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Insolvência e recuperação judicial da Americanas

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04/10/2024 às 15:22

Resumo:


  • Os acionistas minoritários da Americanas são investidores passivos, conservadores e de longo prazo.

  • Os prejuízos atuais e futuros dos minoritários da Americanas são causados por uma fraude contábil e desvalorização das ações.

  • A nulidade do Plano de Recuperação Judicial da Americanas foi requerida devido a cláusulas consideradas inválidas.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Notas

1 Eu havia concluído este artigo quando sobreveio a notícia da homologação do “Plano de Recuperação Judicial” da Americanas, sem, todavia, os pedidos de nulidade especificados no item III, infra, terem sido objeto de exame e decisão, o que me levou a reiterá-los. Se indeferidos, irei agravar, razão pela qual ainda são válidas e oportunas as sugestões discriminadas nos itens XVII e XVIII infra.

2 Jorge Lobo é procurador de Justiça (aposentado) do MP-RJ, mestre em Direito da Empresa da UFRJ, doutor e livre-docente em Direito Comercial da UERJ e advogado. Colaboraram na pesquisa os Drs. Antonio de Faria Guimarães e Berliet Rodrigues Monteiro Filho e o estagiário João Felipe Pinto Bandeira de Mello.

3Os jurisconsultos romanos nos ensinaram: “A fraude a tudo corrompe”.

4 Vide meu livro Da Recuperação da Empresa no Direito Comparado, Cap. III, A Crise da Empresa: A Busca de Soluções, Ed. Lumen Juris, 1993, p.35/46 .

5 Cf. “Apresentação da Americanas para a Assembleia Geral de Credores”, que instruiu a petição dos Administradores Recuperação Judicial (Proc. nº. 0803087-20.2023.8.19.0001, id. 94378842, p. 11).

6 Não me venham com o “papo” de brokers mal intencionados: “Os minoritários só perderão quando venderem suas ações”.

7 Segundo dados da B3, cfr. declaração de voto dissidente do conselheiro Pierre Moreau, item 1, anexo à “Ata da Reunião do Conselho de Administração”, realizada em 18/12/2023).

8....

9 A Americanas, hoje listada no Novo Mercado, que só permite a emissão de ações ordinárias, poderá migrar para o BOVESPA NÍVEL 1 e fazer companhia à Eletrobrás, Bradesco, Itaú Unibanco Holding, Gerdau, Brasken, ou para o BOVESPA NÍVEL 2 e juntar-se à Raizen.

10 Buffet diz que manipulação de contabilidade por empresas é nojenta, disp. www.metropole.com, 25/02/2023.

11 Sextante, 2022, p. 328.

12 Ob. cit., p. 329.

13 O escândalo da Enron levou o Congresso americano a criar a Lei Sarbanes-Oxley (SOx), que tem por escopo prevenir e coibir fraudes nas demonstrações financeiras e “exigir das companhias maior governança nas informações divulgadas e, consequentemente, dar maior segurança aos stakeholders sobre seus investimentos”. Disp. https://www2.deloitte.com/br/pt/pages/audit/articles/lei-sarbanes-oxley.html

14 Golpes bilionários: como os maiores golpistas da história enganaram tanta gente por tanto tempo, de Kari Nars, Ed. Gutemberg, 2009, p. 138/145.

15 Disp. https://oglobo.globo.com/economia/negocios/noticia/2023/06/ceo-da-americanas-diz-a-cpi-que-empresa-passara-a-chamar-de-fraude-o-rombo-que-levou-a-levou-a-recuperacao-judicial.ghtml

16 Sobre o tema, L’élaboration du plan de continuation de l’entreprise en Redressement Judiciaire, capítulo La viabilité de l’entreprise, de Christine Lebel, Maître de Conférence à la Faculté de Droit et de Sciences Économiques de Nancy, pub. Presses Universitaires D’Aix-Marseille, 2000, p. 211. e segs.

17 Apud, Jim Collins, Como as gigantes caem, Ed. Campus-Elsevier, 2010, p. 82.

18 “Governança Corporativa é o conjunto de normas, consuetudinárias e escritas, de cunho jurídico e ético, que regulam os deveres de cuidado, diligência, lealdade, informação e não intervir em qualquer operação em que houver interesse conflitante com o da sociedade; o exercício das funções, atribuições e poderes dos membros do conselho de administração, da diretoria executiva, do conselho fiscal e dos auditores externos, e o seu relacionamento entre si e com a própria sociedade, seus acionistas e o mercado em geral.” in Princípios de Governança Corporativa. Meu artigo publicado na Revista da EMERJ, v. 10, nº 37, 2007.

19 Disp. em: https://bvmf.bmfbovespa.com.br/pt-br/a-bmfbovespa/download/Folder_NovoMercado.pdf

20. Entrevista dada a Danilo Fariello, Governança é chave para sucesso no mercado, Valor Econômico, 20/07/2006, p. D-2.

21 Ed. Elsevier, 2011, p. 375

22 Ob. cit., p.373/379, notas 72 a 92.

23 Idem, p. 350, item 335.

24 Império da dor, Patrick Radden Keefe, Ed. Intrínseca, 2022, p. 187.

25 Com fundamento no conceito de acionista controlador do art. 116. da LSA e do que nos ensinaram consagrados mestres, entre os quais destaco, em ordem alfabética, Alfredo Lamy Filho, Fabio Konder Comparato e Modesto Carvalhosa, vejo-me compelido a discordar do ilustre advogado Paulo Cezar Aragão sobre o que ele denomina ‘acionista de referência’”. A matéria pode ser consultada pelo link:https://exame.com/colunistas/coriolano-gatto/o-aperfeicoamento-do-mercado-de-capitais-e-como-evitar-as-armadilhas/

26 A Exposição de Motivos nº 196, de 24/06/1976, de autoria de Mário Henrique Simonsen, Ministro da Fazenda, deixa claro o espírito da LSA, cf. se constata dos itens 4 e 5, letras (b), (c) e (f), e do capítulo X, Seção IV, que regula a conduta e a responsabilidade do acionista controlador, enfatizando “que o poder de controle só é legítimo para fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir a sua função social, e enquanto respeita e atende lealmente aos direitos e interesses de todos aqueles vinculados à empresa – os que nela trabalham, os acionistas minoritários, os investidores do mercado e os membros da comunidade em que atua”. Nessa época, muito se discutia a respeito da “ética da responsabilidade”, o que gerou o livro O princípio da Responsabilidade, de Hans Jonas, no qual o filósofo demonstra a necessidade imperiosa de criar-se um limite ético, capaz de orientar o homem na Era Tecnológica. Para saber “o que a ética pode fazer à economia e vice-versa”, vide Sobre a Ética e a Economia, de Amartya Sem, prêmio Nobel de economia em 1998, in Ed. Companhia de Letras, 8ª. reimpressão e professor da Universidade de Harvard.

27 A propósito, meu artigo Princípio do Ativismo Societário, Migalhas, 19/06/2006.

28 Neste momento, não há como quantificar o montante do deságio porque o cálculo está na dependência do exercício, ou não, da “opção de reestruturação II”, prevista no Plano. Anote-se que os credores não apoiadores (Banco do Brasil, CEF, ABC e Safra) poderão aderir ao Plano, o que deverá ocorrer, pois, na assembleia geral do dia 19/12/2023, votaram pela sua aprovação.

29 Brazil’s Americanas files for bankruptcy after $ 3.8 bn accounting scandal, disp.https://www.ft.com

30 Alleged fraud at a Brazilian retailer sparks a corporate reckoni: The scandal puts three low-key billionaires in the spotlight, disp. www.economist.com

31 “Estudo de Viabilidade AP-01104/23-01”, laudo de avaliação do Plano de Recuperação Judicial, elaborado pela empresa Apsis Consultoria Empresarial Ltda., com data base de 31.12.2023.

32 Redressement et Liquidation Judiciaires des Entreprises”, de Fernand Derrida, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lausanne, Jean Pierre Sortais, professor da Universidade de Lausanne, e Pierre Godé, diretor do Instituto de Direito Francês, Ed. Dalloz, 3ª. ed.,p. 156, nº 241. O livro é baseado na Lei 85-98, de 25/1/1985. A propósito da revisão do Código de Comércio francês, leia-se “Reforme du droit des entreprises en difficulté”, de Karine Lemercier, professora da Universidade de Maine, e François Mercier, administrador judicial. Disp. www.dalloz-actualite.fr, onde colhemos as informações supra listadas.

33 Loc. cit.

34 Ob. cit., p 157, nº 245/6.

35 Idem, p. 158, nº 246.

36 Loc. cit.

37 Philippe Pernaud-Orliac, Plan de remboursement des créanciers: plan de sauvegard ou de redresssement, item Le tribunal peut parfois rejeter le projet sans qu’il y ait eu consultation, disp. pernaud.fr

38 Alf Ross, Hacia una ciencia realista del derecho: critica del dualismo en el derecho, Ed. Abeledo-Perrot, 1961, e Direito e Justiça, Edipro, 2000.

39 A jurisprudência, inclusive a da Suprema Corte, não definiu, até o momento, o que se deve entender por substantially similar, discriminate unfairly, indubitable equivalente etc. O propósito subjacente desses três requisitos - “substancialmente semelhante”, “discriminar injustamente” e “equivalente indubitável” - é assegurar à classe dissidente o direito de receber valor igual ao atribuído a todas as outras classes situadas de forma semelhante.

40 Em determinadas hipóteses, deixa-se de aplicar a “regra da prioridade absoluta”, em virtude de o acionista, durante a tramitação do processo, ter realizado um aporte, em dinheiro ou bens, para a capitalização da empresa e o bom êxito da reorganização.

41 O plano deve garantir aos credores pagamento no mínimo igual ou mais vantajoso ao que eles receberiam se os ativos do devedor fossem liquidados.

42 Chama-se cramdown a decisão judicial que rejeita a objeção de credores dissidentes da deliberação da assembleia geral de credores e aprova o plano por considerá-lo viável (feasibility), ou que provavelmente obterá sucesso (likely to sucess), ter sido elaborado de “boa fé” e no “melhor interesse dos credores”, ser “justo e equitativo” e “não discriminar injustamente” a classe discordante, impondo o plano à coletividade dos credores. No direito inglês, chama-se “cram down inter class”.

43 “Entende-se por cram up, também segundo as regras do 11 USC, o expediente legal que confere ao juiz o poder de confirmar o plano de reorganização aprovado pelos credores juniores que levam os credores seniores a ele se submeterem, embora dele discordem; por hold up: o credor, ciente de que o plano depende de sua concordância para ser confirmado, nega-se a negociar com o devedor, para, ao final, lograr obter vantagens que não teria em uma negociação regular; free-riders: o credor se recusa a colaborar no processo de reorganização na expectativa de beneficiar-se após o devedor sanar sua crise, não partilhando assim dos ônus e custos suportados pelos demais credores.” (Guilherme Queirolo Feijó, in Cram down: Considerações críticas à importação do regime do Chapter 11 para o regime legal da Lei nº 11.101), disp. www.silveiro.com.br

44 Segundo Guilherme Queirolo Feijó, a good faith não é definida no 11 USC. Baseado em Ordin Robert L., no estudo The good faith principle in de Bankruptcy Code: A case study. The business Lawyer, v. 38, nº 4, p. 1795-1850, de 1983, “a boa fé da lei norte americana não é a boa fé objetiva do direito brasileiro, mas sim a boa fé subjetiva, em que sobressaem “as ideias de sinceridade e franqueza” (artigo citado).

45 Corporate Insolvency and Covernance Act 2020, em vigor desde 26.06.2020.

46 The role of the court in debt restructuring, in Cambridge Law Journal, 7 1: 1-27, disp. www.reserchgate.net

47 Nos Comentários à LRFE, coord. Carlos Henrique Abrão e Paulo F.C. Salles de Toledo, Saraiva, 6ª. ed., p. 242, escrevi: “É curial que, ao exercer os poderes de caráter jurisdicional, instrumental ou administrativo, o juiz não é um órgão passivo, mero homologador das decisões da assembleia geral ou do comitê de credores ou do administrador judicial, pois, ao ordenar o processamento da ação, proferir despachos, decisões e sentenças, superintender a administração da empresa em crise, enfim, presidir o processo de recuperação, deve fazê-lo com tirocínio, competência e plena liberdade, formando sua convicção, seu “livre convencimento”, de acordo com as provas dos autos, ciente de que seus atos estão sujeitos a recurso de agravo (cf., p. ex., art. 59, § 2º)”.

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48 Disp. www.commonslibrary.parliament.uk

49 Disp.euroestructuring.weil.com

50 Claudio Mellone, Il concordato preventivo – la terza fase; omologazione, disp. www.dirittoprivatoinrete.it

51 Tribunale di Perugia – Opposizione all’omologazione di concordato preventivo: soggetti legittimati a proporla e verifica da parte del tribunale della sua ammissibilità e fondatezza”, disp. www.unijuris.it

52 Esta exposição é baseada exclusivamente no livro A recuperação da empresa no Brasil e na Alemanha, de Dora Berger, Ed. Sergio Antonio Fabris, 2001.

53 Eis a tradução de Dora Berger: “§ 245 1 Mesmo quando as maiorias necessárias não tenham sido alcançadas, considera-se como outorgada a aprovação do plano por parte de um grupo votante quando: 1. Os credores desse grupo não sejam colocados em posição pior a que tinham sem o mesmo”.

54 La nueva regulación concursal, (diretora) Cristina Jiménez Savurido, (coord.) Carmen Hermida y Eduardo Garcia, IE – Instituto de Empresa, 2016, p. 359.

55 Revista Il Diritto Fallimentare, Casa Editrice Dott, vol. LXIII, págs. 351/364.

56 Meu ensaio Direito da Crise Econômica da Empresa, pub. no livro Direito Concursal, Forense, 1996, p. 167/205, na Revista de Direito Mercantil nº 109 e na Revista dos Tribunais, agosto de 1998, vol. 754. A propósito do tema, fiz, no ano 2000, duas palestras: no Curso “PAEG - Programa de Advocacia Empresarial num Ambiente Global”, na UNISOS-RS, e na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

57 Disp. https://www.conjur.com.br/dl/stj-aprova-cram-down-voto-credor-56.pdf

58 No mesmo sentido: “A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firmada no sentido de ser possível a concessão da recuperação judicial pelo magistrado, ainda que não alcançado o quórum do artigo 58 da Lei nº 11.101/2005, a fim de evitar o abuso do direito de voto por alguns credores e para garantir a preservação da empresa. Incidência da Súmula nº 568/STJ” (Terceira Turma, no AgInt no AREsp n. 1.632.988/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 30/5/2022, DJe 2/6/2022).

59 “O juiz da ação de recuperação judicial deve exercer, sempre, necessária e obrigatoriamente, 1º o controle da legalidade formal, (…) controle da legalidade material ou substancial (…) e o controle de mérito, tanto do plano de recuperação judicial, quando da deliberação da assembleia geral de credores”, cf. meu comentário ao art. 58, in Comentários à LFRE cit., p. 243, item 2.

60 Cf. assevera o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, apud Helena Cunha Vieira, Poderes instrutórios do juiz no processo brasileiro, Ajuris, v. 60, p. 318.

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Sobre o autor
Jorge Lobo

Mestre em Direito da Empresa da UFRJ e Doutor e Livre-Docente em Direito Comercial da UERJ. Curador de Massas Falidas do MPRJ e é advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOBO, Jorge. Insolvência e recuperação judicial da Americanas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7765, 4 out. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/108871. Acesso em: 18 dez. 2024.

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