1. Introdução
Apresentamos, neste breve artigo, algumas informações sobre curso realizado desde a pandemia de Covid-19 (inicialmente remotamente, entre 2020 e 2021, pela Plataforma Moodle) e, a partir de 2022, presencialmente no Campus Centro do Colégio Pedro II, instituto federal equiparado às universidades federais para efeito da incidência das disposições que regem a regulação, avaliação e supervisão das instituições e dos cursos de educação superior (nos termos da Lei 12.677/2012 c.c. Lei 11.892/2008) localizado no Rio de Janeiro, que oferece licenciaturas e pós-graduações lato sensu e stricto sensu e também atende Educação Básica desde a educação infantil, além de ensino técnico nas modalidades de EMI - ensino médio integrado ao técnico- e PROEJA - ensino técnico para jovens e adultos.
Neste caso, o curso, porém, teve como público principal estudantes de Ensino Médio (2ª e 3ª séries) e ensino técnico (PROEJA) do Campus, embora “lives” realizadas em seu âmbito tenham sido abertas ao público, atingindo cerca de 2 mil visualizações ao todo, conforme se pode ver em:
1) "Da Bahia à Pequena África: a trajetória dos yorubás no Rio de Janeiro" com o Prof. Arthur José Baptista(link: https://youtu.be/FWroNXvi8uM),
2) "O Samba como projeto de Brasil: Cultura, Negritude e Resistência" com o Prof. Mauro Cordeiro (link: https://youtu.be/dQhexQhhtMI),
3)"Dança Afro e Ancestralidade: corpo, gênero e cultura" com a Prof. Ana Catão (link: https://youtu.be/sW7EHjzWCEw).
2. Objetivo
Nosso objetivo com este curso foi oferecermos uma Educação em Direitos Humanos através de uma apresentação de temas, a partir da história do Samba carioca (LIRA NETO, 2017; LOPES & SIMAS, 2015; SODRÉ, 1998; VIANNA, 2004) e da trajetória de sambistas do Rio de Janeiro, usando materiais próprios elaborados para este fim.
Buscamos também chamar a atenção para letras de sambas e sua riqueza melódica, rítmica e poética, bem como coreográfica – destacando como tudo isso permite uma sensibilização de estudantes para temas como cultura, desigualdades sociais e gênero, enfim, Direitos Humanos (GRÜNE, 2012).
3. Conteúdos desenvolvidos
Ao longo do curso, desenvolvemos apostilas e aulas remotas e presenciais, além de avaliações e realização de palestras com convidados em formato de “lives”. Foram tratados temos como:
(a) desigualdades sociais;
(b) cultura,
(c) gênero,
(d) samba como projeto de Brasil;
(e) cultura ioruba;
(f) dança afro
(g) pensamento político brasileiro e a discussão sobre “raça” nos séculos XIX e XX;
(h) Era Vargas e Estado Novo;
(i) carnaval, escolas de samba e negritude;
(j) indústria cultural e
(k) regime militar
Podem ser citados sambas desde “Pelo Telefone” (1917) até as sambistas mulheres contemporâneas que enfrentam o machismo, incluindo sambas de compositores/cantores da Pequena África (Sinhô, Donga, João da Bahiana, sob os auspícios de Tia Ciata, entre outros); do Estácio (Ismael Silva, Bide, Nilton Bastos, entre outros); da Era de Ouro do Rádio (Francisco Alves, Orlando Silva, Carmen Miranda, entre outros); das décadas de 1930 (Noel Rosa, Wilson Baptista, Aracy de Almeida, Aracy Cortes, entre outros); -1940 (Ataulfo Alves, Geraldo Pereira, Linda Batista, entre outros); -1950 (Moreira da Silva, Roberto Silva, Elizeth Cardoso, entre outros); até as décadas de 1960 a 1980 (Zé Ketti, Cartola, Nelson Cavaquinho, Clementina de Jesus, Martinho da Vila, Paulinho da Viola, João Nogueira, Roberto Ribeiro, Aldir Blanc, Alcione, Beth Carvalho, Clara Nunes, D. Ivone Lara, Cacique de Ramos, entre outros); e dos dias atuais, especialmente as mulheres (Mart’Nalia, Teresa Cristina, Dorina, Leci Brandão, entre outras).
Por isso, foram realizadas audições de sambas das décadas de 1920 e 1930 como “Jura”, “Batuque na Cozinha”e“Se Você Jurar”, além de sambas do cancioneiro de Noel Rosa; sambas das décadas de 1940 a 1960 como “Na Subida do Morro” e “Aos pés da cruz”; sambas do cancioneiro de Monsueto Menezes, Silas de Oliveira e Geraldo Pereira; sambas das décadas de 1970 e 1980 adiante, cujo número de obras apresentadas e discutidas é excessivo para citação, do cancioneiro de João Nogueira, Martinho da Vila e Paulinho da Viola; e, finalmente, sambas de enredo da década, por exemplo, “Os Sertões” (Em Cima da Hora, 1976).
Vê-se, portanto, que – mais do que títulos dos sambas, seus temas e assuntos, e os valores trabalhados–, é possível demonstrarmos,em perspectiva decolonial, o olhar sobre o sambista como intelectual, sua trajetória de vida, a luta contra o racismo e as desigualdades sociais realizadas pelo samba, nos marcos do exemplo dado por Nelson Sargento na letra de “Agoniza,mas não morre”.
O samba dessa forma é analisado, em suma, como um veículo para se tratar de aspectos referentes às desigualdades de cor/raça, renda e gênero, bem como exemplo afrocentrado positivo sobre a cultura afro-brasileira.
4. Metodologia
Procedemos do seguinte modo:
(I) Definição do Samba –sua história e a de sambistas, e suas particularidades rítmicas, melódicas e poéticas, além de suas letras –como objeto de reflexão;
(II) Pesquisa bibliográfica que se serviu de Lopes & Simas (2015), Sodré (1998) e Grüne (2012), em especial, mas também outros livros, como Vianna (2004) e Lira Neto (2017).
(III) Realização de aulas, palestras, audições de sambas e avaliações de estudantes para levá-los às reflexões pretendidas;
(IV) Conclusão, com cada turma, das atividades que compuseram o curso ministrado remotamente ou presencialmente.
5. Resultados
Como resultados, podemos citar:
(1) Produção de materiais (apostilas escritas por nós, um advogado que é também sociólogo e cientista político, além de professor de Sociologia do Colégio Pedro II, e uma socióloga e antropóloga que era, à época, doutoranda em Antropologia desenvolvendo tese sobre tema correlato),
(2) realização de “lives” transmitidas no Canal do LAEDH - Laboratório de Educação em Direitos Humanos do Colégio Pedro II - no youtube, com os professores Mauro Cordeiro, Aninha Catão e Arthur José Baptista, cujos links referimos acima, para a realização do curso, além de
(3) relatórios e avaliações produzidos pelos estudantes no sentido de demonstrarem a compreensão dos conteúdos ministrados, das aulas dadas e das palestras proferidas.
Consideramos o resultado muito satisfatório, conseguindo levar debates sobre Direitos Humanos e uma sensibilização dos estudantes em relação aos princípios de uma Educação em Direitos Humanos, nos termos da Resolução n° 1 CNE/MEC.
Finalmente, esta experiência foi também relatada no Encontro Regional Sudeste da Rede Brasileira de Educação em Direitos Humanos em 23 de julho de 2022 e hoje consta como prática pedagógica para EDH divulgada na página da REBEDH (https://www.rebedh.com.br/uma-educacao-em-direitos-humanos-atraves-do-samba/). Os autores agradecem à Prof. Vera Candau, que estava presente na apresentação, pelas palavras de incentivo durante o debate que se seguiu aos relatos realizados.
6. Referências
GRÜNE, Carmela. Samba no Pé e Direito na Cabeça. São Paulo: Saraiva, 2012.
LIRA NETO, João. Uma história do samba. São Paulo: Companhia das Letras, 2017.
LOPES, Nei & SIMAS, Luiz. Dicionário da História Social do Samba. São Paulo: Civilização Brasileira, 2015.
SODRÉ, Muniz. Samba, o dono do corpo. Rio de Janeiro: Mauad, 1998.
VIANNA, Luiz Fernando. Geografia Carioca do Samba. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2004.