Resumo: O presente artigo defende a tese de que o membro do Ministério Público pode expedir requisições e notificações sem a necessidade da prévia instauração de inquérito civil ou procedimento administrativo.
Palavras-chave: Ministério Público, poder de requisição, inquérito civil ou procedimento administrativo, absoluta desnecessidade.
Segundo reza o inciso VI do artigo 129 da Constituição Federal, o membro do Ministério Público pode "expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva", ou seja, uma leitura apressada e equivocada do citado dispositivo normativo autoriza conclusões no sentido de que o Promotor de Justiça apenas pode expedir requisições no curso de procedimentos de investigação formalmente instaurados, sendo vedada a expedição de requisições "avulsas", preparatórias, sem procedimento ou inquérito civil público.
Contudo, uma análise conglobante da ordem normativa revela que o Promotor de Justiça está plenamente autorizado a expedir notificações e requisições sem a necessidade do prévio procedimento administrativo ou ICP, sendo importante assinalar que tal expediente visa facilitar o desempenho ágil das excelsas missões institucionais do Ministério Público, na medida em que permite a rápida compreensão da verdadeira dimensão dos fatos, evitando o agravamento do problema ou a instauração inútil de um procedimento.
Apesar de o artigo 129, inciso VI, da Constituição Federal apontar que o Ministério Público apenas está autorizado a expedir requisições para instruir procedimentos, tal preceito constitucional não veda, de forma alguma, que outros comandos legais outorguem o poder de requisição genérico, ou seja, não há limitação constitucional. O artigo 129, inciso VI, da CF apenas determinou que pode o órgão do Ministério Público expedir requisições para instruir os procedimentos administrativos, não tendo o preceito constitucional restringido a expedição de requisições à instrução de procedimentos administrativos. Se fosse intenção do Constituinte limitar as requisições ministeriais à instrução de procedimentos administrativos teria empregado a seguinte redação: "expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos exclusivamente para instruí-los". Peremptoriamente não é esta a melhor orientação.
Todavia, o artigo 129, inciso IX da Constituição Federal reza o seguinte: "exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade".
Nessa quadra, a própria Constituição autoriza que leis infraconstitucionais estabeleçam outras funções ao Ministério Público, desde que respeitada sua finalidade institucional.
Em consonância com o ditame constitucional, o artigo 8°, § 1°, da Lei n.° 7.347/85, estabelece que "o Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, OU requisitar, de qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis".
Observa-se, portanto, que diante da conjunção alternativa "ou" do artigo 8°, § 2°, da Lei da Ação Civil Pública, é indene de dúvidas que o órgão de execução do Ministério Público ou instaura inquérito civil e expede as requisições para instruí-lo, ou requisita diretamente as informações, certidões, exames e perícias, sem a necessidade do procedimento administrativo, orientação harmônica com o artigo 129, IX, da CF e que na prática facilita a atuação do Promotor de Justiça, que pode agir de forma mais célere e eficiente, eis que desonerado das formas estéreis, inúteis e burocráticas de um formal procedimento, que apenas contribui para o agravamento da lesão difusa investigada pelo Ministério Público, frustrando a força normativa da Constituição.
A conjunção alternativa "ou" do artigo 8°, § 2°, da Lei da ACP espanca todas as dúvidas. É inegável, também, que tal disposição legal encontra abrigo no artigo 129, IX, da CF, tendo sido recepcionada pela ordem constitucional.
Nesta esteira, segundo o artigo 26, inciso V, da Lei n.° 8.625/92, compete ao Ministério Público "praticar atos administrativos executórios, de caráter preparatório", dentro os quais destaca-se a expedição de requisições, ainda que sem o prévio procedimento administrativo, para avaliações preliminares sobre fatos nebulosos, que, de imediato, não reclamam a burocrática instauração de ICP.
Este entendimento é sufragado pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça:
MANDADO DE SEGURANÇA. PREFEITO MUNICIPAL. REQUISIÇÃO DE INFORMAÇÕES PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. PESSOAS CONTRATADAS PELA PREFEITURA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535, DO CPC. SÚMULA 284/STF. DIREITO DE CERTIDÃO. DECISÃO NOS LIMITES CONSTITUCIONAIS. INDEPENDÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DIRETRIZES TRAÇADAS PELA ADMINISTRAÇÃO SUPERIOR DO PARQUET ESTADUAL. OBRIGATORIEDADE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF. DESNECESSIDADE DE PRÉVIA INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO CIVIL OU PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. ARTIGO 26, I, "B", DA LEI Nº 8.625/93.EMENTA:
I - Trata-se de mandado de segurança impetrado pelo ora recorrente, prefeito municipal de Minas Gerais, contra o ato do Ministério Público consubstanciado na requisição de informações sobre as pessoas nomeadas, contratadas e terceirizadas por aquela Prefeitura a partir de 05.10.98.
V - Não se faz necessária a prévia instauração de inquérito civil ou procedimento administrativo para que o Ministério Público requisite informações a órgãos públicos - interpretação do artigo 26, I, "b", da Lei nº 8.625/93.
VI - Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido. (REsp 873.565/MG, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05.06.2007, DJ 28.06.2007 p. 880).
Conclui-se, portanto, que a Constituição Federal, a Lei da Ação Civil Pública e a Lei Orgânica do Ministério Público autorizam a expedição de requisições e notificações sem a necessidade de inquérito civil público ou procedimento administrativo.