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A atuação do Ministério Público na defesa do patrimônio arquivístico sob a guarda do Poder Judiciário.

O problema da eliminação e do acesso aos autos processuais findos

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01/11/2007 às 00:00

Resumo:


  • O Poder Judiciário deve conservar os processos judiciais findos de forma organizada para permitir o acesso público e a pesquisa histórica, em conformidade com a Constituição Federal.

  • A Lei 6.246/75 suspendeu a vigência do artigo 1.215 do CPC, que permitia a destruição de processos judiciais, sendo necessário uma lei federal específica sobre a matéria para revogá-la.

  • O Ministério Público tem o papel de promover a preservação do patrimônio cultural arquivístico, garantindo o cumprimento da legislação e a eficiente gestão dos documentos judiciais, podendo utilizar instrumentos como Recomendação, Termo de Ajustamento de Conduta e Ação Civil Pública.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

4. A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Na qualidade de defensor do regime democrático, guardião do ordenamento jurídico pátrio, dos interesses sociais e individuais indisponíveis e como titular das ações penal e civil públicas (arts. 127 e 129 da CF/88), instrumentos previstos constitucionalmente e que viabilizam a tutela, dentre outros bens jurídicos, do patrimônio cultural brasileiro, incumbe grande parcela de responsabilidade ao Ministério Público no que tange a assegurar que o Poder Judiciário cumpra as determinações legais vigentes sobre a preservação e o acesso ao patrimônio arquivístico sobre sua guarda.

Com efeito, a Constituição Federal elenca como um dos pilares fundamentais da democracia o direito de acesso à informação (art. 5º, XIV), já que a democracia é o regime do poder visível, pois não tolera o poder que oculta ou o poder que se oculta.

E de nada adianta garantir o direito de acesso à informação, se esta não é preservada, ou ainda, se preservada, não está disponível ou em condições de ser acessada, por não estar organizada de modo a possibilitar a sua localização e a sua recuperação.

Como bem coloca Jaqueline Mara Lorenzetti Martinelli, Promotora de Justiça em São Paulo:

O constituinte estava atento a essas questões e não as deixou sem resposta, a fim de que o direito de acesso à informação pudesse efetivamente ser concretizado no dia-a-dia dos cidadãos.

Assim é que elevou os documentos (onde as informações estão contidas) à categoria de patrimônio cultural brasileiro ao lado de outros bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência a identidade, a ação, a memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, determinando ao Poder Público a sua promoção e proteção.

Tamanha a importância do direito de acesso à informação para o regime democrático que o constituinte não parou por aí, tendo se preocupado em especificar a forma pela qual a proteção ao patrimônio documental brasileiro deveria ser realizada.

Determinou, então, caber à administração pública, na forma da lei, a gestão da documentação governamental e as providências para franquear sua consulta a quantos dela necessitarem. [10]

Desta forma, deve o Ministério Público, no exercício de suas funções institucionais, promover a difusão e o cumprimento da legislação atinente à preservação do patrimônio cultural arquivístico, a fim de compelir o Poder Judiciário a instituir arquivos eficientes, capazes de assegurar a preservação e o acesso aos processos judiciais findos, que não podem ficar expostos a riscos de destruição ou perecimento, uma vez que a sua conservação interessa não só às presentes, mas também e principalmente às futuras gerações.

Os promotores de justiça em suas respectivas comarcas devem ficar atentos às condições de acondicionamento dos processos findos e de viabilidade de acesso pelo público, de forma ágil e adequada.

Como instrumentos aptos para o alcance de tal desiderato, pode o Ministério Público contar com a expedição de Recomendação, a celebração de Termo de Ajustamento de Conduta ou com a propositura de Ação Civil Pública.


5. CONCLUSÕES

1.O Poder Judiciário tem o dever de conservar os processos judiciais findos organizados de forma que possibilitem o rápido e eficiente acesso público e a pesquisa histórica, em respeito ao disposto no art. 5º, XIV, 215, caput, e 216, § 2º. da CF/88.

2.A Lei 6.246, de 07 de outubro de 1975, que determinou a suspensão da vigência do artigo 1.215 do Código de Processo Civil, permanece em vigor até o advento de lei federal específica sobre a matéria, não estando a mesma revogada pela Lei 8159/91.

3.O teor do art. 1215 do Código de Processo Civil, em sua redação original, viola o dever constitucional de preservação dos documentos de valor histórico e cultural, já que o Estado deve garantir a todos o pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às fontes de cultura nacional, dentre as quais estão os documentos dotados de valor histórico (arts. 215, caput, e 216, IV, da Constituição Federal).

4.É vedada qualquer forma de alienação de processos judiciais findos, sendo obrigação do Poder Judiciário zelar pela conservação de seu patrimônio arquivístico, pelo qual é responsável.

5.Sempre que possível deve-se assegurar a mantença dos processos judiciais findos na própria comarca de origem, uma vez que como bens culturais os mesmos devem permanecer vinculados aos locais onde foram produzidos, por serem instrumentos de informação sobre a respectiva unidade judiciária.

6.Nas hipóteses de transferência do acervo do Poder Judiciário para outras instituições oficiais é de se impor formalmente ao ente destinatário dos autos processuais findos a obrigação de cumprir integralmente a Lei 8159/91 e seus atos regulamentares, de forma a assegurar o alcance dos objetivos colimados por aquele diploma, tal como o direito de acesso à informação.

7.Há necessidade de uma mudança de postura do Ministério Público em relação à preservação dos processos judiciais findos, de forma que a instituição possa estar sempre vigilante em relação a esta temática e possa alcançar a proteção aos direitos estabelecidos pela Constituição Federal e pela legislação infraconstitucional pertinente.

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8.Deve o Ministério Público, no exercício de suas funções institucionais como defensor do regime democrático e do meio ambiente cultural, promover a difusão e o cumprimento da legislação atinente à preservação do patrimônio cultural arquivístico, a fim de compelir o Poder Judiciário a instituir arquivos eficientes, capazes de assegurar a preservação e o acesso aos processos judiciais findos

9.Como instrumentos aptos para o alcance do objetivo mencionado na conclusão anterior, pode o Ministério Público lançar mão da expedição de Recomendação, da celebração de Termo de Ajustamento de Conduta ou da propositura de Ação Civil Pública objetivando a imposição de obrigação de fazer.


Notas

01 Autos de Devassa da Inconfidência Mineira. Complementação Documental. Museu da Inconfidência. Ouro Preto, 2001, v. 11, p. 10.

02 NUNES, Maria Thétis. A importância dos arquivos judiciais para a preservação da memória nacional. Disponível no site www.cjf.gov.br.

03 Proposta de critérios de seleção de autos findos para a preservação da memória nacional. Comissão Técnica Interdisciplinar para Gestão de Documentos da Justiça Federal. Disponível no site www.cjf.gov.br

04 VALLADÃO, Haroldo. Comentário ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais. Vol. XIII, p. 129-130.

05 Segundo Maria Thétis Nunes (op. cit.) em 1975 um juiz corregedor de São Paulo teria mandado incinerar 100 toneladas de processos.

06 RSTJ vol. 158 p. 159

07 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – PROVIMENTO Nº 556, DE 14.02.1997, DO CONSELHO SUPERIOR DE MAGISTRATURA DO ESTADO DE SÃO PAULO – DESTRUIÇÃO FÍSICA DOS AUTOS DE PROCESSOS JUDICIAIS ARQUIVADOS HÁ MAIS DE CINCO ANOS EM PRIMEIRA INSTÂNCIA – ALEGAÇÃO DE INVASÃO DA COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR SOBRE MATÉRIA PROCESSUAL – ARTIGOS 22, I E 48, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – Tendo em vista o trânsito em julgado de acórdão da egrégia Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça que, ao julgar o Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 11.824, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ 27.05.2002, concedeu a segurança pleiteada para declarar a nulidade do provimento impugnado, é de se reconhecer a perda superveniente do objeto da presente ação direta, tornando-se prejudicado o pedido formulado na inicial. (STF – ADI 1919 – SP – TP – Relª Min. Ellen Gracie – DJU 01.08.2003 – p. 00099)

08 PL 2161/91, de autoria do Deputado José Luiz Clerot.

09 II Encontro Nacional do Ministério Público na Defesa do Patrimônio Cultural, realizado nos dias 23 e 24 de setembro de 2004, na cidade de Santos. Inteiro teor disponível em: www.mp.mg.gov.br/geppc

10 Os arquivos, o Ministério Público e a Democracia. Tese apresentada no XIV Congresso Nacional do Ministério Público realizado em Recife-PE, 17 a 20 de outubro de 2001. Disponível em www.mp.sp.gov.br/caouma

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Sobre o autor
Marcos Paulo de Souza Miranda

Promotor de Justiça. Coordenador da Promotoria Estadual de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico de Minas Gerais. Especialista em Direito Ambiental. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais. Autor do livro "Tutela do Patrimônio Cultural Brasileiro" (Belo Horizonte: Del Rey, 2006).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MIRANDA, Marcos Paulo Souza. A atuação do Ministério Público na defesa do patrimônio arquivístico sob a guarda do Poder Judiciário.: O problema da eliminação e do acesso aos autos processuais findos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1583, 1 nov. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10597. Acesso em: 23 dez. 2024.

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