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A CSLL das receitas de exportação

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IV. AS EXONERAÇÕES TRIBUTÁRIAS DA SEGURIDADE SOCIAL NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

63. A exoneração tributária significa a ausência da obrigação de pagar o tributo, ensina Sacha Calmon Navarro Coelho (Teoria Geral do Tributo e da Exoneração Tributária, RT, p. 118).

64. Há vários tipos exonerativos - continua o aludido autor - e os mais costumeiros são: a imunidade, a isenção, a não-incidência e a alíquota-zero. Para cada um desses tipos de exoneração tributária, o sistema jurídico-normativo atribui características próprias, e a jurisprudência do STF, no particular, empresta soluções peculiares.

65. De grande força simbólica foi o julgamento do RE 227.832 (Relator Ministro Carlos Velloso, J. 01.07.1999, DJ 28.06.2002) no qual o STF entendeu legítima a incidência da COFINS sobre o faturamento da empresa, em uma interpretação harmônica entre o § 3º do art. 155, CF, e o caput do art. 195, CF, com redações anteriores às Emendas Constitucionais 20/1998 e 33/2001.

66. Tratava-se, na espécie, de ação na qual se postulava a imunidade à COFINS em face das operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais, por força do disposto no § 3º, art. 155, CF, na redação dada pela EC n. 3/1993:

"À exceção de impostos de que tratam o inciso II do caput deste artigo e o art. 153, I e II, nenhum outro tributo poderá incidir sobre operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País".

67. A questão constitucional controvertida estava em saber se a expressão "nenhum outro tributo" alcançava a COFINS incidente sobre o faturamento das pessoas jurídicas que tinham as aludidas atividades empresariais.

68. Nada obstante a expressão "nenhum outro tributo" e o reconhecimento de que a COFINS fosse um tributo, o STF entendeu, mediante uma redução teleológica, interpretar o termo "tributo" como "imposto", em consonância com os princípios constitucionais que irradiam do sistema da seguridade social.

69. Em seu voto, o Ministro Relator (Carlos Velloso) recordou, de modo contundente, que quando a Constituição desejou conceder imunidade no tocante às contribuições sociais foi expressa: § 7º do art. 195: "são isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei".

70. O eminente Relator se fiou em sentença lavrada por Sacha Calmon Navarro Coelho, outrora Juiz Federal, que em análise ao § 3º, art. 155, CF, enunciou:

"Dizer que o art. 155, § 3º, da CF, barra as contribuições parafiscais, mormente as sociais, seria o mesmo que dizer dispensados da mantença da seguridade social e das contribuições do art. 149 da Carta, as empresas de mineração, as concessionárias de energia elétrica, a indústria e o comércio de combustíveis e lubrificantes líquidos e gasosos, o que seria um absurdo lógico, altamente atentatório aos princípios da capacidade contributiva (art. 145, § 1º) e da igualdade tributária (art. 150, II), sem falar no art. 195, caput, da CF que defere a todos o dever de contribuir para a seguridade social".

71. Em passagem extremamente didática o Ministro Carlos Velloso indicou as linhas se seu raciocínio jurídico:

"Ora, a interpretação puramente literal e isolada do § 3º do art. 155 da Constituição levaria ao absurdo, conforme linhas atrás registramos, de ficarem excepcionadas do princípio inscrito no art. 195, caput, da mesma Carta – ‘a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei...’ – empresas de grande porte, as empresas de mineração, as distribuidoras de derivados de petróleo, as distribuidoras de eletricidade e as que executam serviços de telecomunicações – o que não se coaduna com o sistema da Constituição, e ofensiva, tal modo de interpretar isoladamente o § 3º do art. 155, a princípios constitucionais outros, como o da igualdade (CF, art. 5º e art. 150, II) e da capacidade contributiva. Não custa reiterar a afirmativa de que a Constituição, quando quis excepcionar o princípio inscrito no art. 195, fê-lo de forma expressa, no § 7º do mesmo art. 195."

72. Daí que, segundo o Ministro Velloso, em termos de seguridade social, as exonerações tributárias são específicas e excepcionais.

73. O voto proferido pelo Ministro Nelson Jobim adentrou a seara jurídico-contábil no qual analisa a incidência do ICMS (sobre o valor da venda), bem como o alcance das expressões "operações relativas" e "tributos" contidas no referido § 3º, art. 155, CF.

74. No tocante à imunidade tributária da seguridade social, o Ministro Jobim asseverou:

"A Constituição tem imunidade específica. Ela atendeu a sua preocupação quando disse, no § 7º, que são isentos de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes. Lá ela tratou do que tinha de tratar, e no lugar próprio".

75. Para chegar à conclusão de que a COFINS não está fora da incidência das aludidas "operações", o Ministro Jobim, cartesianamente, reconstrói os significados e as repercussões jurídicas dos termos "receita bruta", "lucro bruto", "receitas financeiras", "receitas operacionais", "faturamento" e "lucro líquido".

76. A despeito de cuidar da COFINS, o Ministro Jobim analisa a CSLL das empresas de mineração e a base de cálculo desse aludido tributo: o lucro líquido. Conquanto seja longa, a lição do Ministro Jobim vem a cavalheiro e explicita exaustivamente a operacionalização da incidência da CSLL sobre o lucro das pessoas jurídicas (fls. 1006-1009 do acórdão do RE 227.832):

"Na receita bruta de uma empresa mineral que, exclusivamente, opera com mineral, para tirarmos fora aquilo que, efetivamente, não é pedido, ou seja, receitas fora da área mineral, pergunto: teríamos a receita bruta, que seria de quê? A venda do produto, os resultados operacionais dele. No final, descontaríamos deste resultado operacional do produto para apurarmos as receitas líquidas, que é conceito técnico. Abateríamos o quê? Vendas canceladas, descontos incondicionais, impostos incidentes sobre vendas, que são descontados: ICMS, imposto de exportação, ISS, PIS. Faturamento da COFINS também é descontado, aí teríamos o conceito de receita líquida, que é o conceito legal.

Depois da receita líquida temos que abater, ainda, o custo dos produtos da aplicação própria. Os custos das mercadorias revendidas, o custo de serviços vendidos e chegamos a um outro conceito, que é o de lucro bruto. Vejam, esse conceito, que é o terceiro, partiu de quê? Da venda do mineral. Aí, no conceito de lucro bruto, ganhos apurados em razão de variações monetárias, decorrentes da atualização do direito de crédito, calculados com base em índices ou coeficientes aplicáveis por disposição legal. Incluo, ainda, outras receitas financeiras, que seriam ganhos líquidos, para chegar ao imposto de renda, auferidos ao mercado de venda, variável, receita de juros sobre capitais e outras; incluo, ainda, no conceito de lucro bruto, outras receitas operacionais, resultados positivos em participações societárias, dividendos, etc. Abato, desses números, despesas operacionais, gastos estruturais e gerais necessários à atividade da empresa, variações monetárias passivas e outras operações financeiras.

Estou chegando ao cálculo para a incidência de diversos tributos e contribuições, como é que se calcula isso. Eu parti de receita bruta, cheguei ao conceito de receita líquida. Logo após, cheguei ao conceito de lucro bruto. Depois, cheguei ao conceito de lucro operacional, que são tributos técnicos. Ao lucro operacional, a que estou chegando, somo as receitas não operacionais e deduzo as despesas não operacionais. Aí, chegou a um outro conceito, para efeito de imposto de renda, que é o resultado do período básico. Deste resultado do período básico, tenho que abater participação em debêntures, participação de empregados, participação de administradores e partes beneficiárias, contribuições para assistência e previdência de empregados, chegando ao lucro líquido sobre o qual incide a contribuição sobre o lucro líquido. Sobre este valor, incide oito por cento para as empresas reais e dezoito por cento para as pessoas jurídicas, ou seja, temos, aqui, o lucro deste cálculo que é a base de cálculo da contribuição sobre o lucro líquido.

Para chegar ao lucro líquido base da contribuição social sobre o lucro líquido, parti de onde? Dos resultados das operações e vendas da empresa. Ele vendeu, negociou com o minério de mercado, e teve um resultado de lucro líquido. Não incidiria, portanto, a valer o raciocínio, a contribuição sobre o lucro líquido. Se o raciocínio fosse verdadeiro, não teríamos a possibilidade de cobrar contribuição social sobre o lucro líquido de empresas, na parte correspondente aos valores originários da atividade de mineração ou de telecomunicações.

Depois de apurado esse lucro líquido, deduzo a alíquota, o valor devido da contribuição social para chegar a um outro conceito de lucro líquido, o lucro ‘b’, que é o lucro líquido básico menos o pago para a contribuição social. Ainda abato a provisão do imposto de renda, nos balanços da empresa, e chego ao lucro líquido do período-base, que é o lucro contábil, que ainda, não é o lucro tributário. Somo a estes valores, ainda, custos, soma de parcelas não dedutíveis, despesas operacionais, enfim, uma série de valores. Excluo, também, uma série de valores: lucro sobre a exploração correspondente a exportações incentivadas – inclusive discutimos este assunto, aqui, do BEFIEX -, resultado não tributável das sociedades cooperativas e chego, portanto, a um terceiro tipo de lucro, que é o lucro real, antes da compensação de prejuízos.

Vou trabalhar a compensação de prejuízo. O que abato? Compenso prejuízos fiscais do próprio período-base: atividades geral ou rural. Chego a um outro conceito, que é o lucro real após a compensação dos prejuízos do próprio período-base. Ainda tem que bater outras compensações. Quais são? Compensação dos prejuízos fiscais de períodos bases anteriores, atividades gerais, rurais etc., para se chegar ao lucro real.

Se esta empresa só tem operação de minério, só tem negócios em telecomunicações e combustíveis, ela não paga imposto de renda? Ao final, o resultado final do lucro real nada mais é do que operação básica, que está isenta.

Sr. Presidente, concluindo, procurei demonstrar – espero ter feito – que tudo o que diz respeito a tributos, impostos ou contribuições de qualquer natureza que incidam sobre empresas que operam com energia elétrica, serviço de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais, no País, têm como base um resultado financeiro decorrente dessa atividade: a venda de energia elétrica, os serviços de telecomunicações e derivados de petróleo.

Será que precisamos dar às ‘operações relativas a energia elétrica’ o conceito pretendido nesse recurso, ou seja, o conceito de que esteja imune não só a operação como também o resultado dessa operação, que é exatamente o valor financeiro decorrente dessa atividade? É isso que estamos discutindo? Será que esse conceito de operação financeira inclui também o resultado dessa operação? Se incluirmos dentro do conceito de operação financeira o resultado, teremos que assumir a responsabilidade de que só incidirão o ICM, o imposto de exportação e de importação. Não incidiria o Imposto de Renda, a COFINS, o PIS, a contribuição sobre o lucro líquido, nada disso incidiria porque estaríamos na base de todo o cálculo, ou seja, no início estaríamos com a base das operações.

Corre o risco o Ministro Sepúlveda Pertence de pensar que a expressão ‘derivados de petróleo’ vai acabar estourando eventualmente nesses tecidos modernos, que são todos derivados de petróleo, ou seja, em relação aos pólos industriais de polietileno e outros que são derivados de petróleo. Pretendo propor, no exame do meu voto, a análise das conseqüências que isso está nos levando. Há necessidade de se entender, então – aqui vem o ponto – o que contém a expressão ‘operações’. Operações no sentido de incluir seus resultados, ou não? Esse é o ponto fundamental. Se incluirmos, dentro do conceito de operação, os seus resultados, teríamos que incluir os outros tributos, porque ao fim e ao cabo, conforme foi demonstrado claramente, na composição da renda do lucro tributável de uma pessoa jurídica que só opera com mineração, estaria contido sempre na base a venda de energia elétrica, ou estaria sempre originário disso, logo, seria decorrente de operação. Mas como isso não é admissível, porque a demonstração absurda mostra a falsidade da interpretação extensiva, a interpretação teria que ser restritiva, no sentido de que operações relativas a energia elétrica ou a essas atividades não incluam os seus resultados, já que seus resultados são base de outros tributos."

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77. A longa exposição do Ministro Jobim se amolda à questão objeto do presente artigo, e são extremamente atuais as graves advertências quanto às conseqüências de enxergar uma imunidade total em relação a todas as contribuições sociais (gerais e da seguridade social) que incidam sobre as pessoas jurídicas que tenham a exportação como objeto de sua atividade empresarial típica.

78. Ainda em sede de RE 227.832, em debates envolvendo os Ministros Moreira Alves, Sepúlveda Pertence, Carlos Velloso, Marco Aurélio e Nelson Jobim, acerca de inclusão ou não do "faturamento" dentro do termo "operação", o Ministro Moreira Alves entendeu que o "faturamento" era uma etapa da "operação" e se é uma etapa da "operação", "operação" o faturamento é.

79. O Ministro Carlos Velloso redargüiu a essa aludida conclusão (ou premissa naquele caso) do Ministro Moreira Alves recordando que:

"A lei escolheu como fato gerador, o faturamento, certo que a operação pode ser uma etapa do faturamento, mas não é faturamento. Em termos econômicos, há relevância, mas temos de considerar a hipótese de incidência sob o ponto de vista jurídico, e uma coisa é distinta da outra, eminente Ministro."

80. Em seu voto no aludido RE 227.832, o Ministro Ilmar Galvão trouxe à baila a nova redação do art. 195, CF, nos termos da Emenda Constitucional n. 20/1998 que incluiu a "receita" como nova hipótese de incidência, além das existentes "faturamento" e "lucro", de modo que a partir de então cada uma dessas hipóteses de incidência teriam concepções próprias. E, conseqüentemente, repercussões tributárias distintas.

81. Ao final do julgamento, o STF entendeu que a expressão "tributo" contida na redação daquele dispositivo constitucional controvertido não alcançava as contribuições sociais da seguridade social, em particular a COFINS e que, em se tratando de exoneração tributária da seguridade social, havia – como há - expressa cláusula constitucional (art. 195, § 7º, CF), visto que nessa seara as exonerações deveriam ser excepcionais e interpretadas restritivamente, em homenagem ao mandamento constitucional da universalidade dos contribuintes (art. 195, caput).

82. A compreensão externada pelo Ministro Sepúlveda Pertence no julgamento da ADI 1.441 (Relator Ministro Octávio Gallotti, J 28.06.1996, DJ 18.10.1996) revela o destaque especial que as contribuições sociais da seguridade social sempre mereceram do STF: "Contribuição social é um tributo fundado na solidariedade social de todos para financiar uma atividade estatal complexa e universal, como é a da Seguridade".

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Sobre o autor
Luís Carlos Martins Alves Jr.

LUIS CARLOS é piauiense de Campo Maior; bacharel em Direito, Universidade Federal do Piauí - UFPI; orador da Turma "Sexagenária" - Prof. Antônio Martins Filho; doutor em Direito Constitucional, Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; professor de Direito Constitucional; procurador da Fazenda Nacional; e procurador-geral da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA. Exerceu as seguintes funções públicas: assessor-técnico da procuradora-geral do Estado de Minas Gerais; advogado-geral da União adjunto; assessor especial da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Presidência da República; chefe-de-gabinete do ministro de Estado dos Direitos Humanos; secretário nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente; e subchefe-adjunto de Assuntos Parlamentares da Presidência da República. Na iniciativa privada foi advogado-chefe do escritório de Brasília da firma Gaia, Silva, Rolim & Associados – Advocacia e Consultoria Jurídica e consultor jurídico da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB. No plano acadêmico, foi professor de direito constitucional do curso de Administração Pública da Escola de Governo do Estado de Minas Gerais na Fundação João Pinheiro e dos cursos de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, da Universidade Católica de Brasília - UCB do Instituto de Ensino Superior de Brasília - IESB, do Centro Universitário de Anápolis - UNIEVANGÉLICA, do Centro Universitário de Brasília - CEUB e do Centro Universitário do Distrito Federal - UDF. É autor dos livros "O Supremo Tribunal Federal nas Constituições Brasileiras", "Memória Jurisprudencial - Ministro Evandro Lins", "Direitos Constitucionais Fundamentais", "Direito Constitucional Fazendário", "Constituição, Política & Retórica"; "Tributo, Direito & Retórica"; e "Lições de Direito Constitucional".

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVES JR., Luís Carlos Martins. A CSLL das receitas de exportação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1603, 21 nov. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10673. Acesso em: 23 dez. 2024.

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