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Zoneamento: alternativa ao estudo de impacto ambiental e estímulo ao desenvolvimento

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31/01/2008 às 00:00
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Os benefícios do Estudo de Impacto Ambiental para o meio ambiente são grandiosos, mas os custos de sua elaboração são elevados. Existe possibilidade de conviverem medidas mitigadoras de proteção ambiental, como o Estudo de Impacto Ambiental ou o Zoneamento, e desenvolvimento econômico regional?

INTRODUÇÃO

Jared Diamond, em sua obra Colapso – como as sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso, relata a história de sua visita a duas fazendas de laticínios: uma localizada na região norte dos Estados Unidos da América e a outra na região sudoeste da Groenlândia. Sobre essas propriedades, o autor apontou algumas semelhanças, como exemplo, o fato de ambas serem produtivas e as mais prósperas de sua região, bem como de apresentarem dificuldade de escoamento da produção.

Tomando por base esse obstáculo ao progresso das duas propriedades e os recursos disponíveis para transcendê-lo, Diamond analisa a atitude de seus donos, alcançando a seguinte conclusão: o proprietário da fazenda localizada nos Estados Unidos investiu em tecnologia e, atualmente, é capaz de fornecer sua produção aos consumidores de toda a faixa norte do país. A fazenda localizada no sudoeste da Groenlândia, por sua vez, tinha grandes chances de se desenvolver e se tornar uma potência na produção de laticínio em sua época; porém, foi abandonada pelo seu proprietário, há mais de 500 anos, por algum motivo ainda desconhecido.

Jared conta que houve um tempo em que a sociedade da Groenlândia, formada basicamente por nórdicos, detinha um elevado grau de desenvolvimento. No entanto, toda a população daquele país ruiu: ou porque morreram de fome, em razão das guerras civis, ou emigraram até não sobrar ninguém.

Isso levou o autor a concluir que até mesmo as sociedades mais ricas e tecnológicas enfrentam problemas ambientais e econômicos crescentes que não podem ser subestimados. Atualmente, a tecnologia e os avanços científicos têm aumentado a busca de matérias-primas, cujas conseqüências têm sido o desmatamento das florestas, o aquecimento global e o não tratamento dos resíduos e efluentes que atingem os solos, rios e lençóis freáticos.

É nessa esteira que seguirá esta pesquisa, cujo ponto fulcral será demonstrar que o homem mais sábio pode cometer erros insanáveis e ocasionar sua própria destruição. Os benefícios do Estudo de Impacto Ambiental para o meio ambiente é, sem dúvida, grandioso; entretanto, os custos de sua elaboração são extremamente elevados, o que poderá causar entraves ao desenvolvimento regional.

Outro instrumento eficaz de controle da degradação ambiental é o Zoneamento. Por meio dele, é possível ao município e sua região, ao Estado ou ao país, inclusive, reorganizarem sua infra-estrutura, de modo a gerar uma quantidade menor de passivo ambiental.

Nessa linha de raciocínio, é oportuno o questionamento: existe alguma possibilidade de conviverem medidas mitigadoras de proteção ambiental, como o Estudo de Impacto Ambiental ou o Zoneamento, e desenvolvimento econômico? Esse será o tom dado ao texto, cujo objetivo será demonstrar que a convivência entre proteção ambiental e desenvolvimento econômico é perfeitamente possível, basta ao homem tomar as decisões adequadas a cada caso concreto, evitando que a predominância de uma medida sobre a outra seja motivo de catástrofes ambientais capazes de gerar problemas ainda maiores, como a extinção de espécies naturais e animais, inclusive do homem.


A humanidade pode convergir para seu próprio fim

Ao invés de tomar a palavra, gostaria de ser envolvido por ela e levado bem além de todo o começo possível. Gostaria de perceber que, no momento de falar, uma voz sem nome me precedia há muito tempo: bastaria, então, que eu encadeasse, prosseguisse a frase, me alojasse, em seus interstícios, como se ela me houvesse dado um sinal, mantendo-se, por um instante, suspensa. (...) Gostaria de ter atrás de mim (tendo tomado a palavra há muito tempo, duplicando de antemão tudo o que vou dizer) uma voz que dissesse: É preciso continuar, eu não posso continuar, é preciso pronunciar palavras enquanto as há, é preciso dizê-las até que elas me encontrem (...) (FOUCAULT, 2000, p. 5-6)

No dia 02 de dezembro de 1970, Michel Foucault ministrou aula inaugural a seus alunos do Collège de France. No pequeno trecho acima exposto, suas palavras exprimiram a mensagem de que a atual sociedade vive momentos de fragilidade e insegurança quanto às idéias que procura apresentar, porque, ao invés de tomar a palavra, ela deseja, apenas, transferi-la, dando continuidade a uma idéia que alguém iniciou há tempos.

A partir da década de 1970, o homem se conscientiza, com maior evidência, de que as conseqüências de suas atitudes não produzem uma obra pronta e acabada, mas, na verdade, são capazes de transformar aquela obra em outra; suas atitudes são, pois, meios de transformação. No entanto, a despeito de todas as transformações sociais e da "lucidez" que abarca a atual mentalidade humana, que recebeu o nome "pós-moderna", a observação dos fatos cotidianos destaca um paradoxo: apesar da aparente "lucidez" da sociedade pós-moderna, as estruturas democráticas nunca se mostraram tão frágeis, a corrupção nunca foi tão evidente, os valores básicos do homem nunca foram tão difíceis de "reconquistar" e o ambiente em que se vive e se desenvolve o ser humano nunca foi tão degradado.

Nesse sentido, a História pode constituir um termômetro importante para mostrar as tendências futuras da sociedade. Um exemplo: observando o comportamento do homem durante sua história, é possível constatar que sempre houve uma busca por aperfeiçoamento. Ao se analisar essa pretensão humana, porém, nota-se que ela parece ser envolvida por certa conotação maniqueísta, uma vez que, para o progresso se torne realidade, é imprescindível que o ambiente forneça elementos que propiciem esse desenvolvimento. BURKE & ORNSTEN (1998, p. 16) alertam que "(...) o fato de o progresso ter trazido em seu rastro um certo grau de devastação não nos deve surpreender, porque à medida que progredíamos, destruíamos".

Burke & Ornsten demonstram em seu texto essa visão maniqueísta, de certa forma derivada de seu sentido original, ou seja, não como sendo um dualismo religioso sincretista, mas considerando que há um embate entre o progresso humano e a devastação provocada por ele; existe, portanto, uma oposição de valores que sempre será inversamente proporcional, pois, segundo os autores, aquela relação entre progresso/devastação parece ser indissociável. Esse binômio, embora esteja sendo amplamente divulgado pela mídia com apelos de eminentes personalidades que perpassam tanto o mundo político como o artístico, não parece preocupar excessivamente a grande massa da população mundial.

Transcorridas quase três décadas desde a realização da Conferência de Estocolmo, em 1972, não seria um exagero afirmar que continuamos a lidar com a crise sócio-ambiental como se ela representasse apenas uma perturbação intempestiva, uma espécie de ruído de fundo a ser tratado de forma reativa e fragmentada, sem implicar a transgressão da lógica profunda que condiciona a organização das sociedades contemporâneas. Apesar do efeito mobilizador exercido pela Rio 92, as ações que vêm sendo empreendidas em nome da gestão ambiental ou do desenvolvimento sustentável (sic) têm se mostrado até o momento ambíguas, fragmentadas e pouco capazes de fazer justiça à complexidade dos desafios criados pela busca de redução das desigualdades no interior de cada país e entre países, de consolidação progressiva de novos arranjos institucionais para um controle democrático-participativo dos riscos da evolução técnica, e de internalização de uma relação de simbiose autêntica e duradoura dos seres humanos com a natureza.

Isto nos leva a admitir que, no plano das mudanças efetivas (sic) de comportamento, a crise sócio-ambiental constitui um item ainda marginal da agenda de preocupações cotidianas da maior parte da população do planeta (LEFF, 2002, p. 09).

Da leitura do texto de Enrique Leff, publicado em sua obra Epistemologia Ambiental, percebe-se que aquele autor propõe um questionamento sobre o que está sendo realizado no planeta para, efetivamente, reduzir a desigualdade no interior dos países e entre os países e por que a questão sócio-ambiental ainda é considerada segundo plano para a população. O próprio texto, porém, apresenta a resposta: não há uma efetiva modificação no comportamento humano, o que sugere a idéia de que o próprio homem parece desconhecer as causas que o levam a sua própria destruição – ou conhecem, mas são incapazes de modificá-las.

Em interessante trabalho intitulado Colapso – como as sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso, Jared Diamond cita a obra do arqueólogo Joseph Tainter, intitulada The Collapse of Complex Societies [01]; na qual Tainter investiga os possíveis motivos pelos quais as sociedades antigas – como a sociedade da Ilha de Páscoa, os Maias, os Astecas, os Vikings e grande parte dos povos nórdicos, os povos anasazis, que se localizavam a sudoeste dos Estados Unidos da América entre os anos 1130 e 1400 – entraram em colapso. Joseph acredita que o fracasso dessas sociedades não ocorreu em razão da ausência de recursos naturais e, portanto, rechaça a idéia de que existe uma relação entre progresso, caracterizado por ele como a formação de uma sociedade avançada e complexa, e a devastação ambiental.

Uma suposição deste modo de ver as coisas é a de que tais sociedades ficaram imóveis observando o seu crescente enfraquecimento, sem tomarem ações corretivas. Eis aí uma grande dificuldade. As sociedades complexas se caracterizam através da tomada de decisões centralizadas, alto fluxo de informações, grande coordenação das partes, canais de comando formais e compartilhamento de recursos. Muito dessa estrutura parece ter a capacidade, se não o propósito intencional, de superar flutuações e deficiências de produtividade. Com sua estrutura administrativa e capacidade de alocar trabalho e recursos, lidar com condições ambientais adversas deve ser uma das coisas que as sociedades complexas fazem de melhor. (...) É curioso que entrem em colapso quando confrontados precisamente com tais condições para as quais estão equiparadas a superar (...) À medida que se torna evidente para os membros ou administradores de uma sociedade complexa que um recurso básico está se esgotando, parece mais que razoável presumir que alguns passos racionais serão tomados para que se chegue a uma solução. A premissa alternativa – e inércia diante do desastre – exige um crédito de confiança que corretamente hesitamos em dar (DIAMOND, 2005, p. 502).

Conquanto Tainter defenda a idéia de que as sociedades complexas não decaíram em razão da má administração de seus recursos naturais, Jared Diamond propõe, em sua obra, uma teoria diferente. Entende esse autor que progresso e desenvolvimento, quando realizados de forma desordenada, podem resultar em colapsos sociais de grandes magnitudes. Diamond sugere que aquelas sociedades pecaram em seu desenvolvimento em virtude de equívocos no instante em que precisavam tomar decisões importantes. Nesse sentido, o autor expõe a seguinte idéia: entendendo como os grupos decidem de forma errada, é possível usar esse conhecimento como norte para se tomar decisões acertadas.

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Jared apresenta quatro fatores que contribuem para o fracasso da tomada de decisões em grupo: em primeiro lugar, o autor investiga os grupos que fazem coisas desastrosas porque não foram capazes de antever o problema antes que este surgisse; em segundo lugar, a análise se volta para o problema que existe, mas o grupo não consegue identificá-lo; num terceiro momento, o estudo converge para o fato de que o problema existe, o grupo consegue identificá-lo, mas não tenta resolvê-lo e, por fim, o autor demonstra a situação na qual o problema existe, o grupo o identifica, tenta resolvê-lo, mas não é bem sucedido.

Com relação ao fato de as sociedades realizarem ações desastrosas em razão de não serem capazes de antever o problema antes que ele apareça, Jared Diamond cita dois argumentos interessantes: um deles se consolida na idéia de que a sociedade simplesmente não teve experiência prévia de tal problema e, portanto, sequer cogitavam a hipótese de que ele poderia surgir; a outra envolve o raciocínio com o que o autor chama de "falsa analogia". A fim de ilustrar sua tese, o autor expõe como exemplo a exploração do marfim pela sociedade nórdica da Groenlândia e a erosão do solo ocorrida em território Maia.

Ao investir pesadamente na caça de morsas para exportar seu marfim para a Europa, a Groenlândia Nórdica não podia prever que os cruzados iriam eliminar o mercado de marfim de morsa ao reabrirem o acesso ao marfim de elefantes da Ásia e da África, ou que o aumento do gelo marinho impediria o trânsito de barcos para a Europa. Do mesmo modo, não sendo cientistas especialistas em solos, os maias de Cópan não podiam prever que o desmatamento das encostas das colinas desencadearia a erosão do solo desde as encostas até o fundo dos vales. (DIAMOND, 2005, p. 504) grifo nosso.

O autor arremata sua argumentação alegando que "(sic) Embora vivamos em uma sociedade letrada, moderna, cuja escrita discute os assuntos além de reis e planetas (...) Também tendemos a esquecer os fatos" (DIAMOND, 2005, p. 505).

Outra característica que embasa a idéia de que as sociedades podem tomar decisões desastrosas pela ausência de previsão do fatos se concentra na falsa analogia. Ela ocorre quando se está diante de uma situação desconhecida e, por essa razão, existe uma tendência em traçar analogias com situações familiares. Conforme expõe o autor, a utilização deste meio "pode ser perigoso quando [as situações] sejam superficialmente similares" (DIAMOND, 2005, p. 505), grifo nosso.

Um famoso e trágico exemplo moderno de raciocínio através de falsa analogia envolve a preparação militar francesa para a Segunda Guerra Mundial. Após o terrível banho de sangue da Primeira Guerra Mundial, a França reconheceu a necessidade vital de se proteger contra outra possível invasão alemã. Infelizmente, o estado-maior francês supôs que a próxima guerra mundial seria travada de modo semelhante à primeira, na qual a frente ocidental entre França e Alemanha ficaria fechada em frentes estáticas de trincheiras durante quatro anos. (...) Assim, a França construiu um sistema de fortificações elaborado e dispendioso, a linha Marinot, para proteger a frente oriental contra a Alemanha. Mas o estado-maior alemão reconheceu a necessidade de uma estratégia diferente. Usou tanques em vez de infantaria ao lançar seus ataques, reuniu os tanques em divisões blindadas separadas, contornou a Linha Marinot através de terreno florestal, anteriormente considerado inadequado para tanques, e derrotou a França em apenas seis semanas. Ao racioncinar por falsa analogia com a Primeira Guerra Mundial, os franceses cometeram um erro comum: freqüentemente, os generais planejam uma guerra iminente imaginando que será igual à anterior, em especial se em tal guerra anterior o seu lado tenho se saído vitorioso. (DIAMOND, 2005, p. 506) grifo nosso.

A segunda hipótese apontada por Diamond se concentra no fato de a sociedade ter consciência de que o problema existe, porém, não ser capaz de identificá-lo. Uma das razões que levaram o autor a alcançar essa conclusão diz respeito àqueles problemas que não se pode perceber, como é o caso dos nutrientes que fornecem o sustento do solo, os quais são invisíveis ao olho humano. Um clássico exemplo se concentra no desmatamento, que ocasiona a lixiviação do solo pela água da chuva, processo que remove tais nutrientes do solo e o tornam pobre para a lavoura. Nas sociedades antigas, não havia tecnologia suficiente para visualizar tais nutrientes e, pois, não era possível identificar tal problema.

Outro motivo apontado por Jared é a administração a distância dos recursos naturais. A distância entre a sede da administração de uma empresa, por exemplo, e sua propriedade pode resultar em graves danos ao meio ambiente e ao patrimônio da empresa, tendo em vista que não será possível agilizar uma ação capaz de evitar a degradação ambiental ou ainda recuperar, rapidamente, o que já fora degradado.

O autor entende que uma das circunstâncias mais problemáticas que impedem a sociedade de diagnosticar problemas ambientais e resolvê-los em tempo hábil consiste num fenômeno oculto, conhecido por "tendência lenta", "normalidade deslizante", ou ainda por "amnésia de paisagem".

Os políticos usam o termo "normalidade deslizante" para se referir a essas tendências ocultas por trás de flutuações confusas. Se a economia, a educação, o trânsito ou qualquer outra coisa estiverem se deteriorando aos poucos, é difícil reconhecer que cada ano sucessivo está em média ligeiramente pior do que o anterior, de modo que o padrão básico daquilo que constitui a "normalidade" muda gradual e imperceptivelmente. (...) Outro termo relacionado à normalidade deslizante é a "amnésia de paisagem": esquecer-se de quão diferente era a paisagem há 50 anos devido às mudanças graduais ano a ano. (DIAMOND, 2005, p. 508-509)

Confirmando a idéia de Diamond acerca da tendência lenta, também conhecida como normalidade deslizante, Burke & Ornsten citam a devastação ocorrida na ilha da Nova Zelândia, no momento em que o povo maori passa a habitar aquele território.

No início, mal se notavam as marcas deixadas por nossos machados em meio às incomensuráveis riquezes do planeta. Por isso demos pouca atenção à destruição, olhamos sempre em frente, na direção de um horizonte inalcançável. Mas podemos ter uma medida do que fazíamos há dezenas de milhares de anos a partir do último e mais bem preservado registro do machado deixado no Éden. O acontecimento em questão se deu há não mais de mil anos, quando os maoris chegaram à Nova Zelândia. Na época, o animal predominante era o moa, um grande pássaro incapaz de voar. Pesava alguma coisa entre 10 e 200 quilos e, não havendo nenhum mamífero ameaçador, ele assumiu o papel comum aos comedores de ervas e frutas. Os moas eram tão numerosos que ocupantes europeus posteriores tinham dificuldade de arar a terra por causa da quantidade de ossos deles deixadas. Mas passados quinhentos anos desde a chegada dos maoris, os moas da Nova Zelândia haviam desaparecido. Evidências arqueológicas mostram que a carne do moa sustentou os primeiros grupos maoris, que chegavam a ter cinqüenta membros, sem necessidade da agricultura. Os maoris se apossaram do moa como um lanche gratuito e só mais tarde descobriram que isso não existia (BURKE; ORNSTEIN, 1998, p. 261-262)

O terceiro fator, e mais comum, segundo o Diamond, concentra-se na idéia de que o problema existe, a sociedade consegue identificá-lo, mas não tenta resolvê-lo. Essa aparente imobilidade se dá em razão do que os cientistas chamam de "comportamento racional".

Muitas das razões para isso [a identificação do problema e a falta de iniciativa para resolvê-lo] recaem sob aquilo que os economistas e outros cientistas sociais chamam de "comportamento racional" que surge de conflitos de interesse. Ou seja, alguns indivíduos avaliam corretamente que podem agir em seu próprio benefício através de comportamento nocivo para outras pessoas. Os cientistas denominam este comportamento de "racional" porque envolve raciocínio correto, embora possa ser moralmente repreensível. (DIAMOND, 2005, p. 510)

Uma peculiaridade que se manifesta por meio do comportamento racional é a chamada "tragédia do bem comum". Por meio desta atitude – que pode ser considerada irracional se analisada com maior profundidade – o grupo social visa à explorar a capacidade máxima de determinado ecossistema, mesmo que isso resulte na destruição do bem comum e, por conseqüência, no prejuízo de todos os consumidores.

Um modo particular de conflito de interesse tornou-se conhecido como "tragédia do bem comum" (...). Considere uma situação na qual muitos indivíduos consumam um recurso comum, como pescadores pescando em um lugar no mar, ou criadores pastoreando suas ovelhas em um pasto comunitário. Se todos superexplorarem os recursos, estes se tornarão escassos devido à sobrepesca ou ao sobrepastejo e assim declinarão ou até mesmo desaparecerão, e todos os consumidores irão sofrer com isso. Portanto, seria de interesse comum de todos os consumidores serem comedidos e não superexplorarem tais recursos. Mas uma vez que não há regulamentação efetiva de quanto cada um pode tirar para si daquele recurso, então cada consumidor pode corretamente pensar: ‘Se eu não pescar esse peixe ou não deixar minhas ovelhas pastarem, outro pescador ou pastor o fará, de modo que não vejo sentido em ser comedido’ (DIAMOND, 2005, p. 512)

Outro conflito apontado por Diamond e que envolve comportamento racional se concentra no fato de a elite tomar decisões que vão de encontro com os interesses sociais. Defende ele que as elites tem uma propensão a "fazer coisas em seu próprio benefício, sem se incomodar que tais ações venham a prejudicar outros" (DIAMOND, 2005, p. 514). Neste sentido, Jared Diamond cita a obra de Barbara Tuchman, chamada A marcha da insensatez, na qual a autora reflete sobre decisões desastrosas e outros atos de sociedades que foram destruídas em razão das más decisões tomadas por seus governantes. Tuchman aponta que

A maior de todas as forças a afetar a insensatez política é a luxúria pelo poder, que Tácito definiu como ‘a mais repreensível de todas as paixões’. Como resultado da luxúria pelo poder, os chefes da ilha de Páscoa e os reis maias agiram para acelerar o desmatamento em vez de evitá-lo: seu prestígio dependia de erguerem estátuas e monumentos cada vez maiores que os de seus rivais. Estavam presos em uma espiral competitiva, de tal forma que qualquer chefe que erguesse estátuas ou monumentos menores para poupar as florestas seria desprezado e perderia o cargo. (TUCHMAN, 1984, apud DIAMOND, 2005, p. 515) grifo nosso

Na linha do comportamento racional, existe ainda o chamado "comportamento irracional", considerado o "comportamento nocivo para todos (...), surge sempre quando cada um de nós, individualmente, está prejudicado pelo conflito de valores (...), ou seja, sentimo-nos relutantes em abandonar políticas nas quais já investimos muito" (DIAMOND, 2005, p. 516).

Como último fator apontado por Jared como causador das catástrofes ambientais e, conseqüentemente, dos fracassos sociais na tomada de decisões converge para o fato de que o problema existe, o grupo obtém êxito em identificá-lo, tenta resolvê-lo, mas, infelizmente, não é bem sucedido. Isso pode ocorrer porque "o problema pode estar além de nossa capacidade de resolvê-lo, pode haver uma solução mas ser proibitivamente dispendiosa, ou nossos esforços podem ser limitados ou tardios" (DIAMOND, 2005, p. 521).

Verifica-se, portanto, que Diamond discorda de Tainter no que tange ao fracasso das sociedades complexas em virtude da ausência dos recursos naturais. Obviamente, toda sociedade moderna é dependente da extração daqueles recursos, sejam eles renováveis ou não renováveis. "Talvez o segredo do sucesso ou do fracasso de uma sociedade seja em saber em quais valores fundamentais se apegar, e quais descartar e substituir por novos quando os tempos mudarem" (Op. cit., 2005, p. 518). Ou seja, é possível constatar que o foco dos problemas ambientais não se concentra no ato de extrair, pura e simplesmente, os recursos naturais de que a sociedade necessita; mas sim na quantidade de recursos a serem extraídos e como esses recursos serão tratados, isto é, onde e como serão armazenados, como será realizada a recuperação da área degradada, visando à geração mínima de passivo ambiental, como impedir que tal extração de recursos naturais agrida determinado ecossistema e seu entorno, dentre outros questionamentos.

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Sobre o autor
José Victor Mouta

Bacharel em Letras e em Direito pela Universidade do Norte Pioneiro (UENP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOUTA, José Victor. Zoneamento: alternativa ao estudo de impacto ambiental e estímulo ao desenvolvimento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1674, 31 jan. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10900. Acesso em: 26 abr. 2024.

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