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O PIS das instituições financeiras.

O Fundo Social de Emergência e a constitucionalidade da MP nº 517/94

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III. A MP 517/94 E O ART. 73 DO ADCT: VALIDADE FORMAL

17. A ilustre Relatora da combatida Argüição de Inconstitucionalidade n. 95.03.052376-1, Juíza Lúcia Figueiredo, encampou a tese de que a edição da MP 517/94 contrariou o disposto no art. 73, ADCT.

18. Entendeu a digna julgadora que a indigitada MP regulava o FSE e, por conseqüência, violava o art. 73, ADCT. A maioria de seus eminentes pares a acompanhou.

19. Entretanto, no plano formal é equivocado, venia permissa, o argumento de que a MP 517/94 violou o disposto no art. 73 do ADCT (Na regulação do Fundo Social de Emergência não poderá ser utilizado o instrumento previsto no inciso V do art. 59 da Constituição).

20. Com efeito, a determinação constitucional proibitiva da utilização de Medida Provisória (art. 59, V, CF) está adstrita à regulação do FSE, e deve ser interpretada à luz do disposto no parágrafo único do art. 71, ADCT (Ao Fundo criado por este artigo não se aplica, no exercício financeiro de 1994, o disposto na parte final do inciso II do § 9º do art. 165 da Constituição).

21. Está prescrito no referido art. 165, § 9º, II, CF:

"Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:

..........

§ 9º Cabe à lei complementar:

..............

II – estabelecer normas de gestão financeira e patrimonial da administração direta e indireta, bem como condições para a instituição e funcionamento de fundos".

22. A regulamentação do FSE está relacionada às normas de gestão financeira e patrimonial, bem como sua própria instituição e funcionamento. A vedação do art. 73, ADCT, em sintonia com o disposto no parágrafo único do art. 71, ADCT, induz que não poderia o Poder Executivo editar medida provisória para os fins estabelecidos no art. 165, § 9º, II, CF, nem haveria necessidade de lei complementar para esse mesmo desiderato.

23. A regulamentação do FSE, nessa perspectiva, poderia ser feita mediante os outros instrumentos normativos disponíveis, sem necessidade de lei complementar e sem a possibilidade de medida provisória. A inquinada MP 517/94, em hipótese alguma, regulamentou o aludido FSE, visto que não tratou de sua gestão financeira e patrimonial, nem de sua administração direta ou indireta, e, tampouco, cuidou de sua instituição e funcionamento.

24. A surpreendida MP 517/94 não regulamentou o FSE, insista-se, no sentido de lhe propiciar a fiel execução de suas finalidades institucionais, conforme estabelecidas na ECR 1/94. Com efeito, a referida Medida Provisória tratou de deduções e exclusões relacionadas à contribuição social do PIS incidente sobre as pessoas jurídicas constantes no art. 22, § 1º, Lei 8.212/91, e mencionadas no art. 72, V, ADCT. Isso não equivale, reitera-se, na regulamentação do aludido FSE.

25. A divergência inaugurada pelo ilustre Juiz Baptista Pereira enfrentou essa questão e assertou:

"Ainda, outro óbice seria quanto à proibição contida no Art. 73 da Emenda Constitucional n. 1/94, a qual, segundo o fundamento exposto, vedaria o emprego do instrumento legislativo anômalo da Medida Provisória para regular o Fundo Social de Emergência, como no Art. 71 da revisão se o criou. Realmente, é regrado que ‘na regulação’ daquele não cabe o uso de tal recurso normativo excepcional. Contudo, no primeiro passo, a ilação que sobressai da disposição em comento é quanto a proibição da MP para aplicação dos recursos o Fundo Social de Emergência, ou seja, é defeso ao Executivo tentar eliminar os seus objetivos, como se contém na própria dicção do mesmíssimo Art. 71, por intermédio da edição de diploma, com força legal, daquela natureza. Vale dizer encontra-se atado o Executivo quanto às finalidades do Fundo, não podendo, sem anuência do Congresso Nacional, dispor por si só e, na maioria das vezes de efeito irreversível, com MP sobre a destinação de tais recursos. Ainda, como já se mencionou, a legislação editada constitui em benefício para o contribuinte, eis que permite facultativamente – ‘poderão deduzir ou excluir’ – o abatimento da base de cálculo do PIS. Aliás, a tese engendrada nesse sentido até pareceria ilógica, caso não omitisse a sua verdadeira intenção, vez que não se aplicando na MP combatida estar-se-ia possibilitando o aumento do tributo e não sua diminuição. Seria a primeira ocasião na qual o contribuinte ingressaria em Juízo para pagar mais contribuição do que a devida! Assim, é cúmulo do absurdo atribuir-se qualquer efeito deletério na MP editada. (fl. 215 do acórdão)"

26. A eminente Juíza Suzana Camargo, no aspecto da validade formal da MP 517/94, também divergiu do entendimento majoritário e pontificou:

"Efetivamente, restou estatuído no artigo 73 do ADCT que ‘na regulação do Fundo Social de Emergência não poderá ser utilizado o instrumento previsto no inciso V do art. 59 da Constituição’- negrito no original.

Mas, saliente-se que a vedação da utilização da medida provisória diz respeito à regulação do Fundo Social de Emergência, nada havendo no sentido de proibir possam ser concedidas exclusões ou deduções na base de cálculo da contribuição para o PIS, até porque como a própria legislação do imposto de renda prevê esses benefícios, a sua concessão somente tem o condão de favorecer os contribuintes. - negritamos

Desse modo, falece até mesmo interesse processual aos contribuintes no sentido de afastar as deduções e exclusões relativas à receita bruta operacional previstas nas medidas provisórias em tela, já que, consoante enfatizado anteriormente, não houve alteração da base de cálculo prevista pelo artigo 72, V, do ADCT, pelo que, como são obrigados a recolher sobre a totalidade dos elementos, evidente que melhor é a ocorrência da sua diminuição.

Assim, mesmo que se admitisse esta o artigo 73 do ADCT impedindo a utilização de toda e qualquer medida provisória, mesmo daquelas que concedessem benefícios aos contribuintes, dado afetar, em última análise, a regulação do Fundo Social de Emergência que fora instituído, ainda nesse caso não poderia ser acolhida a argüição de inconstitucionalidade, face a ausência de legítimo interesse de parte dos beneficiários.

De sorte que, neste particular, não há nem mesmo como ser conhecida a apontada inconstitucionalidade." (fls. 243-244 do acórdão).

27.Essa adequada compreensão da validade formal – e material – da MP 517/94 e suas reedições foi percebida pela 3ª Turma do TRF 2 ao apreciar o tema (AMS 9502260945, Relator Juiz Federal Convocado França Neto, J. 17.09.2002, DJ 15.10.2002), em acórdão assim ementado:

"TRIBUTÁRIO - CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS - MEDIDA PROVISÓRIA QUE SE LIMITA A ESTABELECER DEDUÇÕES E EXCLUSÕES - CONSTITUCIONALIDADE - A VEDAÇÃO DO ART. 73 DO ADCT, RESTRINGE-SE À REGULAÇÃO DO FUNDO SOCIAL DE EMERGÊNCIA.

1. A Medida Provisória 781/94, e suas sucessivas reedições, ao estabelecerem forma diferente da prevista na Lei 8398/92, para as deduções e exclusões, não altera a base de cálculo da contribuição. Portanto não são inconstitucionais.

2. A vedação constante do art. 73, do ADCT, restringe-se à regulação do Fundo Social de Emergência. Assim, não pode ter sua interpretação ampliada para abranger situações diversas.

3. Apelação improvida, à unanimidade."

28. É de ver, portanto, que inexistente o apontado vício de inconstitucionalidade formal da MP 517/94 e reedições, uma vez que esse instrumento normativo não foi utilizado para regulamentar o FSE, na linha do disposto no art. 165, § 9º, II, CF.

29. A inquinada MP 517/94 ao tratar das hipóteses de exclusões e deduções da base de cálculo do PIS, segundo o novo regime tributário instituído pelo FSE, a ser cobrado das instituições financeiras, não colidiu com o disposto no art. 73 do ADCT.


IV. A MP 517/94 E O ART. 72, V, DO ADCT: VALIDADE MATERIAL

30. Ultrapassado o óbice formal de constitucionalidade da MP 517/94, no aspecto material não houve mácula alguma, vez que inexistente o cogitado alargamento da base de cálculo do PIS (art. 72, V, ADCT), visto que mantida a receita bruta operacional das pessoas jurídicas mencionadas no art. 22, § 1º, Lei 8.212/91, como base de cálculo do aludido tributo.

31. A MP 517/94 cuidou, exclusivamente para efeitos de determinação da base de cálculo do PIS, das deduções relativas à receita bruta operacional daquelas pessoas jurídicas contribuintes, sem que houvesse modificação dessa hipótese de incidência tributária.

32. Nada obstante, a Juíza Lúcia Figueiredo, Relatora do acórdão objeto da impugnação fazendária, partiu da premissa de que do enunciado constante no art. 72, V, ADCT, dimanava norma constitucional auto-aplicável, na linha da classificação encetada por José Afonso da Silva, que dispensaria normatização infraconstitucional.

33. Segundo a ilustrada Relatora, à época da edição da ECR 1/94, o conceito de receita bruta operacional, conforme definido na legislação do imposto de renda, era dado pelo art. 44 da Lei n. 4.506, de 30.11.1964, art. 12 do Decreto-Lei n. 1.598, de 30.12.19777, e 226 do Decreto n. 1.041 (Regulamento do Imposto de Renda), de 11.01.1994.

34. Nesse passo, qualquer instrumento legislativo infraconstitucional que normatizasse acerca da "receita bruta operacional" seria inconstitucional, posto que teria havido uma "constitucionalização" da "legislação do imposto de renda" (Lei 4.506/64, DL 1.598/77 e RIR/94), com a cristalização dessas normas.

35. De efeito, o art. 72, V, ADCT, estabeleceu a incidência do PIS à alíquota de 0,75% sobre a receita bruta operacional, como definida na legislação do imposto de renda, cobrada das referidas pessoas jurídicas contribuintes.

36. A controvérsia reside no alcance normativo do termo "receita bruta operacional" e da expressão "como definida na legislação do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza".

37. Postula-se uma verdadeira "petrificação" dos enunciados constantes na legislação do imposto de renda relacionados à "receita bruta operacional". Ou seja, defende-se que no período de vigência do FSE (ECR 1/94) era defeso legislar sobre o PIS e sobre "receita bruta operacional", sendo inconstitucionais quaisquer normas que dispusessem sobre esses temas.

38. A prevalecer essa tese (petrificação da legislação infraconstitucional reguladora da receita bruta operacional dos contribuintes do PIS), criar-se-á uma nova figura no ordenamento jurídico nacional: legislação infraconstitucional pétrea ou legislação infraconstitucional alçada ao nível de norma constitucional. O absurdo da proposição leva à sua invalidade.

39. Concessa venia, é equivocada a tese de que o art. 72, V, ADCT, seja norma constitucional auto-aplicável, na linha do magistério professado por José Afonso da Silva.

40. Em verdade, para que a norma constitucional seja auto-aplicável há a dispensa da intermediação de qualquer normatividade infraconstitucional. Ela basta em si. A norma oferece o direito e por si só viabiliza o seu exercício, dispensando-se outras normas infraconstitucionais para seu gozo. Enquanto que a norma constitucional reduzida ou limitada pressupõe a intervenção normativa infraconstitucional para ser usufruída, a norma constitucional plena dispensa, repita-se, qualquer outra norma jurídica.

41. À guisa de exemplo de norma constitucional auto-aplicável tenha-se o disposto no art. 14, § 1º, I e II, CF. Para votar, basta o brasileiro completar 16 anos. Para ser obrigado a votar, basta ser maior de 18 anos. Para que o voto seja facultativo, "basta" ser analfabeto ou maior de 70 anos ou maior de 16 e menor de 18 anos. Ou seja, a concretização desse direito constitucional dispensa a intermediação do legislador.

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42. No presente caso, a própria Constituição remete-se à legislação infraconstitucional, como estabelece o art. 72, V, ADCT. Não é norma constitucional auto-aplicável aquela que busca na legislação infraconstitucional subsídios para sua concretização. Esse tipo de norma, segundo José Afonso da Silva, é norma constitucional limitada ou reduzida, como o dissemos.

43. Na senda doutrinária aberta por José Afonso da Silva, a norma constitucional de eficácia reduzida ou limitada é aquela que somente se concretiza ou se realiza plenamente com a intervenção do legislador infraconstitucional. É aquela que por si só não é bastante nem suficiente para permitir o exercício do direito constitucional ofertado.

44. Na situação sob exame, a cobrança do PIS das instituições financeiras à alíquota de 0,75% incidente sobre a receita bruta operacional teria como parâmetro as definições constantes na legislação do imposto de renda (art. 72, V, ADCT).

45. Essa referida legislação do imposto de renda não se apresentava codificada ou sistematizada, nem servia plenamente para as instituições financeiras, dotadas de nuanças tributárias e comerciais específicas, em relação às demais pessoas jurídicas.

46. Daí porque houve a necessidade de edição da inquinada MP 517/94 para conformar adequadamente a legislação infraconstitucional e concretizar o mandamento constitucional que determinou a cobrança do PIS sobre a receita bruta operacional das instituições financeiras. A cogitada MP 517/94, ao afastar outras normas infraconstitucionais, não cometeu nenhuma inconstitucionalidade.

47. Eis os dispositivos legais alcançados explicitamente pela MP 517/94:

"Lei 8.398/92:

Art. 1° A pessoa jurídica tributada pelo imposto sobre a renda poderá reduzir a base de cálculo das contribuições devidas ao Fundo de Investimento Social (Finsocial) e ao PIS/Pasep, mediante estorno da receita que tiver incluída na mesma base, produzida pelos títulos emitidos por entidades de direito público, que permanecerem sob sua titularidade, ininterruptamente, por mais de vinte e oito dias.

§ 1° No caso das instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, poderá ser excluída da base de cálculo das contribuições referidas a receita produzida pelos títulos emitidos por entidades de direito público, independentemente do prazo de permanência sob titularidade daquelas, ficando essa exclusão limitada ao valor dos rendimentos apropriados em cada período.

§ 2° O disposto neste artigo aplica-se aos títulos emitidos e operações efetuadas a partir da data de vigência desta lei.

§ 3° Fica vedado deduzir da base de cálculo das contribuições de que trata este artigo os encargos com a captação de recursos de terceiros, qualquer que seja a forma, aplicados na aquisição de títulos da espécie.

Art. 2° As instituições financeiras poderão excluir da base de cálculo das contribuições devidas ao Finsocial e ao PIS/Pasep as receitas produzidas em operações vinculadas ao crédito rural, nos termos da regulamentação em vigor.

§ 1° Fica vedada a dedução da base de cálculo das contribuições de que trata este artigo da variação monetária passiva dos recursos captados do público destinados a operações de crédito rural.

§ 2º O disposto neste artigo aplica-se às operações contratadas a partir da data de vigência desta lei, bem como a operações contratadas anteriormente, desde que vinculadas ao custeio da safra de verão 1991/92.

Art. 3° As instituições financeiras poderão excluir da base de cálculo das contribuições devidas ao Finsocial e ao PIS/Pasep as receitas produzidas em operações de empréstimo e de financiamento realizadas com pessoas jurídicas, com prazo não inferior a trinta dias.

§ 1° O disposto neste artigo aplica-se às operações contratadas a partir da vigência desta lei.

§ 2° Fica vedada a dedução da base de cálculo de que trata este artigo dos encargos com a captação de recursos de terceiros, inclusive em operações de repasse e refinanciamento, destinadas à aplicação nas operações mencionadas no caput deste artigo."

Lei 7.691/88:

.........

"Art. 5º Nas exclusões de que trata a alínea a do § 2º do art. 1º do Decreto-lei nº 2.445, de 29 de junho de 1988, com a redação dada pelo Decreto-lei nº 2.449, de 21 de julho de 1988, serão também admitidos os lucros e dividendos derivados de investimentos avaliados pelo custo de aquisição, que tenham sido computados como receita."

Decreto-Lei 2.445/88, com a redação do DL 2.449/88:

................

"§ 2º Para os fins do disposto nos itens III e V, considera-se receita operacional bruta o somatório das receitas que dão origem ao lucro operacional, na forma da legislação do imposto de renda, admitidas as exclusões e deduções a seguir:

a) as reversões de provisões, as recuperações de créditos que não representem ingressos de novas receitas e o resultado positivo da avaliação de investimentos pelo valor de patrimônio líquido;"

48. Além dessas normas explicitamente afastadas pela MP 517/94, na esteira do decidido pelo acórdão recorrido, também foram alcançados os seguintes dispositivos legais:

"Lei 4.506/64:

..........

Art. 44 – Integram a receita bruta operacional:

I – o produto da venda dos bens e serviços nas transações ou operações de conta própria;

II – o resultado auferido nas operações de conta alheia;

III – as recuperações ou devoluções de custo, deduções ou provisões;

IV – as subvenções correntes, para custeio ou operação, recebidas de pessoas jurídicas de direito público ou privado, ou de pessoas naturais.

DL 1.598/77:

..........

Art 12 - A receita bruta das vendas e serviços compreende o produto da venda de bens nas operações de conta própria e o preço dos serviços prestados.

Regulamento do Imposto de Renda/1994:

.............

Art. 226. A receita bruta das vendas e serviços compreende o produto da venda de bens nas operações de conta própria e o preço dos serviços prestados (Decreto-Lei n° 1.598/77, art. 12).

§ 1° Integra a receita bruta o resultado auferido nas operações de conta alheia (Lei n° 4.506/64, art. 44).

§ 2° Não integram a receita bruta os impostos não cumulativos cobrados, destacadamente, do comprador ou contratante, dos quais o vendedor dos bens ou prestador dos serviços seja mero depositário."

49. Convém relembrar que o Senado Federal, via Resolução n. 49, de 09.10.1995, em atendimento à decisão do STF, nos autos do RE 148.754 (Redator Ministro Francisco Rezek, J. 24.06.1993, DJ. 04.03.1994), espancou do ordenamento jurídico os aludidos DDLL ns. 2.445 e 2.449, de sorte que em relação a esses diplomas normativos não serão tecidas considerações.

50. Com efeito, a MP 517/94 afastou explicitamente, para as pessoas jurídicas destinatárias do art. 71, V, do ADCT, a aplicação das Leis ns. 7.691/88 e 8.398/92 e os Decretos-Leis ns. 2.445/88 e 2.449/88. Além desses, segundo o acórdão recorrido, também foram alcançados a Lei 4.506/64, o DL 1.598/77 e o RIR/94.

51. Esses mencionados diplomas legislativos cuidavam, dentre outras matérias, também da contribuição do PIS, de sua base de cálculo (receita bruta operacional) e de seus contribuintes, de modo assistemático, ensejador de insegurança e incerteza jurídicas, especialmente porque não tratavam das singularidades próprias das instituições financeiras, sobretudo se comparadas às demais pessoas jurídicas industriais, comerciais ou prestadoras de serviços não-financeiros.

52. Por força do disposto no art. 71, V, ADCT, houve a edição da mencionada MP 517/94 com vistas a racionalizar a cobrança do PIS das instituições financeiras, segundo o novo regime estabelecido no FSE.

53. Do voto divergente do Juiz Baptista Pereira, no cogitado julgamento do TRF 3, extraem-se passagens altamente valiosas que visitam esse aspecto das peculiaridades das instituições financeiras em vista do novo regime tributário do PIS incidente sobre a receita bruta operacional, incluídas as receitas financeiras:

"Em verdade, sou obrigado vez mais repetir, a lide esconde o que se pretende na realidade. Ela não está assentada na MP, mas sim no desígnio de só se adimplir no PIS quanto ao faturamento dos serviços prestados pelas instituições financeiras, os quais, até recentemente sequer eram cobrados dos seus clientes, por não representarem absolutamente ‘nada’ em relação ao principal rendimento ou atividade dessas sociedades, o qual se hospeda na ‘intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros’, nos termos do Art. 17, da Lei 4.595/64.

Para tanto, a impetração traz à baila a colocação de que a Emenda de Revisão conceituou diversamente receita bruta operacional que não seria a mesma coisa que receita operacional bruta, tudo conforme a legislação do imposto de renda.

Ora, isso só poderia ter algum abrigo para as empresas comerciais ou industriais, jamais para as instituições financeiras que são regidas diversamente daquelas, tanto é que o diploma principal que as regulamenta é a cognominada e acima citada Lei do Sistema Financeiro Nacional. Um banco comercial não é igual a ‘casa de secos e molhados’, inda que esta última constitua em também uma sociedade anônima. O primeiro possui o exclusivo desiderato de lucrar, tão-somente, por aquela intermediação de recursos financeiros, enquanto a outra jamais assim pode ser vista, senão seria um banco e não estabelecimento de comércio ou de indústria. Os últimos poderiam até obter as chamadas ‘receitas financeiras’ como atividades acessórias, quando aplicam seus recursos no mercado de capital, mas nunca poderiam ‘intermediar’ tais recursos havendo isso como suas atividades principais.

O PIS, como claríssimo dita o mandamento constitucional, das instituições financeiras deve ser recolhido com base de cálculo na receita bruta, entendida tal como a somatória das atividades principais e acessórias, sabidamente disposto na legislação do IR, destarte, aplicações dos recursos financeiros como atividades principais de tais instituições, aparenta ser mui mais razoável juridicamente que, ao inverso do que se postula, integra aquele, mais os serviços, o cálculo da contribuição sob exame. – Negritamos.

Aliás, até ser acrescido o tópico com o estudo do assunto em tela do analista tributário Hiromi Higuchi, quando diz que: ‘Tratando-se de empresas comerciais e industriais, há nítida distinção entre receita bruta operacional e receita operacional bruta porque aquela está compreendida nesta, ou seja, o campo de abrangência da receita operacional bruta é bem maior. Nas empresas comerciais e industriais, as receitas financeiras não estão compreendidas na receita bruta operacional mas estão dentro da receita operacional bruta. Isso não ocorre nas instituições financeiras’.

Após analisar tal tema em face da legislação do IR, acrescenta que: ‘Por outro lado, nas instituições financeiras, as receitas financeiras têm natureza de receitas de serviços por não se tratarem de simples ganhos financeiros como ocorrem nas empresas comerciais e industriais. As instituições financeiras têm toda uma organização para prestação de serviços inseparáveis dos ganhos financeiros’. (fls. 215-219 do acórdão)".

54. O ilustre Juiz Baptista Pereira rechaçou de modo contundente a tese de que o art. 44 da Lei 4.509/64 aplica-se integralmente às instituições financeiras, porquanto se válida essa proposição, de exclusão das receitas financeiras da receita bruta operacional de instituição financeira, o valor a ser recolhido a título do PIS incidiria apenas sobre os serviços bancários dessas pessoas jurídicas.

55. Quanto aos aspectos conceituais da "receita bruta operacional" e às peculiaridades das receitas das instituições financeiras, o eminente Juiz Baptista Pereira assinalou:

"É inelutável, portanto, que receita bruta operacional não é um conceito retirado de um só dispositivo, senão do conjunto de regras que abrangem todo o resultado da atividade empresarial.

Também não há confusão semântica entre receita bruta operacional e receita operacional bruta. Na lei para as instituições financeiras temos apenas duas conceituações: receita operacional e receita bruta operacional.

Na realidade, tanto do ponto de vista técnico-contábil como do tributário temos em caráter amplo receita operacional, correspondente à totalidade das receitas operacionais que são compostas da receita bruta operacional, adicionada de eventuais outras receitas operacionais, ou sejam aquelas diretas ou indiretamente ligadas aos objetivos sociais.

A receita bruta operacional é aquela originária da venda de bens e serviços da concretização dos objetivos sociais do contribuinte, que se confunde com o faturamento.

Outras receitas operacionais não têm relação direta à concretização dos objetivos sociais do contribuinte. São receitas auferidas por reflexo, de natureza secundária em relação aos objetivos sociais. É o caso, a exemplo, das receitas financeiras percebidas por empresas industriais, comerciais ou prestadoras de serviços, as quais surgem em função das disponibilidades financeiras temporárias geradas pela própria venda de bens ou serviços.

No que se refere às instituições financeiras, de modo geral, a receita bruta operacional tem origem na venda de produtos ou serviços financeiros, em gênero denominados contabilmente de receitas de intermediação financeira, tais como: rendas de operações de crédito, rendas de arrendamento mercantil, rendas de câmbio, rendas de aplicações interfinanceiras de liquidez, rendas de títulos e valores mobiliários, rendas de prestação de serviços e rendas de participações, as quais, somadas a eventuais outras receitas operacionais, chega à denominada receita operacional. – Negritamos.

Ademais, quando utiliza-se a expressão ‘bruta’ significa que se está referindo às receitas operacionais auferidas pelo contribuinte, antes de quaisquer deduções operacionais, na medida que, o que se pretende, seja contábil ou tributariamente, é mensurar o lucro operacional. Tal é corriqueiro nos demonstrativos contábeis das sociedades industriais, comerciais e de prestação de serviços, entretanto incomum às instituições financeiras. Isto por força da normatização contábil a que estão sujeitas pelo Banco Central, onde as receitas originárias da concretização direta ou indireta dos objetivos sociais são chamadas, genericamente, de receitas operacionais (Circular BCB n. 1.273/81 – COSIF).

Assim, receita bruta é equivalente para qualquer empresa ao seu faturamento, enquanto receita bruta adicionada do termo ‘operacional’ resulta do universo das receitas pertinentes às atividades principais e acessórias da sociedade.

Pelo verificado, Senhor Presidente e eminentes Juízes, seja considerando as receitas financeiras como venda de serviços ou operações e seja considerando que receita bruta operacional se resume na somatória de atividades das instituições financeiras, o que dá origem ao lucro operacional, não me convenço da procedência dada à postulação, de que o PIS só incide sobre os serviços, excluídos os ganhos financeiros, o que é, suma, o que pretendem ver reconhecido à causa e, da mesma forma, encontra-se agasalhado no voto da Relatoria e nos demais proferidos que estão a lhe sustentar. – Negritamos.

Acrescente-se, também, desabonando à tese em cenário teríamos outros fundamentos, ora metajurídicos, como se aprovou numa Emenda Constitucional, em razão da situação excepcional relatada na sua exposição de motivos, para que tais instituições financeiras recolhessem a menor do que pagariam caso mantido, durante o período, o PIS na forma da Lei Complementar n. 7/70, pois isto haveria de acontecer caso prevalecente à argüição; noutra visão, seria a primeira vez que a base de cálculo da contribuição ficaria exposta à vontade do contribuinte, porquanto os serviços bancários, apesar de tarifados no seu limite por normas do Banco Central do Brasil, são cobrados facultativamente pelas instituições. É de ser ver que tal não é sensato nem razoável." (fls. 222-224 do acórdão).

56. Nada obstante, é forçoso reconhecer que a combatida MP 517/94, em seu núcleo normativo, veicula regras permissivas. Não há normas proibitivas nem normas obrigatórias, mas normas facultativas. Isso pode ser verificado na parte final do respectivo artigo 1º ao dispor que "as pessoas referidas...., poderão efetuar, nos exercícios financeiros de 1994 e 1995, as seguintes exclusões da receita bruta operacional:..."

57. Por conseguinte, as pessoas jurídicas destinatárias e contribuintes do PIS, em tese, poderiam, se fosse de seu interesse, deixar de efetuar as exclusões legalmente permitidas na receita bruta operacional. O aparente cinismo do argumento só revela que não houve a pretendida modificação na base de cálculo da referida contribuição social.

58. Outrossim, para aferir-se a constitucionalidade ou inconstitucionalidade do conteúdo normativo da inquinada MP 517/94, mister se faz confrontá-la com o disposto nos outros diplomas normativos. Isso torna em indireta a suposta ofensa à Constituição, como assinalado na jurisprudência amiúde do STF. Por todos:

"AI-AgR 487075, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, J. 27.11.2007, DJ. 19.12.2007):

EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. REPERCUSSÃO POSITIVA DA CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. CONSTITUCIONALIDADE DA COBRANÇA. INSTRUMENTO DE ATUAÇÃO DO ESTADO NA ÁREA DE PREVIDÊNCIA. INSTITUIÇÃO MEDIANTE LEI ORDINÁRIA. CONSTITUCIONALIDADE. ALEGADA OFENSA AO ART. 201, CAPUT, § 11. OFENSA REFLEXA. AGRAVO IMPROVIDO.

I - Esta Corte entende que o tributo previsto no art. 195, II, da Constituição Federal, classifica-se como contribuição social, diferenciando-se, portanto, das taxas e impostos.

II - A referida contribuição social é instrumento de atuação do Estado na área de previdência social e sua exigência se dá em "obediência aos princípios da solidariedade e do equilíbrio financeiro e atuarial, bem como aos objetivos constitucionais de universalidade, equidade na forma de participação no custeio e diversidade da base de financiamento".

III - Esta Corte entende ser possível a instituição de contribuição de seguridade social por meio de Lei Ordinária.

IV - A apreciação dos temas constitucionais depende do prévio exame de normas infraconstitucionais. Afronta indireta à Constituição.

V - Precedentes.

VI - Agravo regimental improvido." – negritou-se.

59. Ainda que superado esse eventual obstáculo ao conhecimento da "questão constitucional" sobre o tema, no mérito, como demonstrado à saciedade, razão assiste à tese fazendária e merece ser provido o recurso extraordinário em defesa da constitucionalidade da MP 517/94 e reedições.

60. Isso porque o art. 72, V, ADCT, determinou que a base de cálculo do PIS a ser cobrado das respectivas pessoas jurídicas contribuintes fosse a "receita bruta operacional", conforme definida na legislação do imposto de renda. A objurgada MP 517/94 não modificou essa grandeza econômica como base de cálculo, mas sistematizou as hipóteses de incidência, sem inovar-lhe substancialmente o conteúdo.

61. Impedir ao legislador infraconstitucional a possibilidade de dar uma nova conformação ao estatuto legal do tributo, racionalizando seu regime de apuração e cobrança, sob o argumento de que inválida qualquer normatização sobre o tema, por suposta "constitucionalização", é dotar o disposto no art. 72, V, ADCT, de um elastério inaceitável.

62. Ademais, é imperioso recordar que para as pessoas jurídicas contribuintes do PIS, na modalidade estabelecida no referido art. 72, V, ADCT, as receitas brutas operacionais são compostas das suas receitas financeiras, objeto de suas atividades empresariais típicas, além das vendas de mercadorias e da prestação de serviços.

63. A atacada MP 517/94 conformou adequadamente essa base de cálculo (receita bruta operacional) à situação específica das pessoas jurídicas contribuintes do PIS, uma vez que além dos resultados obtidos com a venda de mercadorias e prestação de serviços, também, no caso delas, os resultados financeiros compõem sua receita bruta operacional.

64. Por isso que, seja no aspecto formal (idoneidade do instrumento normativo), seja no aspecto material (conformidade do conteúdo normativo), a MP 517/94 e suas reedições são constitucionalmente sadias.

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Sobre o autor
Luís Carlos Martins Alves Jr.

Piauiense de Campo Maior; bacharel em Direito, Universidade Federal do Piauí - UFPI; doutor em Direito Constitucional, Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; professor de Direito Constitucional, Centro Universitário do Distrito Federal - UDF; procurador da Fazenda Nacional; e procurador-geral da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA. Exerceu as seguintes funções públicas: assessor-técnico da procuradora-geral do Estado de Minas Gerais; advogado-geral da União adjunto; assessor especial da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Presidência da República; chefe-de-gabinete do ministro de Estado dos Direitos Humanos; secretário nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente; e subchefe-adjunto de Assuntos Parlamentares da Presidência da República. Na iniciativa privada foi advogado-chefe do escritório de Brasília da firma Gaia, Silva, Rolim & Associados – Advocacia e Consultoria Jurídica e consultor jurídico da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB. No plano acadêmico, foi professor de direito constitucional do curso de Administração Pública da Escola de Governo do Estado de Minas Gerais na Fundação João Pinheiro e dos cursos de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, da Universidade Católica de Brasília - UCB do Instituto de Ensino Superior de Brasília - IESB, do Centro Universitário de Anápolis - UNIEVANGÉLICA e do Centro Universitário de Brasília - CEUB. É autor dos livros "O Supremo Tribunal Federal nas Constituições Brasileiras", "Memória Jurisprudencial - Ministro Evandro Lins", "Direitos Constitucionais Fundamentais", "Direito Constitucional Fazendário", "Constituição, Política & Retórica"; "Tributo, Direito & Retórica"; "Lições de Direito Constitucional - Lição 1 A Constituição da República Federativa do Brasil" e "Lições de Direito Constitucional - Lição 2 os princípios fundamentais e os direitos fundamentais" .

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVES JR., Luís Carlos Martins. O PIS das instituições financeiras.: O Fundo Social de Emergência e a constitucionalidade da MP nº 517/94. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1671, 28 jan. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10891. Acesso em: 26 abr. 2024.

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