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Acabando com as "jabuticabas" do processo penal

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Há anos, Gilmar Ferreira Mendes disse que, se alguma coisa existia somente no Brasil e não era jabuticaba, havia algo de errado... A manifestação, meio jocosa, ainda é atual, principalmente em termos jurídicos.

De fato, há dois recursos em nosso sistema processual que só existem aqui: o protesto por novo júri e os embargos infringentes. Eles têm em comum a característica de não se voltarem diretamente contra o mérito da questão, mas apenas a questões puramente "numéricas". O primeiro aplica-se sempre que a condenação do réu for superior a 20 anos de reclusão, pouco importando se justa ou injusta. A segunda aplica-se nos julgamentos realizados por tribunais, nos quais houve voto vencido.

É bastante sintomático que esses dois recursos só existam no Brasil. Qualquer um que tenha algum conhecimento de Direito Comparado sabe que, no Ocidente, o normal é que a imensa maioria dos institutos jurídicos seja comum a vários países. A lógica é simples: boas idéias tendem a propagar-se, sendo copiadas por outras paragens, enquanto institutos que não cumprem sua função tendem a manter-se apenas em seu local de origem e, mesmo assim, motivados por pura inércia.

Dessa inércia, tentamos sair. Vários projetos de lei têm o objetivo de extinguir esses dois recursos. Felizmente, um deles, que acaba com o protesto por novo júri, foi aprovado recentemente pelo Senado. Além do seu caráter de "jabuticaba", esse recurso tem ainda outros problemas.

Primeiro, é anacrônico. Foi inventado durante o Império com o objetivo de evitar ao máximo a imposição da pena de morte, pois tratava-se, obviamente, de uma pena de caráter irreversível. Com o fim da pena de morte, o protesto perdeu qualquer sentido, pois sempre é possível a revisão criminal.

Segundo, expressa uma profunda desconfiança com o Tribunal do Júri. É sintomático que crimes gravíssimos como estupro e latrocínio, cujas penas chegam a bem mais de 20 anos não são submetidos a esse recurso pelo simples fato de serem julgados por um juiz singular. Isso contraria simultaneamente dois princípios constitucionais: o da soberania dos veredictos do júri, no qual o constituinte expressou a imprescindibilidade do instituto; e o da igualdade, no qual pessoas submetidas à mesma pena podem ter, a depender apenas do juiz que as julga, direito ou não à pena.

Terceiro, esse recurso induz os juízes a agir de má-fé, praticando o mesmo abuso de autoridade, quando impõem pena um pouco menor de 20 anos apenas com o objetivo de evitar que o recurso seja utilizado. Ora, é evidente que a pena deve ser imposta exatamente de acordo com a situação concreta do réu, não de acordo com suas possibilidades de recurso. Aí está a violação, desta feita pelos próprios juízes, de outro princípio: da individualização da pena.

Outros problemas podem ser citados, como a maior facilidade para a prescrição dos crimes, já que o segundo julgamento pode demorar a ocorrer.

Agora é esperar a sanção do Presidente da República deste e de outros projetos que pretendem diminuir nossas idiossincrasias e tornar o processo mais eficiente.

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Sobre o autor
Alexandre Magno Fernandes Moreira Aguiar

procurador do Banco Central do Brasil em Brasília (DF), especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Estácio de Sá, professor de Direito Penal e Processual Penal na Universidade Paulista (Unip) e nos cursos preparatórios Objetivo e Pró-Cursos

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AGUIAR, Alexandre Magno Fernandes Moreira. Acabando com as "jabuticabas" do processo penal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1637, 25 dez. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10795. Acesso em: 2 nov. 2024.

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