros, a descumprir norma legal cogente que visa garantir a sobrevivência de empregado que perdeu o emprego, até que eventualmente receba os benefícios sociais.

Ad argumentadum, para aqueles que não se comoveram com os argumentos colacionados, uma última opção: outorgar à empresa um prazo de 10 (dez) dias (que é o de lei), contados do trânsito em julgado da decisão para pagar ou depositar as rescisórias em juízo, devidamente corrigidas pelos índices trabalhistas, sob pena de incidência das multas. Deste modo, mesmo que se considerasse o caráter constitutivo da decisão, estar-se-ia resguardando, ainda que de forma tímida, a ordem jurídica trabalhista.


4) Conclusão

As decisões judiciais que reconhecem o vínculo empregatício possuem natureza declaratória e não constitutiva.

Tais decisões produzem efeitos que ultrapassam os limites do processo, ao indicar aos litigantes em geral, como devem se comportar.

Nesta ótica, é preciso que as decisões judiciais tornem sempre desvantajoso o descumprimento da lei, de forma a incentivar o cumprimento voluntário das obrigações.

Diante disto, seja quando negado o vínculo, seja quando não negado mas estabelecida controvérsia artificial acerca das rescisórias, deve o juiz condenar o empregador que sonegou ou atrasou o pagamento das rescisórias no pagamento das multas dos artigos 467 e 477, § 8º, da CLT.

Sucessivamente, para os que reconhecem caráter constitutivo na decisão que reconhece o vínculo, opção viável seria a de fixar prazo de 10 (dez) dias, contados do trânsito em julgado da decisão para pagamento ou depósito das rescisórias, devidamente corrigidas, sob pena de incidência das multas gizadas.


Notas

01 A Câmara dos Deputados aprovou, em 13.02.07, a emenda do senador Ney Suassuna ao Projeto de Lei 6.272 de 2005. A emenda diminui poderes dos fiscais de trabalho, uma vez que obriga qualquer decisão sobre o reconhecimento de relações trabalhistas a passar primeiro pela Justiça do Trabalho

02 o denominado benefício assistencial ao idoso e ao deficiente, que não dependem de qualquer contribuição.

03 - SINGER, Peter. Entrevista concedida à Revista Veja, São Paulo: Editora Abril, ano 40, nº07, edição 1996, 21 de fevereiro de 2007, p. 14.

04 Art. 464 - O pagamento do salário deverá ser efetuado contra recibo, assinado pelo empregado; em se tratando de analfabeto, mediante sua impressão digital, ou, não sendo esta possível, a seu rogo.

05 - o que não é incomum. Em minha atividade profissional já vi casos de empresas que "aplicavam a justa causa" a mais de 50% de seus empregados, muitas vezes, inclusive, alegando ato de improbidade. Queriam, com isto, em juízo, propor um acordo em que o empregado abrisse mão de horas extras, diferenças salariais, diferenças de FGTS, adicional de insalubridade ou periculosidade, tudo pela reversão da justa causa. O empregado, desesperado, cheio de contas para pagar e dispensado de inopino, se sentia tentado a aceitar. Estes casos impõem a atuação rigorosa do juiz para impor a aplicação da lei e punir a má-fé.

06 TST – Súmula nº 384 MULTA CONVENCIONAL. COBRANÇA (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 150 e 239 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005. I - O descumprimento de qualquer cláusula constante de instrumentos normativos diversos não submete o empregado a ajuizar várias ações, pleiteando em cada uma o pagamento da multa referente ao descumprimento de obrigações previstas nas cláusulas respectivas. (ex-OJ nº 150 da SBDI-1 - inserida em 27.11.1998). II - É aplicável multa prevista em instrumento normativo (sentença normativa, convenção ou acordo coletivo) em caso de descumprimento de obrigação prevista em lei, mesmo que a norma coletiva seja mera repetição de texto legal. (ex-OJ nº 239 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001)

07 - a condenação se restringe à obrigação de fazer (anotação da CTPS), sem prejuízo das obrigações de dar próprias ao liame.

08 - já tive um caso de 12 (doze) anos de serviço, negados peremptoriamente pelo empregador e que só foram comprovados, diante da condução imediata de testemunhas referidas. Se a solução se desse pelo ônus da prova, teria que ter julgado improcedente, in totum a pretensão.

09 - que é a aproximação de uma hipótese à confirmação ou verossimilhança (aparência do verdadeiro).

10 - MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas de Processo Civil (o acesso à justiça e os institutos fundamentais do direito processual). São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 78 (181p).

11 - QUEIROZ, Raphael Augusto Sofiati. Os Princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade das normas e suas repercussões no Processo Civil brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000. p. 27-47 (188p.).

12 - BARCHET, Gustavo. Direito constitucional. Niterói-RJ: Impetus. 2004, p. 33 (424p.).

13 - GOLDSCHMIDT, Rodrigo. O princípio da proporcionalidade no direito educacional. Passo Fundo: UPF Editora. 2003. p.116 (140p.)

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Sobre o autor
José Ernesto Manzi

Desembargador do TRT-SC. Juiz do Trabalho desde 1990, especialista em Direito Administrativo (La Sapienza – Roma), Processos Constitucionais (UCLM – Toledo – España), Processo Civil (Unoesc – Chapecó – SC – Brasil). Mestre em Ciência Jurídica (UNIVALI – Itajaí – SC – Brasil). Doutorando em Direitos Sociais (UCLM – Ciudad Real – España). Bacharel em Filosofia (UFSC – Florianópolis – SC – Brasil), tendo recebido o prêmio Mérito Estudantil (Primeiro da Turma)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MANZI, José Ernesto. Reconhecimento de vínculo de emprego e as multas dos arts. 467 e 477, § 8º, da CLT. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1580, 29 out. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10585. Acesso em: 22 dez. 2024.

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